639 - Por um Processo Civil comunicativo e dialógico

 

PAULO SÉRGIO VELTEN PEREIRA [1] – Desembargador do TJMA

 

 

Área do Direito: Processual Civil; Civil; Constitucional.

 

Resumo: O presente artigo aborda o tema da edição do novo Código de Processo Civil brasileiro e da expansão que o princípio do contraditório terá com a entrada em vigor da nova lei, gerando para o juiz deveres de consulta e de diálogo com as partes acerca da fundamentação a ser adotada em sua decisão definitiva, substituindo a surpresa por um projeto de decisão que garanta a participação efetiva de todos os sujeitos do processo na construção de uma solução mais justa e democrática.

 

Palavras-chave: Novo Código de Processo Civil – Princípio do contraditório – Modelo constitucional de processo – Democracia – Dever de consulta e de diálogo – Processo comunicativo e dialógico – Decisão-surpresa – Decisão-projeto.

 

AbstractThis article discusses the new edition of the Brazilian Code of Civil Procedure. It also debates the expansion caused to the principal of an adversarial process following the entry into force of new bill of law, which will create judge’s duties of consultation and dialogue among the parties pertaining the reasoning he intends to adopt in his final decision, replacing the surprise factor with a decision project that can guarantee an effective participation of all the subjects involved in the process of building up a more just and democratic solution.

 

Keywords: New Code of Civil Procedure – Principal of an adversarial process  – Constitutional model of procedure – Democracy – Duty of consultation and dialogue – Communicative and dialogical process – Surprise-decision – Project-decision. 

 

Sumário: 1. Introdução – 2. Um Código informado pelo princípio do contraditório – 3. O abandono do processo autocrático com contraditório restrito às partes – 4. O modelo constitucional de processo civil brasileiro. – 5. O contraditório como dever de consulta e de diálogo – 6. Da decisão-surpresa à decisão-projeto – 7. Considerações finais – 8. Referências.          

 

 

1. Introdução

 

Com a edição da Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015, que instituiu o novo Código de Processo Civil no ordenamento jurídico brasileiro, percebe-se que os debates forenses e acadêmicos em torno desse novel Diploma têm dado pouca ênfase à dimensão que o princípio do contraditório passará a ter a partir de 16 de março do próximo ano, quando o CPC entrará em vigor, considerando o prazo de um ano da sua vacatio legis.  

        

Desde sempre o contraditório foi limitado a garantir o conhecimento da existência de um processo e a sucessiva manifestação das partes sobre os atos subsequentes, mas com o novo Código esse princípio será expandido para impor novas obrigações ao magistrado condutor do feito, que deverá, antes de decidir, submeter à manifestação das partes a fundamentação jurídica que pressupõe aplicável ao caso, algo como um projeto de decisão.

        

Aqui será visto que essa forma de atuação do juiz no modelo do novo Código de Processo Civil é bem distinta daquela com a qual os operadores do direito estão habituados a trabalhar, em que, essencialmente, apenas se assegura a possibilidade de manifestação de uma das partes sobre os atos praticados e alegações deduzidas pela contraparte, observando-se a bilateralidade do processo.

        

Ao longo do trabalho espera-se demonstrar que a expansão do contraditório tem por finalidade adequar a lei processual ao texto da Constituição Federal, fazendo com que a atividade jurisdicional seja desenvolvida da forma mais democrática possível, por meio do aprofundamento do diálogo com as partes e da cooperação judicial, rompendo-se as barreiras impostas pelo processo autocrático do Código Buzaid, com base no qual o juiz é tratado como diretor isolado da batalha travada entre autor e réu.

        

Submetido ao modelo constitucional de processo, esse contraditório expandido constitui o solo fértil sobre o qual pode se desenvolver um processo civil renovado no país, de bases realmente democráticas, em que as partes, conhecendo previamente a fundamentação jurídica a ser utilizada pelo magistrado, têm a oportunidade de interagir mais ativamente com o Estado-juiz na construção de uma decisão judicial mais justa e efetiva, obtida por um processo igualmente justo e equilibrado.

        

Este ensaio pretende evidenciar que a elaboração da decisão judicial com a observância do dever de consulta e de diálogo, além de permitir a substituição da decisão-surpresa pela decisão-projeto, também pode contribuir decisivamente para a redução do déficit democrático do Poder Judiciário, tudo a partir de um processo comunicativo e dialógico, desenvolvido em sintonia fina com a Constituição.     

 

2. Um Código informado pelo princípio do contraditório

 

Ao tempo da edição do atual Código Civil brasileiro (Lei nº 10.406/2002) dizia-se que as modificações introduzidas no novo ordenamento eram essencialmente tópicas, uma vez que um dos objetivos declarados pela comissão de juristas encarregada da elaboração do anteprojeto era manter, na medida do possível, boa parte da redação original do Código Civil de 1916, considerado por muitos estudiosos um primoroso monumento linguístico.[2]

        

Pouco se falava à época da verdadeira revolução projetada pelos valores e princípios do novo Código Civil, sendo restrita ao círculo acadêmico alguma discussão em torno do sistema móvel de direito privado, composto de princípios e conceitos adredemente vagos para permitir a interpretação dinâmica da nova lei e evitar seu engessamento diante da evolução social.[3]

           

Situação semelhante sucede agora com o novo Código de Processo Civil brasileiro sancionado em março do corrente ano. Dá-se grande destaque para a necessidade de organização, coesão e sistematização dos dispositivos da lei processual,[4] mas se dispensa pouca reflexão para os princípios encartados nos enunciados do Livro I da Parte Geral do Código, em especial para a nova dimensão do princípio do contraditório.

        

A ausência desse debate é lamentável, pois nenhuma mudança legislativa será suficiente para a obtenção de um processo justo, efetivo e de bases democráticas se o intérprete autêntico não estiver pronto para interpretar/aplicar o novo direito segundo seus valores e princípios informativos.[5] Sem conferir especial atenção para o tema, corre-se o risco de a nova lei ser aplicada com os olhos no retrovisor, abstraindo-se dela um raciocínio meramente formal, desprovido de conteúdo, desconectado da realidade cotidiana e sem sintonia com o Estado Democrático de Direito.


Portanto, o alerta é necessário: com o novo Código, não será possível continuar a conceber a existência do contraditório apenas em relação às duas partes do feito, aos sujeitos parciais do processo.

        

Ao abrigar o princípio do contraditório em mais de um dispositivo do Título referente às Normas fundamentais e da Aplicação das normas processuais,[6] o legislador emprestou a esse princípio o papel de pensamento diretor da lei processual. Tanto assim, que se trata do Título de abertura, da sua Parte Geral, cujo propósito é exatamente o de abrigar os princípios vetores que irão informar todos os demais setores do novo Código.[7]

        

E o fato de o princípio do contraditório estar desse modo organicamente posicionado não deixa de ter um importante significado simbólico, na medida em que serve para disseminar na cultura jurídica a necessidade de encarar a nova legislação como um desdobramento da Constituição Federal e ainda sinalizar o dever de interpretá-la de acordo com os direitos fundamentais processuais civis.[8]

        

É nesse contexto que o contraditório constitui fundamento basilar para a interpretação e aplicação do novo direito processual, sendo a sua expansão de vital importância para a construção de um processo moderno, capaz de atender o clamor social por uma justiça mais célere, efetiva e comprometida com a concretização dos valores democráticos.

        

O direito processual é um fiel indicador do grau de democracia e de civilidade existentes em determinado Estado. Por isso, o legislador reformista projetou a nova lei tendo o princípio do contraditório como fundamento basilar, assegurando uma participação mais efetiva das partes no processo de construção da decisão judicial.

        

Nesse contexto, prevê o art. 10 do novo Código que “O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”.

        

Sem correspondência no Código de Processo Civil vigente, o novel dispositivo não encapsula o contraditório na simples manifestação sucessiva de autor e réu, como ocorre atualmente. Ele vai além: redimensiona o contraditório, assegurando a manifestação prévia das partes sobre o fundamento da futura decisão, buscando com isso evitar o proferimento de decisões-surpresa (Verbot der Überraschungsentscheidungen), cuja fundamentação é conhecida somente no momento da publicação.

        

O novo Código será informado por um contraditório participativo, que obrigará o juiz a se comunicar com as partes – e indiretamente com a sociedade –, transformando o diálogo processual num importante fator de democratização do próprio Poder Judiciário. 

 

3. O abandono do processo autocrático com contraditório restrito às partes

 

A perda de funcionalidade e eficiência do velho Código Buzaid não é apenas fruto da atual desarmonia de seus dispositivos, desarmonia gerada pelas sucessivas reformas tópicas adotadas a partir da década de 90. Decorre também da manutenção de antigas fórmulas pouco afetas ao contraditório amplo, que hoje somente encontram sentido e aplicação depois de ajustadas pela lente constitucional.[9]

        

Não há dúvida de que se faz mesmo necessário um novo Código de Processo Civil, capaz não só de dar maior coesão aos enunciados normativos, mas primordialmente aprofundar a harmonização de seus dispositivos com o texto da Constituição Federal de 1988, conformidade que o velho Código Processual de 1973, por ter surgido muito tempo antes, não logrou mais sustentar. Por isso é que entre os objetivos anunciados pela comissão de juristas encarregada da elaboração do Anteprojeto destacam-se a necessidade de imprimir maior grau de organicidade ao sistema e estabelecer uma sintonia fina com a Constituição.

        

O que se busca em verdade, mas quase não se ressalta, é deixar de lado o contraditório restrito aos sujeitos parciais do processo e encontrar meios de arbitrar os conflitos da forma mais democrática possível, prestigiando a efetiva participação das partes e também a cooperação do Estado-juiz, pois o direito fundamental ao contraditório encontra assento no valor participação. Nesse aspecto, melhor seria ter mantido a essência da redação dada ao art. 5º pelo Projeto de Lei aprovado no Senado (PL nº 166/2010), que estabelecia possuir as partes “direito de participar ativamente do processo, cooperando entre si e com o juiz e fornecendo-lhe subsídios para que profira decisões, realize atos executivos ou determine a prática de medidas de urgência”.

        

Apesar da boa redação desse dispositivo, a redação final do novo CPC adotou a alteração introduzida pelo Projeto de Lei aprovado na Câmara (PL nº 8.046/2010), substituindo a expressa regra de cooperação pelo dever de probidade processual e boa-fé, valores igualmente importantes e que somente reforçam a necessidade de instauração de um ambiente cooperativo cuja razão de ser é garantir a participação ativa do autor e do réu no processo,[10] de modo a fornecer ao juiz a maior quantidade possível de elementos aptos a permitir o arbitramento de uma solução lógica, coerente e de acordo com o direito posto, se não para eliminar o conflito, por certo para absorver a insegurança.[11]

        

Não se submete a esse modelo constitucional e sistemático, a forma centralizadora e autocrática de absorção de insegurança reinante na atual processualística nacional, em que somente as partes atuam para valer (quando atuam), ficando reservado para o juiz um papel passivo, de árbitro autômato e equidistante, que conhece o direito (jura novit curia), mas permanece numa redoma de vidro, cooperando pouco e nunca dialogando com as partes na construção do caminho condutor da decisão, que hoje é imposta verticalmente, de forma autocrática. 

        

O tema remete ao mito da caverna de Platão, em que apenas o filósofo que dela podia sair para a luz do dia é capaz de ver as coisas como realmente são e assim governar os demais habitantes que permaneciam olhando para as sombras refletidas na parede da caverna. Revisitando esse mito e aplicando-o como critério de solução dos dilemas do cotidiano, Michael Sandel afirma que essa forma platônica de ver as coisas está certa apenas em parte, “pois os clamores dos que ficaram na caverna devem ser levados em consideração”, já que “a filosofia que não tem contato com as sombras na parede só poderá produzir uma utopia estéril”.[12]

        

Sandel quer com isso mostrar que para se captar o sentido de justiça dos julgamentos não basta ao juiz colocar-se acima dos preconceitos e das rotinas do dia a dia – o que, por si só, já é algo bastante difícil para alguns. Essencial, segundo esse pensador, que também colha opiniões e convicções dos outros sujeitos do processo, ainda que posições parciais, como pontos de partida, pois constitui um falso pluralismo, típico de democracias ainda jovens, apenas assegurar a manifestação dos destinatários da decisão, olvidando que o mais importante é levar em consideração o que dizem, prestigiando o direito de as partes influenciarem o resultado do julgamento.

        

Convocando essa filosofia para o campo da ciência jurídica, é possível concluir que um processo centrado na figura do juiz, que restringe o contraditório à simples manifestação sucessiva das partes, não é um processo de moldura constitucional capaz de produzir resultados justos e coerentes, ou simplesmente aptos a absorver insegurança, sabido que no processo autocrático a jurisdição, com frequência cada vez maior, tem sido utilizada menos para dirimir do que para criar e recriar conflitos.

        

Esse vetusto modelo autoritário de processo deve ser abandonado, sendo em seu lugar erigido um novo tipo de contraditório, expandido a partir de uma visão cooperativa de processo, em que o juiz submete às partes sua primeira impressão técnica sobre a questão a ser decidida, colhe suas manifestações a respeito como pontos de partida parciais, abstraindo daí os elementos para a formação de sua convicção e elaboração da solução final de maneira democrática, proferindo uma decisão fundamentada e com o enfrentamento das argumentações deduzidas.[13]

        

Um país que se proclama democrático e atualmente possui cerca de 95 milhões de processos em tramitação[14] não pode manter seus jurisdicionados sob o jugo de um processo de cariz autocrática, que não privilegia o diálogo inerente ao princípio da colaboração nem se conforma com as escolhas políticas elegidas pela Constituição.

 

4. O modelo constitucional de processo civil brasileiro

 

O processo civil brasileiro não ficou livre do fenômeno da constitucionalização que os direitos, de um modo geral, experimentaram a partir da segunda metade do século XX, fenômeno que Virgílio Afonso da Silva bem definiu como a “irradiação dos efeitos das normas (ou valores) constitucionais aos outros ramos do direito”.[15]

        

Estando a Constituição no centro do sistema jurídico dela se projetam efeitos para as diversas disciplinas, que passam a se comunicar entre si e em perfeita harmonia com os princípios e regras irradiantes do texto constitucional.

        

Em virtude disso, o processo civil também deve se harmonizar com as garantias constitucionais de um Estado Democrático de Direito, entre as quais a que assegura o contraditório aos litigantes no processo judicial, conforme art. 5º LV da Carta Republicana.[16]

        

Para o autor de uma ação judicial isso importa a possibilidade de veicular perante o Estado-juiz o interesse que pretende ver tutelado, assim como a respectiva prova de suas alegações. E para o réu, a garantia de ser comunicado sobre a demanda e de poder se contrapor em face dela, também por meio de alegações e da produção da prova correlata. Para ambos os protagonistas do processo, representa a garantia de que terão suas argumentações efetivamente levadas em conta (isto é, acolhidas ou rejeitadas) por ocasião do proferimento de qualquer decisão.

        

Ao Estado-juiz cabe assegurar o equilíbrio e a igualdade de atuação das partes, dentro do que se convencionou chamar de princípio da paridade de armas, em verdade, um desdobramento dos princípios da isonomia e do contraditório.[17]

        
Tão significativo é o papel do contraditório na atualidade, que esse princípio, no Estado Constitucional, passa a compor o próprio conceito de processo, hoje melhor e mais tecnicamente compreendido como “atividade estatal desenvolvida sob contraditório e ampla defesa para viabilizar o exercício democrático do poder do Estado.”[18]

        

Nesse conceito subjaz a ideia segundo a qual o Estado-juiz não possui a chave da verdade, por essa razão deve se preocupar com a legitimidade de sua decisão, e esta será tanto mais legítima à proporção que advenha de um processo de deliberação, que assegure a participação ampla e efetiva de todos os atores envolvidos. No âmbito do processo civil, o juiz do Estado Constitucional deve ser “ativo na condução do processo em colaboração com as partes”.[19] Outra compreensão não é possível quando se invoca o exercício democrático do poder.

 

E para que uma democracia possa funcionar bem e perdurar, as decisões não podem ser proferidas antes de um amplo processo de deliberação, que envolva o debate e a crítica esclarecida. Forte nesse entendimento, Albert Hirschman sustenta que constitui um risco para a democracia a existência de opiniões sólidas e preconcebidas, que interditam o debate e não valorizam a opinião do outro.[20]

        

Essa visão moderna, fundada na teoria da democracia, pressiona por uma mudança de postura do intérprete autêntico, que deve abandonar opiniões preconcebidas, não raro formadas no discurso ideológico, e abrir a mente para as argumentações deduzidas pelas partes. Mais que isso: deve levar em conta tais argumentações. Essa deve ser a prática resultante do modelo constitucional de processo, fora do qual não há atividade jurisdicional válida e capaz de assegurar o acesso a uma ordem jurídica justa, democrática e apta a tutelar o direito material de forma efetiva e eficiente.

        

Mas para que a atividade jurisdicional seja realmente legítima e viabilizadora do exercício democrático do poder do Estado, o contraditório precisa ser visto nessa dimensão mais ampla, participativa e abrangente de todos os aspectos, processuais e materiais, como decorrência das conquistas sociais obtidas ao longo da evolução histórica. Em suma, a nova processualística deve ter presente um contraditório elevado à condição de dogma, que tenha por base o diálogo e por horizonte a convicção de que nada pode ser decidido sem o conhecimento e a participação das partes.

 

5. O contraditório como dever de consulta e de diálogo 

        

Na perspectiva de um processo realmente dialógico, acertou o legislador com a introdução do art. 10 no novo Código. O dispositivo inspira-se na ideia de cooperação judicial e reafirma o direito de participação ativa das partes no processo, consagrando o contraditório como dever de consulta e de diálogo judicial, considerando que o princípio não fica mais restrito às partes, ele se expande e passa a ter como destinatário também o juiz.[21]

        

Com a entrada em vigor da nova lei, não bastará ao magistrado assegurar a manifestação mútua das partes antes de decidir. Deverá primeiro consultá-las, submetendo ao seu exame prévio os fundamentos que pretende adotar na decisão.

        

O processo é produto da vida de relações que se desenvolve no seio da sociedade. Logo, não pode ficar encastelado na técnica e no conhecimento do aplicador da lei. Ao revés, deve estar aberto para sofrer as influências da sociedade que o criou. E é por meio do diálogo que as partes possuem a oportunidade de influenciar eficazmente na formação da convicção do juiz. 

        

Como pressuposto da decisão judicial, o contraditório expandido transforma o processo em instrumento de comunicação, um processo emancipador de comunicabilidade, como preconizava Habermas,[22] favorecendo o escopo político de participação da sociedade na busca civilizada da solução dos litígios. Uma busca coletiva, que requer interlocutores instruídos, e não mais um trabalho hercúleo de investigação introspectiva, feita no silêncio do gabinete do magistrado.

        

O processo deixa de ser dialético, limitado ao embate argumentativo fixado entre autor e réu, e passa a ser dialógico, pois considera a manifestação das partes como pontos de partida parciais para a elaboração da decisão judicial. Com isso, concede-se aos sujeitos do processo, que vivenciam o contexto fático regulado pela norma, a possibilidade de ser um de seus cointérpretes, pondo fim ao monopólio da interpretação tão criticado pela pena de Peter Häberle, ao argumento de que “todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente um intérprete dessa norma. O destinatário da norma é participante ativo, muito mais ativo do que se pode supor tradicionalmente, do processo hermenêutico”.[23]

        

Com essa visão ampliada de contraditório fundado em dever de consulta e de diálogo com os sujeitos parciais do processo, contribui-se, em preciosa medida, com o equacionamento do problema de déficit democrático do Poder Judiciário[24] – pois a democracia se alimenta muito mais do entrechoque de opiniões do que de consensos e unanimidades –, eliminando a chamada decisão-surpresa, nascida da pressa e da falta de diálogo, sendo por isso incapaz de produzir efeito em face do modelo constitucional de processo.[25]

        

Além de reafirmar as bases democráticas do processo civil brasileiro, a nova técnica do contraditório recolocará no tablado a necessidade da reflexão resultante do cumprimento dos deveres de consulta e de diálogo, retirando os juízes da linha de produção para a qual foram empurrados pelos órgãos de controle com vistas ao atendimento frenético de metas, com graves consequências para a qualidade da prestação jurisdicional.[26] Juízes não podem ser convertidos em autômatos do sistema, devem ser estimulados a proferir decisões maturadas e forjadas no debate processual.

        

O Judiciário da pós-modernidade não deve cuidar apenas de fazer depressa (e a qualquer custo). Deve, conforme o dito espirituoso de José Alberto dos Reis, fazer bem e depressa,[27] o que importa prestar a jurisdição em tempo razoável, mas sem prejuízo da qualidade, trabalho que requer uma demora mínima, necessária à reflexão como fruto do diálogo processual.[28]

        

E não se diga que a sistemática de um processo comunicativo resultará num formalismo excessivo, uma das causas da morosidade que tanto atormenta a comunidade jurídica e constrange o Judiciário.

        

O processo comunicativo prestigiará o formalismo na dose certa, o bastante para disciplinar o andamento do processo, de modo a evitar o arbítrio do poder e os excessos de uma parte em face da outra. Um formalismo-valorativo destinado a conferir segurança jurídica e atenção com os atos que precedem a prolação de uma sentença justa.

        

Quando proferida com precisão, boa técnica e garantia da efetiva participação dos sujeitos do processo, a decisão judicial tende a ser mantida nos tribunais e melhor assimilada pela parte sucumbente, que aceita mais resignadamente o resultado proclamado, à medida que com ele contribuiu, recebendo todas as justificativas concretas pelas quais o juiz deixou de acolher suas alegações, conforme passará a exigir o rico enunciado do art. 489 §1º. Percebe-se, então, que a tutela jurisdicional proferida em bases democráticas, com a observância do dever de consulta e de diálogo, absorve a insegurança de maneira definitiva e plena, devolvendo mais rapidamente a estabilidade para a vida de relações. Eis aí uma boa forma de celeridade a ser resgatada.  

 

6. Da decisão-surpresa à decisão-projeto

 

No contexto de um processo de moldura constitucional, em que o contraditório se expande para incluir o magistrado, sendo redimensionado como dever de consulta e de diálogo, a tradicional decisão-surpresa deve dar lugar à decisão-projeto, compreendida como tal um plano ou esboço de fundamentação jurídica que, depois de submetido à manifestação das partes, em qualquer momento em que se houver de decidir, comporá os fundamentos da futura decisão, com base nos quais o juiz analisará as questões de fato e de direito deduzidas.

 

A depender da qualidade da crítica ofertada pelas partes ao projeto de motivação da futura decisão, o juiz terá a possibilidade de rever a fundamentação pressuposta para a hipótese, conformando-a com as argumentações apresentadas.

        

Assim, através da participação ativa e da cooperação das partes no processo, o condutor do feito tem a oportunidade de entregar uma prestação jurisdicional de melhor qualidade, sendo infinitamente maiores as chances de encontrar uma solução justa, também no sentido de solução precisa e ajustada ao caso, a solução que contemple a chamada equidade individualizadora de que falava Agostinho Alvim.[29]

        

A garantia de manifestação prévia das partes sobre os fundamentos da futura decisão não importa prejulgamento, à medida que, nessa fase preparatória, as questões de fato e de direito deduzidas não são analisadas em pormenor e tampouco há acolhimento ou rejeição de qualquer tipo de pretensão. Tudo isso fica para a ocasião de prolação da decisão propriamente dita, decisão em sentido lato (interlocutória ou sentença).

 

O dever de consulta se encerra na apresentação de um simples esboço ou projeto de decisão (que pode ser oral, quando em audiência), pois o que o novo Código exigirá é que o magistrado apenas submeta ao exame das partes o fundamento jurídico que pretende adotar, sem ter que necessariamente dizer se o adotará para deferir ou indeferir o que se pede. A decisão propriamente dita, se positiva ou negativa, estará sempre a depender da crítica esclarecida apresentada pelas partes, nisso consiste o diálogo judicial.

        

Sendo a regra do contraditório expandido também aplicável à matéria sobre a qual o juiz deva decidir de ofício, a decisão-projeto caberia na seguinte fórmula: “digam as partes sobre a incidência da prescrição ao caso”. Como se vê, a questão não reside apenas em assegurar a manifestação. Está em garantir a manifestação das partes sobre determinada matéria que o julgador pressupõe poder aplicar à situação concreta que se apresentar, mas que somente poderá dela se valer para fundamentar sua decisão, após submetê-la ao escrutínio das partes.

        

Na prática judiciária hodierna, de um modo geral, a decisão vem na forma de surpresa, o juiz decide de ofício matéria que sequer é agitada no processo, porque de ordem pública, suprimindo a possibilidade de as partes, segundo o exemplo dado, trazerem ao seu conhecimento a ocorrência de uma causa interruptiva ou suspensiva da prescrição.[30]

        

A consequência é que a jurisdição acaba gerando perplexidade. O juiz decide sem ouvir ou consultar ninguém e, de ordinário, decide mal. Rende ensejo à interposição de um recurso, que sendo provido, determinará a reforma da decisão e, em alguns casos, a restituição dos autos ao 1º grau para novo julgamento, com perda de tempo e energia, prolongando o litígio e ampliando a carga de trabalho dos tribunais desnecessariamente, tudo em desprestígio da jurisdição e do princípio que assegura a solução do processo em tempo razoável. 

          

A ideia de contraditório como dever de diálogo e de consulta, permitindo a substituição da decisão-surpresa pela decisão-projeto, vem para eliminar o anacronismo, a falta de transparência, o desperdício de tempo e de energia, tornando mais justo o resultado e o processo em si, mercê do equilíbrio propiciado pela garantia da efetiva participação democrática.

 

7. Considerações finais

 

O contraditório expandido previsto no art. 10 do novo Código colocará o direito processual civil brasileiro num outro estágio evolutivo, com a maximização da oportunidade de as partes atuarem de modo mais efetivo na construção da decisão judicial.

        

Concebendo-se o contraditório como dever de consulta e de diálogo, construir-se-á um processo com bases democráticas, que de certo favorecerá o atingimento dos escopos da jurisdição mais eficazmente do que o atual modelo autocrático de processo permite realizar, sobretudo os objetivos políticos de participação da sociedade na busca da melhor e mais adequada solução do conflito de interesses.

        

A nova lei, se corretamente compreendida e aplicada, promoverá uma importante mudança de postura do seu aplicador, que deverá refugar idiossincrasias e posições peremptórias, adotando um estilo de atuação mais transparente, maduro e cooperativo, sujeitando a decisão-projeto à análise crítica das partes, criando espaços para um debate esclarecido e propositivo.

        
?Processo não é monopólio das partes e tampouco do juiz. A natureza pública do instituto reclama um debate plural, democrático e amplificado pelo diálogo permanente de todos os seus sujeitos.

 

O contraditório expandido pela efetiva participação das partes na construção da norma do caso concreto constitui uma preciosa garantia fundamental do processo, uma vez que além de legitimar democraticamente a atuação dos juízes, contribuirá para melhorar a qualidade das decisões judiciais.

        

Por um processo civil comunicativo e dialógico, que venha o novo Código!

 

 

8. Referências

 

ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 1980.

 

CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito.4.ed. Lisboa: Fundação CalousteGulbenkian, 2008.

 

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA- CNJ.Relatório justiça em números. 10.ed. Disponível em:  <ftp://ftp.cnj.jus.br/Justica_em_Numeros/relatorio_jn2014.pdf>. Acesso em 12 nov. 2014.

 

FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2011.

 

FUX, Luiz (Org.). O novo processo civil brasileiro: direito em expectativa. Rio: Forense, 2011.

 

GADAMER, Hans-Georg. Verdad y método, 4.ed. Tradução de Ana Agud Aparício e Rafael de Agapito. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1991.

 

HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e ‘procedimental’ da constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Fabris, 2002.

 

HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Tradução de Guido A. de Almeida. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003.

 

HIRSCHAMAN, Albert O. Auto-subversão: teorias consagradas em xeque. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

 

IBÁRCENA, Lorenzo Zolezzi. Derechoen contexto. Lima: Fondo Editorial de la Pontificia Universidad Católica del Perú, 2012.

 

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

 

LARENZ, Karl. Derecho justo - fundamento de ética jurídica. Tradução de Luis Diez-Picazo, Madri: Civitas, 1985. 

 

MARINONI, Luiz Guilherme; Mitidiero, Daniel. O projeto do CPC: crítica e propostas. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2010.

 

RAMOS, Glauco Gumerato. Processo jurisdicional civil, tutela jurisdicional e sistema do CPC: como está e como poderá estar o CPC brasileiro. In: CARNEIRO, Athos Gusmão; CALMON, Petrônio (Coord.). Bases científicas para um renovado direito processual. 2.ed. Salvador: Editora Podivm, 2009.

 

REALE, Miguel. História do novo código civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

 

SANDEL, MICHAEL J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. 6.ed. Tradução de Heloísa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012.

 

SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2008.

 

 

 



[1] Doutorando e Mestre em Direito Civil pela PUC/SP. Especialista em Direito Processual Civil pela PUC/SP. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão.

 

[2] Ver a respeito: REALE, Miguel. História do novo código civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 83. Nessa obra o grande jurista brasileiro registra que uma preocupação permanente da comissão elaboradora do anteprojeto do Código Civil de 2002 foi preservar a beleza formal do Código de 1916, tido como um modelo insuperável de vernaculidade, ressaltando Reale que uma lei bela representa meio caminho andado para a comunicação da Justiça.

[3] Sobre abertura e mobilidade do sistema de direito privado: CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito. 4. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2008, p. 103 e ss.

[4] Necessidade justificada, segundo a comissão elaboradora do anteprojeto, pelo fato de o velho Código de 1973 ter-se transformado numa colcha de retalhos, mercê das sucessivas reformas tópicas realizadas a partir de meados da década de 1990.

[5]Intérprete autêntico no sentido atribuído por Hans Kelsen, de interpretação realizada pelo órgão estatal aplicador do direito (KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução de João Baptista Machado. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 387 e ss.). Interpretar/aplicar o direito como atividade unitária e não-autônoma, pois o intérprete somente obtém o verdadeiro sentido do texto a partir de um dado caso concreto. Interpretar o direito consiste em dar concretude à lei em cada caso, ou seja, aplicá-la (GADAMER, Hans-Georg. Verdad y método, 4.ed. Tradução de Ana Agud Aparício e Rafael de Agapito. Salamanca: Ediciones Sígueme, 1991, p. 397-401).

[6] O art. 7º determina que o juiz zele pelo efetivo contraditório, não qualquer contraditório; o art. 9º veda que se profira decisão contra uma parte sem antes ouvi-la; e o art. 10 proíbe a prolação de decisão sem que as partes tenham oportunidade de se manifestar sobre seus fundamentos (fundamentos da decisão).  

[7] LARENZ, Karl. Derecho justo - fundamento de ética jurídica. Tradução de Luis Diez-Picazo, Madri: Civitas, 1985, p. 32. Este autor confere aos princípios a função de pensamentos diretores de uma regulação jurídica existente ou possível.

[8]MARINONI, Luiz Guilherme; Mitidiero, Daniel. O projeto do CPC: crítica e propostas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 16.

[9] Exemplo disso são os embargos de declaração, recurso que se distingue dos demais pela ausência de previsão do contraditório no Código de Processo vigente, mas que na prática é assegurado com fundamento no art. 5º LV da Constituição Federal, sempre que possível a aplicação de efeito modificativo em caráter excepcional. O novo CPC, conformando-se com a Lei Maior, expressamente prevê o contraditório para os embargos de declaração no art.1.023 § 2º.  

[10] A redação do art. 5º do Projeto de Lei do Senado foi fortemente criticada ao prever a existência de cooperação entre as próprias partes, o que em tese não se compatibilizaria com a estrutura adversarial ínsita ao processo contencioso. Afinal, se existe processo é porque faltou colaboração mútua no sentido de encontrar uma solução amigável para o conflito. Isso, todavia, seria motivo para simples ajuste e não para o completo abandono do texto, sobretudo, quando o dever de cooperação entre as partes encontrou abrigo no art. 6º do novo CPC. E pior, sem que ficasse aclarado que a colaboração no processo civil do Estado Constitucional, de rigor, deve ser sempre compreendida como a colaboração do juiz em relação às partes. Nesse sentido ver: MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC: crítica e propostas. Op. cit., p. 73. 

[11] É de Ferraz Junior a percuciente observação de que a finalidade última da decisão judicial não é eliminar os conflitos, mas absorver a insegurança por eles gerada. “Absorção de insegurança significa, pois, que o ato de decidir transforma incompatibilidades indecidíveis em alternativas decidíveis, ainda que, num momento subsequente, venha a gerar novas situações de incompatibilidade eventualmente até mais complexas que as anteriores. Absorção de insegurança, portanto, nada tem a ver com a ideia mais tradicional de obtenção de harmonia e consenso, como se em toda decisão estivesse em jogo a possibilidade de eliminar-se o conflito. Ao contrário, se o conflito é incompatibilidade que exige decisão é porque ele não pode ser dissolvido, não pode acabar, pois então não precisaríamos de decisão, mas de simples opção que já estava, desde sempre, implícita entre as alternativas. Decisões, portanto, absorvem insegurança, não porque eliminam o conflito, mas porque o transformam”(FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do direito: técnica, decisão, dominação. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 288).

[12]SANDEL, MICHAEL J. Justiça: o que é fazer a coisa certa. 6. ed. Tradução de Heloísa Matias e Maria Alice Máximo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2012, p. 38-39.

[13] A propósito, a necessidade de enfrentamento de todos os argumentos importantes deduzidos no processo está expressamente prevista no novo CPC (art. 489 §1º IV), não se considerando fundamentada a decisão que não observe essa regra, entre outras. 

[14] De acordo com a 10ª edição do Relatório Justiça em Números, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça. Disponível em:<ftp://ftp.cnj.jus.br/Justica_em_Numeros/relatorio_jn2014.pdf>. Acesso em 12 nov. 2014.

[15]SILVA, Virgílio Afonso da. A constitucionalização do direito: os direitos fundamentais nas relações entre particulares. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 18.

[16] CF, art. 5º LV: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”

[17] O princípio da paridade de armas foi positivado no art. 7º do novo CPC, com a seguinte redação: “É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais (...)”. A regra correspondente do Código de Processo Civil vigente é a do art. 125 I, que diz competir ao juiz “assegurar às partes igualdade de tratamento”. Tem-se que a paridade contemplada no texto da nova lei constitui expressão mais ajustada à prática da igualdade aristotélica, à medida que o juiz pode estabelecer as discriminações necessárias, visando assegurar e preservar a participação igualitária das partes, inclusive, por meio da dinamização do ônus da prova, nos termos do art. 373 §1º do novo CPC.

[18] RAMOS, Glauco Gumerato. Processo jurisdicional civil, tutela jurisdicional e sistema do CPC: como está e como poderá estar o CPC brasileiro. In: CARNEIRO, Athos Gusmão; CALMON, Petrônio (Coord.). Bases científicas para um renovado direito processual. 2.ed. Salvador: Editora Podivm, 2009, p. 574.

[19] MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC: crítica e propostas. Op. cit., p. 32.

[20] HIRSCHAMAN, Albert O. Auto-subversão: teorias consagradas em xeque. Tradução de Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 1996, p. 96.

[21] MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC: crítica e propostas. Op. cit., p. 75.

[22]HABERMAS, Jürgen. Consciência moral e agir comunicativo. Tradução de Guido A. de Almeida. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2003, p. 145.

[23] HÄBERLE, Peter. Hermenêutica constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da constituição: contribuição para a interpretação pluralista e ‘procedimental’ da constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Fabris, 2002, p. 15.

[24] E resolver problemas foi uma das linhas de trabalho da Comissão, conforme exposição de motivos do Anteprojeto no novo Código de Processo Civil.

[25] MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. O projeto do CPC: crítica e propostas. Op. cit., p. 76. Esses autores criticam o fato de o novo Código não haver disciplinado as consequências da decisão-surpresa, que existe e pode ser considerada válida (desde que formalmente fundamentada), embora se revele ineficaz por violar uma das condições de sua prolação, que é exatamente o dever de diálogo em que se desdobra o contraditório. 

[26] As Metas Nacionais do Poder Judiciário, também conhecidas como Metas de nivelamento, foram definidas pela primeira vez no 2º Encontro Nacional do Judiciário, no ano de 2009, em Belo Horizonte, sob a coordenação do Conselho Nacional de Justiça – CNJ. Entre essas metas, a de nº 2 foi merecedora de maior destaque, pois ela determinou aos tribunais que identificassem e julgassem os processos judiciais mais antigos, distribuídos até 31/12/2005. Através da Meta 2 o Judiciário buscou conferir concretude ao direito fundamental à razoável duração do processo (CF, art. 5º LXXVIII), empenhando-se ao máximo para eliminar o estoque de processos responsáveis pelas elevadas taxas de congestionamento nos tribunais. Para 2014, a Meta 2 estabeleceu percentuais de julgamento distintos para os diversos seguimentos do Judiciário. A Justiça Estadual, por exemplo, deverá identificar e julgar, até 31/12/2014, pelo menos 80% dos processos distribuídos até 31/12/2010 no 1º grau, e até 31/12/2011 no 2º grau; e 100% dos processos distribuídos até 31/12/2011 nos Juizados Especiais e nas Turmas Recursais Estaduais. O CNJ também colocou em seu sítio eletrônico um processômetro com o índice de produtividade dos Tribunais brasileiros. Os juízes estão na linha de produção e fiscalizados.

[27] FUX, Luiz (Org.). O novo processo civil brasileiro: direito em expectativa. Rio: Forense, 2011, p. 3.

[28] A propósito do papel do tempo no processo judicial, Lorenzo Zolezzi Ibárcena adverte que “La búsqueda de la verdad toma tiempo y el tiempo es bueno para enfriar las pasiones y hacer que las personas tocadas por la tragedia, los investigadores, acusadores y juzgadores, y el público em general, tengan tiempo para reflexionar y domar esos instintos de que hablámos, esos instintos de venganza, de búsqueda de un castigo casi siempre irreflexivo” (IBÁRCENA, Lorenzo Zolezzi. Derechoen contexto. Lima: Fondo Editorial de la Pontificia Universidad Católica del Perú, 2012, p.160/161).

[29]ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1980, p.4.

[30]Nada obstante o sistema processual atual esteja alinhado, em geral, ao modelo de decisão-surpresa, é oportuno observar que a Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830/1980), de forma vanguardista e aplicando a ideia de contraditório como dever de diálogo e de consulta, já exige desde 2004 que o magistrado ouça a Fazenda Pública antes de pronunciar a prescrição intercorrente na execução fiscal (art. 40 §4º), exatamente para que possam ser arguidas eventuais causas de suspensão ou interrupção da prescrição do crédito tributário.


O Tribunal de Justiça de São Paulo utiliza cookies, armazenados apenas em caráter temporário, a fim de obter estatísticas para aprimorar a experiência do usuário. A navegação no portal implica concordância com esse procedimento, em linha com a Política de Privacidade e Proteção de Dados Pessoais do TJSP