Relação entre o Judiciário e o sistema financeiro é debatida na EPM
Magistrados e representantes das principais instituições financeiras do país reuniram-se nessa sexta-feira (21), na EPM, para o seminário O Poder Judiciário e o sistema financeiro.
O evento teve a participação do presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, desembargador José Renato Nalini, coordenador do seminário; do desembargador Armando Sérgio Prado de Toledo, diretor da EPM; do desembargador Jeferson Moreira de Carvalho, coordenador da EPM e presidente do Instituto Paulista da Magistrados (IPAM), do presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal Filho; do presidente do Itaú, Roberto Egydio Setúbal; do vice-presidente executivo do Bradesco, Alexandre da Silva Glüher; do gerente executivo do Banco do Brasil, Vito Antônio Boccuzi Neto; e do economista chefe do Safra, Carlos Kawall; entre outras autoridades e profissionais do sistema financeiro.
O presidente Nalini iniciou o debate afirmando a necessidade de “azeitamento” da máquina Judiciária, cujo funcionamento é prejudicado por diversos empecilhos, entre eles, a banalização da atividade judiciária. Em relação às demandas envolvendo os bancos, afirmou que, atualmente, representam grande parte das ações do Judiciário paulista, apontando, como uma das causas, a ausência de análise prévia de riscos de insolvência nos contratos de concessão de crédito. “O sistema financeiro é pródigo na concessão de crédito, e a conta mais pesada fica para o Judiciário, inflado com milhões de ações”, afirmou.
O presidente da Febraban, Murilo Portugal Filho, ressaltou que os bancos reconhecem o excesso de ações judiciais do setor, que é o terceiro maior do País, mas observou que os bancos são mais litigados (54% das demandas) do que litigantes. “Os bancos são contra o endividamento leviano e o superendividamento” afirmou, frisando que esse posicionamento tem levado à criação de setores internos de conciliação, além do diálogo com o Judiciário para a busca de medidas pré-processuais, e já está em estudo a criação do cargo de ombudsman para os bancos. “O Judiciário brasileiro tem dois grandes valores: independência e juízes altamente capacitados. Isso nos dá otimismo para a solução de problemas”, ressaltou.
No que concerne ao ajuizamento de ações pelas instituições financeiras, Murilo Portugal Filho afirmou que “uma das razões é que os bancos não podem deduzir despesas da base do imposto de renda e da contribuição social se não ingressarem com ação para recomposição de perdas contratuais (obrigatoriedade prevista na Lei Federal 9.430)”.
O gerente executivo do Banco do Brasil, Vito Antônio Boccuzi Neto, também citou a busca da realização de acordos pelo banco e apontou algumas medidas adotadas, como convênios com os principais Procons do País, participação em mutirões de conciliação e criação de fóruns internos para discutir questões como o superendividamento. “Também buscamos o diálogo com o Judiciário e, apesar das dificuldades, diante do gigantismo do Tribunal paulista, estamos fazendo essa interlocução, inclusive, por meio do Cejusc (capital)”, ressaltou.
O vice-presidente executivo do Bradesco, Alexandre da Silva Glüher, frisou que o banco adota a orientação jurídica do “bom direito”: “Procuramos recorrer ao Poder Judiciário apenas quando houver a possibilidade de êxito”, asseverou, acrescentando que a política administrativa da instituição tem sido a de adesão a todas as campanhas de mediação e conciliação.
O presidente do Itaú, Roberto Egydio Setúbal, apontou as dificuldades enfrentadas pela instituição diante do excesso de litigiosidade e da demora na resolução das demandas, além de outras situações que aumentam a expectativa de perda dos bancos, o que acaba onerando os clientes. “Precisamos buscar formas de tornar todo o sistema mais eficiente, reduzindo as perdas“, frisou, salientando que o banco implementou uma política de apenas levar adiante as ações que consideram que devem ser enfrentadas, procurando reconhecer eventuais erros, de forma a reduzir dos litígios.
O economista chefe do Safra, Carlos Kawall, fez uma exposição sobre o contexto macroeconômico da gestão de recursos financeiros e citou o cenário mundial de recuperação econômica, observando que diversos países realizaram reformas e o Brasil perdeu competitividade por não ter aplicado as medidas necessárias. “Existem questões pendentes que vêm de outras décadas, além da guerra fiscal e do atraso na reforma tributária, entre outros problemas, que aumentam o ‘custo Brasil’, provocando inseguranças que dificultam a realização de investimentos no País”, frisou.
No encerramento do evento, o presidente Renato Nalini ressaltou que o debate foi bastante produtivo, lembrando que o Judiciário não tinha o hábito de dialogar com seus clientes. Ele discorreu sobre as consequências da existência de quatro instâncias de julgamento, chamando a atenção para a “patologia” que representa a existência de quase 100 milhões de processos para uma população de 200 milhões: “Isso decorre da ‘judicialização da vida’”, observou, acrescentando que apenas no Estado de São Paulo são 12 milhões de execuções fiscais, ao custo de R$ 1,5 mil cada, sendo que, com frequência, essas ações têm por objeto valor em torno de R$ 20,00.
Nesse sentido, apontou a importância de a sociedade perceber que custeia a Justiça e que esses custos continuarão a aumentar se ela não aprender a dialogar e procurar resolver suas questões, sem necessitar da tutoria do Judiciário. “A partir de encontros como esse, talvez encontremos alternativas e possamos enfrentar a agenda de reformas, tantas urgentes, que ainda não estamos enfrentando”, concluiu.
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