Teoria geral do processo é tema de aula do curso de Direito Processual Civil

O procurador do Estado e professor Marcelo José Magalhães Bonício foi o palestrante da aula da última segunda-feira (19) do 8º Curso de especialização em Direito Processual da EPM, dedicada à análise de alguns temas da teoria geral do processo em face do novo Código de Processo Civil. A exposição teve a participação do desembargador Milton Paulo de Carvalho Filho, coordenador do curso e da área de Direito Processual Civil da Escola.

 

“Chamamos teoria geral do processo o conjunto de temas que envolvem todo o Direito Processual, seja ele Penal, Trabalhista, Administrativo ou Civil. Quanto mais elementos houver em comum, mais teremos uma teoria geral do processo”. A partir desta definição, Marcelo Bonício discorreu sobre os núcleos comuns aos vários ramos do Direito, entre os quais a visão do ordenamento jurídico como uma dualidade de sistemas ou mundos jurídicos distintos: o Direito material, de um lado, e o sistema processual, de outro.

 

“Os civilistas sequer imaginam que vivem num mundo diferente dos processualistas”, cogitou o palestrante. E explicou que o Direito material é estático, enquanto o Direito Processual é dinâmico, ou seja, “nasce, desenvolve-se nos atos processuais e morre adiante com uma sentença”.

 

Ainda no âmbito das relações entre Direito e processo, o professor asseverou que, se é verdadeira a assertiva da influência do Direito material sobre o Direito Processual, também é acertado dizer que todo processo é neutro, pois que destituído de valores.

 

“No âmbito da sociedade, não há nenhuma aspiração processual. Se perguntarmos a um leigo o que ele espera de um processo, ele dirá que espera que termine logo, pois a celeridade processual é a única coisa que encontra eco na sociedade”, sustentou o professor. Em contrapartida, afirmou que se a pergunta for sobre institutos como o casamento, o contrato, o usucapião ou o direito de propriedade, o interlocutor prontamente externará várias ideias sobre esses temas, “porque Direito material é valor social, e então o Código Civil está carregado de valores; ora protege o hipossuficiente, ora a posse ou a boa-fé, e o Direito Processual assume esses valores como instrumentos de sua realização”.

 

Para o expositor, por exemplo, se o valor da boa-fé é relevante para o Direito Civil – já que, de acordo com a visão maniqueísta, quem agiu de boa-fé tem tudo, e quem não agiu há de ser penalizado – ele é quase irrelevante para o processo civil, já que há deveres éticos no processo, como não litigar de forma maliciosa ou maldosa. “Mas pensem numa coisa: alguém se preocupa em saber se a contestação foi feita de boa ou má-fé? É indiferente se foi feita de boa ou má-fé, porque, de uma maneira ou de outra, faz parte do direito de defesa, da amplitude do diálogo inerente ao processo”, explicou o professor.

 

A instrumentalidade do processo

 

Outro aspecto da teoria geral do processo analisado pelo palestrante foi o da instrumentalidade do processo (estudada pelo professor Cândido Rangel Dinamarco), levando em consideração a assimilação e a proteção de valores do Direito material atinente a cada espécie. “Todo processo é um instrumento de realização de valores jurídicos, políticos, sociais. Como instrumento, é completamente neutro, mas à medida que atua um determinado Direito, fica com a cara de quem o está atuando”, afirmou Marcelo Bonício.

 

Ele observou, por exemplo, que o processo penal tende à proteção do réu em um contexto jurídico de prévia convicção da Polícia e do Ministério Público, prevalecendo a máxima in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu). Da mesma maneira, o processo trabalhista tende ao favorecimento do empregado em face das agressões do mercado de trabalho, do poder e da unilateralidade das empresas empregadoras. Para ilustrar, ele lembrou que, em caso de derrota do empregador, este terá que recolher custas para apelar, ao passo que o empregado, caso derrotado, recorre de graça.

 

O palestrante destacou a neutralidade do processo civil, em que os interesses do autor e do réu equilibram-se na balança. “Se formos ao direito e ao Processo Civil, constataremos que ele trata de maneira igual autor e réu. É o processo mais equilibrado que temos, e é assim porque parte do pressuposto de que o Direito material subjacente a ele é profundamente equilibrado, já que partes maiores e capazes celebram um contrato, pressupondo-se que estejam em condições de entendê-lo, de agir de acordo com as obrigações e direitos que assumiram”, ponderou Marcelo Bonício.

 

Entretanto, ressalvou que o processo civil brasileiro é residual, no sentido de que para ele são dirigidas causas de diversas naturezas, como as tributárias, as ambientais, as de controle da administração pública, as de defesa do consumidor, o processo administrativo, o mandado de segurança, etc. Para o palestrante, isso gera uma distorção do equilíbrio do processo civil que, contudo, não contradiz a regra principal, segundo a qual todo processo é neutro e é apenas um instrumento do Direito material subjacente.

 

Princípios do processo

 

Outro tópico abordado pelo expositor foi o dos princípios do processo. “Para ser verdadeiramente princípio, precisa ter um grau de abstração extremamente elevado, aplicável a todo o sistema. Ou esse princípio é um norte a ser seguido ou é estruturante do sistema”, condicionou Marcelo Bonício.

 

Nesta perspectiva, assinalou o que considera o princípio mais importante, considerado a alma do processo: o contraditório. “Contraditório é a possibilidade de informação de todos os atos praticados no processo. Informação e reação são os dois lados principais do contraditório. A reação será facultada se os direitos discutidos forem disponíveis, mas será exigida se os direitos envolvidos forem indisponíveis”, ensinou.

 

De acordo com o expositor, em um passado relativamente recente, a doutrina definia o processo como uma relação jurídica instaurada entre autor, juiz e réu. “O conceito foi ampliado, de modo que hoje falamos que processo é uma relação jurídica instaurada mediante autor, juiz e réu, com observância do contraditório. Esse elemento contraditório, na doutrina geral do processo, é inerente ao próprio conceito de processo. Acha-se em várias passagens do novo CPC, e isso foi um avanço excepcional do sistema”, asseverou.

 

ES (texto)

 


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