EPM promove o curso ‘Temas atuais da desconsideração da personalidade jurídica’ no Fórum João Mendes Júnior

Otávio Rodrigues e João Scalzilli foram os palestrantes.

  

Os temas “Desconsideração da personalidade jurídica” e “Confusão patrimonial” foram debatidos ontem (25) no curso Temas atuais sobre a desconsideração da personalidade jurídica, realizado no Fórum João Mendes Júnior pela EPM para magistrados e servidores. As exposições foram ministradas pelo promotor de Justiça Otávio Joaquim Rodrigues Filho e pelo advogado João Pedro Scalzilli, com a participação do diretor da Escola, desembargador Francisco Eduardo Loureiro, e do coordenador do curso, juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho.

 

Na abertura dos trabalhos, Francisco Loureiro agradeceu aos palestrantes, coordenadores e participantes e ressaltou que o tema é de grande relevância não só no Direito Empresarial, mas também no campo do Direito Privado e até mesmo do Direito Público.

 

Otávio Rodrigues Filho recordou inicialmente que a pessoa jurídica é um importante instituto do Direito, concebido no século XIX, para que entes diferentes da pessoa física sejam sujeitos de direitos e obrigações, estimulando o empreendedorismo, ao proteger o empreendedor dos riscos da atividade empresarial. E lembrou que a desconsideração da personalidade jurídica foi idealizada para combater o dano causado aos credores pelo uso abusivo e fraudulento do instituto.

 

O professor explicou que a desconsideração da pessoa jurídica tem diferentes finalidades e causas de pedir e está inserida no âmbito dos meios utilizados para responsabilização patrimonial dos sócios e administradores pelas dívidas da sociedade, em caráter subsidiário, quando há pratica de atos que prejudicam efetivamente os credores sociais. Acrescentou que ela é utilizada também quando a sociedade é uma mera ficção para burlar alguma regra, como a cláusula contratual de não concorrência, esconder formação de monopólio em determinado setor ou violar a proibição de certas sociedades de participarem de licitações, casos em que deverá haver ação autônoma.

 

Em relação às causas de pedir, mencionou a confusão patrimonial (a mais comum), a confusão de esferas, a dissolução irregular da sociedade, a subcapitalização e a fraude. E esclareceu que essas situações têm que ser combinadas com o esgotamento ou insuficiência patrimonial da sociedade devedora, porque a desconsideração é sempre uma responsabilidade subsidiária.

 

O palestrante observou que há discussão na doutrina a respeito de a confusão de esferas se tratar de hipótese de desconsideração da personalidade jurídica ou de teoria da aparência, a ser resolvida pela responsabilidade civil. E salientou que os tribunais têm admitido a aplicação da desconsideração justamente pela confusão de esferas, que ocorre quando os elementos externos da sociedade são confundidos propositalmente, como a imagem que projeta perante terceiros, utilização de nomes semelhantes, a veiculação de propaganda conjunta e outros elementos que confundem o público ao qual ela é dirigida e as pessoas que têm relações com a sociedade.

 

Elencou ainda como fundamento para a desconsideração a simples inadimplência a certas espécies de obrigações, como a responsabilidade de sociedades do mesmo grupo por débitos trabalhistas, a responsabilidade de sócios e administradores em relação a débitos dos consumidores e por lesão ao meio ambiente. “É a chamada teoria menor da desconsideração da personalidade, que muitos dizem se tratar de responsabilidade objetiva”, observou. E asseverou que se trata de desconsideração porque é preciso desconsiderar a personalidade jurídica, enfatizando que “o legislador faz essa desconsideração porque elege previamente alguns direitos como mais importantes do que aqueles que são tutelados pela personalidade jurídica e prevê a hipossuficiência dos trabalhadores, dos consumidores, da sociedade em geral, diante da violação de determinados direitos”.

 

Por fim, mencionou a possibilidade de cumulação de pedidos em face dos sócios quando feita na petição inicial e da necessidade de instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, quando pedida no decorrer do processo. E explicou os requisitos, condições da ação, legitimidade ativa e passiva, hipóteses de cabimento, prescrição, competência, antecipação da tutela, medida cautelar, o processamento e extensão do incidente a terceiros por responsabilidade civil por ato próprio.

 

Confusão patrimonial

 

Na sequência, João Pedro Scalzilli discorreu sobre a confusão patrimonial, esclarecendo que ela representa abuso de direito de constituir pessoa jurídica, associando-a uma patologia que tem como causas principais a negligência dos empreendedores (inclusive por despreparo) e a própria existência de grupos de sociedade. Ele lembrou que a desconsideração da personalidade jurídica é o principal remédio para tratar a questão.

 

O expositor salientou a importância da seriedade da autonomia patrimonial, que deve apresentar garantia mínima de solvabilidade aos credores. E ressaltou a tensão existente entre o desejo de estimular o empreendedorismo, com a autonomia patrimonial, e a tutela do crédito, que ficaria prejudicada, pois a confusão patrimonial leva à perda da garantia de recebimento do crédito.

 

Ele discorreu acerca da limitação da responsabilidade dos sócios, que deve ter como condição a efetiva separação patrimonial e não pode persistir diante de desmandos da pessoa jurídica. Recordou o artigo 50 do Código Civil, que trata especificamente da confusão patrimonial e apresenta os requisitos clássicos da teoria maior consubstanciados na necessidade de provar os requisitos do abuso e do dano. E ressaltou que, segundo a teoria menor, basta o esgotamento patrimonial para haver a desconsideração da personalidade jurídica.

 

O professor esclareceu que o dano é caracterizado pela inadimplência por si mesma, enquanto o abuso apresenta cinco vertentes: desvio de finalidade, confusão patrimonial, dissolução irregular, subcapitalização e fraude. Ele ponderou que a subcapitalização prejudica a economia, na medida em que gera risco aos credores, e as instituições bancárias traduzem isso na exigência de garantias colaterais e precificam o risco das operações por meio da elevação da taxa de juros. “A confusão patrimonial é péssima mesmo na hipótese em que é a sociedade que se debruça sobre o patrimônio dos sócios”, enfatizou.

 

João Pedro Scalzilli conceituou confusão patrimonial como o “estado de promiscuidade verificado entre os patrimônios de duas ou mais pessoas, consequência da apropriação por parte dos sócios, administradores, terceiros ou outras sociedades componentes de um grupo econômico dos meios de produção da sociedade”. E distinguiu confusão patrimonial e confusão de esferas: “esfera jurídica é algo maior que o patrimônio. Compreende o patrimônio, mas apresenta elementos não econômicos, como nome domicílio e identificação dos administradores, entre outros. A maior parte da confusão patrimonial é provada por meio da confusão de esferas”.

 

O expositor mencionou ainda a teoria da confusão patrimonial que pressupõe mistura de patrimônios, salientando que é praticamente impossível ter certeza acerca da efetiva mistura de patrimônios e que o juiz está autorizado a reconhecer a confusão patrimonial (e aplicar a teoria da desconsideração) em função da presunção de confusão. Ou seja, trabalha-se com a verdade formal. E ponderou que, segundo a sua tese, isso gera inversão do ônus da prova, esclarecendo­­ que a prova indiciária requer um reforço no módulo de prova.

 

RF (texto e fotos)


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