Combate à corrupção no Brasil e na França é debatido na EPM

Evento reuniu magistrados e especialistas.

 

No último dia 19 foi realizado na EPM o curso Combate à corrupção no Brasil e na França – compliance e cooperação jurídica internacional no Direito Comparado, que teve a participação de magistrados, promotores de Justiça e especialistas dos dois países.

 

A abertura foi feita pelo diretor da EPM, desembargador Francisco Eduardo Loureiro, que agradeceu a presença de todos, em especial dos palestrantes. “É com muita honra que a EPM sedia esse evento, porque não há tema mais atual e relevante do que discutir o combate à corrupção e o compliance, para que possamos conhecer a experiência do Direito Comparado”, ressaltou.

 

O vice-presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, desembargador Artur Marques da Silva Filho, representando o presidente, também agradeceu a presença de todos. “Espero que surjam frutos desse evento, que marcará a história do Tribunal de Justiça, do Ministério Público e das associações da magistratura e do Ministério Público”, frisou.

 

A mesa de trabalhos também foi composta pelos coordenadores do evento, desembargadores Christine Santini, coordenadora de Cursos e Convênios Internacionais da EPM; e Hermann Herschander, conselheiro da EPM; e pelo magistrado Jean-Philippe Rivaud, juiz de ligação da França para o Brasil, Guiana e Suriname.

 

Corrupção e improbidade administrativa no Brasil e na França

 

Na sequência, foi realizado o primeiro painel, “Corrupção e improbidade administrativa no Brasil e na França”, presidido pela desembargadora Christine Santini.

 

Iniciando as exposições, o professor David Chilstein, da Sorbonne School of Law (Université Paris 1) observou que o combate à corrupção internacional na França é uma prática recente. Ele lembrou que a corrupção era corrente e inevitável, mas houve uma moralização do comércio internacional a partir da década de 1990, com assinatura de tratados como a Convenção sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 1997, e a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção ou Convenção Internacional de Mérida, de 2003. Ele destacou as medidas destinadas a contornar as dificuldades ligadas à obtenção de provas e à prescrição, entre elas a utilização da infração da lavagem de dinheiro ao invés da corrupção, a aplicação da infração conhecida na França como abuso de bens sociais, que é a aquisição de bens com recursos da empresa por seus dirigentes, e a integração do sistema de compliance.

 

Em seguida, o juiz Jean-Philippe Rivaud explicou a atuação dos magistrados de ligação na França, lembrando que na França não há uma divisão entre a magistratura e o Ministério Público. Ele esclareceu que os magistrados de ligação fazem parte do corpo diplomático da França e têm as funções de agilizar o encaminhamento do pedido de cooperação internacional e a execução no país de destino, além de ajudar a Justiça francesa, agilizar projetos de cooperação e melhorar a compreensão mútua sobre os sistemas jurídicos e os sistemas judiciários dos países. Ele salientou que a cooperação com o Brasil é uma das melhores do mundo, porque é sem fronteiras: “o maior obstáculo no combate à corrupção e ao crime organizado são as fronteiras jurídicas”. Destacou também a importância do intercâmbio e da troca de experiências para a melhoria dos sistemas jurídicos de cada país.

 

A juíza do TJSP Simone Gomes Rodrigues Casoretti falou a seguir sobre questões sobre a improbidade administrativa. Ela lembrou que a improbidade está prevista na Constituição Federal e destacou a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92), que propiciou um avanço para minimizar a impunidade, com mecanismos que possibilitam o combate à corrupção, com ampliação das sanções e dos atos de improbidade administrativa. Ela observou que ainda há dificuldades na instrução processual e na apuração das provas e enfatizou a necessidade de mecanismos mais eficazes para o combate à corrupção.

 

O promotor de Justiça Silvio Antonio Marques ressaltou a importância da cooperação jurídica internacional para o combate à improbidade administrativa, frisando que a solução de muitos casos depende dessa cooperação, em especial quando há necessidade de obtenção de provas ou de recuperação de ativos desviados do Estado. Entretanto, ponderou que há um “abismo” entre os sistemas de cooperação internacional da maior parte dos países em relação ao sistema da União Europeia. Ele esclareceu que a cooperação é caracterizada pela descentralização e pelo particularismo e explicou os três sistemas de transmissão de demandas internacionais com a União Europeia: indireta, realizada por via diplomática; semidireta, efetuada por meio de autoridades centrais, geralmente ministérios da Justiça; e direta, feita entre magistrados ou integrantes do Ministério Público dos países, com passagem facultativa dos pedidos pela autoridade central. Citou ainda os principais meios de cooperação entre o Brasil e a França.

 

O juiz Marcus Vinícius Kiyoshi Onodera, também coordenador de Cursos e Convênios Internacionais da EPM e do evento, destacou que o combate à corrupção em nível internacional demonstra a maturidade das democracias, como a brasileira e a francesa. “O Judiciário, por meio do devido processo legal, protege, assim, a Rule of Law. Nesse contexto a ação conjunta e integrada dos países por meio de adequada cooperação jurídica internacional é fundamental. E para que isso ocorra depende essencialmente do papel proativo e prudente do juiz, gerando eficiência, celeridade e, sobretudo, justiça ao cidadão e, assim, à sociedade”.

 

Encerrando o primeiro painel, Christine Santini agradeceu a todos e salientou que as palestras mostram que, com boa vontade, dentro de limites, é possível desenvolver uma boa cooperação internacional, quebrando a noção da soberania estrita, como havia há alguns anos. Ela também destacou o papel do Judiciário e do Ministério Público no controle da corrupção não apenas na área governamental, mas também nas empresas.

 

Papel do Judiciário e cooperação jurídica internacional em matéria penal no Brasil e na França

 

Na parte da tarde, foi realizado segundo painel, “Papel do Judiciário e cooperação jurídica internacional em matéria penal no Brasil e na França”, presidido pelo desembargador Hermann Herschander.

 

A abertura do painel foi feita pelo presidente da Seção de Direito Criminal, desembargador Fernando Antonio Torres Garcia, representando o presidente do TJSP, que agradeceu a presença dos expositores e participantes. “Felizmente, as novas quadras que se apresentam têm sido no sentido de que a corrupção e a organização criminosa em nosso meio não podem e não irão prevalecer”, frisou.

 

O juiz Sergio Moro, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, apresentou um panorama da operação Lava Jato e uma avaliação de seus resultados. Ele lembrou que a Lava Jato ainda está em andamento e envolve 78 processos e 328 indivíduos, sendo que já foram julgados 43 casos, com 134 pessoas condenadas por corrupção e lavagem de dinheiro, parte delas já cumprindo pena. Em relação aos casos julgados em Curitiba, recordou que envolvem acertos de corrupção, propinas e subornos pagos em contratos da Petrobrás, que variavam de 1 a 3% dos valores dos contratos. “A operação Lava Jato se insere no rompimento de uma tradição de impunidade da grande corrupção no Brasil”, salientou, ponderando que “o preço da integridade é a eterna vigilância dos governados em relação aos seus governantes”. Ele apontou como fundamentais para o sucesso da operação o foco no caso, os recursos humanos e financeiros, a utilização de força-tarefa, da prisão preventiva, de acordos de colaboração e da cooperação jurídica internacional, o amplo acesso às informações sobre os processos, a rapidez nos julgamentos e o suporte da opinião pública. “É uma conquista de um amadurecimento institucional da democracia brasileira”, frisou.

 

Na sequência, a juíza de instrução do Tribunal de Paris Claire Thépaut explicou que sua atuação é semelhante à de um procurador de Justiça no Brasil, com atuação em matéria econômica e financeira, no combate a crimes como a lavagem de dinheiro, corrupção e fraudes fiscais. Ela enfatizou a importância da especialização judicial no combate a esses crimes e observou que a luta contra a corrupção internacional está em ascensão na França. Mencionou a evolução legislativa sobre o tema na França, em especial a criação, em 2014, da alta autoridade para transparência da vida política e do Tribunal Financeiro e a edição da Lei nº 2016-1691 (Lei sobre Transparência, Luta contra a Corrupção e Modernização Econômica – Lei Sapin II), de 2016, que impôs o estabelecimento de uma política anticorrupção nas empresas, com multas de até 30% do faturamento. Salientou também a criação da Agência Francesa de Anticorrupção, em 2017, que tem entre suas funções assegurar o cumprimento das regras de compliance nas empresas. Ela esclareceu que a cooperação judicial internacional tem dois objetivos principais: procurar provas e recuperar o produto da corrupção e salientou que as regras de compliance e as penas de convenção penal são complementares à legislação penal, o que permite maior eficácia contra a corrupção.

 

Encerrando as exposições, o desembargador Adalberto José Queiroz Telles de Camargo Aranha Filho, coordenador da Área de Direito Penal da EPM, discorreu sobre o combate à corrupção no Brasil à luz dos tratados e convenções internacionais incorporados ao Direito nacional e às legislações penal e processual penal decorrentes. “Há uma diferença muito grande entre o que se pratica no Brasil e na América do Sul em relação à União Europeia, por uma série de questões, entre elas o fato de que a UE atua como um Estado único, com suas reservas, o que facilita muito as investigações e a celebração de acordos e tratados, enquanto que o Brasil é um país com muitos contrastes e com dificuldades de acesso”, observou. Ele discorreu sobre as consequências da corrupção na sociedade e sobre os três principais tratados incorporados ao Direito brasileiro: a Convenção Internacional de Mérida, a Convenção sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros e a Convenção Interamericana contra a Corrupção, ou Convenção de Caracas, de 1996.

 

Participaram também do evento os desembargadores José Carlos Gonçalves Xavier de Aquino, decano do TJSP; Luís Francisco Aguilar Cortez, vice-diretor da EPM; Claudio Antonio Soares Levada, 2º vice-presidente da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis); Aroldo Mendes Viotti, Eduardo Cortez de Freitas Gouvêa e Milton Paulo de Carvalho Filho, conselheiros da EPM; e os promotores de Justiça Roberto Barbosa Alves, representando o diretor da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo; e Renato Kim Barbosa, representando o presidente da Associação Paulista do Ministério Público; entre outros magistrados, integrantes do Ministério Público e servidores.

 

MA (texto) / MA e RF (fotos)


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