Direito dos povos indígenas à luz das normas nacionais e internacionais é analisado na EPM

Realizou-se ontem (11) a segunda aula do curso de extensão universitária “Temas controvertidos de direitos humanos”, promovido pela EPM, sob a coordenação do desembargador Fernando Antonio Maia da Cunha, diretor eleito da EPM, e da juíza Camila de Jesus Mello Gonçalves. 

 

A aula, sob o tema “O direito dos índios no ordenamento e na jurisprudência pátrios e na interpretação da Corte Interamericana de Direitos Humanos”, foi ministrada pelo procurador regional eleitoral André de Carvalho Ramos, professor doutor e livre-docente de Direito Internacional e do Programa de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).

 

Em sua exposição, o professor recuperou a história da evolução dos direitos humanos e sua internacionalização, desde o período de vigência do direito colonial clássico de raiz europeia, autoinvestido de uma missão civilizatória, até o estágio atual da questão. Deteve-se na análise do processo da criação das formas jurídicas e adoção de novos paradigmas que culminaram com aquilo que considera “um pagamento da dívida histórica com as comunidades indígenas americanas”, cujos membros, por autorreconhecimento no Brasil, são estimados em 800 mil, divididos em 275 comunidades.

 

Segundo o professor, para além dos critérios objetivos para a definição do indígena, tais como etnia, cultura, história, idioma e continuidade histórica – e a par da ausência de uma definição legal válida para todos os povos –, a evolução da modalidade de direito coletivo abriu-se para um critério subjetivo, que permite, dentro dos parâmetros da racionalidade e sentimento individual, a autodeclaração da condição indígena. “Ademais,” frisou o professor, “em direitos humanos, os textos normativos são apenas um ponto de partida. A concretização da universalização desses direitos tem base interpretativa”.

 

“Mas de que sujeito do direito estamos falando, afinal? Quem é considerado indígena?” André Ramos esclarece: “A partir do reconhecimento da alteridade e da conquista do Direito Constitucional brasileiro e internacional, o membro de comunidade indígena é aquele que percebe a distinção cultural, autoidentifica-se como pertencente à comunidade indígena e manifesta o desejo de mantença da diferenciação”. Adiante, o professor disse que “o direito indígena está profundamente associado ao enquadramento das populações autóctones por dois eixos: terra e identidade cultural, esta compreendida como conjunto de crenças, tradições e costumes.

 

Voltando à factualidade histórica, o professor ensinou que a internacionalização dos direitos humanos, ainda sem expressa menção aos direitos dos povos indígenas, tem seu marco na carta da ONU, de 1945, e na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948. Mais adiante na história, na década de 60, houve certo consenso na ONU para a redação de dois tratados, já com percepção de estados independentes de legislar sobre populações vulneráveis. São eles: Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (art. 27), que já sugere um reconhecimento mínimo daqueles que não compõem as populações majoritárias, e a Convenção nº 107 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), esta última lastreada na ideia tutelar da assimilação dos povos indígenas pelos estados. O abandono do conceito de assimilação dos povos autóctones pela ideia de autodeterminação deu-se a partir do Acordo nº 169 da OIT sobre povos autóctones e tribais em países independentes, de 1989, mais tarde ratificada pelo Brasil.

 

De modo que a Constituição Federal brasileira de 1988, em seus artigos 232 e 236, em consonância com a Convenção Interamericana de Direitos Humanos, aboliu a crença na supremacia de um modo cultural sobre outros. E diante da percepção e do respeito à alteridade, já trouxe a mudança de definição conceitual de “silvícola” para membro de comunidade indígena.

 

Segundo o professor, o marco brasileiro de reconhecimento dos direitos indígenas é a demarcação das terras das comunidades da região denominada Raposa Serra do Sol, em Roraima. E a faceta litigiosa mais evidente dos direitos indígenas no Brasil está sendo o processo internacional ajuizado na Corte Interamericana de Direitos Humanos, cujo objeto é embargar a construção da usina de Belo Monte, no Pará, sob a alegação de impacto negativo e danos iminentes às comunidades indígenas locais.

 

O professor também elencou os casos em que a Corte Interamericana examinou, tais como o direito à vida, titularidade de terras e mantença de identidade cultural. Sob este último aspecto, relatou caso em que a Guatemala foi condenada a respeitar rituais fúnebres específicos, de comunidades indígenas de origem maia.

 

Finalmente, André Ramos teceu considerações sobre tópicos dos direitos das populações indígenas no Brasil, que estão na ordem do dia de suas reivindicações processuais, tais como a identificação, direitos políticos e sociais, em que a garantia da tutela do Estado evidencia-se pela presença da figura inafastável do promotor de Justiça. “O Ministério Público passou a ser um elemento indissociável das demandas processuais indígenas”.


ES (texto e fotos) 


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