EPM e Cadicrim iniciam o curso ‘Aplicação de alternativas penais com enfoque restaurativo em substituição à privação de liberdade’

Egberto Penido e Marcelo Salmaso foram os expositores.

 

Teve início no último dia 1º o curso Aplicação de alternativas penais com enfoque restaurativo em substituição à privação de liberdade, promovido pela EPM, em parceria com o Centro de Apoio da Seção de Direito Criminal (Cadicrim). A primeira aula versou sobre o tema ‘Enfoque restaurativo em detrimento da privação de liberdade’, com exposições dos juízes Egberto de Almeida Penido e Marcelo Nalesso Salmaso.

 

A abertura dos trabalhos foi feita pelo desembargador Fernando Antonio Torres Garcia, presidente da Seção de Direito Criminal do TJSP e integrante do Cadicrim, que externou a satisfação pela realização do curso. “Temos dois especialistas em Justiça Restaurativa que certamente nos trarão luzes e elementos para que possamos no dia a dia tentar aplicar essas alternativas à prisão”, enfatizou, esclarecendo que o curso é realizado para atender a ato normativo do CNJ.

 

Também compuseram a mesa de abertura os desembargadores Antonio Carlos Malheiros, integrante consultor da Coordenadoria da Infância e Juventude; e Ivo de Almeida, integrante do Cadicrim. Também participou do evento o desembargador Reinaldo Cintra Torres de Carvalho, vice-coordenador da CIJ, entre outros magistrados e servidores.

 

Ao iniciar a exposição, Egberto Penido falou sobre o movimento restaurativo no Brasil e sobre as políticas públicas para implementação da Justiça Restaurativa, estabelecidas pela Resolução nº 225/2016 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pela Resolução nº 288 do CNJ, de 25 de junho de 2019, foco do curso, que colocou o enfoque restaurativo nas alternativas penais.

 

Ele ressaltou que as práticas restaurativas talvez sejam o caminho mais eficaz de construir uma responsabilidade, enquanto que o ato de punir acaba, de certa forma, desresponsabilizando com o cumprimento da pena, mas sem reparação do dano, sem reflexão do valor da norma realizada, sem o autor entender o que o motivou a agir daquela maneira e o que fará para não incorrer no mesmo ato. “Observar essas coisas é de fato responder ao mal feito”, salientou.

 

“Temos vivenciado situações em que o autor do ato (o ofensor) interrompe o processo porque não dá conta de ver as consequências das ações que ele fez, de trabalhar as corresponsabilidades dentro de um conjunto comunitário e de olhar para sua desestrutura familiar. Muitas vezes ele não dá conta dessa carga emocional. Então a ideia de que a Justiça Restaurativa é uma Justiça mais leve é totalmente equivocada. Ela é uma Justiça mais pesada, tem um potencial de transformação por conta disso, na medida em que trabalha muito os sentimentos”, ponderou. E acrescentou que quando se fala de não punição, não se está dizendo que há uma não resposta. “É um conjunto mais amplo, há uma ressignificação muito mais complexa e sistêmica da forma como nós entendemos e lidamos com aquilo que gerou um dano”, esclareceu.

 

Marcelo Salmaso explicou que a Justiça Restaurativa é uma alternativa ao penal e não uma alternativa penal. E observou que se trata de um sistema de concretização do valor Justiça que tem valores, princípios, fluxos e estruturas próprias, diferentes do sistema criminal. “Isso não significa que eles conflitam necessariamente, pode haver uma esfera de diálogo. A Justiça Restaurativa tem a sua existência própria e a concretização do valor Justiça ocorre no contexto comunitário. O fato de ser uma alternativa ao penal não significa que suas práticas não possam qualificar alternativas penais. Podem ser usadas práticas restaurativas para qualificar penas restritivas de direito, reconectar o egresso com sua família e comunidade depois que cumpre a pena, para trabalhar conflitos dentro de sistemas prisionais, entre outras situações. Mas o fato de usarmos práticas restaurativas no âmbito de medidas penais não torna as medidas penais restaurativas na essência. Elas continuam sendo penais com práticas restaurativas que as qualificam”, salientou.

 

Ele explicou que a Justiça Restaurativa como alternativa ao penal e o diálogo com o sistema de justiça formal em essência deve ser pela lógica da derivação. Assim, se um conflito entra pelo sistema de Justiça cabe a derivação para o trabalho da Justiça Restaurativa e, enquanto isso, o processo ou procedimento fica suspenso. Ele explicou que se na Justiça Restaurativa se atinge o resultado: há reparação de danos, atendimento das necessidades, as pessoas assumem novas posturas, conseguem dialogar e reconstituir as relações sociais rompidas. Nesse caso se busca uma maneira, na medida do possível, de não haver uma dupla responsabilização com uma culpabilização do ponto de vista punitivo, ou seja, se busca alguma maneira de o processo ser extinto. Ele observou que isso é tranquilo no caso do Estatuto da Criança e Adolescente, que traz a figura da remissão. Para o adulto, há a transação penal e o processo é extinto, também há os casos em que os acordos vêm como condição da suspensão condicional do processo, explicou.

 

“O problema é quando não há hipótese de suspensão condicional do processo. Existem várias ideias e posições. Alguns trabalham em paralelo e o trabalho da Justiça Restaurativa traz consequências de o juiz reduzir a pena ou abrandar o tipo de pena. Isso traz problemas porque se aquela pessoa tiver perspectiva de ser punida, por que vai se deparar com toda a sua desestrutura social, emocional, se comprometer com um plano de reparação de danos a mudar sua vida, além do estigma da sentença?”, refletiu. E apontou algumas soluções como a de levar em consideração que o objetivo último do Judiciário é alcançar a paz social. “Se a Justiça Restaurativa alcançou a paz social não haveria porque o Estado punir, haveria a perda superveniente do interesse do Estado de punir. É uma possibilidade que se aventa nesse campo”, ponderou.

 

Marcelo Salmaso falou ainda sobre a construção da política pública nacional da Justiça Restaurativa que tem seu marco fundador na Resolução nº 225 do CNJ, inspirada no Provimento nº 35/2014 da CGJ do TJSP, fomentada agora pela Resolução nº 288. “Chegou a hora de buscarmos novos caminhos e esses novos caminhos são os da Justiça Restaurativa”, concluiu.

 

RF (texto e fotos)


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