Ética na mediação é estudada no curso de especialização em Métodos Alternativos de Solução de Conflitos
No dia 20 de julho, o desembargador José Renato Nalini proferiu a palestra “A ética na mediação”, dentro da programação do módulo IV, “Mediação”, do 1º curso de pós-graduação lato sensu, especialização em “Métodos Alternativos de Solução de Conflitos (Conciliação e Mediação) e aplicação no Direito do Consumidor”, da EPM. A aula teve a participação da advogada Paula Thereza Potenza Fortes Muniz, professora assistente do curso.
Inicialmente, o palestrante discorreu sobre os tipos de mediação (prévia ou incidental) e seus procedimentos, conforme estabelecido no Projeto de Lei de Mediação. Ele ressaltou que a mediação prévia, que antecede o processo, é sempre facultativa e pode ser judicial ou extrajudicial.
Em relação à mediação incidental, recordou que ela é obrigatória no processo de conhecimento, salvo algumas exceções previstas no projeto de lei. “Ela acontece quando já existe um processo de conhecimento, embora não faça parte do processo”, explicou.
Ele salientou que a mediação tem como premissa a autonomia da vontade das partes: “O caráter voluntário da mediação garante o poder das partes de administrá-la e de tomar decisões durante ou ao final do procedimento”, explicou, acrescentando que o mediador é um facilitador, que busca estabelecer uma ponte de compreensão entre as partes e não pode se espelhar no juiz, que preside o processo.
Ressaltou, também, a importância do bom uso da linguagem pelo mediador ao redigir o acordo: “Da mesma forma que o magistrado precisa conquistar sua legitimidade, dia-a-dia, por meio da fundamentação de suas decisões, de forma a permitir que qualquer pessoa possa acompanhar o raciocínio que o levou àquela decisão, o mediador precisa fazer uma boa descrição circunstanciada das cláusulas do acordo, de forma que não restem dúvidas para as partes”, frisou, lembrando que a transação obtida na mediação prévia ou incidental pode ser homologada pelo juiz, a pedido de qualquer um dos interessados, passando a ter a eficácia de título judicial.
Ética na mediação
Na sequência, Renato Nalini discorreu sobre o Código de Ética da Mediação. Ele recordou que Ética é a ciência do comportamento moral do homem em sociedade e citou a concepção do professor Miguel Reale, para quem o Direito é o “mínimo ético”. “Considerando que tudo pode ser analisado sob o ponto de vista da ética, aquelas normas que não podem ser desatendidas – sob pena de a sociedade se tornar um caos –, são convertidas em normas positivas ou jurídicas. Assim, não há possibilidade de o Direito não ser ético, porque ele é o ‘mínimo ético’ com que não se pode transigir”, explicou.
Ele observou que a multiplicação das faculdades de Direito não significou maior observância do Direito ou mais justiça no Brasil, porque ainda há falta de compromisso com a ética no País – desde os princípios até os aspectos mais rudimentares do comportamento social. “A ética é a ‘matéria-prima’ de que mais necessitamos no Brasil, porque, embora tenhamos uma Constituição fabulosa que, bem aplicada, transformaria o Brasil, além de criatividade jurídica e doutrina e jurisprudência bem discutidas, nossa prática ainda é lamentável”, afirmou.
Ele ponderou que a falta de ética está relacionada a um declínio de valores na sociedade, que precisam ser ‘ressuscitados’ por meio de um esforço das famílias e de cada indivíduo, observando que não há um ‘certificado de garantia’ em relação à ética: “Ninguém é incólume a uma falha ética e isso exige uma vigilância permanente de cada um e o propósito de ser, a cada dia, mais éticos”, ressaltou.
Nesse contexto, salientou que, embora não se possa descuidar da formação técnica e do conhecimento na mediação, a preocupação ética é o aspecto primordial a ser observado, assim como em qualquer atividade que se proponha a diminuir a injustiça e a iniquidade. Ele lembrou que o artigo 14 do Projeto de Lei de Mediação já constitui uma síntese de código de ética, ao preceituar imparcialidade, independência, aptidão, diligência e confidencialidade para o mediador no exercício de sua função. Citou, ainda, o Código de Ética do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem (Conima), que estabelece que a conduta do mediador deve se pautar pelos princípios da imparcialidade, credibilidade, competência, confidencialidade e diligência.
Renato Nalini ressaltou que a mediação, assim como os demais métodos alternativos de solução de conflitos, resgatam nos participantes a capacidade de diálogo, bem como de assumir suas responsabilidades e de tentar vivenciar o contraditório, colocando-se no lugar do outro. Com isso, contribuem para evitar a judicialização de todas as questões.
Ele lembrou que a solução jurisdicional é heterônoma, pois provém de outra fonte e o autor é excluído ao entrar com a ação, porque ela se desenvolve em um plano do qual ele está alheio. “Estamos na contramão daquilo que a Constituição de 1988 prometeu, que era mudar o modelo da democracia brasileira, de meramente representativa para participativa. Essa mudança exige que a sociedade aprenda a dialogar e, no momento em que se declina da condição de titular de autonomia da vontade e se entrega um problema íntimo a um terceiro, que tem capacidade postulatória e coloca essa ‘angústia’ em uma linguagem ininteligível no processo, onde ela é pasteurizada e o autor é excluído do sistema, restando, apenas, a espera, com a necessidade do decodificador para saber se ganhou ou perdeu, estamos criando uma sociedade incapaz de crescer”, afirmou.
Nesse sentido, ponderou que a sociedade precisa ‘aprender a andar com as próprias pernas’, passando a se interessar e a se manifestar, porque a justiça é de todos e não apenas dos juízes e profissionais do Direito. “A utilização dos métodos alternativos de solução de conflitos devolve à sociedade a administração de seu próprio interesse e isso é ético. O que é aético é entregá-lo ao Estado”, concluiu.