460 - A greve dos correios e o pagamento das contas
LUIZ ANTONIO RIZZATTO NUNES – Desembargador
Tenho sempre referido os correios no Brasil como exemplo de serviço de alta qualidade e eficiência. Ou, como digo, um dos caminhos mais rápidos entre dois pontos é o correio. Realmente, é induvidoso que esse é um dos melhores serviços públicos do país e que cumpre a missão estatal que se espera obter de todo serviço essencial (público, privado ou privatizado). Mas, seus funcionários entraram em greve, que segundo anunciado, não terminou e não se sabe quando cessará. Por conta da paralisação, muitas pessoas podem já ter sofrido danos ou ainda podem vir a sofrer até a completa regularização do sistema.
Por isso, hoje cuido dos direitos dos consumidores afetados pela greve e lembro as regras de prevenção para evitar problemas.
Responsabilidade objetiva da ECT
Inicialmente, quero deixar claro que todo dano causado é de responsabilidade primeira da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) por expressa disposição do Código de Defesa do Consumidor. É que ela responde pelos vícios ou defeitos de seus serviços, o que inclui, naturalmente, a ausência dos mesmos.
Para que a ECT seja responsabilizada não há necessidade de que seja apurada sua culpa. É a chamada responsabilidade objetiva decorrente da exploração da atividade empresarial e seu risco. O empreendedor público, privado ou de atividade privatizada explora o mercado de consumo e a própria exploração da atividade gera risco social, independentemente de sua vontade.
É evidente que, por exemplo, quando uma correspondência entregue pelo consumidor aos serviços do correio não chega a seu destino no prazo ou simplesmente se extravia, essa falha não se dá por interesse da empresa. Ela não decorre da vontade dos administradores da ECT, mas da atividade em si, eis que falhas sempre existirão no sistema de leitura ótica, na incorreta observação do pessoal que faz seleção dos envelopes e pacotes, no transporte etc. Portanto, o dano existirá, apesar da vontade em sentido contrário dos administradores e funcionários.
Danos sofridos
A lei sabe disso. Ela sabe que, apesar do esforço do prestador do serviço, em algum momento, por evento imprevisto, o serviço falhará causando danos ao consumidor. Naturalmente, a responsabilidade é a mesma na ausência do serviço, como a que ocorre no período de greve e que persistirá mesmo após seu fim por mais algum tempo até que o mesmo se normalize.
Por isso tudo, a lei estabeleceu a responsabilidade objetiva. Basta a constatação do serviço contratado e seu defeito para que possa ser pedida indenização. Desse modo, se o consumidor sofrer algum dano por atraso ou não entrega de correspondência, poderá pleitear indenização.
O problema das contas que vencem nesse período
A ausência de um serviço como o dos correios sempre gera danos em larga escala, atingindo fornecedores e consumidores. Nos serviços massificados, como os de telefonia, tevês à cabo, cartões de crédito, empréstimos bancários etc, o serviço dos correios é fundamental para seu funcionamento. Isto porque, é através dele que a maior parte dos milhões de faturas são entregues mensalmente para pagamento.
Consumidor responsável
Entretanto, o não recebimento de uma fatura não retira a responsabilidade do consumidor em pagá-la no prazo se o credor manda as faturas pelo correio mas, simultaneamente, coloca à disposição do consumidor outro modo de quitar o débito. Explico.
Cabe ao fornecedor entregar as faturas antes da data do vencimento. Todavia, com a paralisação dos serviços do correio, a entrega fica prejudicada. O fornecedor, então, tem de oferecer uma alternativa de pagamento ao consumidor. As segundas vias devem ser oferecidas via fax, email, acesso ao site, por ligação telefônica etc. Se essas segundas opções são oferecidas, cabe ao consumidor utilizá-las para o pagamento da dívida.
É bom lembrar que quando os serviços dos correios não estão paralisados, isso não impede que alguma correspondência não seja entregue. Logo, mesmo fora desse período crítico, pode acontecer do consumidor não receber fatura para pagamento dentro do prazo ou simplesmente não recebê-la.
Risco do empresário
Se o consumidor não recebe a fatura para pagamento, não se pode imputar a ele a responsabilidade pelo pagamento no prazo. Não tem sentido culpa-lo pelo que ele não fez. É risco do fornecedor entregar a fatura com tempo suficiente para pagamento, risco esse que não pode ser repassado ao consumidor. Todavia, cabe ao consumidor se acautelar.
Prevenção
Para eventualmente tentar não ser responsabilizado, o consumidor tem que provar que não recebeu a fatura, o que é muito difícil de faze-lo quando ela não é entregue. Dá para fazer a prova, por exemplo, se o consumidor avisou por escrito seu novo endereço para recebimento da fatura e ela foi enviada ao antigo ou quando o próprio correio coloca carimbo de entrega atrasada (anoto que nesse caso, é a ECT quem deve ser responsabilizada pelo atraso). No entanto, afora esses tipos de exceções, o consumidor acaba sendo responsabilizado pelo atraso. Por isso, para evitar prejuízos, apresento as observações a seguir.
O controle das datas
O consumidor deve manter uma agenda com datas dos vencimentos de suas faturas regulares. Se até a véspera do vencimento, ainda não recebeu alguma, então, deve entrar em contato com o credor, solicitando segunda-via para efetuar o pagamento. Essa é uma regra geral para o dia-a-dia e, evidentemente, nesse período de greve deve ser imediatamente seguida. Para aquele que não faz esse tipo de controle, a saída é pegar as contas do mês anterior, ver as datas dos vencimentos e checar o prazo que existe para pagá-las.
Atualmente, todos os grandes fornecedores mantém Serviços de Atendimento ao Consumidor (SACs) e/ou sites, nos quais é possível obter uma segunda via da fatura. Se a credor não tiver esse tipo de serviço, como já disse acima, ele é obrigado a dar outra alternativa para pagamento, como, por exemplo, envio do boleto via fax ou apresentação de dados bancários para depósito em conta (nº de conta corrente, banco e agência, número do CNPJ -- se for pessoa jurídica -- ou CPF -- se for pessoa física). Repito: se o credor não der alternativa, o consumidor não pode ser responsabilizado pelo atraso.
O que se espera, naturalmente, como demonstração de boa prestação de serviços, é que os grandes conglomerados não cobrem multas dos consumidores que eventualmente pagarem suas faturas fora do vencimento no período de greve.
Anoto, de todo modo, que no que diz respeito a entrega das faturas dos serviços de água e esgoto e energia elétrica, a greve não tem muito efeito porque muitas concessionárias utilizam seus próprios funcionários para a entrega das faturas.
Outras cobranças
Há também problemas numa série de cobranças de serviços e compras de produtos relativas ao comércio em geral. Os comerciantes e prestadores de serviços costumam emitir boletos com observação de envio para Cartório de Protesto após certo período de atraso.
Nesses casos, valem as mesmas regras que acima apresentei e, por certo, o consumidor deve entrar em contato com o comerciante ou prestador de serviço imediatamente para obter outro meio de quitação da dívida.
19/9/11