495 - Contratos privados de assistência à saúde – generalidades e responsabilidade administrativa e civil das operadoras
JÚLIO CÉSAR BALLERINI SILVA – Juiz de Direito
Em virtude do fenômeno da globalização, com predominância de um modelo econômico de índole neo-liberal, não intervencionista no domínio econômico (superando-se, portanto, as noções de welfare state e new deal, que predominaram no chamado mundo pós-guerra – em síntese, o fim dos conhecidos “Estados Keynesianos ou providenciários”), tornou a ganhar relevância a polêmica a respeito da delimitação e revisão dos conceitos referentes às esferas do direito público e do direito privado, nos sistemas jurídicos atuais, como já se aventou na introdução da presente obra.
E, ainda aproveitando-se a noção de complexidade que permeia o pensamento científico atual, insta salientar que, com velocidade cada vez mais intensa, se observa, em decorrência dos avanços tecnológicos, com facilidades de comunicação e fluxo de riquezas, que os Estados Nacionais perderam substancial parte de seu poder de gestão, num processo de fragmentação, com o surgimento de entidades privadas, hierarquizadas e organizadas, com grande poder econômico, o que colabora para a dificuldade de elaboração de um novo conceito de direito público e de direito privado no mundo pós-globalização.
As próprias noções clássicas de esquerda e de direita acabam por se aproximar cada vez mais, como, igualmente se dá em relação aos espaços antes dominados pelo predominante interesse público, que tem se esvaziado, tal qual vem ocorrendo com os espaços destinados ao interesse meramente privado, dificultando sobremaneira, a separação entre direito público e direito privado.
Assim, clássicas definições que ligam o caráter público do direito à intervenção do Estado lato sensu num dos pólos da relação jurídica material, como também aquelas que estabelecem o papel do Estado enquanto poder soberano nesta relação, não mais se prestam a definir a questão, num contexto de interferência cada vez maior da seara pública na esfera privada (como se observa, v.g., nas regras previstas pela Lei nº 8.078/90 - o conhecido Código de Proteção e Defesa do Consumidor) e vice-versa (o que se observa nas contratações cada vez mais freqüentes entabuladas com o Estado, sobretudo, nas situações de quebra dos monopólios estatais).
A própria preocupação do Código Civil brasileiro (a conhecida Lei nº 10.406/02 que suplantou o vetusto Código Bevilácqua, ou Código Civil de 1.916), principal estatuto do cidadão, antes apanágio do direito privado em sua acepção ampla (lato sensu), com a disciplina de direitos de personalidade e o abandono ao culto do patrimônio, preconizando valores éticos, deve ser cotejada com a flexibilização de inúmeros cânones constitucionais (verbi gratia a própria questão das privatizações das funções do Poder Público no decorrer da década de 1.990), dando idéia da dimensão do problema enfocado, mormente no que tange à situação da própria inserção do objeto saúde (num primeiro momento, devendo ser tido como um objeto indisponível, sendo inegável seu caráter público, num juízo a priori).
De todo modo, encetadas tais considerações, insta salientar que existe um feixe de relações jurídicas, disciplinado por contratos entabulados entre empresas mantenedoras de planos de saúde ou seguro-saúde (art. 1º e consectários da Lei dos Planos de Saúde – Lei nº 9.656/98), com personalidade jurídica eminentemente privada (a própria Lei nº 8.080/90 que instituiu o SUS ou Sistema Único de Saúde deixou clara a situação de não existência de um monopólio público do sistema de saúde no país – Título III da referida lei em comento – artigos 20 usque 24 e seus consectários), que escapa por completo das relações de direito público na área de saúde, passando a ser disciplinadas pela Lei nº 9.658/98, que disciplinou o chamado plano privado de assistência à saúde.
A Lei nº 9.656/98 estabeleceu, em seu artigo 1º e seus três incisos que estariam submetidas ao seu regramento as pessoas jurídicas de direito privado que operem planos de assistência à saúde, enquanto contratação de trato sucessivo de serviços de cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, assistência à saúde, nas modalidades devidamente identificadas no texto da lei (acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde livremente escolhidos, integrantes ou não de redes credenciadas, visando assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga total ou parcialmente, mediante reembolso e pagamento direto ao prestador).
Embora a lei acabe por se referir, de modo expresso, a um Plano Privado de Assistência à Saúde, não se cuida de um modelo único, mas dual na medida em que são descritas duas formas de atividade, ou seja, preços pré ou pós estabelecidos, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, ou seja, isso permitiria a coexistência das duas formas contratuais, quais sejam, o plano de saúde e o seguro-saúde, sendo certo que as empresas que se dispuserem à exploração dessas atividades recebem o nome técnico de operadoras de planos de assistência à saúde (artigo 1º, inciso II da lei especial em comento).
Interessante a concepção, inclusive, no sentido de que para identificar tais espécies contratuais, bastaria aferir se num dos pólos da relação jurídica material se encontra uma prestadora de serviço de assistência à saúde, para determinar a incidência da Lei nº 9.656/98, se do outro lado se puder definir a presença de um consumidor, nesta peculiar espécie de negócio jurídico.
Peculiar porque desde há muito à ela não se aplicam os cânones das regras clássicas do contrato, cristalizadas no ambiente liberal do laissez faire laissez passet, quanto a autonomia do contrato e a liberdade do contrato eram considerados prelados absolutos.
Isso porque, antes mesmo do advento da Súmula nº 469/STJ que pacificou a questão este autor já vinha reconhecendo que tais contratos, nas condições em que descritos em lei, implicariam na completude do modelo legal de prestação de serviços aptos a ensejar a proteção consumerista[1], não sendo, ademais, este entendimento isolado, eis também defendido por Luiz Antônio Rizzatto Nunes[2] e, mais recentemente, por Fernando Campos Scaff[3].
Tal autor, inclusive, elabora definição do contrato de plano de saúde como sendo aquele em que o “consumidor, mediante o pagamento antecipado e periódico de um determinado preço, obtém de uma empresa a contraprestação consistente na realização de determinados tratamentos e atendimentos médicos, hospitalares e laboratoriais a serem realizados por seus prepostos”[4].
Referido tipo contratual não se confundiria com o contrato de seguro-saúde, surgido no Brasil, com o advento dos artigos 129 a 135 do Decreto-Lei nº 73/66, sendo destinado à garantia do pagamento em dinheiro, diretamente ou mediante reembolso (como frisado no artigo 1º da Lei nº 9.656/98) dos gastos dos segurados com as mesmas despesas médico-hospitalares destacadas acima.
No entanto, apesar do nome sugerir que se cuidaria de uma espécie do gênero contrato de seguro, nessa modalidade específica, o que parece acontecer é uma situação em que, cada vez mais, a aleatoriedade (típica do gênero securitário) acabaria se convertendo em comutatividade, nesse tipo de relação negocial, desnaturando sua natureza jurídica.
Isso porque no contrato de seguro-saúde encontram-se dados estatísticos que gerariam certa previsibilidade no sentido de que os segurados enfrentariam esse ou aquele tipo de problema de saúde, com a inevitabilidade do surgimento de algumas moléstias no decorrer do tempo, de modo que esse índice de sinistralidade nesse tipo peculiar de contrato, acaba por retirar sua aleatoriedade, levando a uma separação dessa espécie dentro do gênero contrato de seguro.
Sobre o tema, importante destacar:
As seguradoras utilizam a lógica atuarial para a minuciosa e rígida seleção dos riscos cobertos, estabelecendo a partir dela o valor dos prêmios cobrados nas apólices coletivas ou individuais.[5]
De todo modo, não se poderia negar que os contratos de seguro-saúde firmados antes do advento da Lei nº 9.656/98, pelo princípio tempus regit actum e diante da própria irretroatividade das normas assegurada pela Constituição Federal (a regra geral, mas não absoluta, como cediço, do artigo 5º, inciso XXXVI da Lex Mater), estariam regidos pelas regras do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) e mesmo pelas regras atinentes aos contratos de seguro que não colidirem com o referido estatuto consumerista (o Código do Consumidor, por sua base constitucional, deve ser visto como de interpretação sistêmica e princiológica em relação às demais regras do sistema, como se exporá linhas abaixo).
A questão da sinistralidade, inclusive, não é nova e já vinha sendo reconhecida pela jurisprudência dos Tribunais pátrios. Nesse sentido, sempre de se pedir vênia para destacar, dentre inúmeros outros, o seguinte aresto:
CONSUMIDOR - PLANO DE SAÚDE COLETIVO - CLÁUSULA ABUSIVA - RESCISÃO UNILATERAL PELA SEGURADORA - AUMENTO DA SINISTRALIDADE - INADMISSIBILIDADE - CONSERVAÇÃO DOS CONTRATOS - BOA-FÉ OBJETIVA - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. 1. O seguro de saúde é contrato ao qual se aplica o Código de Defesa do Consumidor. Assumindo o princípio da conservação dos contratos especial destaque nessa modalidade contratual, cuida-se de evitar que o fornecedor libere-se do vínculo contratual, sempre que este não lhe seja mais favorável ou interessante a avença. 2. A previsão no contrato de assistência de saúde de cláusula permissiva de rescisão unilateral vai de encontro com a sua finalidade de garantir segurança no atendimento médico ao consumidor ou a sua família, se revelando abusiva, portanto nula. 3. As razões da Recorrente se baseiam na relação custo/benefício e não se coadunam com os permissivos legais da rescisão unilateral. Portanto, não pode a Seguradora cancelar apólice coletiva ao argumento de que houve, em determinado período, aumento da taxa de sinistralidade. 4. A decisão vergastada deve ser mantida pelos próprios fundamentos, mais notadamente pelos precedentes jurisprudenciais que colaciona, demonstrando que a tese do recorrente está em confronto com a jurisprudência deste Tribunal. 5. Recurso de agravo improvido. (Recurso de Agravo nº 0139988-6/01, 3ª Câmara Cível do TJPE, Rel. Bartolomeu Bueno. j. 28.02.2008, unânime, DOE 12.03.2008).
Cuida-se, portanto, tanto no caso do seguro-saúde, como no caso do contrato de plano de saúde, de contratos sinalagmáticos, com comutatividade contratual, em que ao consumidor incumbe o pagamento da mensalidade ou prêmio, dependendo da forma contratual e à operadora caberá o dever de arcar com os pagamentos de tratamentos e encargos previstos na lei e no contrato.
De todo modo, parece pertinente destacar que se cuidaria de contrato que não poderia ser rompido unilateralmente pela operadora por não se tornar mais economicamente interessante, não se podendo sequer alterar-lhe abruptamente o preço como modo de visar compelir o consumidor a abandoná-lo. Posicionamento, aliás, do Superior Tribunal de Justiça, nos contratos de seguro, como se observa em REsp.1073595-MG, dispondo-se sobre a questão dos chamados contratos relacionais. Do mesmo modo, aponta-se o reconhecimento, perante o mesmo Areópago de aposentado de continuar vinculado a plano de saúde por tempo indeterminado (REsp. 976125-SP). E, aliás, sobre o mesmo tema, não destoava a cognição do Tribunal de Justiça bandeirante, em entendimento protetivo cristalizado, desde há muito a respeito de tal questão, não mais se podendo invocar o entendimento contrário e minoritário que autorizava rescisões unilaterais nessas espécies negociais.
Realmente, não se poderia confundir essa espécie de contrato com outra correlata, tipicamente securitária, que seria aquela referente ao contrato de seguro que o profissional de saúde (médico, hospital, etc.) tem efetuado para se resguardar em caso de responsabilidade civil, que não resta disciplinada ou coberta pelos termos da Lei nº 9.656/98, tal se dando até porque em tais contratos não estariam presentes os requisitos do artigo 1º, inciso I da lei especial em questão, que se referiria à incidência da lei em casos de tratamentos de saúde, que envolvam atos médicos (consultas, exames, tratamentos, etc.).
O que não se pode esquecer, no entanto, é que seja qual for a forma da qual o negócio jurídico se revista o negócio jurídico, sempre cuidar-se-á de uma efetiva e inequívoca relação de consumo, como asseverado em outros tópicos do presente trabalho, não deixando, sob tal perspectiva, de se cuidar de contratos bilaterais e sinalagmáticos, mas que devem se pautar por efetiva boa-fé objetiva, nunca se esquecendo de seu caráter de contratação por adesão, com necessária proteção de consumidores hipossuficientes (tais contratos, seja quais forem, implicarão no reconhecimento de relações de consumo – Súmula nº 469/STJ com a seguinte redação literal: “a operadora de serviços de assistência à saúde que presta serviços remunerados à população tem sua atividade regida pelo CDC, pouco importando o nome ou a natureza jurídica que adota” – ou seja, nada influirá, para tais efeitos, cuidar-se de plano de saúde ou de seguro-saúde).
Interessante, ainda, notar que como consta do voto proferido pela Ministra Nancy Andrighi, apontou que o Código do Consumidor seria aplicável mesmo aos contratos firmados anteriormente à vigência do referido diploma (Lei nº 8.078/90), como consta do precedente lançado em Resp 267.530 o que, ademais, resta ponderado com propriedade, eis que nao se cuidaria, nesse peculiar situação, de qualquer ofensa ao princípio da irretroavidade das normas frente a direitos adquiridos, atos jurídicos perfeitos e coisa julgada (artigo 5º, inciso XXXVI, CF/88 com disposição, aliás, análoga no artigo 6º, LICC), eis que se cuidaria de obrigação de trato sucessivo. Asseverou mencionada ministra, no precedente em questão, não se tratar, verdadeiramente, de retroatividade da lei. “Dada a natureza de trato sucessivo do contrato de seguro-saúde, o CDC rege as renovações que se deram sob sua vigência, não havendo que se falar aí em retroação da lei nova”.
Obviamente que tal se dá com interpretação conjunta das regras de direito civil, e, sobretudo, do direito do consumidor, pelos respectivos Código Civil e Código do Consumidor, nas hipóteses específicas de incidência – a atual redação da norma contida no artigo 35-H da Lei nº 9.656/98 dá conta de que os contratos de prestação de planos de saúde são relações de consumo.
E isso implica em dizer que, quando do advento da referida lei, os contratos anteriores não puderam ser tidos como revogados por ela – por óbvia aplicação do disposto na norma contida no artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal, de sorte tal que, sob tal perspectiva, os atos jurídicos perfeitos e direitos adquiridos lá cristalizados, restaram íntegros, a não recomendar que qualquer pessoa se prestasse a adequar seus planos à lei nova, eis que, esta impôs novos custos ao consumidor, sendo certo que as vantagens e benesses que a mesma destacou já poderiam ser alcançadas pela interpretação da Lei nº 8.078/90.
A questão se encontra, inclusive, amplamente superada, em sede jurisdicional, a partir da publicação da Súmula nº 469/STJ) isso já seria, mesmo, uma simples derivação de clássico adágio de direito de acordo com o qual ubi commoda ibi incommoda).
A Súmula em questão, inclusive, acabou por consolidar uma tendência, nesse sentido, eis que, antes já havia precedentes acerca da questão (“a operadora de serviços de assistência à saúde que presta serviços remunerados à população tem sua atividade regida pelo CDC, pouco importando o nome ou a natureza jurídica que adota” Resp 267.530).
Ainda em reforço a tal tese seria se ponderar no sentido de que o Supremo Tribunal Federal, em mais de uma oportunidade, já decidiu que as questões referentes a planos de saúde seriam pertinentes ao direito civil (mormente sob a forma de prestação em regime de cooperativas, como dito alhures), de competência exclusiva da União, nos estritos termos da norma contida no artigo 22 da Constituição Federal, o que realçaria malgrado algumas normas de natureza cogente, o caráter privado dessas relações (que, como visto acima, no contexto global atual, tem conseqüências relativas na medida em que, mesmo o direito privado, se encontra permeado por um sem número de normas de interesse público e, portanto, de cogência patente, mormente no que tange ao âmbito da proteção consumerista).
Neste sentido, à guisa de exemplificação, basta que se tomem as decisões proferidas na ADIn (Ação Declaratória de Inconstitucionalidade) nº 1.595-SP, Rel. Min. Nelson Jobim, j. 30.04.1997 e na ADIn (Ação Declaratória de Inconstitucionalidade) nº 1.646-PE, Rel. Min. Néri da Silveira, j. 07.08.1997 , nas quais se reconheceu o caráter de normas de direito civil às tentativas de alguns Estados da Federação de disciplinarem normas referentes a planos privados de saúde, reconhecendo-se o vício de competência legislativa.
Assim, tais relações eminentemente privadas, como já mencionado à saciedade, não envolvem maiores dificuldades no que se refere à possibilidade, por exemplo, de antecipação de tutela (e à sua execução, mesmo em sede de tutela específica – artigo 84 do Código do Consumidor, sem as especificidades da execução em face da Fazenda Pública) ou de emprego de normas coercitivas para o cumprimento das mesmas, eis que não encontram os entraves que permeiam as relações de direito público, mormente diante do sistema de execução diferenciado estabelecido pelo advento da norma contida no artigo 100 e seus consectários da Constituição Federal.
Neste tipo de demanda, em face de entes privados, inclusive, não haverá qualquer óbice à aplicação das disposições do regime de execução dos títulos judiciais, estabelecido pelo advento da Lei nº 11.232/05, inclusive no que tange à incidência do artigo 475J do Código de Processo Civil (como vem sendo estabelecido pelo E. Superior Tribunal de Justiça a esse respeito, bastará a intimação do patrono acerca da estabilidade da decisão que se executa, para que, superado o lapso legal, a multa se exigível) e as próprias disposições do artigo 461 e seus consectários do referido diploma processual civil, no que tange ao estabelecimento das multas diárias ou astreintes.
Pertinente, ainda, que se destaque o teor da norma contida no parágrafo 2º do artigo 2º da Lei nº 8.080/90 (que instituiu o Sistema Único de Saúde) e que, de forma expressa, estabeleceu que o dever do Estado (a garantia do direito à saúde do indivíduo, destacado no parágrafo 1º do mesmo artigo em questão) não exclui o dever das pessoas e da família (com implicações, obviamente, na questão dos alimentos, disciplinada no Código Civil posto que, como visto no primeiro item deste capítulo, a noção de saúde está ligada a vários fatores determinantes podendo ser caracterizada por um estado de bem estar físico e psíquico), mas, de forma importante no que se refere aos contratos privados de saúde, não exclui o dever das empresas e da sociedade (tem-se aí, além do papel das chamadas ONG´s - Organizações Não Governamentais).
Ou seja, sob tal perspectiva, estaria aí inserido o dever das empresas, o que, entendo, engloba não somente a questão dos empregadores, como também das próprias empresas operadoras de planos de saúde, não havendo dúvidas a respeito da responsabilidade não só do Estado, mas de toda a sociedade, na sua acepção mais ampla, o que não pode escapar aos olhos do Magistrado diante de seu papel de garantir o sincretismo e a proteção do texto constitucional no Estado Democrático de Direito, na integração de suas decisões a respeito deste tema (cumprindo, ademais, a orientação lançada no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil, como asseverado em item anterior do presente trabalho).
Não se pode ter, ademais, como desconhecida a própria expectativa da sociedade em relação ao Poder Judiciário, que, cada vez mais, tem tido que intervir em searas antes típicas de outros poderes, notadamente no que se convencionou chamar efetividade de interesses políticos e sociais, o que tem sido muito bem desempenhado pelos Tribunais Superiores, em suas áreas temáticas de atuação.
Aliás, são esses os fenômenos conhecidos por ativismo judicial e jurisdicionalização, que exigem, cada vez, que o magistrado assuma o seu compromisso com a efetividade de direitos assegurados no ordenamento jurídico, o que interessa sobremaneira neste estudo do objeto saúde, diante de antinomias que possam vir a surgir e que devem ser resolvidas com incidência da proporcionalidade em favor de consumidores hipossuficientes.
Mas, de todo modo, no que se refere a essa tutela privada do direito à saúde não pode ferir o chamado princípio da boa-fé objetiva (não se esqueça de que, embora os advogados e o lobby, enquanto grupo de pressão, dos planos de saúde e seguro saúde, mormente se esqueçam disso, o novo Código Civil, diploma publicado em 2.002, que teve início de vigência em 11.01.2.003 deve ser tido como lei posterior à chamada Lei dos Planos de Saúde, a Lei nº 9.658/98), que deve nortear a forma de interpretação dos contratos, estando, desde há muito superada a vetusta teoria da força vinculante absoluta dos contratos (o vetusto brocardo latino que chegou aos nossos dias por obra de glosadores medievais, segundo o qual pacta sunt servanta, o qual atingiu seu apogeu no limite do liberalismo econômico dos séculos XVII e XVIII, quando imperava o regime do laissez faire, laissez passet, idéias superadas desde há muito, sobretudo, a partir do regime “entre guerras”, a partir de conceitos como o New Deal).
E não se desconhece que o mundo esteja passando por uma nova onda de pensamento doutrinário, na qual imperam a complexidade e a interdisciplinariedade (como preconiza Edgar Morin em sua célebre obra a respeito do paradigma da complexidade), em nome de uma globalização econômica e de um neo-liberalismo (na acepção que a ciência política empresta a tais expressões), mas isso, ao contrário do que se possa supor não admite que certas matérias de ordem pública, no que tange à proteção de contratantes hipossuficientes (e reitero, em relação a tanto, tudo quanto já destacado no item anterior do presente trabalho, em relação às jutificativas para tanto), possam ser tidas como normas não escritas para facilitar a livre circulação de riquezas (a despeito do Documento Técnico nº 319 do Banco Mundial, do qual se tratará mais adiante, em outros capítulos deste livro, pregar o enfraquecimento das instituições judiciais como forma de propiciar a livre circulação de riquezas, tal como preconizado por Maria Dakolias[6], no seu relatório ao Banco Mundial não pode jamais autorizar a supressão dos chamados fundamental rights enquanto cláusulas pétreas do sistema constitucional).
Ao contrário, o que a sociedade parece buscar seria, justamente, uma postura mais efetiva, sob a perspectiva da realidade sócio-política do país, dos direitos legalmente estabelecidos mormente quando encontram espeque na Carta Política de 1.988.
De tal modo, e como isso é uma expressa decorrência do texto legal, não se pode atribuir ao Poder Judiciário, como se tem visto em inúmeras peças processuais, o ônus pela suposta falta de segurança existente no campo contratual (o legislador pátrio optou por um sistema de normas abertas no âmbito processual, quiçá, até mesmo, de modo a propiciar um sistema de inserção do país no comércio internacional, flexibilizando o conteúdo de normas contratuais, adaptando o país a sistema mais acostumado ao case system do Sistema Jurídico da Common Law).
E não se nega que o contrato tenha sido um dos meios consentâneos, notadamente no século XVIII, para o desenvolvimento do capitalismo, engendrando acordos em que as classes economicamente mais ativas se privilegiavam mais e mais, mediante a exploração daqueles tidos como classes de trabalhadores, sob a ótica de algumas teorias econômicas, mas vários fatores históricos, como a organização de sindicatos cada vez mais influentes, com greves e movimentos, guerras, inserção de mulheres no mercado de trabalho e outros, foram surgindo de modo a impor limites de atuação a esse princípio geral.
Assim, o princípio da autonomia da vontade ainda hoje em vigência (o Código Civil atual ainda o mantém), mas numa forma muito mais mitigada, possuía, naquela época, uma acepção quase absoluta, o que gerava conseqüentemente, abusos dos mais fortes em relação os mais fracos (fenômenos já apontados por Rudolf Von Jhering em sua conhecida obra “A luta pelo Direito”, numa análise que não poderia deixar de ser considerada darwiniana do ordenamento jurídico), o que não mais pode ser admitido num regime plural que pretenda obter seu reconhecimento e legitimidade como Estado Democrático de Direito.
Diante dessa liberdade na contratação, como assevera San Tiago Dantas, ocorreu o consórcio de empresas, cujo objetivo precípuo era a eliminação da livre concorrência; com isso a doutrina liberal clássica, em fins do século XIX, foi perdendo expressão, em virtude do intervencionismo do Estado, através de conceitos limitadores de tal liberdade (função social, boa-fé, ordem pública etc.), mas que eram, contudo, vagos, sendo que, só passaram a ser estudados e definidos, com mais vagar, a partir da Segunda Guerra Mundial (o que se deveu a partir do advento de doutrinas como a do New Deal, mencionada acima).
E, no direito brasileiro, isso não foi uma exceção, ao contrário, passaram a surgir, legislativamente, uma série de restrições ao direito de contratar, deixando com o que o número de cláusulas dispositivas passasse a competir, em situação de igualdade, com o número de cláusulas não derrogáveis, ou de ordem pública (limitações ao direito de contratar com o Estado, nas relações de trabalho, nas relações de consumo, e, mais diretamente, restrições à disposição de certos direitos básicos como a vida e a saúde etc – fenômenos, ademais, já examinados, com mais vagar, nas linhas anteriores a revelar as grandes dificuldades, hodiernamente, em se buscar separar as searas do direito público e do direito privado.
E, ainda mais, como conseguir entender o escopo de atuação desta autonomia das vontades neste tipo de contratação – o que leva, insista-se, novamente a indícios de que realmente estejamos no limiar da transição do nosso ordenamento jurídico de um sistema de Civil Law, para um sistema jurídico mais afinado com o sistema da Common Law, por sua jurisdição de precedentes, ou case system, vez que, nessa verdadeira zona cinzenta, cada vez mais a jurisprudência pátria tem estabelecido os parâmetros centrais.
Em suma, um desses conceitos supra-aludidos, está estabelecido no Código Civil vigente, de forma expressa, em sua norma contida no artigo 422, qual seja, o chamado princípio da boa-fé objetiva, afigurando-se como meio idôneo de mitigação a exploração dos hipossuficientes, ainda que não se cuide, propriamente, de uma relação de consumo, disciplinada pela Lei nº 8.078/90.
Tudo isso tornaria evidente a facilitação da tutela individual desse direito à proteção da saúde no âmbito das relações preponderantemente privadas – até porque, como asseverado acima, em outros itens deste trabalho, a própria Lei nº 9.656/98 autorizou a integração de tais contratos como relações de consumo, nos termos de sua norma contida no artigo 35H, em sua atual redação – matéria já sumulada, à essa altura, pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula nº 469).
E, com propriedade, Maria Stella Gregori, amparada na opinião de Nelson Nery Jr., aponta no sentido de que a Lei nº 8.078/90 não pode ser entendida como meramente supletiva ou complementar em relação à chamada Lei dos Planos de Saúde (a Lei nº 9.656/98), isso porque a proteção ao consumidor tem nítida base constitucional, por vários preceitos, de modo que, em condições como tal, tudo quanto diga a respeito aos direitos dos consumidores orientar-se-á principiologicamente pelo CDC (Lei nº 8.078/90), não se podendo suprimir seus princípios fundamentais (no que tange à eticidade, transparência, informação, inversão de ônus, etc....).
Nesse sentido, inclusive, parece indispensável, para a melhor compreensão, que se destaque a opinião literal a esse respeito, sintetizada, deste modo, pelo autor citado por Maria Stella Gregori, que o aponta com precisão acerca da questão, lançando verdadeira “pá de cal”, se for permitida a metáfora, a esse respeito:
“... o microssistema do direito das relações de consumo será sempre regido, de forma principal e geral, pela lei especial que o criou, vale dizer, pelo Código de Defesa do Consumidor. ... O Código de Defesa do Consumidor, por outro lado, é lei principiológica. Não é analítica, mas sintética. Nem seria de boa técnica legislativa aprovar-se lei de relações de consumo que regulamentasse cada divisão do setor produtivo (automóveis, cosméticos, eletroeletrônicos, vestuário, etc.). Optou-se por aprovar lei que contivesse preceitos gerais, que fixasse os princípios fundamentais das relações de consumo. É isso que significa ser uma lei princípiológica. Todas as demais que se destinarem, de forma específica, a regular determinado setor das relações de consumo deverão submeter-se aos preceitos gerais da lei principiológica, que é o Código de Defesa do Consumidor. Assim, sobrevindo lei que regule, v.g.; transporte aéreo, deve obedecer aos princípios gerais estabelecidos no CDC ....”[7]
Sob tal perspectiva, parece razoável, eis que desponta com singular clareza solar, que a Lei nº 9.656/98, não obstante tenha a mesma natureza (lei ordinária), suplantar cânones protetivos dos consumidores, sob pena de se criar uma categoria jurídica nova, o consumidor dos planos de saúde, com menos direitos que os consumidores geral, sem qualquer fator de discrimen razoável a esse respeito, o que, se prevalecesse, implicaria em manifesta situação de inconstitucionalidade de tais restrições da nova lei por colidência clara com o princípio constitucional da igualdade (tanto assim que inúmeros expedientes das empresas prestadoras de serviços de plano de saúde e de seguro saúde tem sido afastadas sistematicamente pela jurisprudência dos Tribunais pátrios e pelos enunciados e resoluções do CONSU, órgão interministerial referido na Lei nº 9.656/98, hierarquicamente superior à ANS, agência nacional de saúde suplementar que regulamenta o setor).
Do mesmo modo, a norma contida no artigo 421 ainda do Código Civil vigente estabelece que a liberdade de contratar estará sujeita e limitada à função social do contrato (o que reforça o caráter relativo do princípio do pacta sunt servanta como asseverado acima), bem como, neste sentido se orienta o sistema protetivo estabelecido pelo Código Civil vigente, não só nas relações de consumo, estabelecendo, por exemplo, o que é pertinente para o caso em estudo, de forma expressa, que, em havendo contratos de adesão, a interpretação de tópicos obscuros será sempre mais favorável ao aderente (artigo 423 do referido Código Civil), sendo certo, ainda, que serão nulas, em contrato de adesão, cláusulas que estipulem a renúncia antecipada de direitos resultantes da natureza do negócio (artigo 424 do mesmo codex).
Tudo isso sem prejuízo do quanto asseverado no artigo 54 e seus consectários da Lei nº 8.078/90, no que tange ás limitações ao estabelecimento de cláusulas em sede de contratos de adesão ou contratos standard, que não podem conter cláusulas dúbias, obscuras, sem negrito de desvantagens e restrições etc..., bem como das próprias nulidades pelo emprego de expedientes pouco éticos em contratos de consumo, como aduzido no artigo 51 e seus incisos do mesmo Código do Consumidor, que, como visto, não se aplica subsidiariamente à Lei nº 9.656/98, como consta da imperfeita redação do seu atual artigo 35H, mas se aplica principiologicamente, com preponderância de seus termos, ante a base constitucional da defesa do consumidor.
A mens legis, portanto, parece ser inequívoca no sentido de ampla proteção ao consumidor, não deixando muito espaço para expedientes jurídicos pouco éticos, que procurem minimizar garantias legais, sob a égide do princípio de acordo com o qual pacta sunt servanda.
Sob tal ótica, a aplicabilidade do princípio da boa-fé objetiva, dar-se-á quando houver um desequilíbrio no auto-regramento das intenções das partes, na qual a autonomia da vontade será suprimida pelo princípio da boa-fé objetiva, de modo que a sua aplicação coadunará na finalidade deste que é o estabelecimento do equilíbrio e harmonização das pretensões das partes em conflito (isso, sem sombra de dúvidas, se refletirá no aumento significativo de demandas revisionais, ou, como queiram de índole cognitiva constitutiva, conforme o caso positiva ou negativa, envolvendo o objeto do tema em questão, ou seja, revisão dos contratos referentes a planos de saúde).
Destarte, a incidência da autonomia da vontade no contrato, perderá a sua veemência em face da aplicação do princípio da boa-fé objetiva, quando houver cláusulas abusivas ou quando se pretender inovar abusivamente na interpretação e extensão de tais cláusulas, limitando-se indevidamente direitos dos consumidores, ou por ocasião da inaplicabilidade dos efeitos do negócio jurídico, ou se houver a necessidade de interpretar de forma integrativa uma cláusula contratual lacunosa etc., necessitando-se, assim restabelecer a harmonia nos interesses das partes para a consecução do fim comum do contrato, que é a satisfação dos seus interesses contrapostos.
Ante o exposto no parágrafo anterior pode-se definir o princípio da boa-fé objetiva[8] como um parâmetro de observância geral, na qual o contrato deverá se enquadrar na consonância dos ditames da lealdade e no paradigma de condutas ordinárias que os contratantes devem ter, para a consecução do fim comum dos contratos[9].
Com a devida vênia, de se transcrever, ainda, sobre o tema, alguns enunciados da Jornada de Direito Civil, realizada em setembro de 2.002, pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, que ajudam a compreensão, sobretudo acadêmica, do princípio em testilha:
“Enunciado nº 24: Em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa; Enunciado n. 25: O artigo 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação, pelo julgador, do princípio da boa-fé nas fases pré e pós-contratual; Enunciado 26: O art. 422 impõe ao juiz interpretar, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como exigência de comportamento leal dos contratantes; Enunciado 27: Na interpretação da cláusula geral da boa-fé, deve-se levar em conta o sistema do Código Civil e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores metajurídicos.”
Por derradeiro, em relação a essa visão da questão da análise da tutela privada do direito à saúde (âmbito contratual) cumpre frisar que, se por acaso se fosse realizar uma exegese literal, da norma contida no artigo 422 do novo Código Civil[10] (a Lei nº 10.406/02), o referido princípio só se aplicaria quando da conclusão e no decorrer da execução do contrato.
Tal assertiva hermenêutica não parece ser a mais apropriada, em virtude de desprezar a fase pré e a pós-contratual gerando eventuais e potenciais perdas às partes hipossuficientes que se pretendeu proteger, como se daria, por exemplo, em relação às expectativas erigidas por uma proposta atraente ao oblato, e que por infundada razão venha a ser desfeita ocasionando gastos ao aceitante.
Sendo assim o princípio da boa-fé objetiva se aplica, desde logo, nas tratativas, bem como no post pactum finitum[11]. Haja vista que vários códigos alienígenas (anteriores ao Código Civil pátrio), como é o caso do código italiano que estabeleceu que, no desenvolvimento das tratativas e na formação do contrato, as partes devem portar-se com boa-fé (artigo 1.337), devendo, outrossim, fazer uma interpretação sistemática nos artigos da própria legislação pátria civil, quais sejam as normas contidas nos artigos 112 e 186[12], que reafirmam a finalidade do aludido princípio.
Aliás, de se destacar que o Superior Tribunal de Justiça tem buscado precedentes que, cada vez mais, tornam patente a incidência dessa boa-fé objetiva nos contratos em geral. Como exemplo disso se pede vênia para apontar a decisão no sentido de que Cláusula restritiva de seguro deve ser conhecida no momento da contratação REsp1219406-MG.
Tais questões não são novas, no que se refere à tutela do direito de saúde no âmbito privado, ou seja, envolvendo prestações por parte de particulares, e já vinham sendo resolvidas deste modo, pela jurisprudência pátria, antes mesmo da vigência do atual Código Civil.
E não são poucas, como se destacará no item seguinte, as decisões jurisprudenciais, nesse sentido (e dos mais variados órgãos, inclusive Tribunais Superiores).
Assim, a questão não revela maior complexidade, sob a ótica da possibilidade, ou não, de concessão de antecipação dos efeitos da tutela ou da execução dos Julgados, com o cumprimento efetivo dessas sentenças (como sabido, em não sendo o Estado lato sensu, o devedor da obrigação, não ocorrerão restrições à aplicação das regras da Lei nº 11.232/05 (mantidas sob esse aspecto, no Anteprojeto de Código de Processo Civil), que não as questões de direito intertemporal, como igualmente não haverá que se aplicar o arcabouço burocrático do artigo 100, seus incisos parágrafos, da Carta Política vigente ou as restrições das Emendas que os alteraram), eis que, como dito acima, em se cuidando de particulares (ou seja, de planos explorados por cooperativas ou empresas de caráter privado) não haverá maiores dificuldades de execução da medida.
Tais variáveis são postas em conflito, de forma candente, na questão de massas que se delineia no presente momento, com a discussão das ações que se tem observado de um modo mais ou menos freqüente, nos juízos pátrios, envolvendo processos das mais variadas matizes (ou seja, envolvendo relações jurídicas de natureza pública e de natureza privada), tendo por objeto a garantia de meios materiais para a preservação da saúde dos indivíduos, seja perante o Poder Público, seja perante entidades privadas (como se dá, por exemplo, em relação às empresas mantenedoras de planos de saúde ou de seguro saúde).
No entanto como proposto por farta doutrina, tem-se entendido de um modo mais ou menos uniforme, que as relações privadas de direito à saúde, além de serem previstas pelo advento da Lei nº 9.656/98 (a conhecida Lei dos Planos de Saúde – como já pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, por sua Súmula nº 469), não deixam de ser consideradas como relações de consumo, sendo, portanto, regidas igualmente pela Lei nº 8.078/90 (a própria lei dos planos de saúde prevê tal situação, nas alíneas do seu artigo 35, como aduzido acima), mas não se pode esquecer que, se por acaso houver algum conflito (antinomia) entre a orientação contida na lei especial dos planos de saúde e o estatuto consumerista, por força do que se tem entendido como interpretação principiológica, devem preponderar normas que beneficiem o consumidor hipossuficiente na contratação havida, numa visão, aliás, que se presta à melhor garantia do direito à saúde e ao próprio direito à vida, com espeque na efetividade do princípio da dignidade da pessoa humana.
Isso porque parece inegável que exista uma franca proteção constitucional das relações de consumo, tanto que o capítulo da Carta Política referente à ordem econômica, tem, como um de seus princípios, a proteção dos direitos do consumidor, a revelar a grande preocupação da ampliação do conceito de cidadania que se pretendeu conferir à ordem constitucional neste Estado Democrático de Direito, no qual, obviamente, se deve valorizar a dignidade da pessoa humana, como sobreprincípio ao patrimônio ou ao capital.
Dos próprios critérios exegéticos previstos pela norma contida no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil já se pode extrair tal ilação, no que se refere ao escopo preconizado pelo constituinte ao editar tais normas protetivas, ou seja, a sua mens legis, ou, como queiram, sua mens legislationes, parecendo que as próprias exigências do bem comum se inclinem nessa orientação.
Assim, em ocorrendo situação de antinomia, ou conflito aparente de normas entre os dois diplomas, ou seja, a Lei especial dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/98) e o estatuto consumerista (Lei nº 8.078/90), tem-se como inequívoco que prepondera o entendimento mais favorável ao consumidor hipossuficiente, não se aplicando quanto a isso o princípio de acordo com o qual lex specialis derrogat lex generalis, eis que, como dito, existe embasamento constitucional a orientar o desate em sentido diverso.
Nunca se podendo esquecer, aliás, como dito linhas atrás, que, em casos como tal, o consumidor tem direito a uma proteção integral, com informações adequadas, contra expedientes leoninos, tal como preconizado pelo conjunto de dispositivos lançados nas normas contidas nos artigos 6º, 51, 54 e seus consectários da Lei nº 8.078/90 (a par do regramento da proteção lançada no Código Civil, igualmente analisada acima, para os contratos em geral, no que se refere ao respeito à mesma boa-fé objetiva) – tudo isso sem prejuízo das resoluções da ANS (que se descumpridas sujeitarão os próprios gestores dos planos e seguros-saúde, às penalidades do artigo 35 e seus consectários da própria Lei nº 9.656/98 – sem prejuízo de outras penalidades de índole civil ou, conforme o caso, penal).
A jurisprudência pátria, inclusive, vem se manifestando de forma mais ou menos uniforme neste sentido, como se pode observar, verbi gratia, pela transcrição do seguinte Julgado:
PLANO DE SAÚDE. Cirurgia Cardíaca. Exclusão Contratual. Plano de Saúde. Necessidade de realização de cirurgia no coração da segurada para o fechamento d comunicação interatrial, cujo meio adotado pelo médico foi a colocação de prótese amplatzer. Negativa do convênio em arcar com os custos da prótese na conformidade com a cláusula 9 c, do contrato pactuado entre as partes. Inadmissibilidade. Aplicação das Leis nº 8.078/90 e 9.656/98. Sentença Mantida. Não provimento. TJSP – 4ª Câm. – Ap. 528.367.4/9 – Rel. Ênio Santarelli Zuliani – j. 29.11.2.007.
Ainda, do mesmo Tribunal, tem-se o seguinte aresto, destacado, ademais, pelo Relator do v. acórdão anterior:
CONTRATO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. PLANO DE SAÚDE. Recusa da requerida em custear marca-passo. Descabimento. Procedimento necessário em caráter emergencial sob pena de agravamento da situação – Sujeição da avença aos ditames da Lei nº 8.078/90 – Cláusula de exclusão considerada abusiva e, portanto, tida como não escrita – Cominatória Procedente – Recurso Desprovido. TJSP – Apelação 407.461-4, Rel. Des. Beretta da Silveira, j. 25.07.06.
No mesmo sentido, não parece desnecessário apontar:
PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA DE URGÊNCIA PARA IMPLANTE DE ENDOPRÓTESE TORÁCICA NA AORTA – CLÁUSULA LIMITADORA DE COBERTURA. Sendo o pedido inicial de condenação da ré a cumprir o Plano de Saúde, com observância da Lei nº 9.656/98, não é extrapetita a sentença que, com fundamento nos arts. 46, 47, 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor, declara a nulidade da cláusula contratual que exclui da cobertura o fornecimento de prótese e, em conseqüência a tutela antecipada deferida. TJRJ – Ap. Civ. 2002.001.12322, Rel. Des. Cássia Medeiros, p. 14.11.2.002.
Também perfilando tal entendimento, há razoável tempo, o E. Superior Tribunal de Justiça:
PLANO DE SAÚDE. PROSTATECTOMIA RADICAL. INCONTINÊNCIA URINÁRIA. COLOCAÇÃO DE PRÓTESE: ESFINCTER URINÁRIO ARTIFICIAL. 1 – Se a prótese, no caso o esfíncter urinário artificial, decorre de ato cirúrgico coberto pelo plano, sendo conseqüência possível da cirurgia de extirpação radical da próstata, diante de diagnóstico de câncer localizado, não pode valer a cláusula que proíbe a cobertura. Como se sabe, a prostatectomia radical em diagnóstico de câncer localizado em finalidade curativa e o tratamento da incontinência urinária, que dela pode decorrer, inclui-se no tratamento coberto porque ligado ao ato cirúrgico principal. 2 –Recurso Especial conhecido e desprovido. STJ – Resp 519940/SP, Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, 3ª Turma, DJU 01.09.03.
Tudo isso garantindo ao consumidor não só a inversão dos ônus probatórios em seu favor se houver verossimilhança de suas alegações (artigo 6º, inciso VIII da Lei nº 8.078/90), como igualmente inversões especiais, como no caso das carências em relação a doenças pré-existentes, como se observa pelo artigo 11, in fine, da Lei nº 9.656/98.
E, se acaso isso não bastasse, como dito acima, além do próprio enfraquecimento do princípio da força obrigatória dos contratos (vetusto e clássico brocardo pacta sunt servanda), o próprio Código Civil, que é norma posterior à lei especial dos Planos de Saúde Privada, igualmente estendeu a toda e qualquer contratação de direito privado, ainda que não consumerista, a proteção da garantia da boa-fé objetiva (artigo 422), de modo que não pareceria razoável, o que se admite como argumento de reserva, que somente os contratos de plano de saúde pudessem indistintamente, beneficiar os fornecedores em detrimento de consumidores (isso seria, novamente, ruptura do texto constitucional, posto que denotar-se mais do que cediço que a Carta Política não aceita violações do princípio da igualdade ou da isonomia, sem um adequado fator de discrimen).
Em conclusão de que o consumidor acaba por aproveitar o melhor de dois mundos, no que tange a aspectos de proteção legal e contratual, recomendando maiores cautelas dos gestores de sistemas de planos privados, seja sob a égide de seguro-saúde, seja sob a égide do próprio contrato de plano de saúde, eis que parece clara a orientação no sentido de que, ao calcular os custos da prestação, a prestadora de serviços deva computar os ônus que terá que suportar já que judicialmente poderá vir a ser compelida à prestação em caso de recusa indevida de cobertura, sem prejuízo das respectivas indenizações daí decorrentes, por danos materiais e morais.
Aliás, a orientação contida na Súmula nº 469/STJ, ao refletir tendências, levaria à própria interpretação no sentido de que a proteção consumerista seria aplicável igualmente aos chamados planos antigos, ou anteriores à vigência da Lei nº 9.656/98 e em relação aos quais não teria havido adaptação, eis que igualmente vinha assentando o referido Areópago (REsp 267.530), notadamente no que tange ao fato de se cuidar de contratações de trato sucessivo que, nessas condições, foram colhidas pelo advento da lei nova, angariando os direitos novos concedidos aos consumidores.
Até mesmo doações de sangue, dependendo da perspectiva em que analisadas, acabam sendo vistas, pela jurisprudência pátria, como verdadeiras relações de consumo.
Como visto linhas acima, tem-se que as relações com prestações afeitas ao objeto saúde podem ter vínculo na própria lei lato sensu, como podem ter fonte contratual, e, como tal, natural seria de se esperar que, em não havendo prestação adequada pelo obrigado ao respectivo dever, surgirá a obrigação de indenizar eventuais danos causados com a negativa, desde que satisfeitos os requisitos gerais previstos pelo advento da norma contida no artigo 186 do Código Civil e demais consectários materiais pertinentes ao caso, com indenização tanto de danos materiais emergentes, quanto de danos morais puros ou não.
Aliás, sobre a indenização de danos morais, em caso análogo, por recusa indevida de tratamento (situação que obviamente traz apreensão indevida para o homem médio, enquanto bonus pater famílias ou razonable man, em qualquer dos principais sistemas jurídicos do planeta – Civil Law e Common Law), já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, em notícia veiculada no seu informativo eletrônico, em meados do ano de 2.010.
Em caso semelhante, o mesmo Areópago confirmou o dever da seguradora de contrato deste jaez, a indenizar danos materiais e morais decorrentes de erro médico e descaso para com a saúde de consumidora (REsp 1133386 – RS), como também divulgado pelo mesmo informativo eletrônico.
Do mesmo modo se deu em outro precedente em que a fornecedora se recusou a aquiescer com cobertura de tratamento de enxerto ósseo, como se observa no julgamento do REsp 1.096.560, e, ainda mais, reconhecendo a situação de aflição psicológica pela qual se passa a submeter o consumidor em casos de recusa de cobertura, igualmente se conferiu indenização a uma consumidora que teve negativa de cobertura de cirurgia para extração de vesícula biliar, três dias após a intervenção – REsp 1.072.308.
De igual sorte, conviria destacar, que mesmo quando houver necessidade de novas intervenções, por tratamentos não cobertos, igualmente será reconhecida a abusividade na negativa de cobertura, com reconhecimento do dever de indenizar. Sobre o tema, novamente, já manifestou o Superior Tribunal de Justiça, apontando o seguinte:
DANOS MORAIS. CONTRATO. PRESTAÇÃO. SERVIÇOS MÉDICOS. Trata-se de pedido de indenização por danos materiais e morais devido à recusa da prestadora de plano de saúde de internar, em emergência, na UTI, a paciente conveniada. O recorrente afirma no REsp que a recusa deu-se pelo fato de sua esposa ter-se submetido, 48 horas antes do mal-estar, a uma cirurgia estética que não estava coberta pelo contrato. Contudo, alega ser injusta essa recusa, visto não haver relação de causa e efeito entre a cirurgia e o mal-estar do qual resultou o coma da esposa, conforme comprovou a perícia técnica. Na origem, a ação foi julgada procedente, mas o TJ, por maioria de votos, embora tenha reconhecido a inexistência de nexo de causalidade entre o coma e a cirurgia estética, reformou a sentença, afastando a indenização pelo dano moral ao fundamento de que houve mero descumprimento de cláusula contratual, o que não geraria indenização por dano moral. Destacou o Min. Relator serem fatos incontroversos nos autos o coma, a recusa da operadora do serviço de saúde recorrida de internar na UTI a conveniada, a venda de imóvel para cobrir os gastos com o hospital credor e a falta de relação de nexo de causalidade entre o coma e a cirurgia realizada. No entanto, consignou-se nos autos haver a obrigação de a recorrida prestar a cobertura do plano de saúde, ou seja, mesmo o plano não cobrindo a cirurgia estética, caberia à seguradora cobrir os males porventura advindos da cirurgia. Observa o Min. Relator ser verdade que a jurisprudência deste Superior Tribunal entende que o mero descumprimento de cláusula contratual, em princípio, não gera dano moral indenizável, mas é possível a condenação de dano moral quando há recusa infundada de cobertura de plano de saúde. Explica que o descumprimento de norma contratual que não inflige dano moral seria aquele que causa apenas desconforto ou aborrecimento superficial, por exemplo: atraso na realização de uma cirurgia de rotina. Contudo, no caso, o descumprimento do contrato ultrapassou o simples desconforto e mal-estar: a segurada corria risco de morrer, era uma situação de urgência. Nessas circunstâncias, a seguradora não poderia ter recusado a cobertura solicitada, nem infligir sofrimento e angústia aos familiares da segurada, que, inclusive, venderam um imóvel para cobrir as despesas hospitalares. Ressalta ainda o Min. Relator que o CDC estabelece normas de ordem pública e interesse social e, em seu art. 4º, consagra os princípios da boa-fé objetiva e da equidade e coíbe o abuso de direito, como na hipótese. Ademais, assevera que as cláusulas restritivas do direito do consumidor devem ser interpretadas da forma menos gravosa a ele, ou seja, mais benéficas, visto não ser razoável que o segurado de plano de saúde seja desamparado quando mais precise de tratamento médico e hospitalar. Por todo o exposto, a Turma deu provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 1.072.308-RS, DJe 10/6/2010; REsp 1.037.759-RJ, DJe 5/3/2010; AgRg no REsp 1.059.909-SP, DJe 2/9/2010; AgRg no Ag 884.832-RJ, DJe 9/11/2010, e Ag 661.853-SP, DJ 4/4/2005. REsp 907.655-ES, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 2/12/2010.
Assim, não mais prevaleceria o entendimento anterior no sentido de que tais danos não seriam indenizáveis, considerando-se recusas administrativas como exercício regular de um direito, como se dava, por exemplo, em relação à jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a respeito do tema.
O que se observa, portanto, nesse tipo de situação é que, em face da gravidade dos fatores em jogo, ou seja, dada a natureza do direito invocado, existe sim, potencialidade da negativa implicar em situações psicologicamente negativas aptas ao reconhecimento de um dano moral, rompendo-se com a regra jurisprudencial, do próprio Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o mero inadimplemento contratual não geraria indenização por danos morais.
Sobre o tema, de se analisar Julgado específico do mesmo Areópago em que se considerou que recusa indevida de tratamento por operadora de plano de assistência privada à saúde foi considerada abusiva e gerou indenização, por si só, no montante de trinta mil reais. Neste sentido, precedente do referido órgão jurisdicional manifesto no REsp 1167525-RS. Com igual teor:
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. INCIDÊNCIA DO CDC. PRÓTESE NECESSÁRIA À CIRURGIA DE ANGIOPLASTIA. ILEGALIDADE DA EXCLUSÃO DE "STENTS" DA COBERTURA SECURITÁRIA. DANO MORAL CONFIGURADO. MAJORAÇÃO DOS DANOS MORAIS. Conquanto geralmente nos contratos o mero inadimplemento não seja causa para ocorrência de danos morais, a jurisprudência desta Corte vem reconhecendo o direito ao ressarcimento dos danos morais advindos da injusta recusa de cobertura de seguro saúde, pois tal fato agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, uma vez que, ao pedir a autorização da seguradora, já se encontra em condição de dor, de abalo psicológico e com a saúde debilitada. A quantia de R$ 5.000,00, considerando os contornos específicos do litígio, em que se discute a ilegalidade da recusa de cobrir o valor de "stents" utilizados em angioplastia, não compensam de forma adequada os danos morais. Condenação majorada. Recurso especial não conhecido e recurso especial adesivo conhecido e provido. (Recurso Especial nº 986947/RN (2007/0216173-9), 3ª Turma do STJ, Rel. Nancy Andrighi. j. 11.03.2008, unânime, DJ 26.03.2008).
Ainda no mesmo sentido, outro precedente do mesmo Areópago:
DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. SEGURO SAÚDE. CONTRATAÇÃO ANTERIOR À VIGÊNCIA DO CDC E À LEI 9.656/98. EXISTÊNCIA DE TRATO SUCESSIVO. INCIDÊNCIA DO CDC, MAS NÃO DA LEI 9.656/98. BOA-FÉ OBJETIVA. PRÓTESE NECESSÁRIA À CIRURGIA DE ANGIOPLASTIA. ILEGALIDADE DA EXCLUSÃO DE "STENTS" DA COBERTURA SECURITÁRIA. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE REPARAR OS DANOS MATERIAIS. As disposições da Lei 9.656/98 só se aplicam aos contratos celebrados a partir de sua vigência, bem como para os contratos que, celebrados anteriormente, foram adaptados para seu regime. A Lei 9.656/98 não retroage, entretanto, para atingir o contrato celebrado por segurados que, no exercício de sua liberdade de escolha, mantiveram seus planos antigos sem qualquer adaptação. Embora o CDC não retroaja para alcançar efeitos presentes e futuros de contratos celebrados anteriormente a sua vigência, a legislação consumerista regula os efeitos presentes de contratos de trato sucessivo e que, por isso, foram renovados já no período de sua vigência. Dada a natureza de trato sucessivo do contrato de seguro saúde, o CDC rege as renovações que se deram sob sua vigência, não havendo que se falar aí em retroação da lei nova. A cláusula geral de boa-fé objetiva, implícita em nosso ordenamento antes da vigência do CDC e do CC/2002, mas explicitada a partir desses marcos legislativos, impõe deveres de conduta leal aos contratantes e funciona como um limite ao exercício abusivo de direitos. O direito subjetivo assegurado em contrato não pode ser exercido de forma a subtrair do negócio sua finalidade precípua. Assim, se determinado procedimento cirúrgico está incluído na cobertura securitária, não é legítimo exigir que o segurado se submeta a ele, mas não instale as próteses necessárias para a plena recuperação de sua saúde. É abusiva a cláusula contratual que exclui de cobertura a colocação de "stent", quando este é necessário ao bom êxito do procedimento cirúrgico coberto pelo plano de saúde. Precedentes. Conquanto geralmente nos contratos o mero inadimplemento não seja causa para ocorrência de danos morais, a jurisprudência desta Corte vem reconhecendo o direito ao ressarcimento dos danos morais advindos da injusta recusa de cobertura de seguro saúde, pois tal fato agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, uma vez que, ao pedir a autorização da seguradora, já se encontra em condição de dor, de abalo psicológico e com a saúde debilitada. Recurso especial a que se dá parcial provimento. (Recurso Especial nº 735168/RJ (2005/0045980-3), 3ª Turma do STJ, Rel. Nancy Andrighi. j. 11.03.2008, unânime, DJ 26.03.2008).
Até mesmo hemocentro acaba sendo visto como verdadeiro fornecedor sob a perspectiva da Lei nº 8.078/90, responsabilizando-se por inclusão indevida de nome de consumidor em banco de dados de doação de sangue com restrição por hepatite, como se pode observar pelo decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp. 540922-PR.
No entanto, se o consumidor involuntariamente descobre-se acometido de doença grave, não pode tentar responsabilizar o fornecedor por violação indevida de sua intimidade. Nesse sentido, ainda dentro do que vem entendendo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, de se destacar:
INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. EXAME INVOLUNTÁRIO. Trata-se, na origem, de ação de reparação por danos materiais e compensação por danos morais contra hospital no qual o autor, recorrente, alegou que preposto do recorrido, de forma negligente, realizou exame não solicitado, qual seja, anti-HIV, com resultado positivo, o que causou enorme dano, tanto material quanto moral, com manifesta violação da sua intimidade. A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, entendeu que, sob o prisma individual, o direito de o individuo não saber que é portador de HIV (caso se entenda que este seja um direito seu, decorrente da sua intimidade) sucumbe, é suplantado por um direito maior, qual seja, o direito à vida longeva e saudável. Esse direito somente se revelou possível ao autor da ação com a informação, involuntária é verdade, sobre o seu real estado de saúde. Logo, mesmo que o indivíduo não queira ter conhecimento da enfermidade que o acomete, a informação correta e sigilosa sobre o seu estado de saúde dada pelo hospital ou laboratório, ainda que de forma involuntária, tal como no caso, não tem o condão de afrontar sua intimidade, na medida em que lhe proporciona a proteção de um direito maior. Assim, a Turma, por maioria, negou provimento ao recurso. REsp 1.195.995-SP, Rel. originária Min. Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Min. Massami Uyeda, julgado em 22/3/2011.
E, sempre com a maior vênia possível, se as operadoras de planos privados de assistência à saúde causam danos morais com suas recusas indevidas e demoras no atendimento de cláusulas contratuais, o mesmo poderia ser dito e aplicado, mutatis mutandi, em relação ao Estado lato sensu, eis que, como exposto nesta obra, existe responsabilidade solidária dos integrantes do SUS, e os serviços públicos também geram relações de consumo, como pode ser extraído do advento da norma contida no artigo 175 e seus consectários da Constituição Federal.
Ainda se tem reconhecido que, quando houver previsão ou cobertura contratual ou legal, a recusa da operadora em fornecer medicamentos, além de tratamentos, pode implicar no reconhecimento do dever de indenizar. Neste sentido, de se pedir vênia para apontar mais um aresto do Superior Tribunal de Justiça, desta feita, apontando que:
INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. MEDICAMENTO. Cuida-se de ação de indenização por dano moral ajuizada pelo beneficiário titular de plano de saúde contra caixa de assistência a funcionários de instituição bancária, porque ela se negara a fornecer medicamento à sua regular dependente no referido plano (sua esposa), remédio fornecido após por força de liminar em cautelar. Isso posto, não há como negar a existência de legitimidade ativa ad causam, porquanto se trata de pleito indenizatório em nome próprio, postulado por quem, em princípio, sofreu os dissabores e se sente indignado por causa da negativa da cobertura. Se assim não fosse, também teria legitimidade o autor tal como aquele indiretamente atingido pelo possível aviltamento moral. Porém, nesse contexto, o exagerado valor da indenização, de R$ 100.000,00, justifica a intervenção deste Superior Tribunal para reduzi-lo ao equivalente a dez salários mínimos. Precedentes citados: REsp 530.602-MA, DJ 17/11/2003; REsp 986.947-RN, DJe 26/3/2008, e REsp 356.026-MA, DJ 1º/7/2004. REsp 801.181-MA, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 5/5/2009.
Aliás, já há algum tempo, em minha judicatura monocrática, tenho perfilado entendimento no sentido de que não apenas a aflição mencionada acima se prestaria a gerar conduta apta a uma indenização por danos morais, mas o próprio fato de que tais condutas geram dissabores ao cotidiano do consumidor que, além disso, deve-se desviar de sua rotina usual, o que vale dizer, muitas vezes, de suas atividades produtivas, para buscar a contratação de um advogado, reunir documentos, ir ao Fórum, ao Procon, etc , tudo isso contribuindo para autorizar a imposição de uma indenização por danos morais, ainda que puros (ou seja, sem reflexo patrimonial direto).
E, desde há muito, sendo importante que disso se lembre, o regime jurídico da matéria, qual seja, indenização de danos morais. encontra eco na normatização constitucional, sendo certo que a Carta Política de 05.10.1988, em seu artigo 5°, incisos V e X, tornou a indenização do dano moral numa garantia individual, uma verdadeira liberdade pública, tornando totalmente bizantina e ultrapassada a discussão anterior, que já estava superada pela jurisprudência dos nossos Tribunais, no sentido de que não se poderia indenizar o pretium doloris.
É importante, no entanto, que se destaque que, no direito anglo-saxão, onde predomina a doutrina do examplary damages theory, as indenizações são vultosas pois, além da reparação do dano causado à vítima, como forma de prevenção especial, visa-se ainda a prevenção geral, ou seja, impedir que fatos daquela natureza voltem a acontecer.
No Brasil, entretanto, a legislação não avançou até esse ponto, não sendo permitido ao Juiz que usurpe função legislativa procedendo desta forma (nos E.U.A., v.g., onde se aplicam o system cases e o stare decisis, avultam os poderes jurisdicionais nesse campo).
Em nosso sistema, à míngua de regulamentação legal específica (não houve, tecnicamente, ocorrência de calúnia ou injúria, nos termos do que previa, por exemplo, a norma contida no artigo 1.547 do Código Civil de 1.916, o chamado Código Bevilácqua, que previa critério indenizatório específico para dano moral), convencionou-se adotar, analogicamente, o sistema proposto pelas normas contidas nos artigos 81 e 84 da Lei n° 4.117/62 (Código Brasileiro de Telecomunicações), mesmo tendo em vista o disposto no Decreto-Lei n° 268/67 e a atual Lei de Imprensa. Neste sentido, e.g., 1° TACSP, 6ª Câmara, Ap. 412.831-4 e Ap. 404.563-6.
Acredito que seria o caso de rever essas posturas, de modo a tornar menos interessante a incidência da conhecida teoria dos grandes números, mencionada em termos econômicos.
Ora, de acordo com essa teoria, em contratações de massas, algumas operadoras de alguns tipos de serviços, o que poderia se dar em contratações de serviços de telefonia, de fornecimento de energia ou mesmo nos contratos com objeto saúde, poderiam se sentir tentadas a violar, em larga escala, alguma prerrogativa contratual, porque, estatisticamente, somente um pequeno percentual iria buscar a efetividade de seu direito em juízo, e desse percentual, um menor obteria a tutela integral (aplicam-se aí situações de improcedência do pedido, desistências, acordos por quantia menor, etc...), a permitir que se torne compensador algum tipo de estudo ou planejamento prévio de condutas lesivas, ainda mais porque, como sabido, mesmo aqueles que obtiverem procedência integral, estarão sujeitos a toda uma ritualística morosa, que, a despeito das reformas, pode tornar compensador aplicar o valor que deveria ter sido gasto no cumprimento do contrato, em alguma aplicação financeira, aguardando a fornecedora a efetivação da tutela.
Para que tais juízos não se tornem compensadores, devendo-se desestimular as fornecedoras que assim operem, a jurisprudência dos pretores deveria ousar um pouco mais, se a finalidade buscada pelo aplicador for a consecução de uma eticidade contratual e a busca pela boa-fé objetiva, recomendando-se critérios alternativos de fixação do montante de tais danos (por exemplo, fixar-se horas de faturamento líquido da operadora, em casos de danos morais puros ou patrimoniais reflexos, como modo de desestabilizar suas planilhas, impedindo-se de se utilizar o assoberbamento do Poder Judiciário como modo de aplicação financeira, como dito, ademais, em outros itens do presente trabalho).
Mas, diga-se en passant, de todo modo, em relação a tanto, de se observar se o consumidor contribuiu, ou não, para a ocorrência do dano, eis que, em posicionamento anterior do mesmo órgão superior em questão, já se chegou a negar o pagamento de indenização para paciente que optou, de modo expresso, por manter parte de uma agulha em seu corpo, em nota divulgada pelo mesmo informativo de que se cuidou linhas acima e que convém destacar, nesta obra, para consulta e elucidação acerca de tal questão.
Tudo isso, no entanto, sem que se esqueça de situações em que se evidenciem responsabilidades diversas de alguns dos envolvidos no evento, eis que, como sabido, não obstante a solidariedade não se presuma, devendo decorrer de contrato, ou da letra da lei, existe situação legalmente expressa no sentido de prever a solidariedade pela colaboração, ou seja, com nexo de causalidade, portanto, na ocorrência do dano (artigo 942 do Código Civil vigente, com disposição análoga àquela prevista no artigo 1.518 do revogado Código Civil de 1.916).
Tanto assim que, caso a caso, se aferirá se existe um, ou mais envolvidos no fato (por exemplo, como visto em Julgado descrito linhas acima), já se reconheceu que fornecedora de plano de saúde poderia ser solidariamente responsável com médico (REsp 1133386 – RS), por mazelas advindas da prestação de serviço (como sabido, a atividade da medicina, como regra, pressupõe uma obrigação de meio e não de resultado, isso não quer dizer quando os meios empregados sejam indevidos, por imprudência, negligência ou imperícia, ou mesmo dolo, não possa haver indenização).
Aliás, são comuns situações de reconhecimento de tal situação de solidariedade, em sede indenizatória, na esfera de erros médicos, como se pode observar, verbi gratia, pelo seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:
RESPONSABILIDADE. HOSPITAL. MÉDICO. Na ação de indenização por erro médico ajuizada contra o hospital, o juízo, após analisar a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada, deixou entrever que os médicos que praticaram o ato, litisconsortes meramente facultativos, poderiam também integrar a lide. Assim, determinou a citação deles após o requerimento e a concordância de ambas as partes. Diante disso, a Turma, ao prosseguir o julgamento, entendeu, por maioria, ser nula a decisão e excluiu o médico recorrente da lide, pois o juiz, ao sugerir seu ingresso, agiu como se fosse parte e violou os princípios da demanda (art. 128 do CPC), inércia e imparcialidade. O Min. Relator ressaltou que, apesar de o juiz não ser apenas um espectador da lide, sua atuação não pode sobrepor-se aos deveres impostos às partes na condição de sujeitos processuais, quanto mais se o CPC, quando permite uma participação mais efetiva do juízo, faz isso expressamente (vide art. 130 desse código). Já o Min. Paulo de Tarso Sanseverino aduziu que a inclusão de parte não demandada pelo autor caberia nos casos de litisconsórcio necessário (art. 47, parágrafo único, do CPC) ou se efetivamente ilegítima a parte tida por ré, ressalvadas as situações excepcionais. A Min. Nancy Andrighi (vencida) entendia válida a citação porque, ao final, é proveniente da vontade das partes. REsp 1.133.706-SP, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 1º/3/2011.
Em sentido contrário, a revelar que não se cuida, ainda, de matéria com entendimento uniforme, de se continuar a pedir vênia pra destacar, do mesmo Areópago, o seguinte Julgado:
RESPONSABILIDADE. HOSPITAL. ERRO MÉDICO. A Turma afastou a responsabilidade civil objetiva do hospital recorrente por erro médico ao entendimento de que o dano à autora recorrida decorreu exclusivamente da alegada imperícia dos profissionais que realizaram sua cirurgia (também recorrentes), não tendo ocorrido falha na prestação dos serviços de atribuição da clínica. Ressaltou-se que o fato de as entidades hospitalares manterem cadastro dos médicos que utilizam suas dependências para realizar procedimentos cirúrgicos não lhes confere o poder de fiscalizar os serviços por eles prestados, porquanto não se admite ingerência técnica no trabalho dos cirurgiões. Frisou-se, ademais, que os médicos envolvidos não possuíam vínculo com o hospital. Precedente citado: REsp 908.359-SC, DJe 17/12/2008. REsp 1.019.404-RN, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 22/3/2011.
Interessante destacar, no entanto, que já se reconheceu não ser o caso de se conceber a União como parte legítima, em situação de erro médico, em atendimento, em hospital privado, custeado pelo SUS, eis que isso, por si só, não revelaria a contribuição da entidade federal pela ocorrência do dano, dentro de tudo quanto asseverado linhas acima. Neste sentido, de se continuar a pedir vênia para destacar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
ILEGITIMIDADE. UNIÃO. ERRO MÉDICO. A União não possui legitimidade para figurar no pólo passivo de ação em que se objetiva a indenização por danos morais decorrentes de erro médico ocorrido em hospital da rede privada, durante atendimento custeado pelo SUS. A Lei n. 8.080/1990, no art. 18, I, II, V e XI, dispõe que compete aos municípios gerir e executar serviços públicos de saúde, celebrar contratos e convênios com entidades prestadoras de serviços privados de saúde, bem como controlar e avaliar sua execução e controlar e fiscalizar os procedimentos dos serviços privados de saúde. Assim, no caso, a Turma extinguiu a ação sem resolução do mérito por ilegitimidade passiva da União. Precedentes citados: REsp 513.660-RS, DJ 19/12/2003, e REsp 873.126-RS, DJ 20/10/2006. REsp 717.800-RS, Rel. Min. Denise Arruda, julgado em 25/3/2008.
Mas, insista-se, se o fundamento seria a colaboração para a ocorrência de um dano, como deflui da norma mencionada acima, ou seja, o consectário legal previsto pelo advento do artigo 942 do Código Civil vigente, se ocorrer situação de culpa exclusiva de algum dos envolvidos, não haverá que se cuidar de situação de solidariedade, eis que, como é cediço, essa somente decorreria da lei (que exige tal colaboração) ou da vontade das partes (ou seja, situação negocial). Neste sentido também já se manifestou o Superior Tribunal de Justiça, como se pode observar no julgamento do REsp 1019404.
Mesmo empresas farmacêuticas tem sido responsabilizadas em casos de falta de efetividade dos medicamentos que produzem, como vem sendo observado, por exemplo, por precedente do Superior Tribunal de Justiça em relação a tanto, inclusive reconhecendo-se situação de possibilidade de resguardo de tutela coletiva de interesse de um sem número de consumidores, conviria se continuar a pedir vênia para destacar, com a transcrição, o seguinte entendimento:
CIVIL E PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA PELO PROCON E PELO ESTADO DE SÃO PAULO. ANTICONCEPCIONAL MICROVLAR. ACONTECIMENTOS QUE SE NOTABILIZARAM COMO O 'CASO DAS PÍLULAS DE FARINHA'. CARTELAS DE COMPRIMIDOS SEM PRINCÍPIO ATIVO, UTILIZADAS PARA TESTE DE MAQUINÁRIO, QUE ACABARAM ATINGINDO CONSUMIDORAS E NÃO IMPEDIRAM A GRAVIDEZ INDESEJADA. PEDIDO DE CONDENAÇÃO GENÉRICA, PERMITINDO FUTURA LIQUIDAÇÃO INDIVIDUAL POR PARTE DAS CONSUMIDORAS LESADAS. DISCUSSÃO VINCULADA À NECESSIDADE DE RESPEITO À SEGURANÇA DO CONSUMIDOR, AO DIREITO DE INFORMAÇÃO E À COMPENSAÇÃO PELOS DANOS MORAIS SOFRIDOS.- Nos termos de precedentes, associações possuem legitimidade ativa para propositura de ação relativa a direitos individuais homogêneos.- Como o mesmo fato pode ensejar ofensa tanto a direitos difusos, quanto a coletivos e individuais, dependendo apenas da ótica com que se examina a questão, não há qualquer estranheza em se ter uma ação civil pública concomitante com ações individuais, quando perfeitamente delimitadas as matérias cognitivas em cada hipótese.- A ação civil pública demanda atividade probatória congruente com a discussão que ela veicula; na presente hipótese, analisou-se a colocação ou não das consumidoras em risco e responsabilidade decorrente do desrespeito ao dever de informação.- Quanto às circunstâncias que envolvem a hipótese, o TJ/SP entendeu que não houve descarte eficaz do produto-teste, de forma que a empresa permitiu, de algum modo, que tais pílulas atingissem as consumidoras. Quanto a esse 'modo', verificou-se que a empresa não mantinha o mínimo controle sobre pelo menos quatro aspectos essenciais de sua atividade produtiva, quais sejam: a) sobre os funcionários, pois a estes era permitido entrar e sair da fábrica com o que bem entendessem; b) sobre o setor de descarga de produtos usados e/ou inservíveis, pois há depoimentos no sentido de que era possível encontrar medicamentos no 'lixão' da empresa; c) sobre o transporte dos resíduos; e d) sobre a incineração dos resíduos. E isso acontecia no mesmo instante em que a empresa se dedicava a manufaturar produto com potencialidade extremamente lesiva aos consumidores.- Em nada socorre a empresa, assim, a alegação de que, até hoje, não foi possível verificar exatamente de que forma as pílulas-teste chegaram às mãos das consumidoras. O panorama fático adotado pelo acórdão recorrido mostra que tal demonstração talvez seja mesmo impossível, porque eram tantos e tão graves os erros e descuidos na linha de produção e descarte de medicamentos, que não seria hipótese infundada afirmar-se que os placebos atingiram as consumidoras de diversas formas ao mesmo tempo.- A responsabilidade da fornecedora não está condicionada à introdução consciente e voluntária do produto lesivo no mercado consumidor. Tal idéia fomentaria uma terrível discrepância entre o nível dos riscos assumidos pela empresa em sua atividade comercial e o padrão de cuidados que a fornecedora deve ser obrigada a manter.Na hipótese, o objeto da lide é delimitar a responsabilidade da empresa quanto à falta de cuidados eficazes para garantir que, uma vez tendo produzido manufatura perigosa, tal produto fosse afastado das consumidoras.- A alegada culpa exclusiva dos farmacêuticos na comercialização dos placebos parte de premissa fática que é inadmissível e que, de qualquer modo, não teria o alcance desejado no sentido de excluir totalmente a responsabilidade do fornecedor.- A empresa fornecedora descumpre o dever de informação quando deixa de divulgar, imediatamente, notícia sobre riscos envolvendo seu produto, em face de juízo de valor a respeito da conveniência, para sua própria imagem, da divulgação ou não do problema, Ocorreu, no caso, uma curiosa inversão da relação entre interesses das consumidoras e interesses da fornecedora: esta alega ser lícito causar danos por falta, ou seja, permitir que as consumidoras sejam lesionadas na hipótese de existir uma pretensa dúvida sobre um risco real que posteriormente se concretiza, e não ser lícito agir por excesso, ou seja, tomar medidas de precaução ao primeiro sinal de risco.- O dever de compensar danos morais, na hipótese, não fica afastado com a alegação de que a gravidez resultante da ineficácia do anticoncepcional trouxe, necessariamente, sentimentos positivos pelo surgimento de uma nova vida, porque o objeto dos autos não é discutir o dom da maternidade. Ao contrário, o produto em questão é um anticoncepcional, cuja única utilidade é a de evitar uma gravidez. A mulher que toma tal medicamento tem a intenção de utilizá-lo como meio a possibilitar sua escolha quanto ao momento de ter filhos, e a falha do remédio, ao frustrar a opção da mulher, dá ensejo à obrigação de compensação pelos danos morais, em liquidação posterior. Recurso especial não conhecido.REsp 866636 / SP RECURSO ESPECIAL 2006/0104394-9 Ministra NANCY ANDRIGHI T3 - TERCEIRA TURMA DJ 06.12.2007 p. 312.
Como relações deste jaez são consumeristas, tal como fartamente destacado linhas acima, a jurisprudência dos Tribunais pátrios sequer tem admitido a prevalência de convenções de arbitragem nessas espécies de negócio jurídico (ora, como sabido, em questões de saúde, geralmente, as partes acabam sendo premidas pelas peculiares situações em que se encontram o que implica em dizer que acabam aderindo a qualquer condição que lhe seja inicialmente imposta, ainda que lesiva, como sói acontecer).
Ademais o próprio artigo 51 e seus consectários do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) acaba por criar um sistema de proteção contra cláusulas contratuais abusivas, prevendo sua nulidade, o que implicaria no afastamento de estabelecimento de juízos arbitrais em contratações desta natureza.
Tais questões se tornam relevantes eis que, como asseverado em outros itens deste trabalho, a escolha de juízos arbitrais, pode se revelar perigosa na medida em que os consumidores podem acabar aderindo ao afastamento da incidência do direito protetivo escolhendo regras que sequer conhecem, ou mesmo um julgamento por equidade, nos termos da Lei nº 9.307/96, presidido por outros membros da classe médica que, como visto, pode ser tida como uma classe unida e até mesmo corporativista (pelo óbvio que a regra seja de profissionais sérios, comprometidos com deveres éticos, mas isso não impede que sejam ideologicamente comprometidos com outros valores protetivos de uma classe).
Por essas razões, em estrito cumprimento aos termos preconizados pela proteção sistêmica do arcabouço protetivo das relações de consumo, por se entender que cláusulas desta natureza, seriam lesivas aos interesses dos consumidores, não se tem permitido, como regra geral, que convenções de arbitragem sejam inseridas em contratos versando sobre o objeto saúde, o que implica em dizer que árbitros não terão competência (a lei os considera juizes de fato e de direito, portanto essa seria a expressão) para resolver nem mesmo questões indenizatórias, nessa peculiar espécie de negócio jurídico. Nesse sentido, inclusive, notícia divulgada, em outubro de 2.010, no site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, por sua abrangência em relação ao tema em comento, merece ser destacada:
TJ-SP barra uso de arbitragem em contrato médico 13/10/2010 Justiça privada: Para tribunal, discussão sobre erro médico e indenização devem correr no Judiciário Laura Ignacio | De São Paulo Adriana Braghetta: decisões tanto favoráveis quanto desfavoráveis A 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) julgou que a arbitragem não pode ser usada para solucionar um conflito referente a um contrato entre médico e paciente. Os magistrados negaram a possibilidade de que uma ação de indenização por erro médico fosse submetida a um procedimento arbitral. O paciente entrou na Justiça para pleitear indenização em razão dos resultados insatisfatórios de uma cirurgia para a redução das mamas. O pai do paciente - na época menor de idade - assinou um contrato de prestação de serviços médicos no qual constava cláusula que definia a Câmara Especial de Mediação e Arbitragem Médica (Ceamed) como local para resolver eventuais controvérsias. Na ação de indenização por danos morais, proposta pelo paciente, o médico pleiteou o direito de discutir a questão no tribunal arbitral, em razão da previsão contratual. Na decisão, o desembargador relator Ênio Santarelli Zuniani reconheceu que a Lei nº9.307, de 1996, permite a inclusão nos contratos de adesão - documento cujo teor não pode ser alterado pela parte, caso dos contratos de consumo - de cláusula compromissória. Segundo ele, porém, em um contrato de prestação de serviço, o dispositivo poderia prejudicar uma das partes. Isso porque, a cláusula arbitral poderia inibir o consumidor de buscar a satisfação de seus direitos na Justiça comum. O desembargador considerou ainda que o pai do paciente assinou o contrato com a cláusula em razão da relação de confiança entre médico e paciente.O Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê que a cláusula compromissória não é válida em contratos de adesão. Mas a Lei de Arbitragem, Lei nº 9.307, norma posterior ao CDC, determina que a cláusula arbitral terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituí-la ou concordar expressamente. A cláusula teria que estar em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto somente nessa cláusula. A advogada Adriana Braghetta, do escritório LO Baptista Advogados, afirma que o texto original da lei era mais claro, mas no Congresso foi alterado, provocando essa discussão. "O resultado prático são decisões judiciais favoráveis e desfavoráveis à arbitragem em contrato de prestação de serviço". A advogada afirma que ainda não há decisão de tribunais superiores sobre o tema. O advogado especialista em arbitragem, Pedro Batista Martins, chama a atenção para o fato de atualmente existir contratos de relação de consumo que, contudo, não são meros contratos de adesão. As partes avaliam as cláusulas do contrato. No caso de indenização por erro médico, por exemplo, o advogado vê com bons olhos o uso da arbitragem, tanto pelo lado do médico, em razão da confidencialidade, como do paciente, que terá um julgamento mais rápido. Martins afirma que a decisão do TJSP é isolada e que o TJ do Rio tem decisões favoráveis ao uso do instrumento para prestação de serviços. A advogada que representa o médico na Justiça, Giselia Maria Ferraz Silva de Souza, disse que vai aguardar a publicação do inteiro teor do acórdão para recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e estudar qual estratégia utilizará. A advogada alega que a Lei de Arbitragem garante a possibilidade do uso da cláusula compromissória nesse tipo de contrato.O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) é contra o uso da arbitragem nas relações de consumo. A gerente jurídica da entidade, Maria Elisa Novais, diz que contratos de consumo são, geralmente, de adesão e o consumidor não tem autonomia para negociar cláusulas. "Isso compromete a eficácia da cláusula compromissória de arbitragem porque essa forma de solução de litígio é imposta pelo fornecedor ou prestador de serviço", afirma. A advogada entende ser possível contestar a sua validade e pleitear sua nulidade como cláusula abusiva. Fonte: Valor Econômico.
Outro dado importante a ser considerado diz respeito ao fato de que, em relação à fiscalização da atividade das operadoras de contratos de plano de saúde (em dois tipos básicos, a saber, o contrato de seguro saúde e o plano de saúde propriamente dito, amplos disciplinados pela Lei nº 9.656/98, a partir de seu artigo 1º - de acordo, aliás, como orientação e alterações estabelecidas pela Lei nº 10.185/01, mitigando-se a ingerência da SUSEP e da CNSP em relação a tanto), buscou-se a instituição de uma agência reguladora, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar, criada pela Lei nº 9.961/00), que está hierarquicamente adstrita à fiscalização de um órgão interministerial, o CONSU (Conselho de Saúde Suplementar), nos estritos termos preconizados pela própria Lei dos Planos de Saúde Privados (artigo 35), baixando resoluções que devem ser observadas pela ANS.
Tal órgão interministerial ou CONSU tem suas atribuições devidamente apontadas no artigo 35-A da Lei nº 9.656/98, em seus incisos, sendo certo que tal órgão se encontra em posição hierárquica ascendente em relação a respectiva agência governamental, no caso a Agência Nacional de Saúde Suplementar ou ANS, que tem poder fiscalizatório e normativo expressamente estabelecidos, sobre as atividades das prestadoras de contratos de plano de saúde ou seguro-saúde, nos estritos termos preconizados pelo advento da norma contida no artigo 1, parágrafo 1º da Lei nº 9.656/98.
Tal constatação se revela como de grande aplicabilidade prática na medida em que, em havendo atividade de regulação administrativa pela referida agência, tem-se como importante fonte normativa para disciplinar as relações dos consumidores com as prestadoras dos serviços de saúde, as deliberações do CONSU, a serem observadas pela ANS em sede de tais contratações.
Podem ser destacar como importantes resoluções desta agência reguladora aquelas que: estabelecem as definições de cobertura de doenças pré-existentes (resolução nº 02/98); disciplina a adaptação dos contratos antigos (resolução nº 04/98 – com proteção integral de direitos adquiridos e extensão dos direitos novos concedidos pela lei, como igualmente decorre da orientação contida no artigo 35 da Lei dos Planos de Saúde Privada, por suas alíneas – com fomento, inclusive, de incentivos para a migração, nos termos da Lei nº 10.850/04 – com novas garantias, exigíveis a partir de 15 de abril de 2.009, nos termos da resolução nº 186); a resolução nº 06/98 com sua posterior ab-rogação pela .resolução nº 63/04 a respeito da imposição de limites para variações de custos por faixa etária; a de nº 10/98 referente a coberturas mínimas e sistemas de transplantes (matéria também disciplinada pela resolução nº 12/98), a de nº 11 versando sobre transtornos psiquiátricos, a de nº 13/98 estabelecendo condições para atendimentos de urgência e emergência, a de nº 85 que proíbe a ainda corriqueira prática de exigência de apresentação de cheque-caução, antes de atendimentos (mesmo que não se cuide de parte consumidora de um plano de saúde, nem mesmo em atendimentos particulares poderia o nosocômio se portar desta maneira, eis que patente que, atuando de modo a se aproveitar de estado de perigo, haveria situação de anulabilidade da cártula nos termos da legislação civil e, mesmo, consumerista – artigos 39, 51 e seus consectários do Código de Proteção e Defesa do Consumidor – Lei nº 8.078/90) e, por fim, mais não menos importante (dentre outras que ainda poderiam ser citadas) a de nº 82, que garante o acesso dos consumidores a cirurgias em casos de miopia de grau superior a sete, bem como a permissão de aproveitamento de carências em casos de migração de contrato de plano ou seguro saúde.
De todo modo impende ponderar no sentido de que a referida agência reguladora detenha atribuição legal de fiscalização do setor, nos termos do dito órgão interministerial (CONSU) podendo estabelecer orientações de interesse do consumidor (ou seja, em seu favor já que a legislação ordinária assim o autoriza por força da dita interpretação principiológica do Código do Consumidor a este tipo de contratação), inclusive, com imposição de multas em casos de descumprimento de tais deliberações pela operadora. Nesse sentido, inclusive, já se decidiu:
APELAÇÃO CÍVEL - ANS - NEGATIVA DE COBERTURA - DOENÇA PREEXISTENTE - APLICAÇÃO DE MULTA - LEI 9.656/98. 1. Apelação Cível interposta em face de sentença que julgou improcedente pedido de anulação de multa imposta a operadora de plano de saúde. 2. A Agência Nacional de Saúde Suplementar aplicou multa por negativa de cobertura, ante a alegação de doença preexistente. 3. Se a suspeita de fraude não foi valorada e definida no procedimento correspondente, discriminado na regulamentação (artigo 11, parágrafo único, da Lei nº 9.656/98), é irregular a prática de recusa de cobertura médica, sendo inconseqüente qualquer suspeita de suposta evidência de que o exame requerido estaria relacionado a doença preexistente. 4. É ilícita a recusa da cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente à contratação do seguro-saúde, se a Seguradora não submeteu a segurada a prévio exame de saúde e não comprovou má-fé. 5. Precedentes do eg. STJ (REsp 263564/SP e REsp 617239/MG). 6. Apelação a que se nega provimento. (Apelação Cível nº 397514/RJ (2004.51.01.019389-6), 8ª Turma Especializada do TRF da 2ª Região, Rel. Raldênio Bonifácio Costa. j. 11.03.2008, unânime, DJU 26.03.2008, p. 99).
Tal se dá na medida em que, como é cediço, enquanto atividade de regulação administrativa (ainda que se cuide de uma agência reguladora, a mesma é ente da administração indireta ou descentralizada não tendo suas deliberações poder de revogar legislação que lhe seja superior – o mesmo podendo ser dito mutatis mutandi, em relação ao dito órgão interministerial, o CONSU), não pode extrapolar os termos das leis de proteção do consumidor que prevalecem pelo kelseniano sistema que se estabelece no direito pátrio, isso porque a legislação protege principiologicamente como asseverado acima, os consumidores neste tipo de antinomia.
Tanto assim que já foram destacados, em itens anteriores do presente texto, precedentes jurisprudenciais nos quais prevaleceram tais resoluções que beneficiavam interesses dos consumidores (para isso existe base legal), o mesmo não se dando no entanto, por força do aduzido acima (poder regulamentar que não pode revogar normatização superior emanada do Congresso Nacional), como se pode perceber pelo seguinte trecho de acórdão que se pede vênia para transcrever, no qual se considerou que a resolução nº 11 CONSU não prevaleceria frente aos termos da Lei nº 8.078/90:
SEGURO SAÚDE – COBERTURA. PSIQUIATRIA. Seguro de Saúde. Lei nº 9.656/98. Cobertura. Psiquiatria. Conforme previsão contratual, afigura-se dever da seguradora de saúde suportar o pagamento dos gastos decorrentes da internação do segurado, e revela-se abusiva a cláusula contratual que a limita no tempo. TJRJ – 5ª Câm. – ACi 2007.001.57424 – Rel. Des. Milton Fernandes de Souza – j. 23.10.2.007 – v.u.
E, sobre tal preponderância do CDC (Lei nº 8.078/90), sobre a normatização do CONSU, o referido acórdão estabeleceu, de forma expressa, que:
Cabe destacar que é irrelevante ao deslinde da questão a Resolução 11 do CONSU autorizar o regime de co-participação, já que o Conselho de Saúde Suplementar não possui poder legiferante e suas resoluções representam meros atos administrativos.
No caso apontado, inclusive, a orientação da resolução do CONSU pareceria estar desafiando a própria orientação consolidada pela Súmula nº 302 do Superior Tribunal de Justiça (em consolidação de entendimento que já se manifestava em outros julgados do mesmo órgão – vg, REsp 361.415 e 326.147).
Ainda, arrematando a questão do regime jurídico de direito privado, no interesse dos consumidores deste tipo de contratação, não se pode deixar de apontar o advento da Lei nº 10.223/01, que dispõe sobre a obrigatoriedade de cirurgia plástica reparadora de mama por planos e seguros privados de assistência à saúde nos casos de mutilação decorrente de tratamento de câncer, o que impede as prestadoras de serviço de recusar tal cobertura.
Vale ainda lembrar que a regulamentação administrativa da relação de consumo não torna necessária a prévia normatização da ANS para o exercício de direitos consumeristas previstos em lei, eis que tais direitos se fundam em normas auto-aplicáveis como já previsto por precedente do Superior Tribunal de Justiça que se pede vênia para destacar:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. EMPREGADO DEMITIDO. PRETENSÃO À PERMANÊNCIA EM PLANO DE SAÚDE OFERECIDO PELA EMPRESA. Direito previsto no art. 30 da Lei nº 9.656/98. Exercício condicionado à regulamentação pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por força do inciso XI, do 4º, da Lei nº 9.961/2000. Desnecessidade. Norma auto-aplicável. Interpretação das leis ordinárias para dar máxima eficácia ao direito fundamental à saúde, assegurado no art. 196 da CF. O art. 30 da Lei nº 9.656/98 confere ao consumidor o direito de contribuir para plano ou seguro privado coletivo de assistência à saúde, decorrente de vínculo empregatício, no caso de rescisão ou exoneração do contrato de trabalho sem justa causa, assegurado-lhe o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma também o pagamento da parcela anteriormente de responsabilidade patronal. O art. 30 da Lei nº 9.656/98 é norma auto-aplicável, razão pela qual não tem sua eficácia condicionada à ulterior edição de qualquer instrumento normativo para produzir todos os seus efeitos, não havendo qualquer óbice à sua imediata e plena aplicabilidade. O inciso XI, do 4º, da Lei nº 9.961/2000, não tem o propósito de regulamentar o direito conferido pelo art. 30 da Lei nº 9.656/98, mas ampliá-lo, determinando que a Agência Nacional de Saúde Suplementar adote medidas "para garantia dos direitos assegurados" nesse dispositivo. Recurso especial não conhecido. (Recurso Especial nº 820379/DF (2006/0033447-4), 3ª Turma do STJ, Rel. Nancy Andrighi. j. 28.06.2007, unânime, DJ 06.08.2007).
Júlio César Ballerini Silva é magistrado, mestre em Direito Processual Civil (PUCCAMP) e professor de pós-graduação da (UNISAL e UNIFEOB).
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SILVA, Júlio César Ballerini. Direito à Saúde. Leme: Habberman, Brasil, 2009.
[1] SILVA, Júlio César Ballerini. Direito à Saúde – Aspectos Práticos e Doutrinários, Leme: Habberman, 2.009.
[2] NUNES, Luiz Antônio Rizatto. Comentários à Lei de Plano Privado de Assistência à Saúde (Lei nº 9.656, de 3-6-1998). São Paulo: Saraiva, Brasil, 2000.
[3] SCAFF, Fernando Campo. Direito à Saúde no Âmbito Privado. São Paulo: Saraiva, Brasil, 2010.
[4] Op. cit.
[5] BOTTESINI, Maury Ângelo. MACHADO, Mauro Conti. Lei dos Planos e Seguros de Saúde. São Paulo, Brasil, 2005.
[6] DAKOLIAS, Maria. The Judicial Sector in Latin América and the Caribbean – World Bank Technical Paper number 319.Washington: Library of Congress Cataloging, USA, 1996.
[7] GREGORI, Maria Stella. Planos de Saúde, a ótica da proteção do consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
[8] Segundo Cibele Pinheiro Maçal Cruz e Tucci, “a boa-fé objetiva constitui um princípio geral, aplicável ao direito das obrigações, através do qual se produz nova delimitação do conteúdo objetivo do negócio jurídico, especialmente o contrato, mediante inserção de deveres e obrigações acessórias, ou produzindo a restrição de direitos subjetivos, ou ainda através da aplicação de método hermenêutico integrativo, para interpretação da declaração de vontade, sempre com vistas a ajustar a ralação jurídica à função econômico-social determinável no caso concreto.”
[9] Maria Helena Diniz, discorre no sentido de que segundo o princípio da boa-fé, “na interpretação do contrato, é preciso ater-se mais à intenção do que ao sentido literal da linguagem, e, em prol do interesse social de segurança das relações jurídicas, as partes deverão agir com lealdade e confiança recíprocas, auxiliando-se mutuamente na formação e na execução do contato.”
[10] O artigo 422 do CC, estabelece, como já destacado, que: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução , os princípios de probidade e boa-fé.”
[11] Silvio de Salvo Venosa explana que: “tanto nas tratativas como na execução, bem como na fase posterior de rescaldo do contrato já cumprido (responsabilidade pós-obrigacional), a boa-fé objetiva é fator basilar de interpretação. Dessa forma, avalia-se sob a boa-fé objetiva tanto a responsabilidade pré-contratual, como a responsabilidade contratual e a pós-contratual. Em todas essas situações sobreleva-se a atividade do juiz na aplicação do direito ao caso concreto. Caberá à jurisprudência definir o alcance da norma dita aberta do novo diploma civil, como aliás, já vinha fazendo como regra, ainda que não seja mencionado expressamente o princípio da boa-fé nos julgados. É no campo da responsabilidade pré-contratual que avulta a importância do princípio da boa-fé objetiva, especialmente na hipótese de não justificada conclusão dos contratos.”
[12] Silvio de Salvo Venosa expõe que “desse modo, sob o prisma do novo código, há três funções nítidas no conceito de boa-fé objetiva: função interpretativa (artigo 112); função de controle dos limites do exercício de um direito (artigo 186) e função de integração do negócio jurídico (artigo 421).”