211 - Crime e corrupção

 
REGIS DE OLIVEIRA - Desembargador
 

As palavras estão intimamente ligadas. O crime é a porta aberta para a corrupção, sendo esta um dos crimes. A ligação fica mais próxima ao tratar-se do agente público que o comete. 

 

O principal é que se tenha em mente que o crime não é só uma disfunção social. É produto e resultado da má execução de políticas públicas. Estas são as inúmeras formas de o Estado interagir com a sociedade, levando a todas as comunidades, indistintamente, bem-estar, lazer, cultura, saúde e educação. Ao lado de outros benefícios sociais, o Estado é o grande responsável pela situação caótica em que se encontra o País e suas maiores cidades.

 

Irresponsabilidade, perda do conteúdo familiar, insensibilidade do governante, ausência de paradigmas, falta de religiosidade e, o último e o mais importante, a frustração do amor. É o filho que não sente o amor dos pais, abandonados por estes e vivendo vida marginal. É a escola que não substitui as atenções dos pais e se encontra em seus piores momentos de deterioração.

   

Não há, como se vê, uma causa. É a ausência de um complexo de ações, que recebem o nome de políticas públicas. A sentida ausência do Estado e o desamparo familiar conduzem o jovem a perder os valores sociais. Outrora, os paradigmas eram pessoas do mais alto coturno, cheias de responsabilidade pessoal e pública. Hoje, as referências são o PCC, a corrupção, os políticos mal intencionados que assaltam os cofres públicos, traições sem fim, destempero verbal, padres pedófilos, autoridades envolvidas em todo tipo de crimes, etc. Tudo leva à perda do exemplo. As palavras dos pais responsáveis e dos professores dedicados caem ao vento...

 

A violência agiganta-se e a perseguição a marginalizados chega às raias do absurdo. Prostitutas são agredidas, mulheres violentadas, gays e homossexuais são discriminados. É a sociedade em franco descontrole.

 

Os desvios de comportamentos passam a ser constantes. Quase obrigatórios, a ponto de se entrever a famosa fase de Rui Barbosa, de que se chega a ter vergonha de ser honesto. A retidão de caráter é vista como defeito. O comportamento sério constitui-se em obstrução a que todos se aproximem da libertinagem. O que vale é o mundo dos espertos.

 

O jovem que se vê desamparado pelo Estado, aproxima-se do crime que lhe fornece melhores meios de vida, em que, pelo menos, pode levar à sua mãe um pouco de conforto. A sedução pela vida mais fácil, ainda que perigosa, é o que arrebata o jovem sem expectativas.

 

Daí a perda de valores que devem imperar. Pátria e família passam a ser artigos de luxo. Justiça nem sonhar. É mais fácil e rápida a solução do tresoitão. Para que perder tempo com futilidade, se ele pode resolver tudo de forma rápida e eficiente?

 

Até quanto tempo se pode aguardar soluções do Estado? Ainda mais deste Estado corrupto e que protege os mais iguais, à imagem de George Orwell (“A Revolução dos Bichos”).

 

A vida certa não compensa. A senda criminosa oferece mais conforto, melhor situação perante os iguais, uma vez que será respeitado. Se não tem o respeito do Estado como cidadão, irá ter o dos outros, seus asseclas.

 

A conseqüência da perda de valores equipara-se ao bandido oficial que desvia recursos públicos. Quem é mais culpado? Ambos agridem a sociedade. Um, pela perda do paradigma; outro, por desvio de comportamento.  Um é pobre e foi violentado pela sociedade; o outro é rico e desconhece limites.

           

Ambos são criminosos. O periférico agride a sociedade em que vive, porque não é por ela respeitado. O central, impede que o outro possa ter recursos para dignificar sua vida. Um tira a chance do outro.

           

Ambos são culpados. Um leva o perdão da cruz. Outro, deve ser crucificado.

 



Regis de Oliveira é deputado federal (PSC/SP),desembargador e professor-titular da USP.





O Tribunal de Justiça de São Paulo utiliza cookies, armazenados apenas em caráter temporário, a fim de obter estatísticas para aprimorar a experiência do usuário. A navegação no portal implica concordância com esse procedimento, em linha com a Política de Privacidade e Proteção de Dados Pessoais do TJSP