180 - A defesa perante o Tribunal do Júri

 
JÚLIO CÉSAR BALLERINI SILVA – Juiz de Direito
 

 



A defesa perante o Tribunal do Júri pode ser analisada sob vários aspectos, dependendo do momento em que se enfoque a fase processual, isso porque o fenômeno jurídico é um fenômeno complexo a ser analisado sob várias perspectivas possíveis.



Tal se dá, por exemplo, na medida em que a defesa poderia ser considerada, de início, a partir da própria instauração do inquérito policial para a apuração do fato, o que deve ser feito em obediência ao devido processo legal e à ampla defesa, constitucionalmente assegurados, de modo que, desde logo, eventuais arbitrariedades poderão ser coibidas mediante comunicações ao Juiz Corregedor de Polícia Judiciária, ou, mesmo em âmbito jurisdicional (não correicional), através de medidas como o hábeas corpus (aceito em determinadas condições para o trancamento de ações penais) e, para a corrente que o entende como possível, do mandado de segurança em matéria criminal (notadamente, neste último caso, para providências acessórias como pedidos de liberação de veículos, armas regulares ou demais objetos irregularmente apreendidos).

 

Tudo isso, obviamente, com acesso a procedimentos referentes à possibilidade de pedidos de concessão de liberdade provisória, de relaxamento de eventual prisão em flagrante, temporária ou preventiva (com igual possibilidade de interposição de habeas corpus em casos de denegação ilegal), instauração do incidente de insanidade mental (o que, pode levar à absolvição com aplicação de medida de segurança, preferencialmente um tratamento ambulatorial em contraposição a uma odiosa internação), pedidos de liberação por excesso de prazo não imputável à defesa, etc.

 

Mas, considerando-se que tenha sido encerrado o inquérito e oferecida a denúncia, sendo a mesma aceita (sob pena de interposição de recurso em sentido estrito – artigo 581 e seus consectários do CPP), a defesa poderá se articular, ainda numa fase pré-pronúncia, em sede de defesa prévia, no tríduo posterior ao interrogatório, no acompanhamento e perguntas a testemunhas e diligências e na própria fase do artigo 406 do diploma processual penal em exame.

 

Se, de todo modo, não se conseguir uma absolvição sumária, uma impronúncia ou uma desclassificação (sempre sendo possível a interposição dos recursos cabíveis), na fase posterior à pronúncia, a defesa começará a ser articulada pela contrariedade ao libelo crime acusatório.

 

Muito embora não se cuide de peça obrigatória (tal como ocorre com a defesa prévia), deve o defensor explorar a oportunidade, tal como adverte Tourinho Filho, para quem:

 

Recebido o libelo, cumpre-se o disposto no artigo 421 e seu parágrafo único, propiciando-se à defesa o oferecimento da contrariedade a ele. Esta não é uma peça obrigatória.Tal como a defesa prévia, é facultativa. Contudo, mesmo que a defesa não queira contrariar o libelo, não deve perder aquele prazo, pois dentro dele é que deve arrolar suas testemunhas, que devam depor em plenário, requerer diligências e juntada de documentos[1].

 

Resolvidos os incidentes referentes à contrariedade ao libelo, restará, ainda à defesa, se necessário for, requerer o pedido de desaforamento, nos termos do artigo 424 e seus consectários do Código de Processo Penal (sobretudo para a garantia da imparcialidade do Conselho de Sentença ou para a garantia da segurança do pronunciado).

 

Do mesmo modo, designado o Plenário, poderá a defesa, oferecer sua recusa aos jurados, se assim entender, o que igualmente ajudará a manter a imparcialidade do Conselho ( parece óbvio não ser do interesse da defesa, num caso de marido que mate a mulher, que pertença ao Conselho de Sentença, um grande número de juradas mulheres, e, assim por diante ). Tais recusas, aliás, tem importância redobrada nos crimes imputados a mais de um agente, posto que, nesta hora, dependendo das recusas de cada defensor, poderá, inclusive, haver desmembramento do feito.

 

Importa, ainda, destacar que a defesa, na fase do Plenário, antes das saudações e debates, poderá, em face dos depoimentos das testemunhas, exercer importante papel efetuando perguntas diretas às mesmas, sem o sistema de reperguntas, prevalescente na fase anterior à pronúncia (atuando, ainda, de forma a coibir ou fazer em ata de sessão, eventuais abusos perpetrados pela acusação, na mesma fase).

 

De igual medida, durante a fase dos debates, em havendo abusos por parte do órgão acusador, será de importância a vigilância da defesa constando em atas tais dados para eventual anulação do Plenário, se necessário for, e, ainda, nos seus debates, a defesa deverá explorar o seu tempo de exposição (duas horas), de forma didática, pelos meios éticos necessários, de modo a influenciar o entendimento do Conselho, visando auxilia-los na resposta aos quesitos que lhe serão apresentados pelo Juiz Presidente do Conselho, na sala secreta.

 

Da mesma forma, se a acusação se valer da réplica, poderá o defensor se utilizar da tréplica, para rebater alegações que lhe pareçam despropositadas e que tenham sido entabuladas pelo “ex adverso”.

 

Por fim, deverá fazer valer suas prerrogativas funcionais para fiscalizar se os quesitos apresentados no questionário judicial atendem às teses trazidas a debate, bem como se não foram articulados de forma dúbia ou tendenciosa, que desfavoreça a defesa do submetido a Plenário, fiscalizando para que a incomunicabilidade dos jurados permaneça intangível e pela regularidade dos trabalhos de votação na sala secreta.

 

Caso não obtida a pretendida absolvição (ou mesmo a desclassificação, ou, eventualmente o reconhecimento da inimputabilidade, etc), sempre restará a defesa, no seu honrado mister, se valer dos recursos postos à sua disposição, como, por exemplo, o protesto por novo júri e a respectiva carta testemunhável, se for o caso, como também, recursos especial e extraordinário ou, ainda, ações autônomas como o hábeas corpus, e, na pior das hipóteses, eventualmente, uma revisão criminal (não se esquecendo, nunca, que o Código de Processo Civil poderá ser utilizado subsidiariamente no que for necessário, o que notadamente é muito utilizado para providências de caráter cautelar, referentes à prova, v.g., arrestos, seqüestros, produção antecipada de provas, justificação, etc).

 

Júlio César Ballerini Silva é magistrado e professor de graduação e pós-graduação do Creupi; Mestre em processo civil pela puc-campinas e especialista em Direito Privado pela USP.

 

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:

 

TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de Processo Penal. 13ª Ed. Bauru: Jalovi. 1989.



[1] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Prática de Processo Penal. 13ª Ed. Bauru: Jalovi. 1989. p. 151.



O Tribunal de Justiça de São Paulo utiliza cookies, armazenados apenas em caráter temporário, a fim de obter estatísticas para aprimorar a experiência do usuário. A navegação no portal implica concordância com esse procedimento, em linha com a Política de Privacidade e Proteção de Dados Pessoais do TJSP