144 - Inadmissibilidade da quebra de sigilo fiscal do devedor (a pedido do credor), em ações de execução (fiscais e de títulos – judiciais ou extrajudiciais), mediante simples despacho deferitório da expedição de ofício à receita federal com vistas à localização de bens passíveis de penhora
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WILSON TÚLLIO ALVES DE ANDRADE – Advogado |
SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Da admissibilidade de interposição de agravo de instrumento em face de decisões que embora aparentem natureza externa e formal de despacho revelam nítido cunho decisório impositivo de gravame à parte – 3. Da imperiosa concessão de efeito suspensivo ao agravo enquanto medida liminar de natureza acautelatória de danos à intimidade/vida privada e sigilo de dados do figurante do pólo passivo de execuções judiciais sob pena de apresentar-se inócuo o eventual provimento do recurso diante da perda de seu próprio objeto – 4. Da nulidade do despacho ordinatório de primeiro grau (J. Defiro) ostentador de natureza de decisão interlocutória, posto que impositivo de gravame ao devedor em processo de execução judicial (requisição de ofício à receita federal visando à quebra de seu sigilo fiscal) face à ausência de fundamentação nos termos do exigido pelos arts. 93, IX, da carta magna e 165, segunda parte, do CPC – 5. Do direito fundamental à dignidade da pessoa humana e à vida privada/intimidade e sigilo de dados, enquanto garantias elevadas à cânone constitucional fundamental, nos termos do disposto pelo inciso III, do art. 1º e incisos X e XII, do art. 5º, da Carta Política - restrição de sobreditas garantias constitucionais em processo de execução, somente em hipóteses excepcionais, acaso presente o relevante interesse público e desde que comprovado pelo credor o exaurimento das vias administrativas a seu alcance na busca de bens penhoráveis do devedor, vedada a quebra do sigilo fiscal apenas para localização de referidos bens em processo de execução, uma vez que não cabe ao judiciário substituir a parte autora nas diligências que lhe são exclusivamente atribuíveis para demandar em juízo – 6. Conclusão.
1. Introdução
Tem sido muito comum a expedição, por magistrados de primeiro grau - a pedido do credor em execuções (fiscais ou de títulos – judiciais ou extrajudiciais) -, de ofícios à Receita Federal, colimando a localização de bens (móveis ou imóveis) passíveis de ato de afetação processualmente nominado de penhora;
Com efeito, muito embora represente atualmente a penhora on-line, instrumento processual moderno de alcance prático da finalidade primeira de grande parte das execuções supra mencionadas, notadamente em razão do objetivar nada menos que a localização e bloqueio simultâneo de ativos financeiros para garantia do juízo, mediante a utilização do sistema Bacen-Jud, certo é que, em numerosos casos, nos quais a resposta à consulta de sobredito sistema se apresenta negativa, outra alternativa não se vislumbra ao credor, senão a tentativa de localização de patrimônio pertencente ao devedor, como última medida voltada à possível satisfação do crédito exeqüendo.
Nada obstante, adotam comumente os credores em tais hipóteses, ao invés de esgotarem todos meios a seu alcance no sentido de localizar bens (móveis ou imóveis) de titularidade do devedor passíveis de penhora, a estratégia de elaborar simples petição ao juízo da execução, pleiteando a expedição de ofício à receita federal requisitando a última declaração de bens do devedor, de molde a facilitar-lhes a escolha e indicação de bens perfilhados em aludido documento, bastantes à solver o débito exeqüendo.
Dessarte, em um número significativo de execuções, o pleito sub examine formulado pelo credor é atendido de plano pelo juízo singular, de forma célere, mediante a prolação DE SIMPLES DESPACHO NO BOJO DA PRÓPRIA PETIÇÃO, TRADUZIDO EM “J. DEFIRO”, devidamente subscrito pela autoridade judiciária em comento, decisão esta que, nada obstante possa à primeira vista aparentar a natureza de "simples despacho", revela na verdade ‘cunho decisório’, visto que impositiva de 'sério gravame ao devedor' (QUEBRA DE SEU SIGILO FISCAL), transmudando-se, por isso, em "DECISÃO INTERLOCUTÓRIA", a desafiar recurso de agravo de instrumento, posto que, somente decisões de tal natureza possuem o condão de causar prejuízo à parte ou interessado, já que o despacho, por ser irrecorrível, não tem aptidão de gerar nenhum gravame.
Certo é que, tal decisão passível de recurso de agravo de instrumento, identificada em princípio como mero despacho, assume, ao final e ao cabo, ‘feição nitidamente interlocutória', na medida em que 'impõe sério gravame ao devedor' , ao decidir pela 'quebra de seu sigilo fiscal', uma vez que totalmente desprovida de fundamentação, ainda que de forma concisa, o que, por certo, se afigura de todo inadmissível, mormente em se considerando as restrições causadas por tal decisum às garantias constitucionais fundamentais do devedor, ínsitas aos incisos X e XII, do art. 5º, da Magna Carta (vida privada e sigilo de dados), garantias fundamentais estas, cuja restrição encontra limite de salvaguarda, em um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, consubstanciado na “dignidade da pessoa humana”, exato ao disposto no inciso III, do art. 1º, da Constituição Federal[1].
2. Da admissibilidade de interposição de agravo de instrumento em face de decisões que, embora aparentem natureza externa e formal de despacho, revelam cunho decisório, impondo gravame à parte
De fato, a decisão ora em exame, deferitória de pleito incidental do credor, vindicando a expedição de ofício à receita federal, colimando a localização de bens de titularidade do devedor e exteriorizada em simples despacho subscrito pela autoridade judiciária (J. DEFIRO), embora possua externa e formalmente a natureza de "despacho", revela na verdade, "conteúdo nitidamente decisório", na medida em que causa sério gravame ao devedor (RT 508/199), traduzido na 'quebra de seu sigilo fiscal', circunstância esta que, segundo doutrina abalizada infra transcrita, termina por transmudar sobredito despacho, em "decisão interlocutória", passível de impugnação pela via do RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO, uma vez que, somente decisões interlocutórias possuem o condão de, resolvendo questão incidente no curso do processo, provocar algum gravame à parte ou interessado, exato à hipótese objeto do presente estudo, em que vem o devedor em processo de execução, a experimentar a 'QUEBRA DE SEU SIGILO FISCAL', por meio de decisão desprovida de qualquer fundamentação, ainda que de forma concisa, em franca violação às garantias constitucionais da intimidade e da vida privada e do sigilo de dados, bem como, à dignidade da pessoa humana, preconizadas pela moldura do cânon, ínsito aos incisos X e XII, do art. 5º e inciso III, do art. 1º, da Constituição da República, as quais, embora não erigidas à garantia absoluta, reclamam decisão judicial provida de fundamentação, nos termos do que impõe o inciso IX, do art. 93, da Carta Magna.
Nesse sentido, confira-se nota 14, ao art. 162, do Códex Processual Adjetivo (casuística), in NELSON NERY JÚNIOR E ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, São Paulo, RT, 2004, 8ª ed., p. 632, "verbis":
"Despacho. Conteúdo decisório. "A distinção entre o despacho simplesmente ordinatório e o de conteúdo decisório deve ser buscada no gravame que o provimento judicial impõe à parte interessada" (RT 508/199). Havendo gravame, o ato se caracteriza como decisão interlocutória, impugnável por agravo, pois despacho, por não ter aptidão para causar gravame, é irrecorrível (CPC 504). O ato pode ter externa e formalmente característica de despacho, mas, porque causou gravame, decidiu questão incidente, transmudando-se em decisão interlocutória, pois somente estas podem causar prejuízo à parte ou interessado".
Confira-se ainda, sobre o tema, a abalizada assertiva de sobredito mestre, "in verbis":
"Todo despacho é de mero expediente. Se contiver nele embutido um tema decisório capaz de causar gravame ou prejuízo à parte ou interessado, não será despacho mas sim decisão interlocutória. Isto ressalta cristalino do sistema do código. Afigura-se-nos preferível, por ser mais fiel à disciplina do código, conceituar-se como decisão interlocutória o pronunciamento do juiz que, de alguma maneira, cause gravame à parte, porque estaria o magistrado apreciando questão incidente, sendo, portanto, recorrível (CPC 522)" (Teoria Geral dos Recursos, São Paulo, RT, 2004, 6ª ed., pp. 236-237).
Na mesma trilha, classificando como 'interlocutórias' e, portanto, recorríveis por via de agravo, as decisões que, embora aparentem natureza de mero despacho, 'imponham gravame à parte', pontifica o emérito Prof. JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA, "ad litteram":
"O critério de distinção é o da natureza do pronunciamento, não o da denominação legal: ainda quando o Código chame "despacho" a algum ato decisório, cabível é o agravo" (O Novo Processo Civil Brasileiro, Forense, Rio de Janeiro, 22 ed., p. 144).
Nessa linha de interpretação, já decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça, a sentir-se do v. aresto infra alinhavado, "verbis":
"Enquanto os despachos são pronunciamentos meramente ordinatórios, que visam impulsionar o andamento do processo, sem solucionar controvérsia, a decisão interlocutória, por sua vez, ao contrário dos despachos, possui conteúdo decisório e causa prejuízo às partes" (STJ – 4ª Turma – REsp nº 195.848-MG – j. 20.11.01 – v.u. – DJU 18.02.02, in, THEOTONIO NEGRÃO, Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, São Paulo, Saraiva, 2005, 37ª ed., p. 266).
3. Da imperiosa concessão de efeito suspensivo ao agravo, enquanto medida liminar de natureza acautelatória de danos à intimidade/vida privada e sigilo de dados do figurante do pólo passivo de execuções, sob pena de apresentar-se inócuo o eventual provimento do recurso, diante da perda de seu próprio objeto
Dessarte, ao devedor em processos de execução, apresenta-se como imperiosa em tais hipóteses, a necessidade de antecipar-se os efeitos da tutela de mérito vindicada no bojo do recurso de agravo interposto, com a conseqüente suspensão dos efeitos da decisão agravada - sob pena de tornar-se inútil o eventual provimento do recurso face à perda de seu objeto revelando-se preenchido, quantum satis, o novo pressuposto de aludido recurso ínsito à nova exegese do caput, do art. 522, da Lei Federal nº 5.869/73 (alterada pela Lei nº 11.187, de 19.10.2005) -, diante do contorno por ela assumido, de perigo de dano de difícil reparação (QUEBRA DE SIGILO FISCAL DO DEVEDOR DESPROVIDO DE FUNDAMENTAÇÃO), nos precisos termos do preceituado pelo inciso XXXV, da Carta Magna, enquanto abrigo do princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, bem como, pelos arts. 558, caput e 527, III, do Estatuto Processual, com a nova redação conferida a este último dispositivo, pela Lei Federal nº 10.352/01.
No ponto, afiguram-se presentes em hipóteses que tais, os requisitos do 'periculum in mora', bem como, o 'fumus boni iuris', a justificar a tutela de urgência vindicada via recurso de agravo de instrumento, haja vista exsurgir como iminente, em tais casos, a possibilidade de restrição à pessoa do devedor, das garantias constitucionais da intimidade/vida privada e do sigilo de dados, inspiradas no fundamento da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF) e ínsitas aos incisos X e XII, do art. 5º, da Constituição da República, na medida em que terá ele sua vida privada e sigilo de dados expostos à parte contrária (credor), como derivação de despacho prolatado pela autoridade judiciária, impositivo de sério gravame (quebra de sigilo fiscal como derivação de ofício deferido à receita federal), a transmudar-se, portanto, em DECISÃO DE NATUREZA INTERLOCUTÓRIA, a qual sequer busca expor nesses casos - ainda que de forma concisa - os fundamentos norteadores do magistrado a quo, justificadores da restrição de sobreditas garantias constitucionais, em franca violação ao ao inciso IX, do art. 93, da Carta Política e, bem assim, ao disposto pelo art. 165, segunda parte, do Código de Processo Civil.
Demais disso, tem-se que, referida decisão deferitória do pleito de requisição de ofício à receita federal (formulado pelo credor) em tais hipóteses, além de revelar-se destituída da necessária fundamentação, revela-se, outrossim, prematura e desproporcional, na medida em que ressente-se de precedente determinação ao credor, da adoção de outras medidas de natureza extrajudicial ao seu alcance, com vistas à localização de bens penhoráveis, em respeito ao princípio da menor onerosidade, ínsito ao art. 620, do Códex.
De fato, acaso não deferido o almejado efeito suspensivo liminar, de regra vindicado no bojo de recursos de agravo de instrumento aviados das decisões de cunho incidental retro mencionadas, que atendem na forma de simples despacho o pleito de expedição de ofício à receita federal, formulado pelo credor em ações de execução, o sigilo fiscal do devedor será quebrado e a segurança constitucional perseguida através do recurso em tela, restará visceralmente prejudicada. Mais ainda, perderá aludido recurso, seu próprio objeto em caso de eventual provimento, qual seja, o de preservar as garantias constitucionais do devedor à sua intimidade/vida privada e a seus dados fiscais (art. 5º, X e XII, da CF), garantias estas que, como é cediço, somente podem ceder à 'decisões judiciais fundamentadas', que justifiquem tal restrição, no precípuo interesse maior da Justiça, diversamente da hipótese objeto do presente estudo, onde a determinação da quebra do sigilo fiscal do devedor, volta-se à localização de bens de sua propriedade, na forma de simples despacho (J. DEFIRO), o qual, entrementes, revela 'nítido cunho decísório por causar gravame ao ocupante do pólo passivo de execuções judiciais' (QUEBRA DE SEU SIGILO FISCAL), transmudando-se, portanto, em 'decisão interlocutória', a desafiar 'recurso de agravo de instrumento', máxime, em se considerando que tal decisão apresenta-se desprovida de qualquer fundamentação, ainda que de maneira concisa, violando a um só tempo, o inciso IX, do art. 93, da Carta Magna e, bem assim, o disposto pelos arts. 165, segunda parte e 125, I (princípio da isonomia), do Código de Processo Civil, caracterizando-se, in casu, a violação à garantia de tratamento paritário das partes, na medida em que é o credor literalmente substituído pelo Juízo da execução, em tarefa que somente a ele se reserva, qual seja, a de localizar bens penhoráveis em nome do devedor.
Por derradeiro, faz-se imperioso à análise do tema sub examine, sejam colacionadas à presente exposição, as brilhantes ilações sobre a questão processual ora trazida a lume, derivadas da abalizada doutrina do insigne Prof. HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, “verbis”:
“Dentro do due process of law outrossim, o princípio da legalidade se manifesta na sujeição do juiz e das partes às normas legais tanto de direito substancial como processual, de maneira que no Estado de Direito é uma garantia fundamental a de que as pendências deduzidas em juízo serão sempre compostas à luz do direito material positivo e segundo os ritos do direito processual vigente.
Todo o processo deve ser conduzido segundo o “princípio da legalidade”, ou seja, “o juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código” e de maneira a assegurar às partes igualdade de tratamento (CPC, art. 125). De tal sorte, não se informando o juiz pelas normas processuais, e desatento, assim, àquele princípio, os atos que praticar ou determinar se ressentem de defeitos, passíveis de anulação ou de nulidade. É bom lembrar que o princípio da legalidade, em toda extensão, se manifesta com redobrada importância no terreno da execução forçada, onde se torna imperioso preservar a forma e o conteúdo dos atos segundo estrita observância da lei, visto que, nesse tipo de atividade jurisdicional, está quase sempre em jogo o direito de propriedade do executado (O Processo de Execução e as Garantias Constitucionais da Tutela Jurisdicional, apud, O Processo de Execução, Estudos em Homenagem ao Prof. ALCIDES DE MENDONÇA LIMA, Porto Alegre, Sérgio Antonio Fabris Editor, 1995, p. 152).
4. Da nulidade do despacho ordinatório de primeiro grau (j. Defiro), ostentador de natureza interlocutória, posto que impositivo de gravame ao devedor em processo de execução judicial (requisição de ofício à receita federal visando á quebra de seu sigilo fiscal), face à ausência de fundamentação nos termos do exigido pelo art. 93, ix, da carta magna e 165, segunda parte, do CPC
No ponto, da análise do decisum ora objeto deste singelo estudo – com natureza formal de despacho, mas revelador de cunho decisório, posto que impositivo de flagrante gravame à parte -, que decide pela quebra do sigilo fiscal do devedor em processos de execução forçada (fiscais e de títulos judiciais ou extrajudiciais), mediante deferimento de expedição de ofício à receita federal, faz-se possível inferir, pela sua total ausência de fundamentação, ainda que de forma concisa (art. 165, segunda parte, do Códex), em flagrante vulneração ao cânon constitucional imanente ao art. 93, IX, da Constituição da República, provocando, destarte, a nulidade de referido decisum monocrático, na medida em que, provocando sério gravame ao devedor (e aí reside sua natureza interlocutória a desafiar o recurso de agravo de instrumento), restringe-lhe, de forma inadmissível, as garantias constitucionais fundamentais da intimidade/vida privada e de dados e do respeito à dignidade da pessoa humana, insertas nos incisos X e XII, do art. 5º e inciso III, do art. 1º, da Constituição da República.
Igualmente infringe o r. decisum monocrático em questão (despacho de cunho decisório causador de gravame ao devedor ao decidir questão incidente – envio de ofício á receita federal visando á localização de bens penhoráveis), o disposto no art. 131, do Códex, albergador do princípio do livre convencimento motivado, na medida em que, na forma como é exarado (J. DEFIRO), não exprime as razões de convencimento que conduziram seu r. subscritor monocrático a decidir pela quebra do sigilo fiscal ali estampada, ou nas judiciosas palavras do ilustre Prof. NELSON NERY JÚNIOR: “Cumpre ao magistrado dar as razões de seu convencimento. Decisão sem fundamentação é nula pleno iure (CF 93 IX). Não pode utilizar-se de formas genéricas que nada dizem. Não basta que o juiz, ao decidir, afirme que defere ou indefere o pedido por falta de amparo legal; é preciso que diga qual o dispositivo de lei que veda a pretensão da parte ou interessado e porque é aplicável no caso concreto” (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, São Paulo, RT, 2003, 7ª ed., nota nº 2 ao art. 131, p. 532).
Na mesma trilha, exsurge como patente, in casu, a vulneração, pela decisão judicial ora em estudo (impositiva de gravame ao devedor, a cacterizar sua natureza interlocutória), do disposto no art. 165, da Lei Federal nº 5.869/73, a impor como de rigor, seu decreto de nulidade, na medida em que, não revela os fundamentos aos quais se atém o julgador monocrático na análise da questão posta sub examine (quebra do sigilo fiscal do devedor), exsurgindo, ipso facto, como dever afeto às instâncias de superposição do Poder Judiciário, a prolação de referido decreto de nulidade - que pode suceder-se até mesmo de ofício -, por malferimento aos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais retro mencionados.
Dessume-se do até aqui exposto, que o decisum de natureza interlocutória ora em estudo, prolatado como derivação de pleito do credor e determinante da quebra do sigilo fiscal do devedor em processos de execução, na forma de simples despacho - J. DEFIRO, não se compadece com as garantias constitucionais ínsitas aos consumidores dos serviços do Poder Judiciário, uma vez que não sinaliza seu norte amparador, de molde a permitir ao jurisdicionado a perfeita compreensão das razões de decidir, nas quais se ateve o julgador monocrático.
Sobre o tema em relevo (nulidade da decisão interlocutória que defere pedido do credor direcionado á a quebra do sigilo fiscal do devedor em processos de execução por ausência de fundamentação), veementiza com propriedade, o emérito Prof. NELSON NERY JÚNIOR, “ad litteram”:
“Fundamentar significa o magistrado dar as razões, de fato e de direito, que o convenceram a decidir a questão daquela maneira. A fundamentação tem implicação substancial e não meramente formal, donde é lícito concluir que o juiz deve analisar as questões postas a seu julgamento, exteriorizando a base fundamental de sua decisão.
Caso não sejam obedecidas as normas do art. 93, nºs IX e X da Constituição Federal, a falta de motivação das decisões jurisdicionais e administrativas do Poder Judiciário acarreta a pena de nulidade a essas decisões, cominação que vem expressamente designada no texto constitucional.
“O juiz não poderá deixar de apreciar o pedido. Sua conclusão poderá até ser pelo indeferimento, mas deverá dizer quais as razões pelas quais assim decidiu” (PRINCÍPIOS DO Processo Civil na Constituição Federal, São Paulo, RT, 1996, 3ª ed., p. 170).
Anota ainda sobre a quaestio juris em comento, o insigne Prof. MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, “verbis”:
“A exigência de fundamentação é um obstáculo ao arbítrio, que repugna ao Estado de Direito, mesmo que exercido por juízes, referindo-se ainda, com remissão à ADA PELLEGRINI GRINOVER, à lição de GIUSEPPE BETIOL, de que se trata de mais uma das garantias predispostas pelo Estado de Direito como tutela das liberdades individuais” (Comentários à Constituição Brasileira, São Paulo, Saraiva, 1992, 1ª ed., vol. II, p. 199).
De todo o exposto retro, infere-se, de forma inconteste, afigurar-se como imperativo a busca pelo decreto de nulidade, via instância superior, do r. decisum objeto do presente estudo, determinante de envio de ofício á receita federal, visando à quebra do sigilo fiscal de devedores em processos de execução – e portanto impositivo de sério gravame, de molde a revelar sua natureza interlocutória -, na medida em que, não se desincumbe o Juízo a quo, em tais hipóteses - sequer de forma concisa -, do dever imanente a todo magistrado, ínsito ao postulado garantista inscrito no art. 93, IX, da Lex Fundamentalis e, bem assim, no art. 165, da Lei Federal nº 5.869/73, consubstanciado no inexorável dever de fundamentar as decisões judiciais, mormente, em se considerando a magnitude do ditame constitucional referido, cujo desiderato maior, revela a apreensão e consciência dos elaboradores da Carta Magna vigente, com a subsistência integral de tal garantia constitucional.
Nesta trilha, colhe-se a abalizada preleção do ilustre Prof. português ANTONIO CASTANHEIRA NEVES, “verbis”:
“A fundamentação jurídica deve ser “razoável”, “aceitável”, “defensável”. Não fosse isto, as decisões seriam únicas, e seria inadmissível terem-se outras também válidas” (Questão de Facto – Questão de Direito, Coimbra, Almedina, 1967, p. 415).
5. Direito fundamental à dignidade da pessoa humana e à vida privada/intimidade e sigilo de dados, enquanto garantias elevadas à cânone constitucional fundamental, nos termos do disposto pelo inciso iii, do art. 1º e incisos x e xii, do art. 5º, da carta política - restrição de sobreditas garantias constitucionais em processo de execução, somente em hipóteses excepcionais, acaso presente o relevante interesse público e desde que comprovado pelo credor o exaurimento das vias administrativas a seu alcance na busca de bens penhoráveis do devedor, vedada a quebra do sigilo fiscal apenas para localização de referidos bens em processo de execução, uma vez que não cabe ao judiciário substituir a parte autora nas diligências que lhe são exclusivamente atribuíveis para demandar em juízo.
Com efeito, sendo o processo, hodiernamente compreendido, como instrumento a serviço da ordem constitucional, com vistas a cumprir integralmente, toda a sua função sócio-político-jurídica, mediante o alcance de seus desideratos institucionais e, bem assim, como instrumento eficaz para o acesso à ordem jurídica justa, enquanto escopo-síntese da jurisdição, tem-se como totalmente divorciada da ordem jurídica institucional, a decisão comumente proferida em processos de execução em primeiro grau e que ora se busca examinar neste breve estudo (REQUISIÇÃO DE OFÍCIO À RECEITA FEDERAL MEDIANTE SIMPLES DESPACHO - J. DEFIRO), uma vez que reveladora de cunho decisório e impositiva de sério gravame a cidadãos ocupantes do pólo passivo de aludidos feitos jurisdicionais (QUEBRA DE SIGILO FISCAL), terminando por atrair para si, icto oculi, a natureza de 'decisão interlocutória', a desafiar o recurso de agravo de instrumento, posto que preenchido, quantum satis, o novo pressuposto de admissibilidade imanente a aludido recurso (art. 522, caput, CPC), traduzido no risco de dano irreparável ou de difícil reparação, aqui representado pela possibilidade de violação às garantias constitucionais de intimidade/vida privade e sigilo de dados, incritas no inciso III, do art. 1º e incisos X e XII, do art. 5º, da Carta Política.
Certo é que, antes de requerer o credor, a quebra do sigilo fiscal do devedor em processos de execução com vistas à localização de bens penhoráveis – aqui subtendida como frustrada a tentativa precedente de penhora on-line -, a provocar-lhe a restrição de garantias individuais definidas pelo Texto Constitucional (art. 5º, X e XII, da CF), cabe-lhe, nos termos de entendimento interativo já solidificado no âmbito do Colendo Superior Tribunal de Justiça, exaurir todas as medidas possíveis na esfera extrajudicial (buscas em cartórios de registro de imóveis, detran, jucesp e assemelhados), a fim de localizar bens de propriedade do devedor, passíveis de serem penhorados, não sendo de se admitir a formulação de simples pedido ao magistrado, de endereçamento de ofício à receita federal, uma vez que não cabe ao Poder Judiciário, substituir tarefa de competência exclusiva do credor, sem a prévia comprovação nos autos, do real esgotamento de sobreditas vias extrajudiciais colimando a localização de bens.
Necessário, nesta senda, reconhecer-se nas judiciosas palavras do emérito Prof. JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO, que: "o sigilo (fiscal e bancário), é cláusula pétrea, por constituir direito e garantia individual, em face do seu enquadramento nos princípios constitucionais que impõem respeito à privacidade e ao sigilo de dados (art. 5º, X e XII), impedindo a devassa da intimidade das pessoas e preservando a sua dignidade (art. 1º, III)" (Direitos Fundamentais do Contribuinte, vários autores, Coordenador: YVES GANDRA DA SILVA MARTINS, São Paulo, RT, 2000, p. 312).
No que tange à necessidade de respeito à dignidade da pessoa humana, enquanto princípio fundamental limitador da restrição às garantias fundamentais, in casu, daquelas inscritas nos incisos X e XII, do art. 5º, da CF (intimidade/vida privada e sigilo de dados), assevera com propriedade o emérito Prof. INGO WOLGGANG SARLET, "verbis":
"(...) a dignidade da pessoa humana (para além de sua dimensão jurídico-normativa) constitui o reduto intangível – pelo menos para a ordem jurídica que a consagra e busca proteger – de cada (e de todos) indivíduo e, nesta perspectiva, a última fronteira contra qualquer ingerência externa que se pretenda legítima. Em outras palavras, mesmo que não se possa desconsiderar a existência de violações concretas e reiteradas à dignidade pessoal, estas ofensas, em virtude da positivação da dignidade na condição de princípio jurídico-constitucional fundamental, não poderão encontrar qualquer tipo de respaldo na ordem jurídica que, pelo contrário, impõe ao Estado e particulares um dever de respeito, proteção e promoção da dignidade de todas as pessoas" (Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais, Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2001, pp. 137-138).
Por derradeiro, parafraseando a multicitada assertiva de RONALD DWORKIN, de que o governo que não toma a sério os direitos não leva a sério o Direito, pontifica igualmente o insigne Prof. INGO WOLGGANG SARLET que: "A ordem comunitária (poder público, instituições sociais e particulares) bem como, a ordem jurídica que não toma a sério a dignidade da pessoa (como qualidade inerente ao ser humano e, para além disso, como valor e princípio jurídico-constitucional fundamental) não trata com seriedade os direitos fundamentais e, acima de tudo, não leva a sério a própria humanidade que habita em cada uma e em todas as pessoas e que as faz merecedoras de respeito e consideração recíprocos" (ob. cit., p. 145).
Demais disso, a quebra de sigilo fiscal derivada de ordem judicial, reclama hipótese de grande relevância para a prestação jurisdicional, somente admitida em casos excepcionais, devidamente fundamentada e não apenas sob a justificativa de revelar a existência de bens penhoráveis de devedores em processo de execução (STJ-RT 725/165), uma vez que não cabe ao Poder Judiciário, substituir exclusiva tarefa do credor, consubstanciada em diligenciar na busca de bens penhoráveis do devedor sujeitos à constrição, pretensão esta, no mais, que vem sendo rechaçada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, em seu nobre mister de uniformizar a interpretação do direito federal, exato à leitura dos v. acórdãos infra alinhavados, "verbis":
"PROCESSUAL CIVIL, TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO FISCAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. INVASÃO DE PRIVACIDADE. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO BANCO CENTRAL. SOLICITAÇÃO DE INFORMAÇÕES SOBRE BENS DO EXECUTADO. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA. NÃO-ESGOTAMENTO DE TODOS OS MEIOS PARA LOCALIZAR BENS PASSÍVEIS DE PENHORA. PRECEDENTES. 1. Agravo regimental contra decisão que negou seguimento ao recurso especial da agravante. 2. O acórdão a quo indeferiu pedido de expedição de ofício ao Banco Central para informações sobre a existência de ativos financeiros do devedor. 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica e remansosa no sentido de que: - “O contribuinte ou o titular de conta bancária tem direito à privacidade em relação aos seus dados pessoais, além do que não cabe ao Judiciário substituir a parte autora nas diligências que lhe são cabíveis para demandar em juízo.” (REsp nº 306570/SP, 2ª Turma, Relª Minª ELIANA CALMON, DJ de 18/02/2002) - “A requisição judicial, em matéria deste jaez, apenas se justifica desde que haja intransponível barreira para a obtenção dos dados solicitados por meio da via extrajudicial e, bem assim, a demonstração inequívoca de que a exeqüente envidou esforços para tanto, o que se não deu na espécie, ou, pelo menos, não foi demonstrado. Falecendo demonstração cabal de que foram exauridas, sem êxito, as vias administrativas para obtenção de informações referentes aos bens dos sócios, não há demonstração de vulneração aos arts. 399 do CPC e 198 CTN, que conferem ao magistrado a possibilidade de requisitá-las.” (REsp nº 204329/MG, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 19/06/2000) - “As informações sobre a movimentação bancária do executado só devem ser expostas em casos de grande relevância para a prestação jurisdicional. In casu, a varredura das contas em nome do executado, visando posterior penhora, não justifica a quebra do sigilo bancário.” (AgReg no AG nº 225634/SP, 2ª Turma, Relª Minª NANCY ANDRIGHI, DJ de 20/03/2000) - “O interesse patrimonial do credor não autoriza, em princípio, a atuação judicial, ordenando a quebra do sigilo bancário, na busca de bens do executado para satisfação da dívida.” (REsp nº 144062/SP, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ de 13/03/2000) - “Não merece trânsito recurso especial que discute questão já superada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, qual seja, a impossibilidade de quebra de sigilo bancário como forma de possibilitar, no interesse exclusivo da instituição credora e não da Justiça, a expedição de ofício ao Banco Central para obtenção de dados acerca de depósitos em nome do devedor passíveis de penhora pela exeqüente.” (REsp nº 181567/SP, 4ª Turma, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJ de 21/02/2000) 4. Inexistência de comprovação de esgotamento de todos os meios para localizar bens em nome do executado. 5. A reunião do Fórum Permanente dos Juízes da Varas Cíveis de Pernambuco que aprovou, por maioria, o Enunciado 21-FVC-IMP, apesar da sua relevância nas discussões jurídicas do País, não tem qualquer força legal nem o poder de alterar jurisprudência mais que pacificada no âmbito do STJ. 6. Agravo regimental não-provido" (AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 747.239 – SP – 1ª Turma – j. 28.06.05 – DJU 18.08.05 – Rel. Min. JOSÉ DELGADO - Revista Eletrônica de Jurisprudência do STJ – Documento nº 561876).
DO VOTO DO RELATOR COLHE-SE:
"Esse é o posicionamento que sigo, por entender ser o mais coerente. In casu, conforme se verifica dos autos o pedido da parte recorrente é para a expedição de ofício ao Banco Central para fins de localizar bens em nome do devedor para garantia da execução, ou seja, é pura e simples quebra do sigilo bancário. Ademais, não há comprovação de que foram esgotados todos os meios para localizar bens em nome do executado. Por tais razões, nego seguimento ao Especial (art. 38 da Lei nº 8.038/90, c/c o art. 557 do CPC).”
"PROCESSUAL CIVIL. LOCAÇÃO. EXECUÇÃO. SOLICITAÇÃO DE INFORMAÇÕES A ENTIDADES GOVERNAMENTAIS. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA. ESGOTAMENTO DOS MEIOS POSSÍVEIS PARA A LOCALIZAÇÃO DE BENS. PRECEDENTES. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. I - O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de que a solicitação de informações a entidades governamentais, com a finalidade de fornecer elementos úteis à localização de bens de devedor inadimplente para a penhora, somente se justifica em hipóteses excepcionais, após o exaurimento de todos os demais meios possíveis realizados pelo credor, sendo, ainda, necessária a presença de motivos relevantes, bem como a existência de ordem judicial devidamente fundamentada. Precedentes. II - Recurso conhecido e provido" (REsp nº 659.127-SP – 5ª Turma – j. 23.11.04 – DJU 21.02.05 – Rel. p/ acórdão Min. GILSON DIPP – Revista Eletrônica de Jurisprudência do STJ – Documento nº 508257).
DO VOTO DO RELATOR EXTRAI-SE:
“Neste contexto, exsurge certo que não restou configurada a excepcionalidade da hipótese e tampouco qualquer motivo relevante de interesse público ou social, não se justificando a medida simplesmente no interesse particular do credor em localizar endereço e bens do devedor, mormente por que ainda não estavam exauridos todos os demais meios para a consecução da diligência. Ademais, a eventual solicitação de informações a entidades governamentais deve ocorrer por meio de ordem judicial fundamentada, com a explicitação da necessidade e utilidade da medida, hipótese que não se verificou in casu, havendo patente ofensa ao art. 165 do Código de Processo Civil. Por fim, faz-se mister ressaltar que não compete ao Judiciário promover diligências que cabem às partes litigantes, a não ser excepcionalmente. Ante o exposto, divirjo do Ministro Relator para conhecer do recurso e lhe dar provimento. É o voto. Prosseguindo no julgamento, a Turma, por maioria, conheceu do recurso e lhe deu provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Gilson Dipp que lavrará o acórdão".
PROCESSUAL CIVIL, TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. SOLICITAÇÃO DE INFORMAÇÕES SOBRE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. INVASÃO DE PRIVACIDADE. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA. NÃO-ESGOTAMENTO DE TODOS OS MEIOS PARA LOCALIZAR BENS PASSÍVEIS DE PENHORA. PRECEDENTES. 1. Recurso especial interposto contra v. acórdão que indeferiu pedido de quebra de sigilo bancário para fins de requisição de informações sobre movimentação financeira do recorrido. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica e remansosa no sentido de que: - “O contribuinte ou o titular de conta bancária tem direito à privacidade em relação aos seus dados pessoais, além do que não cabe ao Judiciário substituir a parte autora nas diligências que lhe são cabíveis para demandar em juízo.” (REsp nº 306570/SP, 2ª Turma, Relª Minª ELIANA CALMON, DJ de 18/02/2002) - “A requisição judicial, em matéria deste jaez, apenas se justifica desde que haja intransponível barreira para a obtenção dos dados solicitados por meio da via extrajudicial e, bem assim, a demonstração inequívoca de que a exeqüente envidou esforços para tanto, o que se não deu na espécie, ou, pelo menos, não foi demonstrado. Falecendo demonstração cabal de que foram exauridas, sem êxito, as vias administrativas para obtenção de informações referentes aos bens dos sócios, não há demonstração de vulneração aos arts. 399 do CPC e 198 CTN, que conferem ao magistrado a possibilidade de requisitá-las.” (REsp nº 204329/MG, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 19/06/2000) - “As informações sobre a movimentação bancária do executado só devem ser expostas em casos de grande relevância para a prestação jurisdicional. In casu, a varredura das contas em nome do executado, visando posterior penhora, não justifica a quebra do sigilo bancário.” (AgReg no AG nº 225634/SP, 2ª Turma, Relª Minª NANCY ANDRIGHI, DJ de 20/03/2000) - “O interesse patrimonial do credor não autoriza, em princípio, a atuação judicial, ordenando a quebra do sigilo bancário, na busca de bens do executado para satisfação da dívida.” (REsp nº 144062/SP, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ de 13/03/2000) - “Não merece trânsito recurso especial que discute questão já superada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, qual seja, a impossibilidade de quebra de sigilo bancário como forma de possibilitar, no interesse exclusivo da instituição credora e não da Justiça, a expedição de ofício ao Banco Central para obtenção de dados acerca de depósitos em nome do devedor passíveis de penhora pela exeqüente.” (REsp nº 181567/SP, 4ª Turma, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJ de 21/02/2000) 3. Pedido real de quebra do sigilo bancário e não apenas a indicação de que o devedor ou seus co-responsáveis possuem conta corrente e em qual instituição. Inexistência de esgotamento de todos os meios para localizar bens em nome do executado. 4. Recurso não provido” (STJ – REsp nº 590.834-MG – 1ª Turma – j. 09.12.03 – DJU 08.03.04 – Rel. Min. JOSÉ DELGADO - Revista Eletrônica de Jurisprudência do STJ – Documento nº 448064).
“PROCESSO CIVIL - EXECUÇÃO FISCAL - INFORMAÇÕES SOBRE BENS A SEREM PENHORADOS - REQUISIÇÃO - SIGILO BANCÁRIO - QUEBRA – IMPOSSIBILIDADE EM PROCESSO ADMINISTRATIVO. - A obtenção de informações sobre a existência ou não de bens a serem penhorados é obrigação do exeqüente. - O juiz da execução fiscal só deve deferir pedido de expedição de ofício à Receita Federal e ao BACEN após o exeqüente comprovar não ter logrado êxito em suas tentativas de obter as informações sobre o executado e seus bens. - Recurso improvido” (STJ - REsp nº 206963/ES - 1ª Turma - Rel. Min. GARCIA VIEIRA - DJ de 28/06/1999 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. SIGILO FISCAL. PEDIDO DE DILIGÊNCIA PARA LOCALIZAÇÃO DE BENS. INDEFERIMENTO. ACÓRDÃO HARMÔNICO COM O ENTENDIMENTO DO STJ. SÚMULA N. 83. INCIDÊNCIA. I. Não merece trânsito recurso especial que discute questão já superada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, qual seja, a impossibilidade de quebra de sigilo fiscal como forma de possibilitar, no interesse exclusivo da instituição credora e não da Justiça, a expedição de ofício à Receita Federal, ou entidade privada, para obtenção de dados acerca de bens em nome do devedor passíveis de penhora pela exeqüente. II. Aplicação da Súmula n. 83 do STJ. III. Recurso especial não conhecido” (STJ - REsp nº 466.138-ES - Relator Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR – j. 06.02.03 - DJ de 31.03.2003 – Revista Eletrônica de Jurisprudência do STJ – Documento nº 392577).
"AGRAVO REGIMENTAL. DESPACHO DENEGATÓRIO DE RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÕES AO BANCO CENTRAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. I. O sigilo bancário não deve ser afastado se não em situações especiais em que se patenteie relevante interesse da administração da Justiça. Tal não se configura quando se trate apenas de localizar bens para serem penhorados. II. Agravo regimental improvido” (STJ - AgRg no AG 469.275/DF - Relator Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR – j. 25.02.03 - DJ de 28.04.2003 - Revista Eletrônica de Jurisprudência do STJ – Documento nº 395808).
"PROCESSO CIVIL - EXECUÇÃO FISCAL - INFORMAÇÕES SOBRE BENS A SEREM PENHORADOS - OFÍCIO AO BACEN - SIGILO BANCÁRIO - QUEBRA - ESGOTAMENTO DOS MEIOS POSSÍVEIS PARA LOCALIZAÇÃO - NECESSIDADE. 1. A jurisprudência do STJ só admite a quebra do sigilo bancário, quando o credor-exeqüente já esgotou os meios possíveis à localização de bens do devedor-executado. Precedentes. 2. Regimental improvido” (AgRg no RESP 341.365/SP - Relator Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS – j. 04.11.03 - DJ de 24.11.2003 - Revista Eletrônica de Jurisprudência do STJ – Documento nº 439945).
“A requisição judicial, em matéria deste jaez, apenas se justifica desde que haja intransponível barreira para a obtenção dos dados solicitados por meio da via extrajudicial e, bem assim, a demonstração inequívoca de que a exeqüente envidou esforços para tanto, o que se não deu na espécie, ou, pelo menos, não foi demonstrado. Falecendo demonstração cabal de que foram exauridas, sem êxito, as vias administrativas para obtenção de informações referentes aos bens dos sócios, não há demonstração de vulneração aos arts. 399 do CPC e 198 CTN, que conferem ao magistrado a possibilidade de requisitá-las” (REsp nº 204.329/MG - 2ª Turma, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO - DJ de 19/06/2000 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“PROCESSUAL CIVIL, TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. SOLICITAÇÃO DE INFORMAÇÕES SOBRE MOVIMENTAÇÃO FINANCEIRA. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. INVASÃO DE PRIVACIDADE. EXCEPCIONALIDADE DA MEDIDA. NÃO-ESGOTAMENTO DE TODOS OS MEIOS PARA LOCALIZAR BENS PASSÍVEIS DE PENHORA. PRECEDENTES. 1. Recurso especial interposto contra v. acórdão que indeferiu pedido de quebra de sigilo bancário para fins de requisição de informações sobre movimentação financeira do recorrido. 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica e remansosa no sentido de que: - “O contribuinte ou o titular de conta bancária tem direito à privacidade em relação aos seus dados pessoais, além do que não cabe ao Judiciário substituir a parte autora nas diligências que lhe são cabíveis para demandar em juízo” (REsp nº 306.570/SP - 2ª Turma - Rel. Minª ELIANA CALMON - DJ de 18/02/2002 – Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“PROCESSUAL CIVIL - EXECUÇÃO - INFORMAÇÕES SOBRE BENS EM NOME DO CONTRIBUINTE - OFÍCIO AO BANCO CENTRAL DO BRASIL – IMPOSSIBILIDADE - VIOLAÇÃO ÀS LEIS FEDERAIS NÃO CONFIGURADA – PREQUESTIONAMENTO AUSENTE - SÚMULAS 282 E 356 STF - DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADA - LEI 8.038/90 E RISTJ, ART. 255 E PARÁGRAFOS – SÚMULA 83/STJ - PRECEDENTE STJ. - O interesse patrimonial do credor não autoriza, em princípio, a atuação judicial, ordenando a quebra do sigilo bancário, na busca de bens do executado para satisfação da dívida. - Se o v. aresto hostilizado sequer mencionou os preceitos legais tidos por violados e o recorrente deixou de manifestar os cabíveis embargos de declaração para suscitar a apreciação do tema omitido, carece o recurso do prequestionamento indispensável à admissibilidade do apelo pela alínea "a" do permissivo constitucional. - Divergência jurisprudencial que não atende as determinações legais e regimentais, não se configura para o fim proposto. - Recurso não conhecido” (STJ - REsp nº 144.062/SP - 2ª Turma - Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS - DJ de 13/03/2000 – Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“EXECUÇÃO FISCAL - REQUISIÇÃO JUDICIAL DE QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO - MOTIVO RELEVANTE INEXISTENTE - IMPOSSIBILIDADE. - Informações sobre movimentação bancária só devem ser expostas em casos de grande relevância para a prestação jurisdicional, consoante entendimento assentado na jurisprudência desta Colenda Corte. - Agravo improvido” (AgReg no REsp nº 251.121/SP - 2ª Turma - Relª Minª NANCY ANDRIGHI - DJ de 26/03/2001 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“AGRAVO REGIMENTAL. DESPACHO DENEGATÓRIO DE RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÕES AO BANCO CENTRAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA PACIFICADA NA CORTE. SÚMULA 83/STJ. - As informações sobre a movimentação bancária do executado só devem ser expostas em casos de grande relevância para a prestação jurisdicional. In casu, a varredura dos contas em nome do executado, visando posterior penhora, não justifica a quebra do sigilo bancário. - Agravo improvido” (STJ - AgReg no AG nº 225634/SP - 2ª Turma - Relª Minª NANCY ANDRIGHI - DJ de 20/03/2000 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“SIGILO BANCÁRIO. DIREITO À PRIVACIDADE DO CIDADÃO. QUEBRA DO SIGILO. REQUISITOS LEGAIS. RIGOROSA OBSERVÂNCIA. - A ordem jurídica autoriza a quebra do sigilo bancário, em situações excepcionais. - Implicando, entretanto, na restrição do direito à privacidade do cidadão, garantida pelo princípio constitucional, é imprescindível demonstrar a necessidade das informações solicitadas, com o estrito cumprimento das condições legais autorizadoras” (STJ - REsp nº 152455/SP - 2ª Turma - Rel. Min. HÉLIO MOSIMANN - DJ de 15/12/1997 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES. CONTAS BANCÁRIAS. - É ininvocável o art. 339 do CPC para o efeito de quebra de sigilo bancário de devedor, em causa de interesse exclusivamente patrimonial de empresa pública. Recurso não conhecido” (STJ - REsp nº 117189/PR - 3ª Turma - Rel. Min. COSTA LEITE - DJ de 18/08/1997 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO PARA A LOCALIZAÇÃO DE BENS. INVIABILIDADE. LEI 4.595/1964, ART. 38. - O sigilo bancário não teria qualquer consistência se, para aparelhar a execução, o credor pudesse desvelar os saldos depositados pelo devedor em instituições financeiras. - O art. 38 da Lei 4.595, de 1964, refere-se a informações e esclarecimentos necessários ao julgamento da causa, a que não se assimila a execução paralisada por falta de bens penhoráveis. Hipótese em que, sob o nomem juris de arresto, o MM. Juiz de Direito autorizou verdadeira penhora mediante a quebra do sigilo bancário. - Recurso ordinário provido” (STJ - ROMS nº 7275/SP - 2ª Turma - Rel. Min. ARI PARGENDLER - DJ de 10/03/1997 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ). No mesmo sentido: REsp nº 30148/SP - 2ª Turma - Rel. Min. ARI PARGENDLER - DJ de 03/03/1997 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. OFÍCIO AO BANCO CENTRAL DO BRASIL PARA LOCALIZAÇÃO DE CONTAS EM NOME DO EXECUTADO. - O interesse patrimonial do credor não autoriza, em princípio, a atuação judicial, ordenando a quebra de sigilo bancário, na busca de bens do executado para satisfação da dívida. - Precedentes. Recurso não conhecido” (STJ - REsp nº 128461/PR - 4ª Turma - Rel. Min. CÉSAR ÁSFOR ROCHA - DJ de 12/04/1999 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
“PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. OFÍCIO AO BANCO CENTRAL DO BRASIL PARA LOCALIZAÇÃO DE CONTAS EM NOME DO EXECUTADO. - O interesse patrimonial do credor não autoriza, em princípio, a atuação judicial, no sentido da quebra do sigilo bancário para satisfação da dívida exeqüenda, em substituição a cargo da parte interessada. - Precedentes. Recurso não conhecido” (STJ - REsp nº 160659/SP - 4ª Turma - Rel. Min. CÉSAR ÁSFOR ROCHA - DJ de 12/04/1999 - Seção de Jurisprudência do Site do STJ).
É certo que o sigilo fiscal não representa garantia absoluta, mas é igualmente certo, que sua quebra como derivação de ordem judicial, somente se justifica após haverem sido exauridos pelo credor em processo de execução, todos os meios extrajudiciais postos a seu alcance, no sentido de localizar bens penhoráveis do devedor, uma vez que não se afigura plausível, in casu, pretender-se que, no exclusivo interesse do primeiro, lhe faça as vezes o Poder Judiciário, na tarefa de diligenciar junto à órgãos governamentais, em busca da existência de bens passíveis de sofrerem ato processual de afetação.
Ademais, a quebra do sigilo bancário implica indevida intromissão na privacidade do cidadão, expressamente amparada pela Constituição Federal (artigo 5º, X e XII) e pelo inciso III, do art. 1º, da Lei Maior (dignidade da pessoa humana), que impõe limites à restrição de tais garantias fundamentais, sendo que, cumpre manter o sigilo acerca de qualquer informação ou documentação pertinente ao patrimônio do cidadão, em não havendo ‘motivo absolutamente relevante’, exato à interpretação uniforme sobre o tema, oriunda do Colendo Superior Tribunal de Justiça,conforme decisões colacionadas supra.
Tal decisão interlocutória determinante de envio de ofício à receita federal, ora objeto do presente estudo (despacho J. DEFIRO de cunho decisório causador de gravame ao devedor), não se afigura sustentável, na medida em que, além de apresentar-se despida de qualquer fundamentação (ainda que concisa), ferindo imposição constitucional nesta senda (art. 93, IX), malfere a garantia de tratamento paritário às partes no processo, consoante preconizado pelo art. 125, I, do Códex, haja vista representar tal decisão, em verdade, a ‘assunção direta pelo Poder Judiciário, de diligências (busca de bens penhoráveis) que competem exclusivamente ao credor nos autos de processos de execução (fiscais ou de títulos – judiciais e extrajudiciais).
Neste diapasão, não há como pretender o magistrado singular, que, apenas e tão-somente em razão de ocupar o cidadão, o pólo passivo de uma execução forçada - em sua forma provisória ou definitiva -, renuncie às suas prerrogativas constitucionais inscritas nos incisos X e XII, do art. 5º, da Carta Política, bem como, à garantia da fundamentação dos atos decisórios do Poder Judiciário, estampada no inciso IX, do art. 93, de sobredita Lei Maior e, ainda, à garantia de tratamento paritário das partes, ínsita ao art. 125, I, da Lei Federal nº 5.869/73, uma vez que não se pode alijá-lo (cidadão) de seu direito constitucional à jurisdição, enquanto pleno exercício de uma garantia constitucional imanente ao due process of law.
Nesta trilha, destaca-se a primorosa lição do Prof. EGAS DIRCEU MONIZ DE ARAGÃO, “verbis”:
“O DESEJO DE ATRIBUIR MAIOR EFETIVIDADE À EXECUÇÃO NÃO PODE SER CAUSA DE MENOSPREZO À IGUALDADE DAS PARTES E AO DEVIDO PROCESSO. SEJA NO CASO DAS EXECUÇÕES QUE OCORREM EXTRAJUDICIALMENTE, SEJA NO DAS QUE ACONTECEM NO PROCESSO JUDICIAL, OS LITIGANTES NÃO PODEM SER PRIVADOS DAS GARANTIAS QUE A CONSTITUIÇÃO OUTORGA. NÃO SE ALCANÇA A EFETIVIDADE DO PROCESSO COM O SACRIFÍCIO DE DIREITOS” (Efetividade do Processo de Execução, Revista de Processo, São Paulo, RT, 1993, vol. 72, p. 21).
Nesta mesma senda, faz-se imperioso atentar à doutrina da ilustre Prof. ADA PELLGRINI GRINOVER, no que tange à garantia do tratamento paritário às partes do processo, “ad litteram”:
“Ao longo de todo o arco procedimental, o julgador deve promover um tratamento igualitário entre os sujeitos parciais do processo, outorgando a eles as mesmas oportunidades de participação e o mesmo tratamento. Tratar igualitariamente, não é tratar da mesma forma, mas tratar de maneira a atingir o acesso à ordem jurídica justa, possibilitando isonomicamente às partes a possibilidade de efetiva defesa de seus direitos, sustentação de suas razões, produção de provas” (As Garantias Constitucionais e o Direito de Ação, São Paulo, RT, 1973, p. 15).
No ponto, a relevância da garantia constitucional ao sigilo fiscal - que traduz, na concreção do seu alcance, uma das projeções realizadoras do direito à intimidade - impõe, por isso mesmo, ao Poder Judiciário, cautela e prudência na determinação de ruptura da esfera de privacidade individual, que o ordenamento jurídico, em norma de salvaguarda, pretendeu submeter à 'cláusula tutelar de reserva'.
É que os direitos fundamentais do contribuinte (artigo 5º, incisos X e XII, da CF), não podem ser violados, cabendo ao Poder Judiciário, que é o guardião da lei, preservar os direitos do Estado e aqueles da sociedade, principalnente com esteio no fundamento da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), enquanto princípio limitador da restrição dos direitos tidos como fundamentais pela Magna Carta.
Nesta senda, preconiza o eminente magistrado DOMINGOS FRANCIULLI NETO, acerca do sentido e exegese literal da expressão 'liberdade', contida no art. 5º, LIV, da Carta Política (previsão do devido processo legal), ligando-a de forma indelével à garantia constitucional da intimidade/vida privada e sigilo de dados, "verbis":
"A liberdade não se exaure no direito de ir e vir, mas projeta-se em todos os atributos que dizem respeito à dignidade da pessoa. Empecer total ou parcialmente o gozo de qualquer bem juridicamente protegido é vulnerar o gozo da liberdade, no sentido mais amplo da palavra. De sã consciência, não há dizer que a indevida ou despropositada invasão da intimidade não fira de frente o conceito de liberdade" (Quebra do Sigilo Bancário pelo Ministério Público, apud, Direitos Fundamentais do Contribuinte, Org. YVES GANDRA DA SILVA MARTINS, São Paulo, RT, 2000, p.131).
De registrar-se ainda, que, "o direito à intimidade está protegido, em nossa Carta Republicana, no artigo 5º, X, ao registrar que "são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".
Em contraponto, o direito ao sigilo bancário, por ser uma extensão do direito à intimidade, integra a categoria dos direitos da personalidade, portanto, de 'natureza fundamental', somente passível de restrição, por meio de DECISÃO JUDICIAL FUNDAMENTADA, exato à exegese emanada do inciso IX, do art. 93, da Constituição da República.
Assim é que, no MS n. 21.729-4 ("apud" Parecer GQ n. 110, de 9 de setembro de 1996 da AGU, "in" RDDT 14108), o Ministro Marco Aurélio, do Excelso Pretório, declara, “verbis”: "Em última análise, tenho que o sigilo bancário está sob proteção do disposto nos incisos X e XII do artigo 5º da Constituição Federal. Entendo que somente é possível afastá-lo por ordem judicial".
No mesmo sentido, nesse particular (expedição de ofício à Receita Federal), exsurge o entendimento do eminente Min. Celso de Mello, do Colendo STF, para quem: "o princípio da reserva de jurisdição - mais do que simples formulação de ordem doutrinária - representa, na concreção do seu alcance, um expressivo instrumento de proteção das pessoas em geral contra as ações eventualmente arbitrárias do Poder Público, qualquer que seja a dimensão institucional em que se projete a atividade estatal" (STF - Pleno - MS 23.452-1/RJ, j. 16-9-1999. Precedente citado: MS 23.454, de 19-8-1999).
O exame dos aspectos constitucionais referentes ao sigilo bancário revela que ele faz parte do leque previsto pela Constituição para proteger a vida íntima do cidadão. Assentado esse princípio, cumpre advertir que o deferimento ou indeferimento da quebra desse sigilo não pode ser exteriorizado em ‘MEROS DESPACHOS’ . Faz-se necessária ‘ DECISÃO MOTIVADA’ .
Por outro lado, a quebra do sigilo bancário em sede de processo de execução, acessível ao público (hipótese do presente estudo), descumpre o art. 38, § 1º, da Lei 4.595/64, que assegura que "... a exibição de livros e documentos em juízo, se revestirão sempre do mesmo caráter sigiloso, só podendo a eles ter acesso as partes legítimas na causa, que deles não poderão servir-se para fins estranhos à mesma".
É certo ainda que, no caso da realização de pesquisas para encontrar bens patrimoniais do ocupante do pólo passivo em processos de execução forçada, para a efetivação de ato processual de penhora, não há relevante interesse público configurado, mas apenas interesse privado e de natureza patrimonial do credor. Nesse sentido orientou-se a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp 181.567, DJU de 21.02.2000, REsp 50.354, DJU de 28.06.99, AGA 150.244, DJU de 30.08.1999), tendo sido consignado em um dos casos que: "a obtenção do atual endereço do devedor e a existência ou não de bens de sua propriedade a serem penhorados é obrigação do exeqüente" (REsp 160.405, DJ. 08.06.98).
Por tais razões, faz-se possível inferir que, os poderes conferidos ao Estado-Juiz, não autorizam a quebra do sigilo bancário para a simples pesquisa de bens, voltada à realização de penhoras a incidirem sobre patrimônio de devedores em processos de execução forçada.
Nessa linha de interpretação teleológica, já frisou o insigne Ministro Carlos Velloso, do Excelso Pretório, no que tange à quebra de sigilo fiscal de pessoas físicas e jurídicas, que: "A faculdade conferida ao Judiciário pressupõe, entretanto, que a autoridade judiciária procederá com cautela, prudência e moderação, virtudes inerentes à magistratura, ou que os magistrados devem possuir" (Pesquisas Tributárias - Nova Série - n. 6 - pág. 137).
Releva neste ponto, por oportuno, a transcrição de trecho de artigo do insigne Prof. Uadi Lammêgo Bulos, entitulado, Quebra do sigilo ou quebra da Constituição?, “in verbis”:
“De fato, o sigilo bancário constitui uma projeção do direito à privacidade que não tolera ingerências de órgãos governamentais. A conta bancária é lídima expressão da personalidade. Daí a Constituição brasileira ter considerado privativos os dados pessoais, que só podem sofrer ruptura mediante mandado judicial. A tutela dos direitos do homem, aqui amplamente tomada, é missão conferida ao Judiciário, ainda mais no que tange ao controle dos atos ligados à privacidade. Entregar a vida bancária dos outros aos desígnios da Receita Federal, permitindo o livre acesso às contas dos contribuintes, e até a reabertura de processos já encerrados, é consagrar o retorno dos tribunais inquisitórios, que investigavam, acusavam, julgavam e condenavam ao mesmo tempo. Não estamos defendendo a total impossibilidade de quebra do sigilo bancário, mesmo porque nenhuma liberdade pública é absoluta. Tanto é assim que a Constituição brasileira em nada impede o combate à sonegação fiscal. Apenas impõe critérios para a devassa do segredo: necessidade de autorização judicial e impossibilidade da criação de normas com efeitos retroativos. De outra parte, se é certo que o sigilo bancário pode e deve ser quebrado, desde quando esteja configurada a justa causa para o seu rompimento, mais exato ainda é que existe um devido processo legal a ser observado para a tomada de quaisquer providências. Essa exigência irmana-se com outra, qual seja, a necessidade de se motivar a sentença em que se autoriza a quebra. Deliberações destituídas de motivação mostram-se despojadas de efeitos jurídicos, pois nenhuma medida restritiva de direitos pode ser adotada sem que o ato que a decreta seja devidamente fundamentado pela autoridade jurisdicional, precisamente para ficarem demarcados a fumaça do bom direito e o perigo da mora" (Artigo publicado no site - saraivajur.com.br).
Dessarte, por representar a quebra do sigilo fiscal do cidadão, medida de caráter excepcional, mister atender ao critério de proporcionalidade, ou seja, o magistrado quando da sua manifestação, há de avaliar se a quebra é indispensável para a proteção do interesse público, porquanto, existindo outra (medida) menos gravosa ao cidadão, deverá optar por esta, em observância ao Princípio da Menor Onerosidade, inscrito no art. 620, da Codificação Civil Adjetiva.
No que tange à garantia contida no art. 620, do Código de Processo Civil, tem-se que a r. decisão interlocutória ora objeto do presente estudo (J. DEFIRO – OFÍCIO À RECEITA FEDERAL), impositiva de sério gravame ao devedor em processos de execução, não se atém à real exegese de sobredito dispositivo de lei processual, porquanto, não se legitima onerar sobremaneira o devedor, através da imposição da quebra de seu sigilo fiscal, apenas e tão-somente com vistas à localização de bens penhoráveis de sua propriedade, posto não restar cacterizada hipótese relevante e excepcional a justificar tal medida restritiva de garantias fundamentais (art. 5º, X e XII, da CF), máxime, em se considerando, que, na ampla maioria dos casos, não comprova precedentemente o credor ao magistrado, o efetivo exaurimento das medidas extrajudiciais existentes a seu alcance na busca de bens de propriedade do devedor.
Nesse sentido, assevera com propriedade o eminente Prof. AMILCAR DE CASTRO, acerca do postulado contido no art. 620, do Codex, “in verbis”:
“Todos os meios executivos são onerosos para o executado, mas não seria justo e seria inútil, que se preferisse um meio mais custoso, quando por outro menos pesado pudesse o exeqüente conseguir o mesmo resultado prático. É um elevado princípio de justiça e eqüidade, informativo do processo das execuções, este que o Estado deve, quanto possível, reintegrar o direito do exeqüente com o mínimo de despesa, de incômodo e de sacrifício do executado” (Do Procedimento de Execução, Rio de Janeiro, Forense, 1999, p. 117 ).
Na mesma trilha, veementiza o renomado Prof. CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, acerca da garantia imanente ao art. 620, da Codificação Adjetiva, “verbis”:
“Pode-se mesmo dizer que existe um sistema de proteção ao executado contra excessos, um favor debitoris inspirado nos princípios da justiça e da eqüidade, que inclusive constitui uma das linhas fundamentais da história da execução civil em sua generosa tendência de humanização. É em nome dos valores humanos, éticos, políticos e econômicos alojados à base do sistema executivo que a lei busca o adequado equilíbrio entre os interesses das partes em conflito, para que a execução seja tão eficiente quanto possível, com o menor sacrifício possível ao patrimônio do devedor” (Execução Civil, São Paulo, Malheiros, 1998, 6ª ed.,nº 187, p. 307).
E arremata, sobre a garantia contida no art. 620, da Codificação Adjetiva Civil, o emérito Prof. RICARDO RODRIGUES GAMA, “verbis”:
“O princípio do menor sacrifício do devedor, ou também denominado da economia da execução, assegura os direitos do devedor diante da utilização excessiva dos instrumentos da execução, evitando que, além da satisfação do débito, ele sofra outros prejuízos. Este princípio é consagrado pelo art. 620 do Código de Processo Civil. Consoante o disposto neste artigo, quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor” (Contraditório no Processo de Execução, Revista Jurídica 258/18 -ABR/99 – DOUTRINA).
Acerca do direito de acesso do devedor em processos de execução forçada, à ordem jurídica justa, enquanto manifestação insofismável do due process of law, exsurge como norte seguro, a doutrina do ilustre Prof. MAURO CAPPELLETTI, “ipsis verbis”:
“De fato, o direito ao acesso efetivo tem sido progressivamente reconhecido como sendo de importância capital entre os novos direitos individuais e sociais, uma vez que a titularidade de direitos é destituída de sentido, na ausência de mecanismos para sua efetiva reivindicação. O acesso à justiça pode, portanto, ser encarado como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas proclamar os direitos de todos” (Acesso à Justiça, Porto Alegre, Sérgio Antonio fabris Editor, 1988, p. 158, Tradução: Ministra ELLEN GRACIE NORTHFLEET).
Ainda no sentido do direito inalienável das partes litigantes ao exercício do contraditório, aqui representado por sua efetiva participação no processo, sobreleva a douta lição de J.J. GOMES CANOTILHO, “verbis”:
“A observância de um procedimento apto. a garantir às partes litigantes o amplo exercício dos poderes e faculdades inerentes ao princípio do contraditório legitima a autoridade dos provimentos jurisdicionais, destinados, em última análise, a disciplinar os interesses alheios. Aliás, a democratização do exercício do poder através da participação pressupõe que esta participação se traduza, mediante sua canalização através de procedimentos justos, numa influência qualitativa no resultado das decisões” (Direito Constitucional, Coimbra, Almedina, 1933, p. 1024).
Ressalte-se, no mais, que a atividade cognitiva do juiz no processo de execução não se apresenta como infalível, eis que está sujeita ao controle da parte interessada. Nesta vertente, tem-se como inquestionável a incidência da garantia do contraditório no processo de execução, pois que, igualmente suscetível à moldura do cânon ínsito ao inciso LV, do art. 5º, da Lex Fundamentalis.
Neste diapasão, tem-se que o processo executivo inclui-se, como é cediço, na categoria “processo judicial”, que a norma constitucional perfilha sem qualquer restrição ou ressalva, registrando-se, por imperioso, o maior grau de incidência da garantia do contraditório no processo de execução, face à sua natureza gravosa de expropriação de bens do patrimônio do devedor.
Colhe-se, nesse sentido, a lição do ilustre Prof. RICARDO RODRIGUES GAMA, “verbis”:
“Além dos recursos contra ato decisório do Juiz colocados à disposição das partes, estas têm direito a acompanhar e a intervir nas ocorrências processuais (atos processuais). Na execução, não é somente o credor quem atua, devendo o devedor apresentar a sua defesa e participar dos atos que julgar necessária a sua presença. Exterioriza-se o contraditório não só com a audiência, pois existem outras formas das partes atuarem no processo. No processo de execução inexiste audiência para a oitiva do executado, do exeqüente ou de testemunhas. executado e o exeqüente participam do processo valendo-se da forma escrita. Através de requerimentos, o Juiz conhece as pretensões dos envolvidos. Fora os casos de previsão expressa na lei processual, é claro que o devedor pode manifestar-se no processo de execução todas as vezes que sentir que seus direitos estão sendo lesionados. O contraditório colocado como garantia não implica somente a possibilidade de o indivíduo participar e se defender em determinado processo em que é parte. É mais do que isso, ele pode exigir essa participação. Nem a lei pode afastar este direito, pois, se assim dispor, certamente deve ser considerada inconstitucional. O princípio do contraditório é tão importante que dispensa a previsão constitucional ou legal. Contudo, para garantir os direitos do litigante, abaixo da norma constitucional, nada pode ferir o princípio do contraditório. É claro que a idéia deste princípio acusando a necessidade do contraditório deve ser requisito de todo processo desenvolvido validamente” (Contraditório no Processo de Execução, Revista Jurídica 258/18 -ABR/99 – DOUTRINA).
Conclusão
Por derradeiro, faz-se imperioso que permaneça em alerta o devedor em processos de execução forçada, com vistas a expressar em tempo, o exercício de seu direito à ampla defesa e ao contraditório, enquanto corolários do due process of law, insurgindo-se em face de decisões lacônicas como a objeto do presente estudo (r. decisão monocrática determinante da quebra do sigilo fiscal do devedor, formalmente expedida na forma de despacho, mas com natureza transmudada em interlocutória, face à imposição de sério gravame à parte), porquanto desprovida de fundamentação, em completo desrespeito á garantia de tratamento paritário das partes, impondo-se, em casos que tais, a interposição de recurso de agravo de instrumento ao E. Tribunal de Justiça de SP, não se olvidando da necessidade de eventual aviamento de recurso especial ao Colendo Superior Tribunal de Justiça, com esteio nas alíneas ‘a’ e ‘c’, do permissivo constitucional (acompanhado de interposição simultânea de medida cautelar àquela Corte Superior visando à obtenção de efeito suspensivo ao recurso especial), diante da clara negativa de vigência ao artigo 125, I, da Lei Federal 5.869/73 (Código de Processo Civil), albergador do Princípio da Isonomia (Cf. art. 5º, caput, da Carta Magna), que impõe ao Juiz, entre outros deveres, o de assegurar às partes igualdade de tratamento.
No ponto, a decisão interlocutória ora em exame, nega vigência ainda, ao art. 165, segunda parte, da Lei Federal nº 5.869/73, na medida em que determina o envio de Ofício à Receita Federal (a pedido do credor), com imposição de sério gravame ao devedor, posto que, embora possua tal decisão, externa e formalmente a natureza de "despacho", revela "conteúdo decisório", uma vez que impositiva de sério gravame ao devedor em processos de execução forçada (RT 508/199), traduzido na 'quebra de seu sigilo fiscal', circunstância esta que, segundo doutrina abalizada retro transcrita, termina por transmudar sobredita decisão, em "decisão interlocutória", a reclamar, por isso mesmo, a devida fundamentação.
Tal decisão, ora objeto deste singelo estudo, porque desprovida de qualquer fundamentação, ainda que de forma concisa (J. DEFIRO – OFÍCIO À RECEITA FEDERAL), viola, nada obstante, de forma patente o postulado imanente à garantia da fundamentação dos atos decisórios, ínsito à segunda parte do art. 165, do Código de Processo Civil, posto representar tal decisão, restrição às garantias constitucionais da intimidade e da vida privada e do sigilo de dados, bem como, ao postulado da dignidade da pessoa humana, preconizadas pela moldura do cânon, ínsito aos incisos X e XII, do art. 5º, e inciso III, do art. 1º, da Constituição da República, as quais, embora não erigidas à garantia absoluta, reclamam decisão judicial provida de fundamentação, nos termos do que impõe o inciso IX, do art. 93, da Carta Magna.
Nega a decisão em exame ainda, vigência ao art. 620, da Lei Federal nº 5.869/73, no momento em que impõe ao devedor em processos de execução forçada, o ônus injustificável de arcar com a restrição de suas garantias individuais fundamentais (art. 5º, X e XII, da CF), traduzida na QUEBRA DE SEU SIGILO FISCAL, em completa desatenção às garantias asseguradas ao devedor no processo executivo, entre elas, a de não ser obrigado a suportar gravames desnecessários à execução, mormente quando tal penalidade apresenta-se sob a forma de despacho impositivo de sério gravame (por isso que transmudada sua natureza para decisão interlocutória), sendo notória, in casu, a inexistência de situação especial, em que se encontre patente o relevante interesse da administração da Justiça, uma vez que tal hipótese não se configura quando se trate apenas de localizar bens suscetíveis de penhora.
A decisão em questão, empresta ainda à lei federal interpretação divergente da firmada no seio do Colendo Superior Tribunal de Justiça, visto que, ao decidir o MM. Juízo a quo - a pedido do credor -, pelo envio de Ofício ã Receita Federal colimando a localização de bens passíveis de constrição de titularidade do devedor, com conteúdo determinante da quebra de sigilo fiscal do deste, sem que previamente comprovasse o credor, o exaurimento das vias administrativas postas a seu alcance na localização de bens de propriedade do devedor, conferiu ao art. 399, I, da Lei Federal nº 5.869/73, interpretação totalmente dissonante daquela emprestada à norma infraconstitucional sub examine, pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, uma vez que, de há muito, vem aludido Tribunal Superior, interpretando tal dispositivo de forma teleológica, de forma a extrair seu verdadeiro sentido, pelo que, uniformizou o entendimento de que: "a solicitação de informações a entidades governamentais, com a finalidade de fornecer elementos úteis à localização de bens de devedor inadimplente para a penhora, somente se justifica em hipóteses excepcionais, após o exaurimento de todos os demais meios possíveis realizados pelo credor, sendo, ainda, necessária a presença de motivos relevantes, bem como a existência de ordem judicial devidamente fundamentada, posto que, não restando configurada a excepcionalidade da hipótese e tampouco qualquer motivo relevante de interesse público ou social, não se justifica a medida simplesmente no interesse particular do credor em localizar o endereço e bens do devedor".
Nesse sentido, os acórdãos já retro colacionados:
AgRg no RECURSO ESPECIAL Nº 747.239 – SP – 1ª Turma – j. 28.06.05 – DJU 18.08.05 – Rel. Min. JOSÉ DELGADO; REsp nº 659.127-SP – 5ª Turma – j. 23.11.04 – DJU 21.02.05 – Rel. p/ acórdão Min. GILSON DIPP; REsp nº 590.834-MG – 1ª Turma – j. 09.12.03 – DJU 08.03.04 – Rel. Min. JOSÉ DELGADO; REsp nº 466.138-ES - Relator Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR – j. 06.02.03 - DJ de 31.03.2003; AgRg no RESP 341.365/SP - Relator Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS – j. 04.11.03 - DJ de 24.11.2003; REsp nº 206963/ES - 1ª Turma - Rel. Min. GARCIA VIEIRA - DJ de 28/06/1999; REsp nº 306570/SP, 2ª Turma, Relª Minª ELIANA CALMON, DJ de 18/02/2002; REsp nº 204329/MG, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, DJ de 19/06/2000; AgReg no AG nº 225634/SP, 2ª Turma, Relª Minª NANCY ANDRIGHI, DJ de 20/03/2000; REsp nº 144062/SP, 2ª Turma, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ de 13/03/2000; REsp nº 181567/SP, 4ª Turma, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JÚNIOR, DJ de 21/02/2000; AgReg no REsp nº 251.121/SP - 2ª Turma - Relª Minª NANCY ANDRIGHI - DJ de 26/03/2001; REsp nº 152455/SP - 2ª Turma - Rel. Min. HÉLIO MOSIMANN - DJ de 15/12/1997; REsp nº 117189/PR - 3ª Turma - Rel. Min. COSTA LEITE - DJ de 18/08/1997; ROMS nº 7275/SP - 2ª Turma - Rel. Min. ARI PARGENDLER - DJ de 10/03/1997. No mesmo sentido: REsp nº 30148/SP - 2ª Turma - Rel. Min. ARI PARGENDLER - DJ de 03/03/1997; REsp nº 128461/PR - 4ª Turma - Rel. Min. CÉSAR ÁSFOR ROCHA - DJ de 12/04/1999; REsp nº 160659/SP - 4ª Turma - Rel. Min. CÉSAR ÁSFOR ROCHA - DJ de 12/04/1999.
Observa-se, por fim, que a decisão em estudo, contraria dispositivos da Constituição Federal, notadamente, o art. 5º, caput (Princípio da Isonomia) e incisos X, XII, LIV (due process of law) e LV (contraditório e ampla defesa) e o art. 93, IX:
A uma, porque desconsidera o direito do devedor em processos de execução forçada, de participar de forma efetiva do processo executivo - provisório ou definitivo -, em primeiro grau, na medida em que determina (sem intimá-lo para que se manifeste e de forma unilateral) o envio de Ofício à Receita Federal a fim de localizar bens de sua propriedade. A duas, porque efetiva tal determinação (quebra de sigilo fiscal), por meio de simples despacho (J. DEFIRO), o qual, por causar gravame ao devedor, restringindo suas garantias fundamentais inscritas nos incisos X e XII, do art. 5º, e inciso III, do art. 1º, da Carta Política, traduz-se em ‘decisão de cunho interlocutório’, a reclamar a devida fundamentação, ainda que de forma concisa, mormente em se considerando as premissas balizadoras do atual estado democrático de direito, inspirado nas liberdades públicas concedidas aos cidadãos desde 05.10.88, de se manifestarem de forma ampla na defesa de seus direitos, não tendo feito o inciso LIV, do art. 5º, de sobredito Diploma Fundamental, nenhuma ressalva às categorias de processo judicial em que seriam aplicáveis tais garantias, permitindo-se presumir assim, sua ampla incidência a favor dos litigantes, em todos os tipos de processo judicial (conhecimento, execução e cautelar).
Ao fim e ao cabo, classificando como legítima a resistência que ora se preconiza no presente estudo, enquanto direito inalienável a ser exercido pelo devedor nos autos de execução forçada - provisória ou definitiva, invoca-se a notória preleção do douto e eminente Prof. CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, “ad litteram”:
“...ficaria perigoso impedir ou reprimir, no processo executivo, a resistência do demandado. Vedar-lhe os atos de resistência, ou limitá-los aquém do indispensável para que sua participação seja eficiente e apta. a legitimamente afastar os desvios e possíveis excessos, constituiria negação do contraditório no processo executivo. Reduzir-se-ia a execução a mero procedimento arbitrário, perdendo significado a relação jurídica processual que ali se afirma existir” (Execução Civil, São Paulo, Malheiros, 1998, 6ª ed., p. 178-179). [1] Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: .................................. III - a dignidade da pessoa humana;
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