11 - Reforma do Judiciário e controle externo

 
ALEXANDRE DE MORAES - Secretário da Justiça
 

A criação de um "controle externo" ao Judiciário seria verdadeira afronta à República

O Início de um novo século, coincidente com o início de um novo governo federal, aumentou as expectativas de mudanças e reformas em diversos planos, tanto previdenciário e tributário quanto trabalhista e judiciário. Essas condições, que deveriam gerar a possibilidade de reforma estrutural e modernização do Estado, diversamente estão levando a ataques exagerados e desfocados em relação a um dos Poderes da República, o Poder Judiciário.

Fruto da excessiva politização da discussão com pitadas de desinformação, a criação de um "controle externo" vem sendo tratada como a grande solução para todos os problemas crônicos da justiça brasileira, em especial a acessibilidade e demora dos julgamentos.

A discussão que vem sendo travada parece ignorar a necessidade de reformas estruturais nos organismos estatais dos Três Poderes, exigência da evolução política, social e da redemocratização brasileira e que deve englobar o Executivo e o Legislativo, cujas estruturas, igualmente às antigas estruturas do Judiciário, também foram desgastadas com o tempo, pois parece ser consenso que a fórmula sobre a qual foram assentadas as regras básicas de funcionamento, primeiramente do Parlamento, e, em um segundo momento histórico, transferidas ao regime presidencial, estão desgastadas e superadas.

Há, pois, necessidade de repensar os Três Poderes, suas formas de atuação e seus relacionamentos com a sociedade, visando ao bem da democracia, sem contudo, falar-se em ingerência externa à qualquer dos Poderes ou em restrição às suas autonomias.

Fixada essa premissa, é inegável a necessidade de modernização na prestação jurisdicional, a redução de prazos e número de recurso, a introdução da informatização e tecnologia de ponta no desenvolvimento dos atos processuais, a agilização das decisões - pois justiça que tarda é justiça falha, pois gera impunidade - diferentemente do adágio popular (a justiça tarda mais não falha).

O que não se pode aceitar é, sob esse pretexto, moldar-se verdadeira intervenção na autonomia do Poder Judiciário, pois auxilio entre Poderes é necessário e republicano – intromissão é perigosa e antidemocrática.

A reforma do Poder Judiciário deve ser analisada sobre esse aspecto, afastando-se preconceitos, afastando-se questões menores e, principalmente, afastando-se conceitos erroneamente importados, que passam a ser tratados como verdades absolutas no cenário político brasileiro. Refiro-me ao controverso debate sobre controle externo da magistratura, que vem sendo discutido como grande solução para os problemas da Justiça, mesmo não existindo, nos moldes que se pretende imprimir no Brasil por altas esferas do poder federal, em nenhum país democrático da atualidade.

Alguns países europeus adotam, com diferentes nomenclaturas, uma espécie de Conselho Superior da Magistratura (Portugal, Espanha, França, Grécia e Itália), jamais, porém, com funções que permitam ingerência na autonomia e independência de julgar; outros países europeus, por sua vez, nem isso admitem (Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, Grã-Bretanha, Irlanda, Luxemburgo, Holanda e Suécia), como aliás, também não admitem os Estados Unidos e o Canadá, sem que com isso sejam considerados paises menos justos ou democráticos.

A criação, no Brasil, do Conselho Nacional de Justiça, como órgão do judiciário, será importante, podendo vir a assegurar maior agilidade e transparência social, mas, certamente não será a solução para todos os problemas da Justiça, tais como falta de verbas e infra-estrutura, ausência do número adequado de juizes, excesso de recursos no sistema processual.

A criação de um "controle externo", porém, seria verdadeira afronta à Republica, pois não se consegue conceituar um verdadeiro Estado Democrático de Direito sem a existência de um Poder Judiciário autônomo e independente, que exerça sua função de guardião das leis e garantidor dos direitos fundamentais, sem quaisquer vínculos de subordinação com os Poderes políticos.



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