319 - Adoção de um sistema de precedentes no Brasil como reflexo da atual ordem constitucional

 

THIAGO BALDANI GOMES DE FILIPPO[1] - Juiz de Direito

 


SUMÁRIO
: Introdução; 1. Direito fundamental do acesso à Justiça; 2. Breves considerações acerca da Common Law e da Civil Law; 3. Ordem Jurídica pós-Constituição de 1988; 4. Insegurança jurídica como reflexo da aplicação de normas principiológicas; 5. Sistema precedentalista dos EUA; 6. Regras de uniformização no direito brasileiro - tendência à adoção de um sistema precedentalista; Considerações finais.

 

RESUMO: Este trabalho refere-se à necessidade de adoção de um sistema de precedentes no Brasil, similar ao existente nos Estados Unidos da América, como reflexo da atual ordem constitucional, marcada pela ênfase aos princípios. Inicia-se tecendo considerações sobre o direito fundamental do acesso à Justiça, o qual inclui a prestação da tutela jurisdicional de forma razoavelmente previsível. Posteriormente, são feitas breves distinções entre a common law e a civil law. A seguir, analise-se a ordem constitucional atual, com o estímulo à aplicação de princípios na solução de conflitos, gerado pela existência de leis de conteúdo aberto. Após, alude-se sobre a insegurança jurídica existente pela aplicação dessas normas e, a partir de uma exposição sobre o sistema de precedentes dos EUA, identifica-se a preocupação brasileira atual com a uniformização da jurisprudência para, em seguida, concluir-se que a tendência é a adoção de um sistema de precedentes.

 

ABSTRACT: This work concerns the necessity of the adoption of a system of precedents in Brazil, similar to the one existent in the United States of America, as a reflex of the actual constitutional order, qualified by the emphasis on principles. It begins with considerations on the fundamental right of access to Justice, in which the reasonably predictable jurisdictional protection is included. Later, some brief distinctions are made between common law and civil law. As it follows, there is an analysis on the existent constitutional order, aiding the application of principles in the solution of disputes, generated by the existence of broad content laws. Later, there is a discussion about juridical insecurity that occurs because of the application of these rules e, starting from an exposition on the US system of precedents, the actual brazilian concern with a uniform jurisprudence is identified to, as it follows, concluding that the tendency is the adoption of a system of precedents. 


PALAVRAS-CHAVE:
precedentes. princípios. common law. tutela. justiça. 

 

KEY WORDS: precedents. principles. common law. protection. justice.


Introdução


A Constituição da República de 1988 inaugurou uma ordem constitucional marcada pela prevalência dos princípios sobre as regras, o que se afina com o ideal de Justiça, aproximando-se do Direito da Ética, pois os julgadores podem se valer desses preceitos abstratos para decidirem com equidade. Entretanto, o malefício desse sistema é a insegurança jurídica causada pelas mais diferentes interpretações, ensejando os mais variadas decisões para casos idênticos ou semelhantes. Portanto, a partir da análise do da common law, mais precisamente do sistema de precedentes dos EUA, enxerga-se, no direito brasileiro, uma tendência de uniformização da jurisprudência, identificando-se, pois, a necessidade de adoção da sistemática de precedentes, observando-se as vicissitudes do ordenamento jurídico pátrio, para se conferir segurança ao sistema e estabilidade nas relações jurídicas.


1.  Direito fundamental do acesso à Justiça


O direito de acesso à Justiça encontra-se previsto no artigo 5º, inc. XXXV, da Constituição da República. Está inserido, portanto, no rol dos direitos e garantias individuais, espécie dos direitos fundamentais. Nesse sentido, modernamente, ele não implica em conferir a todos, simplesmente, o direito de ação. Mais que isto, dele também decorre a necessidade de se prestar uma tutela jurídica justa e efetiva para o caso em particular.

        

É que, tratando-se de direito fundamental, a norma veicula pelo mencionado dispositivo deve ser interpretada em sua máxima efetividade possível (princípio da máxima efetividade dos direitos fundamentais).

        

Desse modo, a norma em comento implica, em um primeiro momento, em conferir a todas as pessoas o direito de demandarem, isto é, de obterem uma resposta de mérito do Poder Judiciário, ainda que de procedência, desde que preenchidos certos requisitos, a saber, as condições da ação.

        

Porém, em um segundo momento, o acesso à Justiça significa mais que direito a uma resposta de mérito. Abrange, de fato, a necessidade de prestação de uma tutela adequada a consertar a ameaça ou violação do direito material em pauta, justa, efetiva e prestada em um prazo razoavelmente curto.

        

Ao tecer comentários sobre a qualidade dos serviços jurisdicionais, à sua tempestividade e efetividade, Cândido Rangel Dinamarco escreve (2009, p. 117):

 

Um eficiente trabalho de aprimoramento deve pautar-se por esse trinômio, não bastando que o processo produza decisões intrinsecamente justas e bem postas mas tardias ou não traduzidas em resultados práticos desejáveis; nem sendo desejável uma tutela jurisdicional efetiva e rápida, porém injusta. Para a plenitude do acesso à justiça importa remover os males resistentes à universalização da tutela jurisdicional e aperfeiçoar internamente o sistema, para que seja mais rápido e mais capaz de oferecer soluções justas e efetivas. É indispensável que o juiz cumpra em cada caso o dever de dar efetividade ao direito, sob pena de o processo ser somente um exercício improdutivo de lógica jurídica.   

 

Portanto, o processo, assim como a tutela que se objetiva por meio dele, somente se legitima à medida em que ocorre o devido atendimento à situação jurídica de direito material que se é posta perante a apreciação do Poder Judiciário. Caso contrário, não passa de mero exercício de dialética e debates de teses jurídicas, insuficiente para a pacificação social, seu fim último. Nesse sentido, José Roberto dos Santos Bedaque leciona (2001, p. 19):

 

O processo não é mero instrumento técnico, nem o direito processual constitui ciência neutra, indiferente às opções ideológicas do Estado. Somente a conscientização, pelos processualistas, do caráter ético de sua ciência, da necessária identidade ideológica entre processo e direito substancial, permitirá que o instrumento evolua para melhor atender a seus escopos.

 

Desse modo, longe de se tratar de um ramo do Direito ensimesmado, o direito processual deve estar afinado com os escopos políticos e as necessidades maiores de uma Nação, situando-se de acordo com a realidade concreta dos jurisdicionados.

        

Assim, conforme salienta Rodolfo de Camargo Mancuso, (2007, p. 8) a resposta judiciária de qualidade deve ser: (a) justa (equânime e plausível); (b) jurídica (tecnicamente fundamentada e consistente); (c) tempestiva (vedação à excessiva duração do processo – art. 5º, LXXVIII, CF); (d) razoavelmente previsível (a jurisprudência dominante e suas súmulas vinculantes, persuasivas e impeditivas de recurso).

        

Aplaudem-se os esforços legislativos visando a conferir maior efetividade à tutela jurisdicional. Nesse sentido, a inserção em nosso sistema dos institutos da tutela antecipada e inibitória (ambos trazidos pela Lei n. 8.952/94), do procedimento monitório (Lei n. 9.079/95), do procedimento mais célere para se exigir o cumprimento de sentença (Lei n. 11.232/2006) e na execução de título extrajudicial (Lei n. 11.382/2006), apenas para mencionar algumas, dentre tantas outras alterações que vieram a contribuir com a celeridade e efetividade processual.

        

Louvam-se, também, os esforços interpretativos que, diariamente, exercitam magistrados, membros do Ministério Público e advogados os quais, esquivando-se de interpretação meramente literal e simplista do texto da lei, encontram a interpretação que mais se afina com a almejada celeridade.

        

Entretanto, sem deixar de se reconhecer a importância da celeridade da tutela, o presente trabalho foca-se na última característica apontada acima por Mancuso: a razoável previsibilidade das decisões como forma de se conferir qualidade às tutelas jurisdicionais.

        

Ademais, se são inegáveis os esforços visando à efetividade do processo, também é verdade que nosso País nunca contou com tantos feitos. Somente no Estado de São Paulo, para se ter um exemplo do mais populoso Estado da Federação, o total de processos supera 18 milhões, o que corresponde a quase 50% do movimento do resto do País. Somente no ano de 2008, os juízes do Estado de São Paulo receberam 6.153.649 novas ações, realizaram 1.443.310 audiências e proferiram 3.880.614 sentenças (2.102 cada), o que equivale a 5,75 sentenças por dia corrido ou 9 por dia útil[2].

        

Ora, dentro do universo de feitos existente no Brasil, há os mais variados entendimentos sobre temas idênticos ou muito parecidos, o que gera, inegavelmente, insegurança jurídica e proliferação de ações sobre o mesmo assunto. Em última análise, acarreta, até mesmo, desprestígio ao próprio Poder Judiciário, quando, muitas vezes, desrespeita-se, até mesmo, posicionamentos consolidados em matéria constitucional emanados pelo próprio Supremo Tribunal Federal.

        

Desse modo, é forçoso que existam instrumentos em nosso sistema para que as decisões sejam previsíveis, sem acarretar, obviamente, em lesão ao princípio da persuasão racional do juiz (livre convencimento motivado). Conforme sustenta Luiz Guilherme Marinoni (2009, p. 48):

 

Trata-se de grosseiro mal entendido, decorrente da falta de compreensão de que a decisão é o resultado de um sistema e não algo construído de forma individual e egoística por um sujeito que pode fazer valer a sua vontade sobre todos os que o rodeiam e, assim, sobre o próprio sistema de que faz parte. Imaginar que o juiz tem o direito de julgar sem se submeter às suas próprias decisões e às dos tribunais superiores é não enxergar que o magistrado é uma peça no sistema de distribuição de justiça e, mais do que isto, que este sistema serve ao povo.

 

Torna-se, pois, necessário o estudo do sistema precedentalista da Common Law e o reconhecimento de que se trata de mecanismo importante na atual ordem jurídica, como tem se apresentado neste País após a Constituição de 1988.

 

2. Breves considerações acerca da Common Law e da Civil Law


Há duas grandes famílias de Direito no mundo: os ordenamentos do Civil Law e aqueles afetos ao Common Law. Este teve sua origem na Inglaterra e se expandiu para vários outros países que outrora foram dominados pelo Reino Inglês. É adotado pelos EUA, Áustria, Bangladesh, Barbados, Canadá (Província de Quebec), Guiana, Hong Kong, Índia, Inglaterra, Nigéria, entre outros. Aqueles são os países que assentam suas origens na tradição jurídica da Europa continental, mormente no sistema romano-germânico, sendo adotado pela maioria dos países.  

        

Nessa esteira, importante constatação faz Lawrence M. Friedman (2002, p. 8):

 

Nobody outside the circle of English domination in fact has ever adopted the common law. In modern times, a number of non-Western countries have shopped around for a Western legal system, which (they thought) would do a better job of catapulting them into the contemporary world than their indigenous systems. Japan and Turkey are famous examples. In no case did such a country choose the American or English model. In every case, what was chosen was civil law, continental European law. Why? One answer is that these are codified systems. Their basic rules take the form of codes – rationally arranged mega-statutes, which set out the guts of the Law, the essential concepts and doctrines. In theory, the judges have no power to add or subtract from the law, which is entirely contained within the codes. Their only task is to interpret these rules. The core of the common law, on the other hand, was essentially created by judges, as they decided actual cases. The common law grew, shifted, evolved, changed prismatically, over the years, as it confronted real litigants, and real situations. But as result, it became hard to find and to indentify “the law”. The common law was, in a way, everywhere and nowhere – it was an abstraction, scattered among thousands of pages of case reports. It was not, in short, package for export (tradução livre: ninguém fora do círculo da dominação inglesa de fato adotou a common law. Em tempos modernos, alguns países não-ocidentais procuraram importar modelos jurídicos do ocidente, os quais (segundo eles pensaram) funcionariam melhor para os impulsionar no mundo contemporâneo do que seus sistemas nativos. Japão e Turquia são exemplos famosos. Em nenhum caso país como tal escolheu o modelo americano ou inglês. Por quê? Uma resposta é que se trata de sistemas codificados. Suas regras básicas assumas a forma de códigos – mega-lei racionalmente estruturadas, as quais estabelecem as regras do ordenamento, os conceitos básicos e doutrinas. Teoricamente, os juízes não têm poder para acrescerem ou subtraírem a lei, a qual é inteiramente contida nos códigos. A common law, por outro lado, foi essencialmente criada pelos juízes, à medida que decidiam os caos. A common law cresceu, alterou-se, evoluiu e mudou de prisma, ao longo dos anos, à medida que confrontava litigantes de fato e situações reais. Porém, como resultado, tornou-se difícil se encontrar e identificar “o Direito”. A common Law estava, de certo modo, em todos os lugares e em lugar nenhum – uma abstração, espalhada entre milhares de páginas de livros sobre os casos. Não foi, em suma, empacotada para exportação. 

 

Explica-se, assim, o motivo pelo qual apenas os países que um dia foram dominados pelo império inglês possuem o sistema da common law, pois este não se trata de um “dado”, algo que possa ser estabelecido do “dia para a noite”, como o sistema codificado próprio da civil law. Pelo contrário, reflete o dia-a-dia dos tribunais, com a construção paulatina de entendimentos sobre dado caso.

 

Uma observação, no entanto, deve ser feita com relação aos Estados Unidos. Conforme salienta Guido Soares, trata-se, em verdade, de um sistema misto, uma combinação entre Common Law e Civil Law, apesar de se verificar uma preponderância da Common Law. Nos dizeres do autor (1999, p. 52):

 

Os EUA, salvo o Estado de Louisiana, são considerados um sistema misto, conquanto pertencente à Common Law (e a Escócia, Israel, África do Sul e Filipinas, países de sistema misto, pertencentes à família romano-germânica). Nos EUA, as antigas possessões espanholas, como a Califórnia e o Texas, embora reflitam, em alguns aspectos dos direitos de família, algo das leis dos antigos colonizadores, certamente são do sistema da common law; a Louisiana, contudo, dentro dos EUA, é o único Estado da Federação que se conservou fiel aos primeiros colonizadores franceses e espanhóis, uma vez que pertence à família dos direitos romano-germânicos.

          

Uma das diferenças marcantes entre os dois sistemas é o fato de, na Civil Law, ser utilizado o método dedutivo (geral para o particular), ao passo que, na Common Law, utiliza-se o método indutivo (particular para o geral), para o estudo e solução de casos concretos.

        

Essa diferença salta aos olhos logo no primeiro dia de aula na Faculdade de Direito. Um aluno que, em seu primeiro dia no Curso de Direito, já estuda Direito Civil, por exemplo, no Brasil, iniciará seus estudos a partir da leitura da Lei de Introdução ao Código Civil para adentrar, em três ou quatro aulas, no estudo pormenorizado dos artigos do Código. Irá estudar, portanto, normas gerais e, a partir delas, formará seu raciocínio jurídico. Portanto, ao elaborar uma peça, um parecer ou uma decisão, seu pensamento deverá ser sob a forma de um silogismo: a premissa maior é a lei, a premissa menor o caso concreto e a conclusão é a solução almejada.

        

Por outro giro, um aluno que inicia seus estudos em uma Faculdade de Direito dos EUA, por exemplo, em seu primeiro dia de aula dificilmente lerá algum artigo de lei. Seu estudo dar-se-á a partir de um caso, interpretando-o e extraindo dele (ou de um conjunto de casos) a regra jurídica a ser aplicada. Portanto, quando ele for elaborar uma peça processual, um parecer ou uma decisão, sua decisão estará voltada, precipuamente, para julgados que já tenham decidido casos idênticos ou semelhantes, obtendo-se, pois, de uma situação análoga, a regra que pretende subsumir a dada hipótese.

        

Assim, ainda nos EUA, se o assunto é controle de constitucionalidade, a regra é extraída do caso Marbury v. Madison (1803). Para a questão da separação de poderes, o caso é Morrison v. Olson (1988); para a separação entre Igreja e Estado, Lee v. Weisman (1992); para a liberdade de expressão, Brandenburg v. Ohio (1969), e assim por diante. Trata-se de casos decididos pela Suprema Corte dos EUA, a qual, por meio de ato totalmente discricionário, decide os casos que serão por ela julgados, de acordo com a importância a eles atribuída no tocante à Nação, como um todo, algo semelhante ao instituto da repercussão geral, trazida ao sistema brasileiro pela Emenda Constitucional n. 45/2004.

        

Assim, se na Civil Law o papel da doutrina assume grande relevância, pois atua para, de certa forma, direcionar a interpretação da legislação, no sistema da Common Law ela possui relevância secundária, pois a interpretação do sistema (dictum) encontra-se nos próprios fundamentos da decisão, cujo holding (ratio decidendi) tem força de lei.

        

É bom que se frise que na Common Law o Poder Legislativo também faz leis, as quais são hierarquicamente superiores às judge-made laws (precedentes de observância obrigatória). Entretanto, elas serão aplicadas apenas nas lacunas destas. Assim, apesar de gozarem de primazia, elas são residuais, pois apenas vão completar os vácuos deixados pela ausência de julgado relativo a determinado caso. Nesse aspecto, Guido Fernando Silva Soares arremata: “Embora seja o case law a principal fonte do direito, pode ele ser modificado pela lei escrita que, nos EUA, lhe é hierarquicamente superior; diz-se, então, que um case foi ´reversed by statute´” (1999, p. 38).

        

Outra questão de relevo, por se tratar de aparente traço distintivo entre os dois sistemas é a diferenciação entre as teorias unitária e dualista do ordenamento jurídico. Segundo Dinamarco (2009, p. 136-137):

 

Trata-se das teorias segundo as quais o escopo do processo seria a justa composição da lide ou a atuação da vontade concreta do direito. A primeira delas identifica-se com a teoria unitária do ordenamento jurídico (Carnelutti) e a segunda, dualista (Chiovenda, Liebman). O ordenamento jurídico seria unitário se processo e direito material se fundissem numa unidade só e a produção de direitos subjetivos, obrigações e concretas relações jurídicas entre sujeitos fosse obra de sentença e não da mera ocorrência de fatos previstos em normas gerais. A corrente dualista afirma que no universo do direito de origem romano-germânica (civil law) a ordem jurídica divide-se em dois planos muito bem definidos, o substancial e o processual, cada qual com funções distintas. O direito material é composto por normas gerais e abstratas, cada uma delas consistente numa tipificação de fatos (fattispecie – p.ex., causar dano a outrem) e fixação da consequência jurídica desses fatos. (v.g., a obrigação de indenizar): sempre que ocorre na vida concreta algum fato que se enquadre no modelo definido naquela previsão legal, automaticamente se desencadeia a sanctio juris estabelecida no segundo momento da norma abstrata. Direitos subjetivos, obrigações e relações jurídicas constituem criação imediata da concreta ocorrência dos fatos previstos nas normas: a sentença não os cria nem concorre para a sua criação.


Devido à característica de criação do direito, prevalece na Common Law a idéia da teoria unitária. Assim, nos meandros das leis emanadas pelo Legislativo, que veiculam preceitos de cunho abstratíssimo e abertos, são produzidas outras leis, a partir do julgamento de casos concretos, as quais, sem desobedecer àquelas, vão integrar o sistema, conferindo-lhe uma feição especial. Admitindo ser impossível se adequar a pirâmide Kelseniana à Common Law, Guido Soares confessa (1999, p. 54):

                                     

Inútil buscar uma imagem de figura geométrica, pelo menos na geometria cartesiana, que permita descrever a Common Law; se existe uma figura que se possa aproximar à mesma, seria a de uma colcha de retalhos, que cumpre, à perfeição, sua finalidade, que é dar abrigo à sociedade, e pensar os seus ferimentos, representados em violações da paz social.

        

Apesar de, tradicionalmente, prevalecer em nosso sistema o caráter dualista do ordenamento jurídico, passa-se a pensar, nos dias atuais, no caráter unitário desse sistema. Isto porque a Constituição de 1988 veiculou normas principiológicas (de cunho abstratíssimo e de baixa densidade normativa) e um extenso rol de direitos fundamentais que norteiam e orientam toda a legislação infraconstitucional, pautando-se, sempre, pelo valor-fonte de todo o sistema, a saber, a dignidade da pessoa humana, nos termos do art. 1º, inc. III, da Constituição.

 

Nesse aspecto, adquire relevo a função do juiz, como agente integrador da legislação aos comandos supremos da Lei Maior e de seu ato maior, a sentença, como ato de Estado legítimo a criar direitos e obrigações, a partir da integração entre as normas. 


3. Ordem Jurídica pós-Constituição de 1988


A Constituição da República, promulgada em 05 de outubro de 1988, instaurou uma nova ordem jurídica, marcando a transição de um Estado de regime autoritário para um Estado Democrático de Direito, marcado, precipuamente, conforme mencionado, pelo respeito à dignidade da pessoa humana como substrato de todo o ordenamento jurídico e pela necessidade de se garantir condições sócio-econômicas mínimas para que todos se esmerar na busca de seus sonhos e aspirações, objetivando-se uma igualdade ontológica. Desse modo, como escreve Hannah Arendt (2007, p. 335):

 

A igualdade, em contrate com tudo o que se relaciona com a mera existência, não nos é dada, mas resulta da organização humana, porquanto é orientada pelo princípio da justiça. Não nascemos iguais; tornamo-nos iguais como membros de um grupo por força da nossa decisão de nos garantirmos direitos reciprocamente iguais.

 

A atual Constituição da República produziu, pois, um sentimento de fidelidade constitucional, de reconhecimento e respeito às normas por ela estabelecidas. O Direito Constitucional figura, assim, no centro de todo o ordenamento jurídico, a fim de iluminar todos os outros ramos do Direito, conferindo-lhes legitimidade, a partir de preceitos mais ou menos abstratos e de alta carga axiológica.

        

Nesse diapasão, após a superação do jusnaturalismo e do positivismo clássico, nos dizeres de Barroso, esse novo Direito Constitucional é marcado, filosoficamente, pelo pós-positivismo, movimento tendente a proclamar a “...ascensão de valores, o reconhecimento da normatividade dos princípios e a essencialidade dos direitos fundamentais”. (Barroso, 2008, p. 342).

        

Reaproximam-se, pois, Direito e Ética, visando à realização de Justiça, uma vez que, conforme assinalou José Renato Nalini (2008, p. 42):

 

A tragédia da justiça humana é que a incidência da lei e a observância de ritos não coincide sempre e inevitavelmente à correção do injusto. Os Romanos já haviam reconhecido que o excesso de direito conduzia à mais rematada injustiça. Aristóteles, ao formular a teoria do justo meio, evidenciou que a moderação, o equilíbrio e a distância dos excessos representaria o ideal do justo. Justo humano que, para se aproximar do ideal de justiça, precisa ser temperado pela equidade.

 

Barroso (2005) também faz referência, como marcos teóricos desse novo Direito Constitucional, ao princípio da força normativa da Constituição e a nova interpretação constitucional.

 

Sobre o princípio da força normativa da Constituição, Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e Paulo Gustavo Gonet Branco sintetizam (2008, p. 118):

 

Reduzindo-o à sua expressão mais simples, poder-se-ia dizer que esse cânone interpretativo consubstancia um conselho – Friedrich Müller nos fala em apelo – para que os aplicadores da Constituição, na solução de problemas jurídico-constitucionais, procurem dar preferência àqueles pontos de vista que, ajustando historicamente o sentido das normas, confiram-lhe maior eficácia. Considerando que toda norma jurídica – e não apenas as normas da Constituição – precisa de um mínimo de eficácia, sob pena de perder ou sequer adquirir a vigência que depende a sua aplicação, impõe reconhecer que, ao menos sob esse aspecto, o princípio da força normativa da Constituição não encerra nenhuma peculiaridade da interpretação constitucional, em que pese a sua importância nesse domínio hermenêutico, um terreno onde, sabidamente, qualquer decisão, ao mesmo tempo que resolve um problema constitucional em concreto, projeta-se sobre o restante do ordenamento e passa a orientar a sua interpretação.

 

Do princípio em pauta decorre a necessidade de uma nova interpretação constitucional. Ela decorre, basicamente, do entendimento que as normas, na grande maioria dos casos, são polissêmicas, isto é, possuem mais de uma interpretação plausível. Portanto, o papel do intérprete já não mais se resume a mero exercício de subsunção, visando apenas identificar qual a norma aplicável ao caso sob análise, mas, sobretudo, sua atividade é de ponderação, devendo identificar quais os princípios colidentes e decidir qual ou quais deles, no caso em análise, fornece(m) a melhor solução. Nesse sentido, Barroso adverte (2008, p. 346):

 

As cláusulas constitucionais, por seu conteúdo aberto, principiológico e extremamente dependente da realidade subjacente, não se prestam ao sentido unívoco e objetivo que uma certa tradição exegética lhes pretende dar. O relato da norma, muitas vezes, demarca apenas uma moldura dentro da qual se desenham diferentes possibilidades interpretativas.

 

Ao comentar em específico o papel do juiz, Cláudia Fonseca Morato Pavan escreve (2008, p. 455):

 

A atuação da jurisprudência não é mais, hoje em dia, como se dava à época da Escola da Exegese, limitada à declaração de qual é a lei aplicável ao caso presente, com a adoção, quase que exclusiva, do método gramatical de interpretação. Em verdade, não há, no direito positivo, resposta pronta para todos os casos que são levados ao Judiciário; o papel do juiz não é apenas o de “exegeta-boca-da-lei”; a função jurisdicional não é uma função mecânica, mas sim, uma função viva.

 

Nessa esteira, conforme Owen Fiss (2004, p. 36), a função do juiz é conferir significado concreto e aplicação aos valores constitucionais. Nos EUA, desde a célebre decisão do Justice Marshall em Marbury v. Madison, datada de 1803, já de tinha essa concepção. Conforme salientam John Nowak e Ronald Rotunda (2004, p. 4-5):

 

Marshall believed that the people of the nation had the right to established binding, enforceable principles for the governing of society (...) The fact that the people chose a written Constitution with fundamental principles  to bind the government in the future was evidence that the Constitution should be the superior and binding law. If the Constitution was the superior law, then an act repugnant to it must be invalid (tradução livre: Marshall acreditaca que o povo da nação tinha o direito de estabelecer princípios obrigatórios e executáveis para o governo da sociedade (...) O fato que as pessoas escolheram uma Constituição escrita com princípios fundamentais para obrigar o governo no futuro foi uma evidência que a Constituição deve ser lei superior e de observância obrigatória. Se a Constituição é lei superior, então um ato contrário a ela deve ser inválido).

 

Carlos Maximiliano, mesmo antes da Constituição de 1988 já declarava (1979, p. 59);

 

A praxe, o ensino e a ciência não se limitam a procurar o sentido de uma regra e aplicá-lo ao fato provado; mas também, e principalmente, se esmeram em ampliar o pensamento contido em a norma legal à medida das necessidades da vida prática. Além do significado de uma frase jurídica, inquirem também do alcance da mesma.

 

A interpretação, sobretudo, deve ser pautada também pelo princípio da razoabilidade, o qual decorre, inclusive, segundo corrente de pensamento que prepondera nos EUA, dos direitos fundamentais. Chemerinsky ensina (2005, p. 523-524):

 

Substantive due process, as that phrase connotes, asks whether the government has an adequate reason for taking away a person’s life, liberty or property. In other words, substantive due process looks to whether there is a sufficient justification for the government´s action (tradução livre: devido processo substancial, como a frase sugere, procura investigar se o governo tem uma razão adequada para retirar a vida, liberdade ou propriedade de uma pessoa. Em outras palavras, devido processo substancial vai perquirir se há uma justificativa suficiente para a ação governamental)

 

Assim, sem menosprezar métodos tradicionais, a nova interpretação constitucional propõe outros meios, levando-se em consideração toda a principiologia que se extrai de seu texto, a qual contém, por natureza, alta carga axiológica, sendo veiculada por normas abertas, as quais necessitam da devida integração para regularem, de forma eficiente, as situações da vida que abarcam. Isto se deve, por conseguinte, à constatação de que nem sempre os métodos tradicionais de interpretação serão idôneos à concretização da vontade constitucional.

        

Dessa forma, constata-se o relevo e importância que adquiriam os princípios, em detrimento das regras. Princípios são “normas com alto grau de abstração e baixa densidade semântico-normativa” (Rothenburg: 2003, p. 18), ao contrário das regras, as quais apresentam justamente as características opostas, correspondendo, nos dizeres de Ronald Dworkin, à lógica do “tudo ou nada” (2002, p. 32).

          

Princípios não são apenas conselhos, orientações para a aplicação das regras de conduta, despidos de coercibilidade. Assim como as regras, possuem natureza normativa. Diferenciam-se das regras, entretanto, pelos seguintes fatores, apontados por Robert Alexy (2008, p. 90-91):

 

Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes. Já as regras são normas que são sempre ou satisfeitas ou não satisfeitas. Se uma regra vale, então, deve se fazer exatamente aquilo que ela exige; nem mais, nem menos. Regras contêm, portanto, determinações no âmbito daquilo que é fática e juridicamente possível.

 

Nessa esteira, Luis Roberto Barroso também apresenta a seguinte distinção (2008, p. 351-352):

 

Regras são, normalmente, relatos objetivos, descritivos de determinadas condutas e aplicáveis a um conjunto delimitado de situações. Ocorrendo a hipótese prevista no seu relato, a regra deve incidir, pelo mecanismo tradicional da subsunção: enquadram-se os fatos na previsão abstrata e produz-se uma conclusão. A aplicação de uma regra se opera na modalidade tudo ou nada: ou ela regula a matéria em sua inteireza, ou é descumprida. Na hipótese do conflito entre duas regras, só uma será válida e irá prevalecer. Princípios, por sua vez, contêm relatos com maior grau de abstração, não especificam a conduta a ser seguida e se aplicam a um conjunto amplo, por vezes indeterminado, de situações. Em uma ordem democrática, os princípios freqüentemente encontram em tensão dialética, apontando direções diversas. Por essa razão, sua aplicação deverá ocorrer mediante ponderação: à vista do caso concreto, o intérprete irá aferir o peso que cada princípio deverá desempenhar na hipótese, mediante concessões recíprocas, e preservando o máximo de cada um, na medida do possível. Sua aplicação, portanto, não será no esquema tudo ou nada, mas graduada à vista das circunstâncias representadas por outras normas ou por situações de fato.

 

Desse modo, tem-se que a vontade constitucional apenas será efetivada à medida que os princípios por ela estabelecidos tiverem a devida aplicação.

        

No mais, observe-se que toda a explanação acima acerca da nova interpretação constitucional adquiriu maior relevo, também na legislação infraconstitucional, com a entrada em vigor do Código Civil de 2002. Este diploma, ao lado dos paradigmas da operabilidade e sociabilidade, assentou-se no paradigma da eticidade, aproximando-se também o Direito Privado de preceitos éticos e morais, com incidência direta nas várias relações jurídicas que o homem comum faz parte diariamente.

        

Ademais, o Código Civil se vale de cláusulas gerais e conceitos legais indeterminados, verdadeiras “janelas abertas” à aplicação dos valores e preceitos constitucionais nas relações jurídicas privadas. Judith Martins-Costa assinala (2002, p. 118):

 

Estas janelas, bem denominadas por Irti de “concetti de collegamento” com a realidade social são constituídas pelas cláusulas gerais, técnica legislativa que conforma o meio hábil para permitir o ingresso, no ordenamento jurídico codificado, de princípios valorativos ainda não expressos legislativamente, de “standards”, arquétipos exemplares de comportamento, de deveres de conduta (e, por vezes, nos casos concretos, também não advindos da autonomia privada), de direitos e deveres  configurados segundo os usos do tráfego jurídico, de diretivas econômicas, sociais e políticas, de normas, enfim, constantes de universos metajurídicos, viabilizando a sua sistematização e permanente ressistematização no ordenamento positivo. Nas cláusulas gerais a formulação da hipótese legal é procedida mediante o emprego de conceitos cujos termos têm significado intencionalmente vago e aberto, os chamados “conceitos jurídicos indeterminados”. Por vezes – e aí encontraremos as cláusulas gerais propriamente ditas –, o seu enunciado, ao invés de traçar punctualmente a hipótese e as consequências, é desenhado como uma vaga moldura, permitindo, pela vagueza semântica que caracteriza os seus termos, a incorporação de princípios e máximas de conduta originalmente estrangeiros ao corpus codificado, do que resulta, mediante a atividade de concreção destes princípios, diretrizes e máximas de conduta, a constante formulação de novas normas.

 

O sistema aberto viabiliza, nessa medida, a integração da legislação infraconstitucional com o Texto Maior, ensejando a chamada eficácia privada (ou horizontal) dos direitos fundamentais, que se assenta, conforme aduz Gustavo Tepedino (2004, p. 337), na “tábua axiológica” composta pelos princípios da dignidade humana (art. 1º, inc. III, da CF), igualdade (art. 5º, da CF) e solidariedade social (art. 3º, inc. I, da CF).


4. Insegurança jurídica como reflexo da aplicação de normas principiológicas


Extrai-se da abordagem acima que a atual Ordem Constitucional estatuiu a natureza normativa aos princípios, podendo estes ser, tranquilamente, os fundamentos jurídicos de uma decisão judicial. Trata-se, inclusive, de prática fomentada pelo sistema, à medida que a nova interpretação constitucional, que se espraiou também para toda a legislação, principalmente após a sistemática adotada pelo Código Civil de 2002, adquire o espaço dantes ocupado tão somente pelos métodos clássicos de interpretação.

        

Conforme mencionado, o juiz adquire papel mais ativo e sua atividade torna-se mais complexa, pois exerce, em várias oportunidades, juízo de ponderação, em detrimento de mero juízo de subsunção, com o qual se contentava a Escola da Exegese.

        

Isto é extremamente benéfico, pois visa a pautar o Direito por preceitos éticos e morais, de cunho abstrato, comprometendo-se o ordenamento não com a aplicação pura das leis, mas, sobretudo, com a realização de Justiça.

        

Aponta-se, todavia, como “ponto negativo” dessa sistemática a patente insegurança jurídica gerada pela aplicação dos princípios. É que, por possuírem alto grau de abstração e grande conteúdo axiológico, a aplicação dos princípios, sua abrangência e extensão ficam a cargo de cada julgador, ensejando a falta de segurança jurídica aos jurisdicionados e relativo desprestígio do próprio Judiciário, uma vez que, para soluções idênticas ou muito semelhantes, apresentam-se soluções das mais díspares possíveis.

        

Atentando-se justamente para o novo papel assumido pelo julgador, em virtude da atual ordem constitucional, Marinoni destaca (2009, p. 47):

 

O juiz do civil law passou a exercer, com o tempo, papel inconcebível diante da tradição do civil law e tão criativo quanto o do seu colega da common law. O juiz que controla a constitucionalidade da lei obviamente não é submetido à lei. O seu papel nega a idéia de supremacia do legislativo. O juiz, mediante as técnicas da interpretação conforme e da declaração parcial de nulidade sem redução de texto, confere sentido à lei. A feição judicial da imposição do direito também é clara – ou ainda mais evidente – ao se prestar atenção na tarefa que o juiz exerce quando supre a omissão do legislador diante dos direitos fundamentais. Ora, isto apenas pode significar, aos olhos dos princípios e da tradição do civil law, uma afirmação do poder judicial com força de direito, nos moldes em que se concebe no common law. No entanto, percebe-se que há, no civil law, preocupação em negar ou obscurecer – ou talvez tornar irrelevante – o papel que o neoconstitucionalismo impôs ao juiz. Há completo descaso pelo significado da nova função judicial. Não há qualquer empenho em ressaltar que o juiz, no Estado constitucional, deixou de ser um mero servo do legislativo. A dificuldade em ver o papel do juiz sob o neoconstitucionalismo impede que se perceba que a tarefa do juiz do civil law, na atualidade, está muito próximo da exercida pelo juiz do common law. É exatamente a cegueira para a aproximação destes juízes que não permite enxergar a relevância de um sistema de precedentes no civil law (grifo nosso).

        

Posto isto, alude-se que a uniformidade das decisões judiciais, importante mecanismo a ser adotado em vista do novo papel desempenhado pelo magistrado, vai ao encontro dos anseios sociais por segurança jurídica e estabilidade das relações. Trata-se da regra do stare decisis et non quieta movere, explicada por Cláudia Pavan da seguinte forma (2008, p. 459):

 

O stare decisis et non quieta movere, adotado por países anglo-saxões, tem a função de conferir uniformidade às decisões judiciais. Essa regra é traduzida da seguinte forma: estar com as coisas decididas e não mover as quietas. Em outras palavras, significa que, após a decisão do tribunal de cúpula, os juízes das demais instâncias do Poder Judiciário naturalmente passam a aplicar o entendimento do juízo colegiado mais elevado.

          

        

Ao analisar o sistema dos EUA, Guido Soares, citando o Prof. E. Allan Farnsworth aponta quatro qualidades do sistema de precedentes (1999, p. 41):

 

1ª) equality (possibilidade de que, em futuros casos iguais ou semelhantes aos julgados, a solução tenderá a ser a mesma); 2ª) predictability (virtualidade de que futuros casos com elementos factuais semelhantes aos julgados serão julgados da mesma maneira, o que permite ao advogado, em particular ao consultor, melhor aconselhamento de seus clientes na prevenção de futuros pleitos; 3ª) economy (o que denominamos economia processual, uma vez que já há issues decididos, as matérias novas serão resolvidas com mais rapidez); 4ª) respect (soluções que dão grande responsabilidade, pela sua força suasória, ao próprio Poder Judiciário).


Portanto, em atenção aos ideais da igualdade, previsibilidade, economia e respeito, adquire revelo o sistema precedentalista dos EUA como importante ferramenta da segurança jurídica. Passa-se, pois, a tecer breves comentários sobre ele para, em seguida, analisar-se a maneira pela qual o ordenamento jurídico pátrio caminha no sentido de se adotar um sistema precedentalista.


5. Sistema precedentalista dos EUA


Os EUA, conforme já mencionado neste trabalho, pertencem, em sua essência, à família da common law, apesar de apresentarem vicissitudes que fazem dele um sistema misto. Uma das características mais marcantes de seu sistema jurídico, reflexo da existência daquele sistema, é a adoção da sistemática dos precedentes. Estes, na visão do Prof. Cole, podem ser conceituados como (2008, p. 14):

 

The legal rule used by an appellate court in the forum in which the case has been decided, applied to the relevant facts which create the issue before the court for decision. Stare decisis is the policy which requires that the courts subordinate to the appellate court establishing the precedent follow that precedent and not “disturb a settled point (tradução livre: a regra legal usada por uma corte de apelação dentro dos limites de jurisdição nos quais o caso foi decidido, aplicada aos fatos relevantes que criaram a questão a ser decidida pela corte. Stare decisis é o instituto que demanda que as cortes subordinadas à corte de apelação que estabeleceu o precedente sigam-no e não “perturbe o ponto estabelecido”).

 

Nos EUA, a sistemática dos precedentes é vista como decorrência da própria estrutura do Judiciário (art. III, da Constituição daquele país), haurida da tradição inglesa. São entendidos, inclusive, como decorrência do próprio princípio da igualdade, no sentido de que seria impensável que as pessoas recebessem a mesma proteção das leis se não obtivessem a mesma decisão judicial para casos semelhantes levados à apreciação do Poder Judiciário.

        

Os precedentes podem ser de observância obrigatória (binding authority precedents) ou servirem apenas como um “conselho”, uma “sugestão” às demais cortes (persuasive authority precedents). Esclarece Sèroussi (2001, p. 110):

 

Os binding precedents, cuja autoridade é total, implicam: o respeito de um tribunal às suas próprias decisões; o respeito às decisões das jurisdições superiores pelos tribunais inferiores da mesma alçada; o respeito pelos juízos do Estado, em matéria de direito federal, às decisões judiciárias que emanam das jurisdições federais. Os persuasive precedents só têm autoridade reduzida, secundária, situando-se mais no plano da moral: um tribunal pode não seguir uma decisão tomada por um juízo que lhe é inferior; um tribunal de um Estado tem o direito de não seguir a decisão tomada por um tribunal de categoria equivalente que pertence a um outro Estado.

 

E quais são, exatamente, os precedentes de observância obrigatória? É sabido que nos EUA existem as cortes estaduais e federais. As primeiras julgam questões afetas às leis estaduais e, inclusive, questões federais às quais a Constituição não tenha atribuído competência exclusiva a cortes federais. Estas, por sua vez, julgam questões atinentes às leis federais, as quais, dentro da sistemática daquele país, são consideradas hierarquicamente superiores às leis estaduais (regra do pre-emption), ao contrário do que ocorre no Brasil, onde não se considera a existência dessa mencionada hierarquia, mas apenas a existência de níveis diversos de competência legislativa.

        

Pois bem, naquele país, a corte suprema de cada Estado e as cortes federais de apelação têm a aptidão de gerarem binding precedents dentro dos respectivos limites de jurisdição, ou seja, dentro dos limites territoriais do respectivo Estado ou dentro dos limites da “região” federal (federal circuits, na linguagem do sistema norte-americano).

        

No mais, em se tratando da Suprema Corte dos EUA, ela tem jurisdição nacional e, portanto, a aptidão de produzir binding precedents para todas as cortes do país.

        

Diz-se em todos os casos aptidão, pois somente haverá observância obrigatória se a decisão for tomada pela maioria da corte também no tocante às razões fundamentais da decisão. Assim, a tomada de decisões pela maioria ocorre nos EUA diferentemente da forma que é feita no Brasil. Neste, para que haja uma decisão tomada pela maioria, basta que haja coincidência quanto ao dispositivo. Assim, se um julgador chegar à mesma conclusão (dispositivo) a que chegou outro, haverá, de todo o modo, maioria. Nos EUA, a coincidência deve se dar, também, quanto às razoes fundamentais da decisão. Bem por isso, um voto proferido nos EUA é dividido em várias partes (Parte I, II, III etc.) para que outro julgador possa concordar com a razão da Parte I, por exemplo, e, mesmo que discorde das razoes expostas na Parte II, por hipótese, mas chegue à mesma conclusão, as razões expostas na Parte I podem ser contadas para somar à maioria.    

        

Não se deve confundir, entretanto, para se verificar o precedente, as razoes fundamentais para a decisão, extraídas a partir dos fatos relevantes existentes no processo, que irão formar o princípio ou regra de lei a ser obrigatoriamente aplicada a casos análogos (analogous cases) ou idênticos (directly on point cases) – holdings (ratio decidendi, no direito inglês) – com as demais razões periferias de que se valeram os julgadores para a argumentação jurídica de seus votos, chamadas dicta (obter dictum).

        

Assim, pondera Charles Cole (2008, p. 20):

 

The judge or lawyer attempting to ascertain the precedent from a prior case must know the relevant facts which the court used for purposes of decision in the prior case and the principle of law which the court applied to the relevant facts. The precedent of a case is, therefore, simply the principle of law or rule of law that was applied to the relevant facts for decision on the basis of the legal issue or issues actually presented to that court for decision. All statements of the court which are not necessary for the decision in that case are dicta (tradução livre: o juiz ou advogado desejoso de obter o precedente correto deve conhecer os fatos relevantes que a corte usou para a decisão e o princípio de lei aplicado aos fatos relevantes. O procedente de um caso é, assim, simplesmente o princípio ou regra de lei aplicado aos fatos relevantes para a decisão em cotejo com a questão ou questões jurídicas apresentadas à corte para decisão. Todas as outras declarações que não são necessárias para a decisão no caso são consideradas dicta.


Porém, é de se observar que nem sempre um caso levado à apreciação do Judiciário terá um binding precedent para “agasalhá-lo”. Várias vezes, mormente se consideradas as mudanças sociais e as multifacetadas situações surgidas, demandas inéditas são deflagradas. Trata-se dos chamados cases of first impression (casos de primeira impressão). Nestas hipóteses, o juízo estará livre para formar sua convicção, interpretando as leis emanadas do Legislativo de maneira mais livre e se valendo dos outros precedentes, meramente persuasive, cujas questões decididas possam ser aproveitadas, de alguma forma, para o julgamento do caso inédito.

        

No mais, faz-se importante esclarecer que o procedente, nas palavras do Prof. Cole, não está lapidado em rocha (2008, p. 24). Ele pode ser alterado pela mudança de leis ou pela alteração de entendimento da própria corte ou de corte superior (Suprema Corte), compreendendo que a norma estabelecida não possui mais razão de ser, em consonância com a nova realidade social. Diz-se, pois, que a decisão foi overruled. Mais uma vez, Charles Cole destaca (2008, p. 24):

 

The law-maker (the legislative branch of government) may change the basic law relating to the precedent, the passage of time and evolving culture may render the precedent obsolete, or the majority of the Court may change its judicial philosophy in such a manner to overrule prior precedent and establish new precedent (tradução livre: quem faz as leis (o órgão legislativo do governo) pode alterar a lei básica relacionada ao precedente, a passagem do tempo e evolução cultural pode deixar o precedente obsolete, ou a maioria da Corte pode alterar sua filosofia de tal forma a “revogar” o precedente anterior e estabelecer um novo).


Cumpre-se observar, ainda, que, em regra geral, o juiz de primeiro grau não tem autoridade para declarar revogado um precedente estabelecido por corte superior. Entretanto, em situações excepcionais, encontram-se decisões que deixam de aplicar determinado precedente, por entender que ele está flagrantemente obsoleto em virtude da nova realidade social. Obviamente, todavia, conforme adverte Cole (2008, p. 22), a parte prejudicada tem a oportunidade de recorrer e submeter à corte superior a apreciação da matéria, podendo ela revogar o precedente ou reformar a decisão judicial, preservando-o.      

        

Passa-se, a seguir, à identificação de certas regras brasileiras que evidenciam a preocupação com a uniformização da jurisprudência no direito pátrio e, em seguida, sustenta-se a necessidade da adoção de um sistema precedentalista como forma de diminuir incertezas, visando a maior segurança jurídica.



6. Regras de uniformização no direito brasileiro - tendência à adoção de um sistema precedentalista


Há certas regras no direito brasileiro que evidenciam a preocupação, neste sistema, com a uniformização das decisões judiciais, mediante a valorização das decisões tomadas por órgãos de instâncias superiores.

        

Existe, por exemplo, a disposição contida no parágrafo 3º do art. 475, do CPC, o qual dispensa o reexame necessário quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente.

        

Outro caso está no parágrafo 1º do art. 475-L, do CPC, segundo o qual é inexigível o título judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou ato normativo tidas pelo Supremo Tribunal Federal como incompatíveis com a Constituição Federal.

        

Ainda, outro caso que pode ser destacado está no art. 557, também do CPC, que impõe que o relator negue seguimento a recurso, dentre outras hipóteses, quando ele estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior.

        

Existem outros exemplos na legislação. Indubitavelmente, entretanto, que, de todos eles, o caso mais emblemático encontra-se nas disposições constitucionais atinentes às súmulas vinculantes. Trata-se de inovação trazida pela Emenda Constitucional 45/2004, que inseriu o art. 103-A na Lei Maior, dispositivo que demanda requisitos de forma e de fundo para sua elaboração e validade. Ela deverá ser aprovada por maioria qualificada de 2/3 dos votos do Supremo Tribunal Federal (8 Ministros), havendo de incidir sobre matéria constitucional que tenha sido objeto de decisões reiteradas pelo tribunal.

        

Exige o texto constitucional, ainda, que, para a validade da súmula, ela seja publicada na imprensa oficial. Procura-se assegurar o conhecimento do entendimento sumulado, assim como ocorre com as leis.

        

Determina o parágrafo 1º do artigo 103-A que a súmula terá por objetivo a validade, a interpretação, e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre os órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. Estão abrangidas, assim, as questões atuais sobre interpretação das normas constitucionais ou o cotejo destas com normas infraconstitucionais.

        

Exige-se, ainda, reiteradas decisões sobre matéria constitucional, ou seja, que a matéria seja objeto de outras discussões na Suprema Corte, impedindo-se que a súmula retire todo o seu fundamento de uma única decisão, mesmo que oriunda do Pleno.

        

O parágrafo 2º do artigo 103-A, da Constituição, regulamentado pela Lei n. 11.417, de 19/12/2006, dispõe que a aprovação, revisão ou cancelamento da súmula podem ser provocados por aqueles que têm legitimidade para o oferecimento de ação direta de inconstitucionalidade, cujo rol encontra-se no artigo 103, da Lei Maior.

        

Finalmente, o parágrafo 3º do mesmo artigo dispõe sobre o cabimento de reclamação direta ao Supremo Tribunal Federal contra ato, judicial ou administrativo, que tenha contrariado o teor da súmula. A conseqüência será a nulidade do ato administrativo ou cassação da decisão judicial e a determinação que outra seja proferida, sem se chocar contra o entendimento sumulado, que traça os próprios limites objetivos da súmula, não se desconhecendo a necessidade de se proceder às eventuais distinções (distinguishing) na aplicação.

        

No tocante às súmulas vinculantes, esclarecem Gilmar Mendes, Inocêncio Coelho e Paulo Gonet (2008, p. 965):

 

O precedente vinculativo, que se caracteriza pelo fato de a decisão de um alto tribunal ser obrigatória, como norma, para os tribunais inferiores, tem as nações anglo-americanas, a exemplo da Inglaterra, Canadá e Estados Unidos, como reputado ambiente natural, por serem eles de direito de criação eminentemente judicial.

 

Tem-se, nesse aspecto, que a necessidade que casos semelhantes sejam julgados de forma similar decorre do senso social de Justiça, atendendo ao princípio da segurança jurídica. Por óbvio, o julgamento similar de casos semelhantes fortalece a imagem do Judiciário. Isto porque, existindo padronização, torna-se mais difícil a reforma de uma decisão de primeiro grau. Como consequência, o número de processos nos tribunais sofreria sensível redução, possibilitando-se que apenas questões mais relevantes fossem por eles julgadas, quer por se tratar de casos inéditos, quer por se tratar de decisões que, devido às mudanças sociais, necessitem de reparos para acompanhá-las. No Brasil, a adoção de um sistema precedentalista, adaptado às realidades brasileiras, atenderia às exigências do princípio da segurança jurídica, estabilizando-se as relações sociais.

        

O sistema precedentalista brasileiro também teria seu fundamento constitucional no princípio da igualdade (art. 5º, caput, da CF), pois pessoas com conflitos de interesses semelhantes teriam, respeitadas as vicissitudes do caso concreto, a mesma resposta do Poder Judiciário, impossibilitando-se que os jurisdicionados fiquem à mercê das mais variadas e inusitadas interpretações judiciais, submetidos à verdadeira “loteria jurídica”, possibilitada pela aplicação principiológica como fundamento das decisões judiciais.

        

Outro aspecto de relevo quanto à adoção de um sistema precedentalista seria a diminuição também no número de leis editadas pelo Legislativo. Isto porque, como é cediço, para se tentar corrigir discrepâncias interpretativas, editam-se as mais variadas leis, visando ao esclarecimento e ao espancamento de dúvidas quanto a um assunto, com o objetivo de deixá-lo cada vez mais claro. Isto não é a função das leis. Por conceito, delas devem ser extraídas normas de “comandos genéricos e universais” (Ferraz Jr.: 2008, p. 90). Desse modo, se houvesse um sistema precedentalista, conferindo-se efeitos vinculantes aos casos idênticos ou semelhantes decididos pelas cortes superiores, evitar-se-ia essa “avalanche” legislativa, tão conhecida pelos brasileiros, passando a lei a cumprir o seu papel, de modo a estabelecer condutas genéricas e abstratas, deixando para o intérprete e agente integrador do fato ao direito (juiz), a função de conferir coerência ao sistema. Ora, as normas não devem ser extraídas apenas das leis. Estas veiculam normas gerais. As normas podem, e devem, ser extraídas das decisões judiciais, as quais servem para conferir concretude às disposições daquelas, devendo ser utilizadas da melhor e mais abrangente maneira possível. Conforme lembra Tércio Sampaio Ferraz Jr (2008, p. 94):

 

A nota de generalidade é um preconceito derivado da concepção de direito do século XIX, que identificou a norma jurídica com a lei. Ora, a lei contém um tipo de norma. É preciso reconhecer, porém, que é norma também a sentença do tribunal. O preconceito explica-se pelo temos dos privilégios, típicos das ordens jurídicas do Antigo Regime, anterior à Revolução Francesa. Supunha-se que a sentença deveria ser uma simples derivação lógica da norma geral, donde seu caráter normativo ser apenas derivado e não autônomo. Com isso se limitava o arbítrio judicial, não comum na sociedade pré-revolucionária.  

 

Posto isto, esclarece-se que, no caso brasileiro, o sistema precedentalista seria extraído a partir de uma releitura da coisa julgada material de decisões tomadas por cortes superiores, expandindo-se, como regra, seus limites subjetivos para atingirem situações jurídicas idênticas ou semelhantes, identificáveis pelo magistrado consoante a hipótese dos autos. Desse modo, as decisões colegiadas, como regra, teriam efeitos erga omnes àquelas hipóteses fático-jurídicas semelhantes, gerando, pois, coerência e coesão no ordenamento jurídico. 

        

Nesse sentido, as decisões tomadas pela maioria do pleno ou órgão especial dos Tribunais de Justiça dos Estados e Tribunais Regionais Federais, do Trabalho e Eleitorais seriam de observância obrigatória pelos juízes a eles vinculados e meros “conselhos” para os demais (como o são as decisões brasileiras na sistemática atual). O mesmo poderia ser estendido a Turmas Recursais (da Lei n. 9.099/95) e à Justiça Militar. Por outro giro, as decisões tomadas pela maioria do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça seriam nacionalmente obrigatórias.

        

No mais, à semelhança do que ocorre com o sistema precedentalista norte-americano, determinado precedente poderia deixar de subsistir por nova decisão do tribunal que o produziu ou pela entrada em vigor de nova lei que alterasse a base normativa que houvera justificado a edição do precedente.

        

Ainda, à semelhança do que ocorre nos EUA, o juiz brasileiro poderia deixar de aplicar um precedente, desde que, em sua fundamentação, justificasse que, devido às mudanças da sociedade, ele se tornou obsoleto, não mais subsistindo. É que, assim como as leis, os precedentes ficariam submetidos ao critério da razoabilidade, podendo não incidir no caso em concreto, desde que haja fundadas razões que justifiquem sua não-aplicação.


Considerações finais


Procurou-se identificar, no presente trabalho, a necessidade de adoção do sistema de precedentes no Brasil, como reflexo da ordem jurídica instalada pós-Constituição de 1988. É lógico que, para a instauração desse sistema, necessitaria de emenda à Constituição e respectiva alteração nos códigos de processo, para estabelecê-lo de acordo com a realidade brasileira, além da implementação de formas de publicidade das decisões vinculantes. Nos EUA, por exemplo, os profissionais do direito têm acesso aos precedentes por meio de periódicos ou por meio eletrônicos, como a Westlaw e Lexis. Mas, de toda forma, não se pode mais conceber que as normas apenas tenham de ser extraídas das leis. Em verdade, nada obsta que elas também sejam extraídas das decisões judiciais. Estas, em nossa tradição, têm sido conhecidas como a norma do caso concreto. Entretanto, em prol da segurança jurídica e estabilidade das relações, suas disposições devem ir mais além: seus efeitos devem ser estendidos para os casos idênticos ou semelhantes. Com isso, evitam-se as patentes disparidades de entendimento do Judiciário sobre o mesmo e a “avalanche” legislativa, prática que, infelizmente, instalou-se neste País.


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[1] Juiz de Direito no Estado de São Paulo; Mestrando em Ciências Jurídicas pela Faculdade Estadual de Direito do Norte Pioneiro – Jacarezinho/PR. Mestrando em Direito Comparado pela Universidade de Samford/EUA; tfilippo@tj.sp.gov.br

 

[2] Dados obtidos no periódico Tribuna da Magistratura – informativo da Associação Paulista dos Magistrados – Ano XVIII – Número 180 – Junho de 2009.


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