Magistrados e advogados debatem questões polêmicas do Direito Bancário em seminário da EPM no Gade 9 de Julho

Evento teve a participação de integrantes do CSM.

A EPM promoveu ontem (20) no Gade 9 de Julho o seminário Alguns aspectos polêmicos do Direito Bancário, com o apoio da Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo (OAB SP). Com painéis sobre contratos eletrônicos e combate às fraudes bancárias e aplicação da Lei do Superendividamento (Lei nº 14.181/21) nos contratos bancários, o evento teve 1.025 matriculados nas modalidades presencial e on-line, abrangendo 82 comarcas e 19 estados. A abertura teve a presença do presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Fernando Antonio Torres Garcia; do vice-presidente, desembargador Artur Cesar Beretta da Silveira; e do corregedor-geral da Justiça, desembargador Francisco Eduardo Loureiro.

O desembargador Roberto Nussinkis Mac Cracken, coordenador da área de Direito Bancário da EPM e do seminário, abriu os trabalhos. Ele agradeceu a participação de todos, em especial dos integrantes do Conselho Superior da Magistratura e dos palestrantes, e o apoio da direção da EPM e ressaltou o objetivo de debater aspectos polêmicos do Direito Bancário com magistrados, profissionais da área jurídica dos bancos e representantes da advocacia.

O corregedor-geral da Justiça, desembargador Francisco Loureiro, ressaltou que o tema é central para o Poder Judiciário em razão do volume de demandas de Direito Bancário, que constituem 30 a 40% do total da Seção de Direito Privado, e porque a matéria é um campo fértil para as demandas predatórias, com mais de um milhão de ações em tramitação, caracterizadas por comportamentos ilícitos, como falsificação de procurações, partes que não têm conhecimento do litígio e fracionamento de demandas. “É fundamental que esse tema seja debatido e apaziguado, para o bem dos usuários do serviço e do próprio Judiciário”, frisou. 

O desembargador Beretta da Silveira salientou a atuação dos coordenadores do curso na aproximação com as instituições financeiras com o objetivo de buscar soluções que evitem a judicialização das demandas. “A matéria do Direito Bancário é portentosa e as demandas infindáveis e, para fazer frente a isso tudo, é necessário estudos e conscientização, para que possamos prestar o melhor serviço”, enfatizou.

O presidente do TJSP, desembargador Fernando Torres Garcia, também destacou o alto índice de judicialização das questões que envolvem o Direito Bancário e a importância de buscar soluções. “Gastamos muitos recursos humanos e financeiros em pontos que poderiam ser direcionados para áreas mais sensíveis da sociedade, então faço votos que desse evento saiam deliberações que facilitem a vida do brasileiro de São Paulo, porque, quanto maior a eficiência, qualidade e presteza do serviço público que prestamos, melhor cumpriremos nossa missão constitucional”, asseverou.

Também compuseram a mesa de abertura os desembargadores Spencer Almeida Ferreira, também coordenador da área de Direito Bancário da EPM e do seminário; e Marcia Regina Dalla Déa Barone, coordenadora do Gade 9 de Julho.

Contratos eletrônicos e combate às fraudes bancárias

Iniciando as exposições, o juiz Vítor Frederico Kümpel recordou o crescimento acelerado do comércio eletrônico com a pandemia, sem os devidos cuidados de segurança, e falou sobre as medidas antifraudes, como a autenticação multifatorial, uso de biometria, proteção de dados pessoais e informação exaustiva ao consumidor; e os principais tipos de fraudes: phishing (links falsos), fraude de identidade, ataques man-in-the-middle (interceptação de comunicação entre cliente e instituição financeira e desvio de dados) e fraudes de pagamento eletrônico. Citou também os impactos dessas fraudes, como a perda financeira, danos à reputação e consequências legais e regulatórias, mas observou que a preocupação das instituições financeiras é a redução de custos e os resultados, ponderando que elas não alterarão a maneira de captação de ativos mais rápida e informal, se ela prepondera em relação a eventuais custos decorrentes de fraudes ou condenações por danos morais e materiais.

O advogado Paulo Celso Pompeu ponderou que o “inimigo” está do lado de fora, com diferentes tentativas de fraudes, e que o segredo para combater essa situação é a disseminação da informação. Destacou também a atuação das instituições financeiras contra as fraudes, por meio de serviços de atendimento aos clientes e monitoramento de operações, e o combate à litigância predatória, por meio de estruturas de segurança corporativa das instituições financeiras, monitoramento de documentos das ações e verificação da pretensão resistida, informando que em 90% das demandas predatórias não houve acionamento prévio das instituições financeiras.

O presidente da Comissão de Direito Bancário da OAB SP, Marcelo Tesheiner Cavassani, observou que atualmente 80% da movimentação bancária é feita pelos canais digitais e que a operação bancária é segura, com altos investimentos em ferramentas para combater a fraude, mas é necessário atenção e informação. Ele observou que há um assédio da advocacia para ingressar com ações contra bancos, com ou sem motivos, com base em entendimentos equivocados sobre a responsabilidade dos bancos, e ponderou que pode haver culpa concorrente ou exclusiva do consumidor, por desatenção, ao “entregar” dados aos criminosos, por exemplo, se houver regularidade da postura bancária e ausência de falha na segurança.

O desembargador Spencer Almeida Ferreira esclareceu aspectos processuais relacionados às fraudes bancárias. Explicou questões sobre a formalização e validação dos contratos eletrônicos, base legal e legislação aplicável, uso da inteligência artificial para análise automatizada dos contratos, detecção de fraudes e personalização, entre outras. Destacou também a vulnerabilidade do consumidor diante do avanço da tecnologia e citou jurisprudência recente do TJSP sobre golpes envolvendo falso funcionário, central de atendimento, Pix e fraude na biometria, os procedimentos judiciais de defesa do consumidor, como a inversão do ônus da prova, responsabilidade objetiva das instituições financeiras, uso da prova pericial e sentenciamento.

Aspectos polêmicos da Lei do Superendividamento em face dos contratos bancários

O desembargador Tasso Duarte de Melo iniciou o segundo painel lembrando que a Lei nº 14.181/21 inseriu no Código de Defesa do Consumidor a prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor. Ele frisou que o banco tem o dever de concessão de crédito responsável, esclarecendo adequadamente consumidor e perquirindo se aquele que toma o crédito terá condições de pagar. E lembrou que a violação das obrigações inseridas pela Lei do Superendividamento autoriza o juiz a rever cláusulas, taxas de juros, encargos moratórios e prazos, de modo a viabilizar, de maneira justa e equilibrada, o pagamento da dívida.

O juiz Alexandre David Malfatti destacou o papel dos contratos bancários no superendividamento e citou dados de junho que mostram que cerca de 47% dos casos de inadimplência no país são decorrentes de contratações de cartão de crédito e empréstimo pessoal e consignado, o que demonstra deficiência no modo de lidar com a Lei nº 14.181/21. Ele enfatizou que o dever de informação é central na defesa do consumidor e lembrou que a Lei do Superendividamento incluiu vários artigos no CDC, com três eixos: o dever de informação e o crédito responsável, a conciliação e a repactuação de dívidas e ponderou que os bancos deveriam buscar renegociar dívidas ao invés de esperarem a decisão judicial da ação de repactuação de dívidas.

O advogado Álvaro Felipe Rizzi Rodrigues falou sobre os desafios das instituições financeiras para o gerenciamento dos créditos, diante do número de inadimplentes no país, cerca de 72,5 milhões de pessoas. Ele recordou a evolução normativa a respeito do tema e falou sobre a atuação dos bancos na prevenção e no tratamento do superendividamento, destacando as dificuldades, como a identificação de credores e da renda, e a realização de acordos e planos de pagamento.

Por fim, o desembargador Roberto Mac Cracken apontou questões controvertidas da Lei do Superendividamento e afirmou que ela macula o CDC, ponderando que não se pode tratar a pessoa natural com maior rigidez do que a pessoa jurídica e que poderia ser mais vantajoso para o devedor se tornar microempresa individual e buscar recuperação judicial do que fazer uso da lei. Ressaltou também que a garantia do mínimo existencial, incluída como direito básico do consumidor pela Lei nº 14.181/21, inicialmente fixada em 25% do salário-mínimo vigente, o que corresponderia a R$ 303,00, valor reajustado para R$ 600,00 pelo Decreto nº 11.567/23, é incompatível para a sobrevivência de uma entidade familiar. “Eu não posso obrigar uma pessoa a pagar dívida e deixar que fique à míngua, sem alimentar sua família, sem se alimentar, semr ter um padrão mínimo de saúde”, frisou.

Encerrando os trabalhos, o diretor da EPM, desembargador Gilson Delgado Miranda, agradeceu a participação de todos, em especial dos palestrantes, e o trabalho dos coordenadores, e salientou que a EPM cumpre o papel constitucional de capacitação de magistrados e servidores, mas está aberta a outros profissionais, com discussões sobre os mais diversos temas. “Participem, a Escola está aberta a todos, para debate de temas relevantes, em um ambiente democrático”, concluiu.

MA (texto) / KS (fotos)


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