Processo estrutural é discutido na EPM
Sérgio Arenhart e Eduardo Talamini foram os expositores.
A EPM promoveu na quarta-feira (3) a palestra Processo estrutural, com exposições do procurador regional da República Sérgio Cruz Arenhart e do advogado Eduardo Talamini. O diretor da EPM, desembargador Gilson Delgado Miranda, atuou como mediador dos debates. Ele enfatizou a importância do processo estrutural, lembrando que o tema está na pauta de discussões do Congresso Nacional e do Conselho Nacional de Justiça e desperta interesse na doutrina
O desembargador José Maria Câmara Junior, coordenador do evento, salientou a atualidade do tema e o papel do processo estrutural na instituição de um modelo de atuação jurisdicional com escopo não apenas de resolver a situação concreta, mas também de viabilizar mecanismos ou ferramentas processuais para construir soluções estáveis, duradouras, negociadas e gradualmente implementadas.
Sérgio Arenhart explicou que o processo estrutural rompe com a ideia de que o processo é pré-estabelecido e serve para qualquer realidade. “Ele foi pensado para ser um instrumento aberto, que se adapte, para realizar direitos e realizar o Direito”, ressaltou. Ele lembrou que o processo civil foi criado para lidar com um direito material entre particulares, em um modelo simples de relação jurídica, mas a função jurisdicional mudou e o Judiciário começou a abordar conflitos gerais, como os de fornecimento de medicamentos, em que o Estado tem que gerir um conjunto de pessoas que tem uma doença ou várias doenças. “A lógica do processo estrutural não é supor que eu consiga com ordens intervir em algum modelo e implementar políticas públicas ou realizar direitos fundamentais. Ele vai privilegiar a elaboração de planos de atuação, cronogramas de intervenção, porque a situação é complexa”, afirmou.
Nesse sentido, citou o Tema 698 do Supremo Tribunal Federal, esclarecendo que, embora ele não faça referência a processos estruturais, trabalha com essa ideia. Mencionou também o Projeto de Lei 3/25, em tramitação no Senado, que visa regulamentar o processo estrutural, e as recomendações 163/25, do CNJ, e 5/25, do Conselho Nacional do Ministério Público, que regulam as intervenções no Judiciário e no Ministério Público. Ele citou algumas características preconizadas pela Recomendação 163/25 do CNJ, como a multipolaridade, lembrando que o processo estrutural precisa permitir a intervenção de vários sujeitos, na busca da solução mais adequada como um todo e não para o autor necessariamente; a complexidade, tendo em vista que a implementação é progressiva e gera consequências imprevisíveis; a prospectividade, ao lidar com questões que serão realizadas no futuro e precisam ser pensadas por meio de estimativas; e a intervenção em instituições públicas ou privadas viciadas ou que gerem violações sistemáticas de direitos.
Sérgio Arenhart destacou também o incentivo ao diálogo interinstitucional na solução de problemas ou de questões ligadas a políticas públicas, enfatizando que a ideia do processo estrutural não é dar mais poder ao Judiciário, mas inseri-lo em um debate público. “O processo estrutural não é uma ode ao ativismo judicial, é uma técnica que permite que aquilo que o Direito Constitucional nos diz que deve ser a forma de intervenção em matéria de política pública, seja feita em matéria de processo, que o Judiciário dialogue com outras instâncias, que podem ter um desenho institucional mais adequado a certa finalidade”, afirmou. Mencionou ainda a ênfase na autocomposição e em soluções baseadas em intervenções planejadas e a necessidade de reestruturação da função jurisdicional, para possibilitar engajamento e outra visão em relação a esse tipo de intervenção.
Na sequência, Eduardo Talamini discorreu sobre a atuação dos agentes e entes de fiscalização e de execução de processos estruturais, que são pessoas ou grupos de pessoas organizadas em comissões ou comitês responsáveis pela fiscalização do cumprimento de tutelas estruturantes ou de executá-las. Ele ressaltou que esses agentes não se confundem com comitês ou grupos que representam as partes, nem com a figura do amicus curiae. Entre as premissas do procedimento, apontou o caráter prolongado do desenvolvimento da tutela estruturante e o fato de as tutelas serem abertas, estabelecendo metas ou objetivos e não uma definição exata de providências.
Ele apontou a inviabilidade de o juiz assumir a condução de todos os atos desse tipo de tutela, sendo necessário designar agentes ou entes fiscalizadores ou executivos, e mencionou os fundamentos legais para essa designação, previstos no Código de Processo Civil. Explicou a seguir as características das figuras típicas, como o interventor judicial na execução de decisões do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o administrador-depositário em penhoras complexas e o administrador e o conselho de credores na recuperação judicial e na falência. Falou também sobre a atuação de agentes e órgãos atípicos, como nas intervenções em sociedades anônimas e limitadas em conflitos societários, e citou exemplos desses agentes ou entes, como o grupo técnico de assessoramento na ACP do Carvão, o comitê interfederativo do caso de Mariana, os comitês do caso Braskem, em Maceió, e o comitê de assessoramento criado para implementar decisões sobre vagas em creches e pré-escolas na cidade de São Paulo. Por fim, falou sobre o enquadramento legal desses agentes ou entes e suas características principais, como a natureza de auxiliar do juiz, ausência de autonomia decisória e o regime de responsabilidade.
MA (texto e fotos)