Desafios do Direito Indígena são discutidos em evento conjunto da EPM com o Tribunal de Justiça e a Escola Judicial de Roraima

Evento foi realizado simultaneamente em São Paulo e Roraima.

 

A Escola Paulista da Magistratura (EPM), em parceria com a Corregedoria Geral de Justiça do Tribunal de Justiça de Roraima e a Escola Judicial de Roraima (Ejurr), promoveu hoje (10) o seminário Direito Indígena no Brasil contemporâneo: desafios e perspectivas na proteção dos povos tradicionais. Realizado simultaneamente na EPM e na Ejurr, em Boa Vista, e de maneira on-line, o evento visou debater a evolução da proteção jurídica os povos tradicionais, a jurisprudência recente, o papel das corregedorias e a atuação do sistema de Justiça na efetivação dos direitos indígenas.

 

O corregedor-geral de Justiça de Roraima, desembargador Erick Cavalcanti Linhares Lima, abriu a mesa de debates de Roraima. Ele agradeceu a parceria institucional e destacou o impacto da cooperação entre as escolas. A seguir, fez um resgate histórico do tratamento jurídico dado aos povos indígenas, explicando como a Lei nº 6.001/73 sustentava a política de integração e classificava os indígenas segundo seu grau de contato com a sociedade envolvente. Ao contrastar esse cenário com os avanços introduzidos pela Constituição Federal de 1988, ponderou que, embora os direitos culturais e políticos tenham sido reconhecidos, sua implementação ainda enfrenta entraves, especialmente no campo da documentação civil, da participação política e do acesso à informação.

 

O promotor de Justiça André Paulo dos Santos Pereira apresentou uma reflexão estruturada em três aspectos: a possibilidade de reconhecimento de um sistema jurídico indígena próprio, a existência de uma jurisdição indígena e a forma de diálogo entre essa ordem normativa e o Direito estatal. Ele explicou que o fenômeno jurídico indígena passou a ser reconhecido inicialmente como mero costume, modelo insuficiente diante dos padrões internacionais de proteção. Expôs também as bases normativas brasileiras e internacionais que permitem sua recepção no ordenamento estatal, incluindo o artigo 231 da CF, o artigo 57 do Estatuto do Índio e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

 

O vice-reitor da Universidade Estadual de Roraima (UERR), Edson Damas da Silveira, abordou o marco temporal, lembrando que a tese se consolidou a partir do julgamento do caso da terra indígena Raposa Serra do Sol e ganhou novos contornos diante de decisão recente do Supremo Tribunal Federal. Ele explicou que a proposta de fixar a data da CF como critério para reconhecimento de terras conflita com princípios fundamentais, porque que os direitos territoriais indígenas não podem ser reduzidos a um marco cronológico. Ressaltou ainda que a finalidade da demarcação é dupla: reconhecer historicamente territórios usurpados e assegurar condições para a continuidade cultural e física das comunidades indígenas.

 

No encerramento da mesa de Roraima o desembargador Cristóvão José Suter Correia da Silva conduziu os debates com os painelistas.

O diretor da EPM, desembargador Gilson Delgado Miranda, abriu a mesa de debates em São Paulo ressaltando a satisfação da Escola em realizar o seminário em parceria com o TJRR e a Ejurr. Ele agradeceu a participação de todos em destacou o compromisso institucional com a disseminação de conhecimento e o fortalecimento de políticas públicas voltadas aos povos indígenas.

 

Na sequência, o professor Álvaro Luiz Travassos de Azevedo Gonzaga ponderou que a pós-verdade agrava a anomia vivida por jovens indígenas, que sofrem pressões externas e questionamentos sobre suas próprias identidades. Ressaltou que estereótipos e desinformação criam falsas imagens dos povos originários e reforçou a importância da Convenção 169 da OIT, que legitima o reconhecimento comunitário. Finalizou alertando que as novas formas de comunicação intensificam a produção de distorções e excluem vozes indígenas, reforçando a necessidade de um olhar plural e respeitoso.

 

A desembargadora federal Cristina Nascimento de Mello, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, enfatizou que o avanço tecnológico chegou aos povos indígenas sem mediação adequada, criando riscos de apropriação de saberes, imagens e narrativas. Ressaltou que a tecnologia deve servir como ferramenta de fortalecimento cultural, preservando línguas, histórias e conhecimentos, e não como meio de exploração. Defendeu a soberania de dados indígenas e alertou para a necessidade de que qualquer coleta ou uso de informações seja decidido e controlado pelas próprias comunidades.

 

A juíza Hallana Duarte Miranda destacou que a construção de um sistema de Justiça culturalmente adequado exige reconhecer a diversidade dos povos e comunidades tradicionais, ouvir seus saberes e superar práticas tutelares. Relatou sua experiência no Vale do Ribeira, em São Paulo, onde aprendeu a importância da escuta ativa, da participação direta dessas comunidades na formulação de políticas e do uso das normativas de direitos humanos como ferramentas procedimentais. Enfatizou que território é vida para essas comunidades e que decisões judiciais precisam refletir essa matriz identitária, superando visões coloniais que historicamente invisibilizaram esses povos.

 

Ao final, o juiz Paulo Roberto Fadigas César conduziu os debates em São Paulo.

 

RL (texto) / MB e RL (fotos)


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