Uso da IA na segurança dos estádios e atuação do Juizado do Torcedor são debatidos na EPM
Evento teve quatro palestrantes.
A aplicação da inteligência artificial no aprimoramento da segurança nos estádios de futebol e o papel do Juizado do Torcedor na garantia dos direitos dos cidadãos foram discutidos hoje (7) no curso Juizado do Torcedor e inteligência artificial: o fortalecimento da segurança nos estádios de São Paulo da EPM. O evento teve 373 matriculados nas modalidades presencial e on-line, abrangendo 77 comarcas e dez estados.
Na abertura, o diretor da EPM, desembargador Gilson Delgado Miranda, agradeceu a presença de todos e destacou a atuação do Juizado do Torcedor na mitigação de conflitos, com julgamentos céleres e efetivos. Ele lembrou a importância do debate a respeito do tema, que envolve a emoção dos torcedores com seus clubes de futebol.
Iniciando as exposições, o desembargador Sérgio Antonio Ribas, coordenador do evento, fez um breve histórico do Juizado do Torcedor, criado em 2009, após diversos confrontos entre torcedores. Ele explicou a composição dos profissionais do Juizado, que atuam nos estádios na solução de casos de menor potencial ofensivo, com penas de até dois anos. Acrescentou que o Juizado do Torcedor também tem jurisdição para atuar fora dos locais dos jogos, em um raio de até cinco quilômetros do estádio, com enfoque em crimes envolvendo racismo, homofobia e invasões.
Sérgio Ribas informou que há um grupo de trabalho no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que estuda a replicação do Juizado do Torcedor de São Paulo em estádios de todo o Brasil e destacou a presença no curso da juíza Beatriz Junqueira Guimarães, do Juizado Especial de Belo Horizonte (MG). Ele encerrou a participação elencando benefícios que a IA pode trazer aos jogos de futebol. “O reconhecimento facial, por exemplo, pode nos ajudar a evitar práticas criminosas e trazer mais segurança aos estádios. A importância da IA relacionada ao Juizado do Torcedor mostra-se patente”, concluiu.
O juiz José Fernando Steinberg, titular do Juizado Especial Criminal do Foro Central, explicou o funcionamento do Juizado do Torcedor e citou sua nova nomenclatura, Juizado Especial de Defesa do Torcedor, instituída pela Lei Geral do Esporte (Lei nº 14.597/23). Ele lembrou que a competência do Juizado do Torcedor é estritamente criminal e não alcança o âmbito esportivo. Comentou que o Juizado Especial Criminal não se submete à sistemática do juiz de garantias nos crimes mais leves, mas nos crimes mais graves previstos na Lei Geral do Esporte será preciso passar pelo juiz de garantias para medidas cautelares necessárias durante a investigação criminal.
O expositor observou que a Lei Geral do Esporte trouxe penas mais severas para alguns crimes, como manipulação de resultados, racismo, misoginia e incidentes envolvendo torcidas organizadas. “Hoje a torcida organizada responde civilmente de maneira objetiva e solidária. Por isso quem manda nessa organização também responde de maneira mais severa”, afirmou. José Fernando Steinberg salientou a dificuldade de fiscalização de torcedores que são banidos dos eventos esportivos e como a inteligência artificial pode auxiliar no reconhecimento facial dessas pessoas.
Estádios inteligentes
Na sequência, o designer de produtos digitais Moisés Felippe Bertges afirmou que apesar de o termo IA ter se popularizado nos últimos anos, a ideia de um ser inteligente tem raízes mitológicas, citando ‘Talos’, ser artificial da mitologia grega. Ele recordou outros casos em que a ideia da IA já estava presente, como o Leão Autômato, criado por Leonardo Da Vinci no período renascentista; o Teste de Turing, que avaliava se uma máquina é capaz de imitar o comportamento humano, desenvolvido na década de 1950; e Eliza, o primeiro chatbot do mundo, criado em 1966, além das representações da IA nos filmes de ficção científica.
O palestrante lembrou que a IA está presente no dia a dia das pessoas e destacou seu uso em plataformas de streaming, na geração de conteúdos diferentes do mesmo filme ou série, dependendo do histórico e preferências de acesso de cada pessoa. Com relação aos estádios de futebol, disse que hoje já é possível fazer análises de vídeo em tempo real, prevendo até possíveis confrontos. “O magistrado que precisar julgar um caso de agressão em um estádio poderá receber uma síntese detalhada, com vídeos do incidente e o histórico do torcedor, permitindo uma decisão rápida e fundamentada”, concluiu Moisés Bertges.
O juiz Fernando Antonio Tasso, coordenador da área de Direito Digital da EPM, fez um elo entre Juizado do Torcedor, IA e regulação. Ele explicou as diferenças conceituais entre a identificação biométrica, que abrange o reconhecimento de características físicas, fisiologias e de comportamento humano, e o processo de autenticação biométrica, que identifica características-chave do rosto, dos olhos e converte as informações em dados matemáticos. Ressaltou que os dois métodos podem contribuir para o aprimoramento do chamado ‘estádio inteligente’, que integra diversas tecnologias, que propiciam aumento da segurança das pessoas, redução do tempo de espera em catracas e até mitigação do cambismo.
Fernando Tasso ponderou que a IA também traz riscos, como os vazamentos e compartilhamentos indevidos de dados pessoais por meio de invasões hackers ou até mesmo o compartilhamento voluntário do detentor de dados. “O vazamento de biometria é permanente. Uma vez comprometidas a impressão digital, íris ou o reconhecimento facial, você não pode trocar ou voltar atrás”, apontou, citando ainda a atuação do crime organizado no uso de dados sensíveis para fraudes. Por fim, observou que a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o projeto de lei que regulamenta o uso da IA no Brasil (PL 2.338/23), em tramitação na Câmara dos Deputados, não visam impedir a produção de dados, mas sim dar mais segurança e responsabilidades para os agentes de tratamento de dados.
Estiveram presentes os desembargadores Wanderley José Federighi, conselheiro da EPM; José Jacob Valente, coordenador da área dos Juizados Especiais da EPM; e José Carlos Ferreira Alves, coordenador da área de Formas Alternativas de Solução de Conflitos da Escola; e os juízes Fabrício Reali Zia e Márcio Antonio Boscaro, entre outros magistrados, servidores e demais profissionais.
RL (texto) / MB (fotos)