Prevenção do superendividamento na União Europeia é discutida na EPM

Jurista português Mário Frota foi o expositor.

 

A EPM promoveu na segunda-feira (16) o seminário Prevenção do superendividamento na União Europeia: a nova diretiva do Parlamento europeu, com exposição do jurista português Mário Frota, ex-professor da Universidade de Paris e professor emérito da Associação Portuguesa do Direito do Consumidor.

 

Na abertura, o diretor da EPM, desembargador Gilson Delgado Miranda, agradeceu a participação de todos, em especial do palestrante, e ressaltou a oportunidade de aprofundamento sobre a nova diretiva europeia e reflexão sobre a sua aplicabilidade em diferentes contextos na prevenção do superendividamento. Ele ressaltou que a Diretiva nº 2.225/23 do Parlamento europeu traz alterações significativas e revoga a Diretiva 48/08, ainda em vigor, criticada pela sua incapacidade de proteger os consumidores contra práticas de empréstimos irresponsáveis e por não estar adequada à proteção do consumidor, especialmente no mercado digital. “Essa iniciativa legislativa reflete o reconhecimento de que a prevenção é mais eficaz e menos custosa, tanto social quanto economicamente, do que as medidas corretivas. A prevenção do superendividamento não é apenas questão regulatória, mas o imperativo de justiça social e sustentabilidade econômica. Esperamos que as discussões possam contribuir para o desenvolvimento de políticas mais eficazes e para o fortalecimento de uma cultura de consumo consciente”, frisou.

 

Mário Frota explicou que a Diretiva 2.225/23 deverá ser regulamentada pelos Estados-Membros da União Europeia até 20 de novembro deste ano e deverá vigorar após 12 meses. Ele salientou que o objetivo da legislação é evitar o superendividamento dos consumidores. “A União Europeia tem consciência do fenômeno que sucede com os próximos da bancarrota, ao dizer que no mercado de crédito em expansão é especialmente importante que os mutuantes não concedam empréstimos de modo irresponsável ou sem verificação prévia da solvência e que os Estados-Membros efetuem a supervisão para evitar tal comportamento e determinem sanções. Os Estados-Membros deverão tomar as medidas adequadas para incentivar práticas responsáveis em todas as fases”, salientou.

 

O professor detalhou as obrigações impostas às instituições de crédito, como a verificação da solvência dos consumidores e a proibição de discriminação no acesso ao crédito, de presunção de consentimento e de concessão de crédito não solicitado. Também destacou a obrigatoriedade de prestar informações e a proibição à publicidade que incentive o crédito com sugestão de que ele corresponde a uma melhoria da situação financeira do consumidor. “Deve haver mescla de publicidade e informação forçosa sobre os contratos. A informação deve ser completa, verdadeira, atualizada, clara, objetiva e adequada, suscetíveis de permitir uma decisão informada quanto à celebração do contrato”, frisou. Ele citou ainda a imposição aos Estados-Membros de institucionalização da educação financeira, com consulta às instituições de defesa dos consumidores sobre as orientações a serem prestadas, e o direito de retratação ou arrependimento de 14 dias, que pode ser prorrogado por 12 meses, caso haja omissão no contrato ou no formulário de retratação.

 

O desembargador Alexandre David Malfatti, coordenador da área de Direito do Consumidor da EPM, ressaltou que o superendividamento está relacionado a aspectos sociais que impõem ao intérprete do Direito uma visão diferenciada no tratamento dos contratos. Ele observou que na Diretiva 2.225/23 há um dever de aconselhamento sobre o que é melhor para o consumidor endividado, enquanto no Brasil o magistrado precisa recorrer a interpretações sistemáticas e ousadas para afirmar que o juiz tem o poder de modificar o contrato e exigir crédito responsável. Ele lembrou ainda que mais da metade dos artigos do Código de Defesa do Consumidor brasileiro fazem referência ao direito de informação, mas enfatizou as dificuldades para a sua aplicação em um país com um contingente de analfabetos funcionais correspondente a quase metade da população.

 

A juíza Monica Di Stasi ponderou que, embora a Diretiva 2.225/23 seja muito mais detalhada que o CDC, na essência os pilares são comuns. “Na diretiva se propaga o crédito responsável como forma de evitar ou prevenir o superendividamento e a exclusão social do consumidor, tal qual fazemos na nossa lei”, salientou. Em relação ao dever de informação, citou julgado do ministro Herman Benjamim, que destaca uma mudança de mentalidade, porque era costume dizer que os consumidores precisam se informar, mas a lei diz que é obrigação do fornecedor de crédito se informar sobre quem está contratando com ele e prestar informações claras e acessíveis. “Não podemos inverter a lógica. O consumidor, que é hipossuficiente na relação de consumo, não pode ser obrigado a ir atrás da informação e compreender coisas fora do seu alcance. A lei brasileira, assim como a diretiva, prestigia essa circunstância de que o fornecedor do crédito tem o dever de informar e, se falhar nesse dever, a nossa lei traz sanções, assim como a diretiva permite que cada Estado aderente faça a sua própria legislação”, afirmou.

 

Também participou da mesa de trabalhos o juiz Guilherme Ferreira da Cruz, também coordenador da área de Direito do Consumidor da EPM.

 

MA (texto e fotos)


O Tribunal de Justiça de São Paulo utiliza cookies, armazenados apenas em caráter temporário, a fim de obter estatísticas para aprimorar a experiência do usuário. A navegação no portal implica concordância com esse procedimento, em linha com a Política de Privacidade e Proteção de Dados Pessoais do TJSP