Aplicações da Justiça Restaurativa na educação e nos demais contextos sociais é discutida na EPM

Katherine Evans e Dorothy Vaandering foram as expositoras.

 

A EPM promoveu ontem (22) o curso As crenças importam: expandindo e sustentando a Justiça Restaurativa no contexto do Judiciário, com exposições das professoras Katherine Evans, da Eastern Mennonite University (EUA), e Dorothy Vaandering, da Memorial University (Canadá).

 

Na abertura, a coordenadora da Coordenadoria da Infância e da Juventude do Tribunal de Justiça de São Paulo (CIJ), desembargadora Gilda Cerqueira Alves Barbosa Amaral Diodatti, recordou o pioneirismo do TJSP na implantação de projetos de Justiça Restaurativa e ressaltou que a EPM é um espaço privilegiado para a construção da cidadania e da paz, frisando a importância de se considerar fatores comunitários e sociais, além dos individuais, no enfrentamento da violência.

 

O vice-coordenador da CIJ, desembargador Carlos Otávio Bandeira Lins, relacionou o tema das crenças à obra do filósofo canadense Charles Taylor, ao recordar a experiência do jesuíta Matteo Ricci na China, que promoveu o diálogo intercultural como caminho de entendimento. Ele ponderou que a Justiça Restaurativa também exige a postura de romper barreiras de valores distintos e criar pontes de diálogo para a restauração dos vínculos.

 

O juiz Egberto de Almeida Penido, coordenador da área de Justiça Restaurativa da EPM e coordenador adjunto do curso, enfatizou a relevância das expositoras, lembrando a inspiração que ambas trazem do educador Paulo Freire e a importância das práticas desenvolvidas no Brasil no ambiente escolar. Ele ressaltou que a Justiça Restaurativa vai além de um método de solução de conflitos, pois exige a compreensão das dimensões culturais, estruturais e simbólicas que sustentam a violência, reafirmando sua vocação transformadora na construção da paz.

 

O juiz Marcelo Nalesso Salmaso, também coordenador da área de Justiça Restaurativa da EPM, lembrou que as palestrantes unem sólida produção acadêmica à experiência prática na implementação da Justiça Restaurativa em suas comunidades, trazendo ao público brasileiro uma visão que ultrapassa técnicas e alcança a transformação de pessoas, instituições e comunidades.

 

Exposições

 

Dorothy Vaandering salientou a influência da obra de Paulo Freire no trabalho dela e de Katherine Evans, em especial a obra Pedagogia do oprimido, destacando a questão das crenças e o entendimento do educador de que todos têm valor e estão interconectados, noção central da Justiça Restaurativa. E citou a definição de Paulo Freire de conscientização: “aprender a perceber as contradições sociais, políticas e econômicas e agir contra os elementos opressivos da realidade”.

 

Ela destacou também o conceito de “práxis”, de Paulo Freire, relacionado à radical interação entre reflexão e ação, ponderando que a raiz dessa reflexão e dessa ação diz respeito às crenças e à conscientização. “Por meio da conscientização, desenvolvemos nossa percepção dos sistemas e de nossa parte neles. As pessoas geralmente falam dos sistemas como se não pudessem modificá-los, como se fossem entidades, mas elas criaram esses sistemas e por essa razão podem modificá-los. Quando os sistemas estão institucionalizados, como as políticas e práticas institucionais, estão enraizados em nós e muitas vezes são as lentes pelas quais vemos o mundo. É mais difícil mudá-los, mas não impossível, apenas requerem mais conscientização e mais esforço”, frisou.

 

Katherine Evans asseverou que se as pessoas acreditarem que todos têm valor e estão interconectados, podem mudar o mundo. “Se realmente acreditarmos nisso e agirmos nesse sentido, podemos transformar nossos relacionamentos, políticas, práticas e estruturas”, frisou. Ela salientou que essa noção está no centro do trabalho com Justiça Restaurativa na área de educação e apresentou um diagrama que tem esse conceito no centro e é circundado por valores como respeito, dignidade e preocupação mútua e ações de reparação de danos e transformação dos conflitos, cultivo de relacionamentos saudáveis e desenvolvimento de ambientes de ensino justos e equitativos.

 

Ela lembrou que a reparação de danos e a resposta legal são abordagens diferentes. “Quando respondemos aos crimes e delitos, enfatizamos a lei e as regras, mas quando falamos em reparar danos, falamos sobre as pessoas e suas necessidades de cura. Se a justiça estiver relacionada à cura, então reparar danos é curar”, ponderou.

 

Katherine Evans ressaltou ainda que para a Justiça Restaurativa o conflito não é algo que deva ser evitado, porque é parte integrante dos relacionamentos mais importantes da vida das pessoas. “O que faz um relacionamento tão poderoso é que o comprometimento com esse relacionamento faz com que as pessoas estejam dispostas a permanecer no conflito até que possam transformá-lo em um relacionamento mais forte. O conflito pode ser destrutivo se não tivermos a noção de que a pessoa com quem estamos em conflito tem valor e está conectada conosco”, frisou.

 

Dorothy Vaandering salientou que um diagrama similar ao que utilizam no trabalho com JR na educação poderia ser desenhado para todas as instituições sociais, se as pessoas quiserem transformar a sociedade. E Katherine Evans indagou como ficariam as práticas judiciárias se fossem adotadas as ações preconizadas no diagrama da JR na educação, convidando todos a refletirem como essas questões poderiam ser consideradas nos níveis pessoal, institucional e estrutural e como a JR poderia ser incorporada no trabalho e na vida de cada um.

 

RL e MA (texto) / MB (fotos)


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