Alterações nas prisões em flagrante decorrentes da Lei 12.403/2011 são analisadas na EPM

No dia 31 de maio, foi realizada, na EPM, a palestra “Dez meses da vigência da Lei 12.403/2011: como ficaram as prisões em flagrante”, proferida pelo desembargador José Damião Pinheiro Machado Cogan, coordenador do evento e da área de Direito Processual Penal e Direito Penal da EPM.  

O evento teve como debatedores o juiz Jayme Walmer de Freitas, coordenador do Núcleo Regional de Sorocaba da EPM, e o promotor de Justiça Everton Luiz Zanella, assessor da Escola Superior do Ministério Público de São Paulo. Entre os participantes, estavam magistrados, integrantes do Ministério Público, policiais civis e militares, advogados, defensores públicos, delegados, assistentes jurídicos e outros profissionais. 

Iniciando sua exposição, o desembargador Damião Cogan recordou que a prisão em flagrante é uma tradição do Direito, desde a Antiguidade: “A hipótese de flagrante estava muito arraigada nos povos antigos, por várias razões, sendo a mais comum o fato de representar a certeza da infração, ao se surpreender alguém na prática de um ato infracional”, explicou, acrescentando que, ao se prender o infrator em flagrante, há uma resposta imediata à coletividade – moral e material, porque ele é afastado do convívio social –, com a reparação da ordem jurídica violada. 

Em relação à legislação brasileira, destacou a edição do Decreto de 23 de maio de 1821, expedido por Dom Pedro I, que criou limites para a prisão, determinando que o recolhimento de criminosos só poderia ocorrer em caso de flagrante ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária. Ele lembrou que as Constituições de 1934, 1937, 1946, 1967 e 1969, não falavam em autoridade judiciária, mas “autoridade competente”, mas, com a Constituição de 1988, a prisão passou a ser monopólio do Judiciário, conforme determinado no artigo 5º, inciso 61 (“ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei”). 

Alterações trazidas pela Lei 12.403/2011 

O palestrante explicou que, com o advento da Lei 12.403/2011, houve uma diminuição da importância da prisão em flagrante, que se tornou efêmera: “O fragrante é a única hipótese em que se autoriza que a autoridade administrativa prenda alguém – com a comunicação imediata à autoridade jurisdicional –, mas a nova legislação tornou sua duração muito curta, com período máximo de 48 horas”, explicou, lembrando que, antes da alteração legislativa, a prisão em flagrante perdurava por toda a instrução, não sendo convertida em prisão preventiva, que era aplicada em situações específicas. 

Ele ressaltou que, antes da nova lei, muitas vezes, as prisões em flagrante eram mantidas por muito tempo até serem revogadas. “A Lei 6.416/77 determinou que só se mantivesse a prisão em flagrante se presentes os requisitos da prisão preventiva (art. 310, § único). Isso estabeleceu o critério da necessidade da prisão para fins de instrução e trouxe um equilíbrio, mas a maioria dos magistrados não analisava se os requisitos da preventiva estavam presentes, após a comunicação do flagrante, o que gerava prisões que se prolongavam, às vezes, sem necessidade”, frisou. 

Nesse contexto, salientou que a Lei 12.403/2011 teve o viés de obrigar o juiz a fazer uma análise efetiva dos requisitos para manter a prisão, porque ele terá de convertê-la em novo título de prisão: “Ao ser comunicado do flagrante, o juiz tem três opções, conforme previsto no art. 310: relaxar a prisão ilegal; converter a prisão em flagrante em preventiva; ou conceder liberdade provisória, com ou sem fiança”.  

Entretanto, ponderou que não seria preciso estabelecer que a duração da prisão em flagrante seria de 24 a 48 horas: “Acho que não havia necessidade de a prisão em flagrante ser afastada dessa forma. Bastava se colocar um dispositivo expresso, dizendo que o juiz era obrigado a examinar e explicitar, fundamentadamente, que os requisitos da preventiva estavam presentes, cobrando-se isso dele”. 

Conversão da prisão em flagrante em preventiva 

Ao falar sobre a possibilidade de conversão da prisão em flagrante em preventiva, o palestrante considerou “um pouco exagerado” o estabelecimento de um período de 24 horas para a conversão, porque o magistrado não terá elementos para saber se é caso de se manter a prisão, além de haver maior cobrança da polícia. “Poderia se fazer a análise dos requisitos da preventiva, em um primeiro momento, e fazer a conversão somente após a conclusão da investigação, dez dias depois, quando o juiz já teria um pouco mais de elementos”, ponderou. 

Ele ressaltou, ainda, que a nova lei dificultou a prisão preventiva, que somente será aplicada, quando não couberem as medidas cautelares previstas no art. 319: “A regra hoje é a liberdade e a prisão é a exceção, conforme já sinalizava a o art. 310, parágrafo único da Lei 6.416/77”, observou, ponderando que, em relação à aplicação das cautelares, a Lei 12.403/2011 não trouxe grandes mudanças, apenas tornou um pouco mais gravosa a liberdade para o indivíduo surpreendido em flagrante. 

Quanto às hipóteses de admissão da decretação da prisão preventiva, chamou a atenção para o fato de que ela somente será admitida nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos (art. 313, inciso I), citando diversos crimes com pena inferior a quatro anos, entre eles: roubo simples tentado, maus tratos, sequestro e cárcere privado, receptação, formação de quadrilha ou bando, resistência sem a execução do ato, coação no curso do processo, fuga de presos com violência a pessoa, entre outros. “Esses casos ficam em aberto, porque não temos uma resposta imediata”, afirmou, ponderando que o problema teria sido minorado se fosse acrescentada, nesse inciso, a ressalva “excepcionados aqueles com violência ou grave ameaça”. 

Damião Cogan discorreu, também, sobre os critérios para a concessão de liberdade provisória, destacando a possibilidade de se conceder a fiança em todas as hipóteses e o aumento dos valores previstos (art. 325). Ele ponderou que, na maioria dos casos, o preso não poderá pagá-la, e o juiz acabará aplicando o art. 350, de concessão da liberdade provisória sem fiança. “Conforme adiantou Heleno Cláudio Fragoso, em relação à criação do dia-multa, o procedimento não estava destinado a ter grande importância entre nós, porque ‘somos um país pobre e os condenados no sistema penal, em regra, são os miseráveis’”, ressaltou. 


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