Seminário debate vantagens e contradições do uso da videoconferência no processo penal

A relação dialética entre avanço tecnológico e preservação dos direitos individuais na aplicação da Justiça foi a tônica do profícuo seminário havido na última sexta-feira (7) na EPM, com participação de magistrados e de defensores públicos, sob o tema Audiência por videoconferência no Processo Penal, promovido em parceria com a Escola da Defensoria Pública do Estado de São Paulo (Edepe).

 

A abertura dos trabalhos foi feita pelo diretor da EPM, desembargador Armando Sérgio Prado de Toledo, e teve a participação da defensora pública-geral do Estado de São Paulo, Daniela Sollberger Cembranelli, e do juiz assessor da Corregedoria Geral da Justiça Regis de Castilho Barbosa Filho, mediador do seminário.

 

Com o objetivo de debater e levantar vantagens e contradições do uso da ferramenta digital para interrogatório, em busca de uma prestação jurisdicional mais célere, atuaram como expositores o desembargador Otávio Henrique de Sousa Lima, o juiz assessor da Corregedoria Geral da Justiça Jayme Garcia dos Santos Júnior e os defensores públicos Patrick Lemos Cacicedo (coordenador do Núcleo de Situação Carcerária) e Juliana Garcia Belloque (defensora do 1º Tribunal do Júri da Capital).

 

Vieram da Defensoria Pública os argumentos contrários ao uso da videoconferência no processo penal. Embora declarando-se favoráveis ao uso da tecnologia para a conquista de maior eficácia e celeridade na prestação jurisdicional, a tese unânime dos membros presentes no debate é a de que na dinâmica da audiência por videoconferência a liberdade de comunicação do réu com seu defensor, a segurança e a confiança do diálogo com o juiz ficariam prejudicados. Seu saldo negativo seria uma diminuição das garantias dos direitos fundamentais dos acusados.

 

“Se por um lado entendemos a importância da tecnologia para a instrução processual, por outro lado não podemos suprimir os direitos individuais”, frisou Daniela Sollberger Cembranelli. No mesmo tom, Patrick Lemos Cacicedo afirmou: “Sou o maior fã do processo eletrônico e do que ele representa em termos econômicos, mas não podemos esquecer o jurisdicionado, com suas aflições, sua dor e sua sede de justiça. Essa forma de interrogatório não me parece um instrumento que possa maximizar a garantia dos direitos do réu no processo”.

 

Cacicedo apontou a experiência prática do que considera uma forma segura e ideal do uso da videoconferência. Segundo o defensor público, na Justiça baiana, o defensor está lotado nos presídios; sua presença ao lado do acusado é uma forma de garantia de seus direitos individuais, assegurando, apesar da distância, o princípio contido na máxima judicial norte-americana de que “todo réu tem direito a um dia na corte”.

 

Ampliando o debate de como aplicar a tecnologia sem abdicar da discussão ética e valorativa na contemporaneidade, os mesmos princípios de defesa intransigente dos direitos individuais foi manifestado pela defensora pública Juliana Garcia Beloque. “O papel da Defensoria Pública é comunicar-se com o assistido e compreendê-lo. Quando enfatiza que a videoconferência fique restrita, é porque deseja, inclusive, a integridade do próprio Poder Judiciário em seu papel civilizatório.”. E emendou em favor da tese do benefício da proximidade do acusado: “Jamais consegui qualquer confissão do réu à distância”.

 

Os magistrados presentes ao debate revelaram-se favoráveis ao uso da videoconferência e, até, da ampliação de suas hipóteses legais. A esse respeito, Jayme Garcia dos Santos Júnior, tendo levantado no início de sua fala os tópicos já sedimentados da crítica ao uso do interrogatório à distância, afirmou que o legislador foi tímido ao traçar as hipóteses legais do uso da videoconferência, pois entende que poderiam ter sido ampliadas sem prejuízo do princípio das garantias individuais preconizadas pela Constituição. Otávio Henrique de Sousa Lima, por seu turno, afirmou que “o interrogatório por videoconferência representa um avanço, embora tímido, pois entendo que poderia ser mais ousado. Vamos ter que nos adaptar.”

 

O juiz Rodrigues Müller Valente, da 6ª Vara Criminal de Guarulhos, que fez uso da palavra a partir da assistência, por provocação da mesa, relatou casos concretos da realização de interrogatório a distância em Guarulhos, sempre mediante prévia anuência do acusado. “Só vejo vantagens”, afirmou. “Os equipamentos de transmissão são perfeitos, e a presença exclusiva da tríade composta pelo advogado, pelo réu e pelo operador da Prodesp no presídio tem criado um ambiente seguro e confiável para a realização da videoconferência, sem registro de quaisquer queixas da defesa ou do Ministério Público”.

 

Das exposições feitas pelos magistrados presentes, inferiu-se que a audiência por videoconferência já é um fato, embora constitua exceção legal. Mencionou-se a edição da Lei Federal nº 11.900, de 8 de janeiro de 2009, a qual alterou dispositivos do Código de Processo Penal para prever a possibilidade de realização de interrogatório e outros atos processuais por sistema de videoconferência.

 

Referida norma estabelece que o interrogatório, ainda que de réu preso, deve ser feito pela forma presencial, salvo decisão. Porém, o juiz, excepcionalmente, por decisão fundamentada, de ofício ou a requerimento, poderá determinar a realização do interrogatório pelo sistema de videoconferência. Para isso, será necessário que a utilização do mecanismo atenda a uma das seguintes finalidades: prevenir risco à segurança pública, em função de suspeita de que o preso integre organização criminosa ou que possa fugir durante o deslocamento; viabilizar a participação do réu na audiência em casos de doença ou de impedimento por circunstância pessoal; evitar a influência do réu sobre testemunhas ou vítimas; ou “responder à gravíssima questão de ordem pública”.


ES (texto e fotos) 


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