Teoria da desconsideração da personalidade jurídica é tema de aula na EPM

Realizou-se no dia 12 de março aula do primeiro módulo do 6° Curso de pós-graduação em Direito Empresarial, da EPM, sob o tema “Desconsideração da Personalidade Jurídica”. A aula foi ministrada pelo desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, professor doutor em Direito Comercial, professor doutor da USP e da PUC/SP, coordenador do curso e vice-diretor da EPM.

 

Também integrou a mesa, como mediador, o diretor da EPM, desembargador Fernando Antonio Maia da Cunha coordenador adjunto do curso. Além dos alunos, fizeram-se presentes na assistência o desembargador Manoel Justino Bezerra Filho, também coordenador adjunto,  e o juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho, professor assistente.

 

No início da preleção, o professor qualificou sua aula como “reflexões de natureza prática em torno da Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica”. Introduzida no Direito positivo brasileiro pelo jurisfilósofo Miguel Reale, a teoria estabelece os limites da responsabilidade dos sócios pelas dívidas das sociedades.

 

No passeio histórico pela origem e evolução do Direito Comercial, Pereira Calças mencionou a forma embrionária das modernas sociedades comerciais. “Data dessa época a conhecida celeuma entre “minimalistas” e “maximalistas”. Aqueles consideravam dotadas de personalidade jurídica todas as sociedades civis e mercantis; e estes estabeleciam distinção entre corporações e sociedades civis em sentido estrito, negando a estas a personalidade jurídica”, esclareceu o professor.

 

“Até a edição do Código Comercial de 1850, não havia concepção clara que distinguisse o que era pessoa jurídica. A concepção de pessoa jurídica da sociedade empresária, cujo patrimônio distingue-se do de seus membros, foi inserida nos arts. 18 e 20 do Código Civil de 1916, de Clóvis Bevilacqua. Atualmente nasce a pessoa jurídica com o registro comercial, na forma dos artigos 45, 985 e 1.150 do atual CC. Nesta concepção, existe separação estrita da pessoa jurídica e de seus sócios. A limitação da responsabilidade dos sócios é essencial para o incremento da atividade econômica”, ensinou o professor.

 

Pereira Calças também abordou os primórdios do debate doutrinário e da origem da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Segundo o professor, a primeira aplicação concreta desta teoria, lastreada em alegações de abuso de direito de pessoa jurídica e fraude contra credores, ocorreu na corte inglesa, em 1897, em ação movida contra o empresário Aaron Salomon, cujo pedido foi provido em primeira instância, mas reformado pela Câmara dos Lordes.

 

No plano mundial, informou o professor, o primeiro grande estudo sistemático sobre a teoria foi empreendido na década de 1950 pelo alemão Serick, da Universidade de Tubingen. Adiante, ensinou que a ideia da desconsideração foi introduzida por Rubens Requião, na Universidade Federal do Paraná, no final de 1960.

 

“O atual Código Civil (CC) brasileiro estabelece para os operadores do direito a distinção entre sociedades empresárias e sociedade simples, constituindo-se entendimento dogmático e jurisprudencial. Mas qual o objetivo prático dessa distinção?” – indagou o professor. “Ela é útil, por exemplo, no manejo da Lei de Falência, só aplicável às sociedades empresárias. Por outro ângulo de análise, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica só é aplicável nos litígios que envolvam sociedades empresariais, limitadas ou anônimas (SAs), porque nas sociedades simples a responsabilidade é ilimitada. O mesmo princípio é aplicável às associações civis e religiosas, fundações e partidos políticos”, elucidou o professor.

 

“Também não se aplica a desconsideração da personalidade jurídica à massa falida, ao condomínio e ao espólio, pois estes entes não são considerados pessoas jurídicas, mas sujeitos de direito. Toda pessoa jurídica é sujeito de direito, mas nem todo sujeito de direito é pessoa jurídica. Às sociedades em comum (sem contrato escrito ou inscrito) também não se aplica a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, pois a responsabilidade de seus sócios também é ilimitada”, pontuou o professor.

 

De acordo com o professor, o autor do pedido de desconsideração da personalidade jurídica precisa demonstrar seus pressupostos legais. E em seu entendimento, são suficientes a prática de ato ilícito ou esvaziamento patrimonial de forma fraudulenta pelo sócio. “A teoria, cuja aplicação há de ser episódica e temporária, relativiza a personalidade jurídica, mas não a anula. Sua lógica cartesiana é a de que não existe o direito absoluto.”

 

Ainda sob a possibilidade concreta de aplicação da teoria, Pereira Calças mencionou o professor Fábio Comparato. “Segundo esse jurista, a evolução da economia capitalista do século passado criou a multiplicidade de organizações autônomas, grupos econômicos formados por uma sociedade empresária controladora e sociedades controladas, com mobilidade interna de transferência de ativos”. Nesses casos, “mantidas a distinção patrimonial e a diversidade de interesses, é possível a responsabilização da controladora pelas dívidas de quaisquer das controladas”, salientou o professor.

 

O professor apontou, finalmente, o risco de banalização da aplicação prática da teoria. “Não se pode passar como um trator sobre as sociedades comerciais e extingui-las”, alertou, encerrando a palestra.


ES (texto e fotos)


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