Questões de saúde e de segurança pública relacionadas à pedofilia são analisadas na EPM

Com a aula “Transtornos pedofílicos e relacionados ao consumo de substâncias: questões de saúde e de segurança pública”, teve continuidade, no último dia 12, o 1º Curso de segurança pública da EPM.  A aula foi ministrada pelo psiquiatra Danilo Antonio Baltieri e teve a participação do vice-presidente do Tribunal de Justiça Militar de São Paulo, juiz coronel Fernando Pereira, e da advogada Janaina Conceição Paschoal, coordenadores do curso.

 

“Todas as doenças psiquiátricas constituem questão de saúde pública”, afirmou o palestrante no início da aula. Ele explicou que o nexo com a segurança pública é o cometimento de algum crime pelo portador da doença mental, e invocou o senso comum: “As vezes vemos na mídia um indivíduo que cometeu crimes terríveis e nos perguntamos: “será que ele é portador de doença mental? E é inevitável associá-lo a alguma anormalidade psiquiátrica.” Entretanto, o professor informou que a relação de homicídios cometidos por esquizofrênicos é baixa: de um para 140 mil. Depois, concluiu: “A vasta maioria dos portadores de doença mental não se envolve em crimes violentos. São, antes, vítimas de atos violentos”.

 

Esta taxa, no que concerne à etiologia dos crimes sexuais, segundo Danilo Baltieri, aumenta, naturalmente, quando o portador de transtorno esquizofrênico promove a associação da doença primária com o uso de drogas. “Os dados estatísticos apontam as drogas como potencializadoras da violência sexual contra meninos, principalmente o álcool, que foi a droga objeto de estudo de caso de molestadores de meninos. Quanto maior a dependência de álcool, menor o controle impulsivo, e o risco se torna maior em muitos tipos de crime contra a pessoa”, observou o professor. “Mesmo assim, não supera a taxa de homicídios cometidos pela população não doente. Então não dá para associar de maneira unidirecional a doença mental, de forma geral, com qualquer comportamento violento”, objetou.

 

Adiante, ponderou o professor que há alguns transtornos psiquiátricos diretamente associados à prática de crimes violentos, como é o caso da pedofilia. “Mas existem indivíduos pedofílicos que têm o desejo e a fantasia sexual infantil intensa e recorrente, mas que nunca atuam contra crianças”, pontuou.

 

A seguir, Danilo Baltieri estabeleceu distinção entre molestadores de crianças (predominantemente masculinas) e de mulheres adultas. “Esses são os casos mais numerosos e frequentes, segundo as estatísticas”, informou. Disse, ainda, que essa percepção fez com que, no mundo ocidental civilizado a força-tarefa de saúde mental, cujas premissas são a identificação e o tratamento precoce de transtornos mentais, o estabelecimento de políticas que assegurem o direito ao tratamento e a inserção social, as estratégias de supervisão da comunidade, a busca de respostas jurídicas baseadas em evidências científicas e a educação continuada do “staff”, está muito próximo dos operadores do Direito. “Essas estratégias”, salientou, “estão sendo iniciadas no Brasil, não como queda de braço entre uma e outra ciência, como infelizmente se vê no dia a dia, mas como uma parceria”, salientou.

 

Danilo Baltieri observou que, no Brasil, poucos agressores sexuais recebem tratamento dentro e fora das prisões. Em relação às políticas severas de repressão, como o aumento da pena, implementadas em várias países, afirmou: “Não diminuíram e não diminuirão a incidência de crimes sexuais”.

 

Adiante, o professor observou que o juiz não pode utilizar o termo “pedófilo”, pertencente à área médica, porque ele não é juridicamente tipificado. "O termo jurídico-social é 'agressor sexual' (sexual offender). E a qualificação como crime sexual depende da história e da cultura.”

 

A seguir, discorrendo sobre o aspecto patológico, informou que de 20 a 40% dos molestadores de crianças são portadores de pedofilia, que conceituou como “um transtorno agudo da preferência sexual associado à distorção cognitiva, predominantemente masculina, consistente na excitação diante de imagens infantis de crianças com menos de 14 anos de idade, não necessariamente realizada por prática sexual”.

 

O professor esclareceu, ainda, que a pedofilia é a doença mais estigmatizada de toda a Medicina e que, somente quando a agressão sexual se realiza, temos o crime associado à doença. “Portanto, dizer que ‘pedofilia é crime; denuncie’  é categoricamente errado. Em 90% dos casos, a pedofilia não afeta a capacidade intelectiva para a compreensão da doença, mas a capacidade volitiva de autodeterminação”, ensinou. Outro dado estatístico que veio à baila é que cerca de 50% dos portadores da doença são casados.

 

No que concerne às estratégias de tratamento (infelizmente dispendioso, por conta da quantidade de profissionais envolvidos no processo), o suporte familiar é decisivo para prognóstico de cura. “O tratamento reduz a incidência criminal de forma significativa, embora seja sempre desejável a parceria com o sistema de Justiça, porque nem sempre o paciente quer se tratar, mas buscar apoio médico e convencer-se da normalidade de seus atos”, asseverou o professor.

 

Finalmente, Danilo Baltieri afirmou que os casos de pedofilia raramente são isolados. “Frequentemente estão associados a outras parafilias, como a zoofilia e o exibicionismo público, por exemplo. E estudos recentes apontam para alterações neurofuncionais.”

ES (texto e fotos)

 


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