Curso de Direito do Consumidor tem aula sobre responsabilidade civil no CDC
No dia 8 de abril, o desembargador Sérgio Cavallieri Filho (foto), ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, proferiu a palestra “Aspectos gerais da responsabilidade civil no CDC” no 4º Curso de especialização em Direito do Consumidor da EPM. A aula teve a participação do juiz Alexandre David Malfatti, coordenador do curso e da área de Direito do Consumidor da EPM, e do juiz Carlos Castilho Aguiar França.
Primeiramente, Sérgio Cavallieri Filho apresentou breve introdução histórica sobre a evolução da responsabilidade civil nas áreas de consumo. Ele observou que o Código Civil de 1916 possuia apenas uma norma que fazia referência à temática, em seu artigo 159, denominado de “cônsul” pelo magistrado, em alusão a comerciais de refrigeradores da época. Neste artigo estava presente a responsabilidade subjetiva, ou seja, para que houvesse responsabilidade civil, o fato gerador da mesma deveria ser precedido de culpa.
A seguir, recordou que a revolução tecnológica e cientifica verificada no século XX ensejou uma revolução social e política, ligada intrinsicamente com o Direito, uma vez que este regula a vida em sociedade. Com isso, surgiram novos ramos do Direito, dentre eles, o Direito do Consumidor.
De acordo com o palestrante, as áreas mais afetadas por esta revolução social foram o Direito de Família e o âmbito da responsabilidade civil. Isto acarretou a ineficiência da referida norma do Código de 1916 para lidar com os mais diversos tipos de demandas levadas à apreciação do Judiciário. Em decorrência do exaurimento da norma, e da dificuldade de ajustá-la à sociedade moderna, introduziu-se a figura da responsabilidade objetiva para os casos de responsabilidade civil, em paralelo ao Código Civil, ou seja, em leis especiais.
Contudo, a grande mudança, em sede de responsabilidade civil, veio com a Constituição Federal de 1988, o que, nas palavras do palestrante ”mostra como a responsabilidade civil subiu de status”, passando também, a ter maior abrangência. Entretanto, nas relações de consumo a responsabilidade ainda era subjetiva, o que destoava com o quadro social e econômico da época. Para que este problema fosse solucionado, criou-se o Código de Defesa do Consumidor (CDC), aplicando as novas regras da responsabilidade civil às relações de consumo. Ele lembrou que este fato decorreu também da problemática dos acidentes de consumo, uma vez que produção em massa gera dano em massa.
Sérgio Cavallieri Filho destacou três mudanças fundamentais na responsabilidade civil nas relações de consumo com a criação do CDC. Primeiramente, estabeleceu-se a responsabilidade direta do fornecedor de produtos e serviços com o consumidor. O CDC também afastou a dicotomia entre responsabilidade contratual e extracontratual em âmbito de responsabilidade civil nas relações de consumo, ou seja, o fornecedor responde diretamente à vitima, independentemente de responsabilidade contratual entre as partes. Por fim, estabeleceu responsabilidade objetiva para o fornecedor de produtos e serviços.
No que diz respeito à responsabilidade, o código brasileiro foi além, estabelecendo responsabilidade por serviço e produto, ao contrário dos Estados Unidos da América e da Europa, onde a responsabilidade faz referência ao produto somente. Sendo assim, o consumidor brasileiro reveste-se de maior segurança, tendo em vista que o CDC deve ser aplicado em todos os casos em que exista uma relação de consumo, uma vez que se trata de lei especial, criada mediante disposição constitucional, justamente para essa finalidade.
Outro ponto relevante abordado foi o sistema próprio do CDC. Segundo o palestrante, o código faz distinção entre fato e vício do produto ou do serviço. Fato é usado no diploma como sinônimo de acidente de consumo, originando as expressões “fato do produto” e “fato do serviço”. Vício, por outro lado, é um defeito, porém menos grave, não chegando a acarretar um acidente, mas que reduz a qualidade ou quantidade do produto ou serviço.
Conforme explicado pelo palestrante, a matéria acerca da responsabilidade decorrente de fato e vício foi disciplinada nos artigos 12 e 14 do CDC. No artigo 12, encontra-se a cláusula geral da responsabilidade pelo fato do produto, enumerando os responsáveis a quem se destina esta cláusula. Ressalte-se aqui que, para a responsabilidade ser imputada aos fornecedores, deve-se demonstrar o nexo causal presente entre o produto e o dano proveniente do mesmo, ou seja, prevalece a responsabilidade subjetiva. Mesma regra se encontra no artigo 14 do aludido diploma, onde está regulada a responsabilidade pelo fato do serviço, que, diferentemente à do artigo 12, é solidária.
No que diz respeito aos defeitos, o desembargador enumerou os três tipos principais: podem decorrer da concepção, sendo esta a modalidade mais grave, da fabricação ou de informação. Presente um destes defeitos, mais o nexo causal com o acidente ocorrido, responde o fornecedor independentemente de culpa. Vemos aqui novamente presente a figura da responsabilidade subjetiva.
Ele observou, entretanto, que existem riscos inerentes, presentes em alguns produtos, que não podem ser aniquilados. Para estes casos, o fornecimento de uma informação correta e precisa acerca dos perigos inerentes é fundamental. De certo se faz que alguns produtos apresentam determinado perigo em função de sua natureza, como é o caso de facas e remédios, contudo, somente poderemos falar em defeito do produto quando o mesmo não apresentar a segurança legitimamente esperada. Este é o fato gerador da responsabilidade, e não a natural periculosidade do produto ou serviço.
Outro aspecto relevante abordado na aula dispõe acerca da vítima de acidente que não se configura como comprador ou usuária do produto ou serviço. O palestrante lembrou que, com a entrada em vigor do CDC, o comprador passou a dispor de todas as garantias necessárias para se proteger de acidentes decorrentes do produto adquirido, mas havia dúvida a respeito do direito de terceiro lesado em decorrência do defeito deste mesmo produto. Nesse sentido, frisou que o artigo 17 do CDC garante a este terceiro o direito de pleitear reparação de danos frente ao fornecedor ou fabricante.
Sergio Cavallieri Filho citou, também, a previsão de responsabilidade objetiva do profissional liberal, contida no CDC. Decorrente disto, o dolo deverá ser provado para que a indenização seja devida. “Como não se trata de contrato em massa, a norma é pertinente, desde que corretamente interpretada”, ponderou.
Ele mencionou, ainda, as excludentes de culpabilidade por parte dos fornecedores e fabricantes, explicando que, para que isto ocorra, o fornecedor deverá provar que o defeito inexiste ou que o acidente deu-se por culpa exclusiva do consumidor ou terceiro. Por fim, discorreu acerca da prescrição e decadência, lembrando que a prescrição se relaciona com o fato do produto ou serviço e a decadência diz respeito ao vício do produto ou serviço.
FH (texto)