Fabio Ulhoa Coelho ministra aula sobre contratos de licença de exploração de marcas
As finalidades, formas e aspectos jurídico-processuais dos contratos de licença para uso de marca e de franquia foram tratados em aula do curso de extensão Propriedade Industrial no último dia 25, na EPM. A aula foi ministrada pelo professor Fabio Ulhoa Coelho, chefe do Departamento de Direito Comercial da PUC-SP, e teve a participação dos desembargadores Manoel de Queiroz Pereira Calças, vice-diretor da EPM, e Enio Santarelli Zuliani, ambos coordenadores do curso.
Em comentário preliminar, Pereira Calças destacou o pioneirismo e a importância do palestrante, qualificado como incentivador e autor da ideia do novo Código Comercial Brasileiro.
No início da preleção, Ulhoa Coelho enalteceu os coordenadores pela estruturação do curso sobre propriedade industrial, que destacou como “um sistema que precisa ser estudado mais e melhor, porque é sinal de desenvolvimento econômico nacional ter uma proteção jurídica consistente do âmbito do investimento feito pelo empresário na criação de sua marca de identidade no mercado”.
Adiante, o professor afirmou a relativa novidade da ideia de propriedade sobre um bem intelectual. Segundo ele, essa noção surgiu na Revolução Francesa, no âmbito do direito autoral da Declaração dos Direitos do Homem, como uma forma de proteger o autor em relação ao editor. E esclareceu que, cerca de cem anos antes disso, surgiram na Inglaterra os primeiros atos, estatutos ou disciplinas da propriedade intelectual em sua forma de direito autoral, mas com um sentido bem diferente, visto que não havia naquele país a ideia de propriedade sobre a criação. “O que se protegeu no primeiro diploma do que hoje conhecemos como propriedade intelectual na Inglaterra foram os direitos do editor a um monopólio sobre as obras que publica. Hoje, há uma convergência entre essas duas tendências. O direito à propriedade intelectual protege tanto o empresário do ramo cultural, o editor, quanto o autor”.
Ulhoa Coelho ensinou, ainda, que o direito autoral corre riscos sempre que há uma significativa evolução tecnológica. E citou formas indiretas de questionamento sobre a ideia do exercício de propriedade sobre criação intelectual, como as licenças creative commons (padronização virtual de licenciamento e distribuição de conteúdos culturais com abdicação parcial de direitos, mediante declaração de vontade dos criadores). Aduziu, ainda, o comentário de que “hoje, só compra livros quem quer ter alguma coisa que fique de pé na estante, porque o conteúdo está disponível na internet por preço mais barato ou de graça.”
Regressando à fronteira histórica entre tecnologias digitais e direito autoral, o palestrante lembrou que a indústria fonográfica passou um aperto muito grande há alguns anos com a criação do Napster, sistema de compartilhamento de arquivos. Segundo Ulhoa Coelho, muitas empresas faliram nesse período. Mas, graças à criação de aplicativos para venda de música por empresas conceituadas no mercado, já faz dois ou três anos que a indústria fonográfica voltou a ter lucro. “Estamos passando por um momento em que é ineficaz qualquer regra de propriedade intelectual. Mas creio que, se seguirmos o modelo da indústria fonográfica, ou seja, venda de conteúdos por preço acessível, autores de obras jurídicas passarão pelo mesmo processo”, ponderou.
Sob esse aspecto, o da adaptação aos novos tempos, o professor afirmou que o momento é muito rico, seja porque o Direito brasileiro cria as condições e ao mesmo tempo demanda um aprofundamento dos juristas nesta área do conhecimento, seja porque os próprios fundamentos estão postos em cheque com a internet.
A história da colaboração entre empresários
Adentrando a seara dos contratos de licença para uso de marca e de franquia, Ulhoa Coelho ensinou que o ponto de partida para o entendimento de sua natureza é o conceito dos contratos de colaboração empresarial. “São contratos entre dois empresários, em que o empresário-colaborador, assume a obrigação de criar, consolidar ou ampliar o mercado dos produtos e serviços fornecidos pelo empresário-fornecedor. Nessa categoria, enquadram-se a distribuição, a representação comercial, a concessão para comercialização de veículos automotores terrestres, etc”. E explicou que, no contrato de licença de uso de marca, o licenciado é o colaborador; na franquia, o franqueado é o colaborador.
Adiante, teceu considerações sobre os objetos de distinção do empresário junto ao mercado. “Houve tempo em que o elemento de identificação importante era a pessoa ou nome do empresário em face da concorrência. O produto era bom, por exemplo, porque era comercializado pelo caixeiro-viajante X. Diversamente de hoje, quando a qualidade está ligada à marca, a qualidade do produto vinculava-se ao nome do representante”, ensinou.
Adiante, comentou os quatro designativos ou signos empresariais, cada um sujeito a um regime jurídico próprio: o nome empresarial, que identifica o sujeito de direito; a marca, que identifica o produto; o título do estabelecimento e o nome de domínio.
Distinções entre contratos para licença de uso de marca e de franquia
Segundo Ulhoa Coelho, não existe contrato de licença de uso de nome empresarial, de nome de estabelecimento, ou de uso de nome de domínio. Diversamente, há bastante tempo, a marca é objeto de contrato desse tipo de licença.
O professor explicou que, para o entendimento da figura de contrato de licença de uso e suas consequências jurídicas, há a necessidade de distinção entre licença e cessão. “O regime da cessão é o da compra e venda; o da licença equivale à locação de um bem móvel”, esclareceu. Ele alertou para o fato de que, embora o contrato de licença de uso não possua uma forma específica, é necessária a forma escrita para averbação no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), condição para a produção de efeitos jurídicos perante terceiros.
Ulhoa Coelho discorreu, ainda, sobre o merchandising, espécie de licença de uso de marca, cuja característica é exploração da marca pelo licenciado em um produto diferente daquele que o licenciador explora.
Ao falar sobre o contrato de franquia, destacou a importância do critério da competência para a sobrevivência das empresas. “Só existe um lugar no mundo em que basta ter virtudes para ter êxito como empresário: a novela. No mundo real, vale o brocardo: quem não tem competência não se estabelece.”
Ele esclareceu que a franquia é um contrato que resulta da conjugação da licença de uso de marca e da prestação de serviços de organização empresarial. “O contrato de franquia contempla três aspectos ou subcontratos: de administração, de engenharia (layout do estabelecimento) e de marketing (publicidade e técnicas de exposição de produtos)”.
Ulhoa Coelho ensinou, ainda, que, diante da promiscuidade de franqueadores, foi editada a Lei nº 8.955/94, que moralizou o instituto da franquia, estabelecendo regras fundadas na transparência de relações para a condição de franqueador. Mas, segundo seu entendimento, o mercado demanda uma nova lei que tipifique melhor os contratos, pois estaríamos vivendo novamente um ciclo vicioso, em que pessoas apresentam-se como franqueadores sem a competência exigida pelo estatuto.
O professor teceu, finalmente, considerações sobre as hipóteses de falência dos contratantes nos contratos de licença de uso de marca e de franquia e seus reflexos processuais.
ES (texto)