Controle jurisdicional das políticas públicas é debatido em novo curso da EPM

No último dia 6, teve início, na EPM, o curso Controle jurisdicional das políticas públicas e responsabilidade do Estado. A aula inaugural, “Regime jurídico administrativo”, foi ministrada pelo desembargador Paulo Magalhães da Costa Coelho (foto), que coordena, juntamente com o juiz Luis Manuel Fonseca Pires, o curso e a área de Direito Público da Escola.

 

Na abertura dos trabalhos, o desembargador saudou a presença de diversos magistrados no curso, bem como de servidores: “Fiquei muito feliz com a participação de todos nessa reflexão que faremos, buscando aperfeiçoar questões tão atuais e tão ligadas à vida do povo brasileiro, mas que, por muitas vezes, ainda são mal compreendidas. Essa disponibilidade e humildade demonstradas pelos colegas revela o espírito do nosso tempo, espírito que faz evoluir o Tribunal de Justiça e a Escola da Magistratura”, ressaltou.

 

Paulo Magalhães começou sua exposição salientando que não se pode interpretar e aplicar um instituto de Direito Público sob uma perspectiva isolada, porque ele está incluído em um contexto, que dá os pressupostos para a sua interpretação e aplicação. “Esses pressupostos são o regime jurídico administrativo, onde estão inseridos todos os temas de Direito Público”, explicou.

 

Ele ressaltou a importância do regime jurídico administrativo, em especial, diante da tradição privatística das escolas jurídicas brasileiras: “O Direito sempre foi encarado a partir do Direito Civil, na perspectiva liberal individualista, e as questões de Direito Público foram relegadas a segundo plano, resultando em uma sólida formação dos bacharéis em Direito Privado e uma escassa ou nula formação em Direito Público”. O professor observou que isso teve consequências dramáticas na interpretação e aplicação dos institutos de Direito Público, feitas a partir do regime jurídico de Direito Privado, provocando uma grave distorção. “Só mais recentemente as escolas passaram a dar a devida referência ao regime jurídico de Direito Público e ocorreu uma inversão do eixo metodológico dessas escolas e da própria Ciência Jurídica. Hoje, o Direito Público influencia todos os demais ramos e questões como a propriedade ou a família têm uma referência constitucional”, salientou.

 

Nesse contexto, lembrou que, em relação ao Direito Privado, com longa tradição histórica, desde a sua origem no Direito Romano, o Direito Público é recente, em especial o Direito Administrativo, que passou a estruturar-se como ramo autônomo somente com o advento da Revolução Francesa: “Quando o Estado moderno, liberal, democrático passou a ser implementado, a partir da ascensão da burguesia ao poder político, foi preciso estabelecer limites à atuação do Estado, porque a burguesia necessitava de igualdade jurídica – ou liberdade para poder contratar – e respeito a sua liberdade negocial. Mas percebeu-se que as normas de Direito Privado eram insuficientes para isso. O Estado edita a ordem jurídica, mas, ao mesmo tempo, submete-se a essa ordem, sendo preciso criar normas jurídicas próprias para discipliná-lo”.  

 

O professor acrescentou, ainda, que, com o aumento da complexidade do Estado, ele deixou de ser apenas regulador, passando, também, a ser interventor e prestador de serviços: “Com isso, o Estado passou a necessitar de normas jurídicas de caráter especial, que lhe dotassem de prerrogativas para implementação dos interesses coletivos, e isso fez com que o Direito Administrativo passasse a se estruturar na Europa e no Brasil”.

 

Na sequência, discorreu sobre os princípios do Direito Administrativo, frisando, inicialmente, que ele deve se pensado em bases próprias, embora muitas vezes seus institutos ainda sejam aplicados sob a ótica do Direito Privado. “Isso implica grave equívoco metodológico, com graves consequências”, ressaltou.

 

Ele explicou que o regime jurídico de Direito Público é estruturado basicamente em torno de dois polos: prerrogativas e sujeições. “No processo de satisfação do interesse coletivo, o Estado é dotado de normas especiais e específicas – não encontradas no Direito Privado – para concretizar o interesse coletivo em face do individual. Mas, nesse processo, também existe a dimensão de proteção do indivíduo”, ressaltou, citando, como exemplo, o princípio da legalidade e lembrando que ele atua de forma muito diversa no Direito Público e no Direito Privado. “Há uma razão de proporcionalidade ou diálogo entre a satisfação desses interesses coletivos e a proteção aos direitos individuais, sendo necessária uma harmonização entre os dois polos”, ponderou.

A seguir, explicou o princípio da legalidade, chamando a atenção para a exigência do valor da moralidade: “É preciso ter o cuidado ético na exigência da administração do que é publico, ainda que o comportamento seja legalmente autorizado”. Destacou também o valor da igualdade, frisando que ela deve ser entendida nas suas duas vertentes: o tratamento isonômico e o dever de discriminação positiva, tratando situações diferenciadas de um ponto de vista diferenciado. 

Complementando a exposição, Paulo Magalhães discorreu sobre os demais princípios do regime jurídico administrativo: supremacia do interesse público, indisponibilidade do interesse público, presunção de legitimidade dos atos administrativos, autotutela, continuidade do serviço público, especialidade dos entes estatais, responsabilidade civil objetiva do Estado, e, por fim, o controle jurisdicional dos atos administrativos.

Em relação ao último, salientou que os atos da administração ficam ordinariamente sujeitos à revisão judicial: “A atuação da administração não é livre; sempre que ela agir e violar a legalidade ou a ordem jurídica, ou um direito individual ou coletivo, ficará sujeita ao controle judicial”. Ele explicou que esse princípio implica o princípio da legalidade e da inafastabilidade da jurisdição (“nenhuma ameaça ou lesão a direito pode ser subtraída da apreciação do Poder Judiciário”) e acrescentou que consiste em um processo de controle da revisão da legalidade extrínseca e da legitimidade (controle substancial), porque há um controle de mérito: “o juiz não pode substituir a vontade política do administrador, mas pode verificar ela se está de acordo com os valores da Constituição”.    

 

 


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