EPM inicia o curso “O Direito na era digital”

Os conceitos elementares do Direito e os desafios trazidos à Justiça na era digital, a substituição do papel e a segurança da informação, foram temas analisados na EPM, no último dia 8, na aula inaugural do curso de extensão universitária O Direito na era digital. A aula foi ministrada pelo juiz Fernando Antonio Tasso, coordenador do curso, e teve a participação do juiz Antonio Carlos Alves Braga Júnior, coordenador adjunto, ambos assessores da Presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo.

 

Fernando Tasso fez uma explanação geral sobre os temas a serem tratados no curso. “De nada adiantaria falarmos sobre o processo eletrônico se, ao julgarmos as causas que tratam da aplicação do Direito nesse novo contexto, não soubermos sequer ler uma perícia digital, por exemplo. O curso visa a familiarização com esses conceitos”, justificou.

 

“O Direito na era digital configura um novo ramo da ciência jurídica ou é um estudo interdisciplinar?”, inquiriu, à guisa de mote inicial. E partindo de uma definição preliminar de ramo de Direito, qual seja, aquele que é dotado de princípios, objeto e método próprios, o palestrante afirmou que os recursos tecnológicos permeiam relações jurídicas já conhecidas. Portanto, o avanço da informática trouxe novo contexto a fatos jurídicos já abrangidos por outros ramos da ciência jurídica. Com isso, o palestrante valeu-se de definição professor Augusto Marcacini, segundo o qual, “Direito da Informática é um estudo interdisciplinar das relações entre a informática e todos os ramos do Direito, voltado para a compreensão e enquadramento normativo dos novos fatos trazidos pela expansão da tecnologia e pela formação de uma sociedade em rede.”

 

Ele asseverou que o uso das ferramentas digitais para o desenvolvimento do processo incorporaram novos conceitos jurídico-tecnológicos ao nosso léxico ativo. E passou a discorrer sobre a natureza desses conceitos. Em princípio, estabeleceu a distinção entre dados e atributos da informação. Ensinou que a boa informação atende a quatro atributos para ser considerada hígida e utilizável, quais sejam, a confidencialidade (regrada pela resolução 121 do CNJ), a integridade, a disponibilidade e a autenticidade, que se traduz na certeza de que a informação provém de fonte identificada e confiável.

 

Adiante, teceu considerações sobre aspectos da desmaterialização documental, esclarecendo as distinções conceituais entre documento digital, assinatura digital, certificação digital e segurança dos documentos digitais, esta definida como “o arcabouço jurídico e tecnológico criado para a garantia da autenticidade, integridade e validade jurídica dos documentos em forma eletrônica”.

 

Antecedentes legislativos e forma atual do processo digital

 

De acordo com o palestrante, a regulamentação da forma digital dos atos processuais, nos termos da Lei 11.419/06, “Não foi uma geração espontânea, mas decorre de uma evolução legislativa bem remota.”

 

Na esteira desta afirmação, Fernando Tasso discorreu sobre os antecedentes do processo digital na legislação brasileira. Entre os dispositivos mencionados, citou o registro dos atos essenciais do processo por meio da taquigrafia (prevista no artigo 247 do CPC de 1939) e através da estenotipia (nos termos da nova redação do artigo 170 do CPC pela Lei 9.952/94); a gravação das audiências em fitas magnéticas nos juizados especiais cíveis e criminais (Leis 7.244/84 e 9.099/95); a criação de programas de informática para subsidiar a instrução das causas nos juizados especiais federais, através da Lei 10/259/01; a transmissão de informações processuais, tais como a carta precatória por meio de telegrama, radiograma ou telefone, conforme artigo 205 do CPC de 1979; a citação, intimação ou notificação por meio de AR, telex ou fac-símile, na forma do artigo 58, inciso IV da Lei 8.245/91 (Lei de locação); a autorização dos tribunais para disciplinar a prática e a comunicação dos atos processuais por meios eletrônicos, conforme artigo 154, parágrafo único, da Lei 11.280/06; a autorização das ferramentas processuais para penhora on line de ativos financeiros, de bens imóveis e para leilão, nos termos da Lei 11.382/2006.

 

Adiante, explanou a forma digital dos atos processuais praticados atualmente, tais como os modos de interação no ambiente eletrônico, o peticionamento eletrônico, a intimação e a citação eletrônica, a padronização da gravação, transmissão e armazenamento de audiências e a possibilidade telepresencial de sua realização.

 

Discorreu, ainda, sobre alguns princípios do Processo Civil que foram revisitados pelo processo eletrônico, entre os quais o da isonomia processual, que veda a priorização temática de demandas favoráveis ao Estado ou o desenvolvimento dos processos digitais em detrimento dos físicos; o do acesso à Justiça, que prevê o monitoramento da capacidade de absorção processual do Judiciário; o da gestão de infraestrutura e recursos e a criação de centrais facilitadoras e de apoio ao usuário; o do devido processo legal; o do contraditório, pela possibilidade de oitiva de testemunhas por carta precatória ou de ordem, de sustentação oral remota, de reuniões entre o juiz e as partes através do Skype; o da publicidade; o da duração razoável do processo e celeridade; o da oralidade e correlatos; o da economia processual; o da simplicidade e instrumentalidade das formas. No horizonte dos princípios a serem revistos, também descortinou o dos prazos processuais, diante da superação de etapas e eliminação da burocracia processual, bem como da disponibilidade onipresente e não excludente do processo.

 

O palestrante traçou, finalmente, um panorama dos desafios legais trazidos à Justiça. Entre estes, citou a conformidade aos órgãos de governança em termos de processo digital, entre os quais o mais importante, o CNJ com as suas resoluções em busca de uniformização da Justiça. Comentou, ainda, os desafios e as dificuldades da administração dos recursos humanos em face da necessidade de reorganização do efetivo para a composição do cartório do futuro. “O processo digital modificou a forma de trabalhar no processo na exata medida em que foi eliminada a prática de atos mortos, esses consistentes em atos materiais, hoje automatizados (grampeação, furação, juntada, transporte, impressão, certificação, numeração, carim, etc.). A automação desses atos gerou a redução do tempo de tramitação processual em até 70%”, asseverou.

 

Em seu exercício prospectivo, afirmou que a conformação do cartório do futuro implica a necessidade de direcionar os investimentos de recursos humanos ao gabinete de apoio ao juiz, aparelhando-o com mais funcionários, na medida em que as serventias passarão por um processo natural de enxugamento e fusão, formando cartórios que serviriam diversas varas judiciais. Ele ponderou que esse modelo já é conhecido com sucesso na Corte Paulista, dada a exitosa experiência em Segundo Grau, com o instrumento dos Gabinetes de Trabalho dos Desembargadores e a formação de Cartórios que atendem a Grupos de Câmaras, sendo objeto de um projeto piloto em desenvolvimento no Fórum João Mendes Júnior.

 

Fernando Tasso falou, finalmente, das dificuldades enfrentadas hoje para a implantação do processo criminal digital. “O Grande problema é o inquérito policial, pois não há como obrigar que ele seja digital desde a sua origem, pois dependente de terceiros para sua formação, que não estão sob a gestão do TJ, impondo-se a digitalização em caso de apelação.

 

O curso, ministrado às sextas-feiras, terá prosseguimento até 17 de outubro, de acordo com a programação a seguir:

 

Dia 15/8

Tema: A evolução do Direito na era digital – Legislação e jurisprudência. O Marco Civil. Aplicações práticas e desafios internacionais

Palestrante: professor Renato Opice Blum

 

Dia 22/8

Tema: Processo eletrônico e modernização da Justiça

Palestrante: juiz Gustavo Santini Teodoro

 

Dia 29/8

Tema: O serviço extrajudicial eletrônico: convergência com o processo civil digital.

Palestrante: juiz Antonio Carlos Alves Braga Júnior

 

Dia 5/9

Tema: Proteção do conhecimento na era digital. Direitos autorais e mídias digitais

Palestrante: professora Juliana Abrusio

 

Dia 12/9

Tema: Novos modelos de negócios. Contratos Eletrônicos e responsabilidade civil. Loja virtual, leilão virtual, venda pelas redes sociais. Contratos eletrônicos em espécie, provas digitais e validade jurídica.

Palestrante: professor Marcos Gomes da Silva Bruno

 

Dia 19/9

Tema: Concorrência desleal, segurança da informação e meios de controle. Riscos corporativos no uso de novas tecnologias: implicações no direito do trabalho e no direito de privacidade.

Palestrante: professor Rony Vainzof

 

Dia 26/9

Tema: Você é o que compartilha – o uso das redes sociais e o case Tribunal de Justiça de São Paulo

Palestrante: professor Gil Giardeli

 

Dia 3/10

Tema: Redes sociais e riscos. Gerenciamento de crises e perspectivas

Palestrante: professora Martha Gabriel

 

Dia 10/10

Tema: Prova e perícia digital. Preservação das evidências em redes: sociais, internet, interativas, digitais. A função do perito especializado, riscos na produção da prova digital e cases.

Palestrante: professor Giuliano Giova

 

Dia 17/10

Tema: Crimes eletrônicos e os Tribunais. Os crimes eletrônicos e a legislação. Encerramento

Palestrante: professor Renato Opice Blum

 

ES (texto e fotos)

 

 


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