Políticas públicas de segurança são analisadas em aula na EPM

No último dia 10, a programação do curso Controle jurisdicional das políticas públicas e responsabilidade do Estado foi dedicada ao tema das políticas públicas de segurança. A aula foi ministrada pela juíza Alexandra Fuchs de Araujo (foto) e contou com a participação do juiz Luis Manuel Fonseca Pires, coordenador do curso e da área de Direito Público da EPM.

Inicialmente, a palestrante conceituou política pública de segurança como uma obrigação do Estado, advinda de previsões constitucionais, estabelecendo-se como programas de ação destinados à prevenção, ao controle e à repressão da criminalidade, de modo a situá-la num limite que não ameace a harmonia social e a própria ordem estabelecida.

De acordo com Alexandra Fuchs, no processo de realização da política pública de segurança deve haver uma atuação coordenada dos órgãos federais com os órgãos dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, além da participação da sociedade em ações de assistência técnica e de mobilização social, bem como de controle democrático.

 

Adiante, ela discorreu sobre a base normativa da segurança pública, exercida pelos órgãos policiais “para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio”. Ensinou tratar-se de direito fundamental previsto no preâmbulo e no artigo 5º da Constituição Federal como direito individual; como direito social e como dever do Estado no artigo 6º; como direito e responsabilidade coletiva no artigo 144 do mesmo diploma.

 

Após a explicitação do contexto legal, apontou, por meio de dados estatísticos, o aumento da violência no âmbito nacional. Ela revelou que a taxa de homicídios dolosos no país cresceu 7,8% entre 2011 e 2012; os latrocínios cresceram 140% no mesmo período; as mortes por arma de fogo representaram, em 2011, 70,4% dos homicídios; a taxa de estupros alcançou 26.1 ocorrências por 100 mil habitantes.

 

Diante do mapa da violência, a professora afirmou que, embora exista uma política de segurança pública no Brasil, cuja previsão de investimento representa 6% do PIB, seu orçamento praticamente não é realizado. E asseverou que apenas 30% dos 2,2 bilhões de reais orçados em 2013 foram efetivamente investidos na área. “Esses dados, por si, justificam o controle judicial da política pública de segurança”, concluiu Alexandra Fuchs.

 

Adiante, ela comentou a existência de uma ampla legislação infraconstitucional envolvendo segurança pública no país, materializada em projetos de diversos órgãos governamentais e não governamentais, como ONGs e conselhos comunitários.

 

Sob o prisma do funcionamento das diversas ações programáticas, segundo o desenho normativo, ela deteve-se no Plano Nacional de Segurança Pública, que envolve várias ações governamentais no âmbito federal a serem implementadas, cuja agenda de compromissos, em uma ordem de relevância, prevê o combate ao narcotráfico e ao crime organizado; o desarmamento e controle de armas; a repressão ao roubo de cargas e melhoria de segurança nas estradas; a implantação do subsistema de inteligência de segurança pública; a ampliação do programa de proteção a testemunhas e vítimas de crime; e a regulamentação do tratamento dado pela mídia à violência.

 

Já no âmbito da cooperação entre o Governo Federal e os Estaduais, ela citou as metas de redução da violência urbana; a inibição de gangues e combate à desordem social; a eliminação de chacinas e execuções sumárias; o combate à violência rural; a intensificação das ações do Programa Nacional dos Direitos Humanos; a capacitação profissional e reaparelhamento das polícias; e o aperfeiçoamento do sistema penitenciário.

 

De acordo com a palestrante, a estratégia de implantação da política pública de segurança evoluiu desde seu início, em 2000. “Ligada inicialmente apenas ao aspecto da execução penal, hoje existe uma visão interdisciplinar da segurança pública, indissociável de outros direitos fundamentais”, salientou.

 

Fundamentos para o controle jurisdicional das políticas públicas

 

Na perspectiva da segurança como direito essencial necessário para compor a dignidade, Alexandra Fuchs afirmou que suas prestações, graduais, são passíveis de universalização. “Onde há direitos exigíveis e inexigíveis, cabe ao Poder Judiciário determinar casuisticamente esses espaços e à doutrina oferecer regras gerais capazes de auxiliar nessa tarefa”, ponderou.

 

A palestrante observou que as ações individuais de reivindicação de direitos fundamentais, como instrumentos de implementação de políticas públicas, têm se revelado mais eficazes que as ações coletivas. Ela lembrou, no campo da saúde, o êxito obtido na garantia de fornecimento de medicamentos essenciais à conservação da vida. No plano da segurança pública, mencionou, entre outros casos, a obtenção de vagas no sistema prisional e a aquisição de viaturas para delegacias policiais.

 

“A impressão é que a ação coletiva não foi feita para a efetivação de políticas públicas por sua dimensão e complexidade. Esse tipo de ação envolve um ator social, tem grande força de repercussão, afeta o orçamento público de forma mais significativa do que na ação individual e também coloca em xeque a própria política do Executivo, diferenciando-se muitas vezes da forma prevista em lei”, comentou Alexandra Fuchs.

 

A origem das dificuldades para a implementação das políticas públicas

 

Em prosseguimento, a palestrante asseverou que, no campo da implementação das políticas públicas no país, configura-se uma tensão entre os Poderes: “Embora o ideal republicano pressuponha a atuação cooperativa dos Poderes, o Legislativo pugna pela implementação dos programas na forma prescrita em lei; o Executivo, com frequência, no exercício de suas próprias razões, não realiza o orçamento; e o Judiciário luta pelo controle e estabelecimento de novas técnicas para sua efetiva implementação”.

 

Sob este aspecto, falou sobre os impasses do controle das políticas públicas pelo Judiciário. “Sem perder de vista o papel da sentença como instrumento de pressão a favor dos atores sociais titulares de direito em face do Executivo e de submissão do administrador ao controle do Judiciário, os mecanismos à disposição do juiz muitas vezes revelam-se ineficazes. A execução dos provimentos das ações coletivas esbarram na resistência do Executivo ou em dificuldades de ordem prática, como, por exemplo, o bloqueio de verbas e o estabelecimento de processos de licitação para a reforma ou construção de presídios para sentenciados e creches para crianças. Por outro lado, as multas estipuladas transformam-se em precatórios, a serem pagos, talvez, algum dia.”

 

No que tange à responsabilidade objetiva do Estado pela indenização de danos materiais individuais decorrentes de omissão ou má gestão no cumprimento de política de segurança pública, a professora apontou a possibilidade do bloqueio direto de verbas orçamentárias para o pagamento de indenizações e pensões, lembrando precedente em acórdão do STF.

 

A palestrante comentou, ainda, dificuldades análogas enfrentadas por outras nações na implementação de políticas públicas. Asseverou, finalmente, que a política pública de segurança nacional acaba não se realizando por sua complexidade, por não haver a consensualidade ideal em torno do dever constitucional. Em nome de uma visão dialética e dialógica do problema, afirmou que “não podemos entendê-la apenas como reforma legislativa para tornar as leis penais mais rigorosas, ou como política carcerária para garantia de direitos aos presos. Sem a participação de todos os atores sociais no próprio processo de controle judicial das políticas públicas, inclusive trazendo o administrador para o processo, é muito difícil mudar esse quadro negativo”.

 

ES (texto e fotos)

 

 

 


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