Vicente Greco ministra aula sobre crimes econômicos na EPM

O crime de lavagem de dinheiro e os crimes econômicos foram tema da palestra do professor Vicente Greco Filho (foto), no último dia 30, no Curso de atualização em Direito Processual Penal da EPM. A aula contou com a participação do juiz Carlos Alberto Corrêa de Almeida Oliveira, coordenador do curso e da área de Direito Processual Penal da Escola. 

“Na evolução dos tempos, tivemos a modificação no perfil dos bens jurídicos tutelados. A concepção dos direitos individuais evoluiu para uma preocupação com direitos coletivos e direitos difusos.” Com esta assertiva, o palestrante iniciou sua exposição, em que discorreu sobre as divergências doutrinárias para identificação da abrangência do Direito Penal Econômico e, em seu âmbito, os meios de prova, bloqueamento de patrimônio, liberdade provisória, penas alternativas e outros temas polêmicos. 

Vicente Greco fez preliminarmente observações sobre a história do Direito Penal. Asseverou que o foco nos direitos individuais remonta à pré-história da regulação da relação entre indivíduos e destes com o mundo. “A tutela de bens jurídicos individuais, como a salvaguarda de bens móveis do furto, já estava no Código de Hamurabi; o Direito Romano já penalizava o homicídio e o estelionato. Não é que os direitos individuais ou individualizados tenham sido colocados de lado, mas tiveram um paralelo de incremento da importância de outros direitos, de igual ou maior relevância na convivência social”, ensinou.

 

A crise do princípio da responsabilidade individual no Direito Penal Econômico contemporâneo

 

A seguir, o palestrante discorreu sobre a evolução do perfil do criminoso ao longo da história do Direito Penal. “No passado, pensava-se no criminoso enquanto pessoa individualizada. E isto perdurou até a época clássica da ética positiva de Lombroso (Cesare Lombroso, 1835–1909) e de Ferri (Enrico Ferri, 1856–1929). Hoje, a preocupação maior do Direito Penal – e contra a qual ainda não encontrou uma resposta adequada – é com a criminalidade organizada.

 

O professor afirmou que a nova forma da criminalidade é de tal forma permeável com as tradicionais que, hoje em dia, a ela estão ligados diretamente mesmo aqueles crimes que tem um bem jurídico individualizado. “Figuras como o PCC, por exemplo, estão ligadas a furto de automóveis ou a homicídios pontuais intergangues, por ódio ou disputa de território”, ilustrou.

 

Nesta esteira, ele afirmou que a alteração do criminoso levou a uma fusão da criminalidade ligada a interesses individuais àquela relacionada aos interesses difusos, um fenômeno da modernidade. Nesta perspectiva, citou crimes impensáveis há três séculos, como os de trânsito, os ligados ao meio ambiente e ao direito autoral, como a pirataria.

 

Entre as preocupações ligadas ao contexto da criminalidade organizada e ao Direito Penal Econômico, discorreu sobre o caso da Espanha, “país que vem liderando de uma maneira muito curiosa as alterações doutrinárias a respeito”. Ele revelou que o último Código Penal espanhol, editado na década de 90, por influência do jurista Diego-Manuel Luzón Peña, incluiu os chamados delitos econômicos com uma alínea muito bem definida, tratada dentro de uma parte geral ligada à personalidade da pena, à responsabilidade, ao Direito Penal da culpa e à individualidade da prática do delito. Em consequência, o Código desta época divide-se em crimes contra os patrimônios individual e coletivo.

 

“A Espanha entrou numa das piores crises por falta de uma fiscalização administrativa, especialmente das instituições financeiras. Houve uma débâcle geral em termos econômicos e esse fenômeno, puramente social e econômico, gerou uma superlegislação de ordem econômica e de combate a delitos e a infrações econômicas, a ponto de se pensar que o Direito geral Econômico precisa de uma parte especial”, pontuou o professor.

 

Vicente Greco salientou que, ao lado dessa problemática do Direito Penal Econômico, a Europa moderna, também em virtude desse mesmo fenômeno, desenvolveu uma preocupação muito grande com a corrupção, porque os grandes golpes econômicos estiveram e estão ligados à corrupção, seja a estatal, seja da empresa ou do aproveitamento da condição econômica menos favorecida das pessoas envolvidas como captações de empresas fantasmas e outros crimes contra a economia popular.

 

Em síntese, o professor ressaltou que “Direito Penal Econômico e corrupção constituem os dois focos principais da preocupação europeia do combate à criminalidade, ainda sem uma resposta adequada, porque o sistema tradicional do Direito Penal exige o princípio da culpa, o princípio da imputação, o princípio da causalidade, o princípio da personalidade da pena, dos quais não se pode abrir mão à custa de punir quem quer que seja”.

 

As novas formas de combate aos crimes econômicos

 

O professor discorreu ainda sobre a internacionalização dos crimes, um fenômeno da globalização, e dos sistemas jurídicos de controle adotados nos países para o combate à corrupção. Ele comentou, a propósito, que “o controle do sistema financeiro no Brasil, inclusive no que se refere à garantia dos aplicadores, é um dos mais rigorosos e apurados do mundo inteiro”.

 

No novo contexto do Direito Penal – e dos novos mecanismos para identificação do inimigo do Estado no que tange à proteção de pessoas fragilizadas diante do poder econômico –, afirmou que teorias como a da cegueira deliberada (no caso dos crimes por omissão previstos no artigo 13 do CP) e da responsabilidade pela estrutura de poder criada para atos ilícitos, ganharam importância fundamental na relação de causalidade, responsabilização dos crimes e imputação das penas.

 

No que se refere à corrupção, Vicente Greco ensinou que a Espanha optou por punir a pessoa jurídica no âmbito do Direito Penal, ao contrário do Brasil, cuja responsabilização é buscada no campo do Direito Administrativo e Civil, na forma da Lei 12.846/2013. “Com isso, aquela nação quebrou todo o Direito Penal na sua parte geral, porque a parte geral do Código Penal, como nós a conhecemos e estudamos, não serve para a pessoa jurídica, pois a esta não se imputa culpa, dolo, negligência ou imprudência. Tampouco tem personalidade, no sentido de sofrer a pena”.

 

Com isso, o professor concluiu que a punição da empresa adotada pela Espanha foi uma péssima solução, porque estas sofrem mutação, e a medida penal acabou prejudicando os grandes e pequenos acionistas, não logrando atingir o autor da falcatrua e criando o fenômeno da plurivitimização.

 

Diante dessa problematização, citou a edição de diversas convenções internacionais para o combate à corrupção em geral, não só a praticada por funcionário público (estatal), mas também aquela caracterizada como um desvio de conduta para um favorecimento pessoal, destacando aquelas que considera mais importantes, quais sejam, as de Mérida e a Convenção Interamericana contra a Corrupção.

 

Em prosseguimento, Vicente Greco discorreu sobre a Lei de Lavagem de Valores, a 9.613/98, com alterações substanciais pela Lei 12.683/2012. “A Lei de Lavagem de Dinheiro, que visa a descoberta ou a identificação da origem do dinheiro para coibir a organização criminosa, baseada em tratados internacionais, parte do princípio que é por meio dessa atividade que a organização criminosa alcança os benefícios decorrentes dos crimes contra a ordem econômica, contra o meio ambiente, os de tráfico de pessoas ou de drogas”, frisou.

 

O professor apontou, finalmente, avanços no campo da cooperação internacional para o combate à lavagem de dinheiro. “Hoje, vemos antigos paraísos fiscais, como a Suíça, fornecendo elementos e repatriando valores para a reparação da evasão de divisas, diante de uma pressão internacional para a incriminação dessas condutas ilícitas”.

 

ES (texto)


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