Guarda compartilhada, “Lei da Palmada”, abandono afetivo e alienação parental são analisados na EPM
No dia 1º de outubro, a programação do curso de extensão universitária Temas controvertidos de Direito de Família e Sucessões foi dedicada ao estudo da guarda compartilhada, da chamada “Lei da Palmada”, do abandono afetivo dos filhos e da alienação parental. A aula teve como expositora a professora Ana Carolina Silveira Akel e contou com a participação da juíza Flávia Poyares Miranda, coordenadora do curso e da área de Direito de Família e Sucessões da EPM.
Ana Carolina Akel falou inicialmente de dois elementos comuns aos temas em questão, constituintes da base da felicidade humana. “Antes de qualquer coisa, temos que falar do amor e do afeto, cuja somatória tem como sinônimo a felicidade, pois todos gostamos de recebê-los”. E aduziu que, além de gostar de recebê-los, a criança e o jovem necessitam desses ingredientes, reputados imprescindíveis à sua formação, para que vivam bem e sejam felizes.
Ela asseverou que o ordenamento jurídico geral tem que se adequar às realidades sociais. “O Direito de Família mudou de forma significativa nos últimos vinte anos, e os temas aqui tratados demonstram as mudanças que o ele sofreu e vem sofrendo. Positivados nas leis infraconstitucionais como o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Código Civil e o Código Penal, esses institutos visam assegurar a supremacia do interesse do menor, garantindo a eles princípios constitucionais como a vida, a integridade física e mental, a liberdade, a igualdade, a felicidade, a paternidade responsável”, ensinou.
Racionalidade da guarda compartilhada para a preservação dos afetos
A professora comentou, a seguir, a Lei 11.698, que dá aos pais que estiverem em processo de separação a opção pela guarda compartilhada, em que ambos dividem responsabilidades e despesas quanto à criação e educação dos filhos. “Ela surgiu justamente para minimizar a dor e o sofrimento dos filhos, uma alternativa ao papel tradicional da mãe como genitora-guardiã e do pai como provedor de alimentos”, esclareceu.
Ela discorreu sobre a racionalidade do instituto, em um contexto de ausência de investimento no êxito e duração do casamento. De acordo com a palestrante, em sua base está a celeridade do mundo moderno, fenômeno que acarretou a perda de solidez nas relações interpessoais. “O que não é sólido não se sustenta no tempo, extingue-se rapidamente”, refletiu. E destacou, também, o novo perfil da mulher: “inserida no mercado de trabalho, economicamente ativa e participando em pé de igualdade na vida profissional, ela não mais se sujeita à condição de dependência econômica de maridos e companheiros”.
Entretanto, observou que, embora ainda subsista a guarda uniparental, prestigia-se a utilização da guarda compartilhada. Mas, dado o caráter não impositivo do instituto, “o estabelecimento da guarda compartilhada só é possível nas situações em que pai e mãe percebem que aquilo que acabou foi o ‘casal conjugal’ e não o ‘casal parental’, que subsiste ao tempo. Tanto que, de acordo com a jurisprudência, o consenso é fundamental para a utilização da guarda compartilhada.”
Ela comentou ainda que muitos profissionais do Direito ainda desconhecem a guarda compartilhada – que mantém os vínculos afetivos latentes –, confundindo-a com a guarda alternada, não recepcionada pelo Código Civil. A diferença, explicou, consiste em que, “a guarda compartilhada é estabelecida pelo princípio da estabilidade e da confiança. Assim, a criança não é um pingue-pongue, como na guarda alternada. Naquela, é necessário que seja fixado o lar habitual da criança, quem será o genitor-guardião, prevendo-se a flexibilização de visitas ao genitor-visitante, o estabelecimento das rotinas necessárias à vida da criança, mediante regras oriundas do diálogo entre os envolvidos, baseadas no imperativo jurídico do bom senso e da razoabilidade.”
Tentativas de alienação parental e suas consequências
Em prosseguimento, a palestrante comentou a Lei 12.318/2010, que dispõe sobre a prática da alienação parental. Ela explicou que a alienação parental ou “implantação de falsas memórias” é uma patologia que ocorre quando uma das partes envolvidas na separação, geralmente a mãe, não se conforma e não consegue superar seu luto. Promove, então um jogo de manipulação e fomenta na criança, ainda sem poder de discernimento, a rejeição ou ódio pelo outro genitor, através da criação de situações mentirosas e inverídicas.
Ela valeu-se da definição do psiquiatra norte-americano Richard Gardner, a primeira pessoa que falou da doença, na década de 1980, que diz: “a síndrome da alienação parental é o transtorno caracterizado pelo conjunto de sintomas que resulta no processo pelo qual um progenitor transforma a consciência de seus filhos mediante diferentes estratégias, com o objetivo de impedir, obstruir ou destruir seus vínculos com o outro progenitor, até torná-la contraditória. Praticar alienação parental é programar uma criança para que odeie o genitor sem qualquer justificativa. Trata-se de verdadeira campanha para desmoralizar o genitor. O filho é usado como instrumento da agressividade direcionada ao parceiro. A mãe monitora o tempo do filho com o outro genitor, como também os sentimentos com ele”.
Segundo a professora, os dados da ocorrência do fenômeno são alarmantes. “Estima-se que hoje, em 80% das separações, exista alienação parental em graus e níveis diferentes”, informou. Diante desse quadro, comentou a necessidade de profissionais do Direito preparados para coibi-la, evitando suas consequências nefastas para a criança. Mas também apontou a necessidade de prestação de ajuda médica especializada ao genitor-alienador.
Adiante, discorreu sobre a natureza jurídica do afeto no âmbito do Direito de Família. “O afeto não pode ser cobrado. No entanto, a ausência dele, cujas consequências são tão nefastas ao filho, gera o dever do genitor de indenizar para compensar o mal causado por sua omissão”, ponderou. E citou julgado do TJSP nesse sentido.
Ana Carolina Akel discorreu finalmente sobre a Lei 2.654/03, a chamada “Lei da Palmada”, também conhecida como “Lei Menino Bernardo”, que alterou alguns artigos do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/1990), pela qual não é mais permitido o uso do castigo físico e o tratamento cruel ou degradante à criança. Em seus comentários, ponderou que faltou ao legislador acrescentar à lei a proibição de negligência e de violência psicológica.
ES (texto)