Aspectos controvertidos da sucessão dos companheiros são debatidos na EPM

O professor Zeno Augusto Bastos Veloso foi o palestrante do curso de extensão universitária Temas controvertidos de Direito de Família e Sucessões da EPM no último dia 5. Ele discorreu sobre os aspectos controvertidos do artigo 1.790 do Código Civil, que trata do regime sucessório dos companheiros, em aula que contou com a participação do professor José Fernando Simão, como debatedor, e da juíza Flávia Poyares Miranda, coordenadora do curso e da área de Direito de Família e Sucessões da Escola.

 

“Diante de tantas controvérsias, como é que os operadores do Direito estão conseguindo expor suas ideias e resolver problemas sucessórios com os artigos 1.790 e 1.829, que trata da sucessão dos cônjuges?”, indagou Zeno Veloso, preliminarmente. Adiante, fez uma explanação histórica da união estável. “A união estável existia no Brasil, há algumas décadas com outro nome, mas fingiam que não existia, ‘para manter a paz e a tranquilidade das famílias’, entendendo-se como tais aquelas constituídas formalmente pelo casamento. Era esta que merecia o respeito e o aplauso de todos. As outras eram famílias de segunda ou terceira classe, com o silêncio e o beneplácito do legislador”, asseverou.

 

Nesse contexto social excludente, explicou o professor, empregavam-se termos hoje em desuso, como filiação ilegítima, bastardia e filiação adulterina para dessignar os filhos concebidos na relação extraconjugal.  “Era nas costas destas crianças que vinha o chicote da sociedade, em nome da paz e da tranquilidade das famílias”, exclamou.

 

Ele falou ainda das múltiplas formas de discriminação sofridas pela mulher desquitada antes da vigência do Código Civil de 2002. E diante da resistência moral da sociedade, lembrou o jurista e senador Nelson Carneiro e as lutas pelos direitos de filhos de pais não casados e mulheres brasileiras com o estabelecimento do divórcio.

 

De acordo com Zeno Veloso, foram essas lutas nos bastidores políticos e institucionais que culminaram com os aportes das conquistas no campo do Direito de Família na Constituição, notadamente a igualdade entre os cônjuges e os filhos e o reconhecimento da união estável. Tanto que “um dos capítulos inaugurais do Direito de Família na Constituição preconiza que “a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado” (artigo 226), ao contrário das outras, que diziam “a família, constituída pelo casamento, tem proteção do Estado.”

 

Com isso, defendeu o palestrante que a Constituição tornou-se mais democrática com os direitos civis nela inseridos, entre os quais os direitos dos companheiros na união estável. Entretanto, em seu entendimento, o legislador brasileiro sempre foi refratário em questões de Direito de Família. “O Brasil foi um dos últimos países a estabelecer o divórcio, como está sendo agora um dos últimos a regular a união homoafetiva na instância legislativa”, afirmou.

 

Entre outros aspectos, ele analisou o inciso II do artigo 1.790 do CC, adiante reproduzido: “A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes: (...); II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles”.

 

Conforme recordou Zeno Veloso, a expressão “sucessão de companheiros”, constante das disposições gerais dos direitos das sucessões, foi introduzida por Nelson Carneiro. De acordo com o novo regramento, estendeu-se aos participantes a partilha de bens adquiridos onerosamente durante a união estável. “Contudo, apesar dos avanços legais na defesa dos companheiros e dos filhos havidos na relação extraconjugal, o inciso I do supracitado artigo impõe-lhes restrições para o recebimento da herança, ao contrário do cônjuge.

 

Outro aspecto do dispositivo legal debatido foram as dificuldades matemáticas para a partilha de bens deixados pelos companheiros aos membros concorrentes de famílias híbridas. Sob este aspecto, além de explicar regras assentes para a divisão de bens, o professor José Simão comentou decisão da corte paulista favorável à companheira, em ação em que o município queria arrecadar os bens não onerosamente adquiridos, com base na teleologia sistemática da norma, cujo entendimento é o de que o Estado não pode receber bens deixados pelo falecimento em detrimento do companheiro.

 

ES (texto)


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