Execução de bens, ações afirmativas e ativismo judicial são debatidos no Curso de Formação Inicial

O Curso de Formação Inicial promovido pela EPM para os juízes substitutos aprovados no 184º Concurso de Ingresso teve continuidade na última semana com debates sobre temas como a execução e o cumprimento de sentença, ações afirmativas e combate à discriminação racial e ativismo judicial.

 

No dia 24 de novembro, os novos juízes assistiram palestras ministradas pelos juízes Gilson Delgado Miranda e Evandro Carlos de Oliveira sobre aspectos práticos do procedimento de execução de título extrajudicial e cumprimento de sentença. As preleções contaram com o apoio e participação do juiz coordenador do curso Marcos Pimentel Tamassia.

 

Entre outros tópicos atinentes à busca judicial de bens do devedor para a satisfação do credor, os expositores discorreram sobre a forma dos atos de constrição, como a penhora e o arresto, e sobre alienação judicial e particular para a satisfação do crédito.

 

Ações afirmativas – discriminação racial

 

Já no dia 25, o advogado Sílvio Luiz de Almeida, presidente do Instituto Luiz Gama, debateu com os participantes o tema das ações afirmativas para promoção da igualdade étnica e repúdio ao racismo, com ênfase nos atos praticados pelo Estado para coibir práticas discriminatórias através da sanção penal e no empreendimento de ações promocionais para a efetivação dos direitos fundamentais elencados na Constituição Brasileira.

A aula contou com a participação do juiz Hamid Charaf Bdine Júnior, integrante da coordenação do curso.

 

O palestrante discorreu sobre as formas de discriminação racial, as cotas raciais na educação e no serviço público, a questão dos limites da liberdade de expressão e o estado desse debate no âmbito do Direito Constitucional brasileiro. Comentou ainda a jurisprudência criada para coibir o racismo e afirmar a cidadania.

 

“Entendido de maneira geral como um ato de violência e exclusão sobre indivíduos ou grupos sociais que pertencem ou fazem parte de ambientes em que foram historicamente excluídos, o racismo é um processo de discriminação por conta de certas características que os indivíduos não são capazes de controlar, porque ninguém escolhe ser mulher ou homem, negro ou branco, ou a própria estrutura do seu desejo. Entretanto, o racismo transcende esta definição. Ao contrário do preconceito, que não tem um caráter sistêmico, a vítima do racismo não sofre apenas um prejuízo da autoestima, mas de toda a sua vida, em seus aspectos relacionais e econômicos”, ensinou Sílvio Luiz.

 

De acordo com o palestrante, impõe-se àqueles que lutam contra a sua prática do racismo uma dupla tarefa: o combate para anulação dos seus efeitos e transformação das relações sociais e das próprias instituições formadas eu seu ambiente. “Não defino ações afirmativas apenas como políticas públicas, porque podem ser aplicadas também no setor privado. É possível que, constatada a discriminação no setor privado, ele próprio resolva instituir medidas que visem combater a desigualdade”, sustentou o professor.

 

Impacto das decisões e ativismo judicial - separação de Poderes

 

No dia 26 de novembro, os juízes Alberto Alonso Muñoz e Luís Manuel Fonseca Pires analisaram decisões e ativismo judicial e seus impactos sociais, na perspectiva da separação de Poderes, adentrando a seara de casos concretos que os juízes poderão enfrentar no cotidiano da prestação jurisdicional. O encontro contou com a mediação do juiz Marcos Pimentel Tamassia, integrante da coordenação do curso.

 

O debate sobre o tema da interferência nas políticas públicas na contemporaneidade do sistema jurídico brasileiro foi introduzido por uma preleção feita por Alonso Muñoz. Em sua contextualização histórica da formação do Estado de Direito, ele descortinou a evolução do papel do Poder Judiciário e as restrições e ampliações das premissas de atuação do magistrado no tempo. Lembrou que a definição do papel do juiz como estrito aplicador da lei foi estabelecida pelo Direito positivista ou normativista do século XIX, vigente no Brasil até a Constituição de 1988, quando a instituição dos princípios fundamentais e sua aplicação às esferas da vida pública e privada redefiniu o perfil ideal do magistrado como um “criador do Direito”.

 

Adiante, o palestrante levantou o binômio ativismo judicial e legitimidade na reflexão sobre o impacto social do controle das políticas públicas. Ele comentou as três mais importantes objeções ao ativismo, seja em intenções expressas pelo mercado ou pelos discursos na esfera dos Poderes Legislativo e Executivo.

 

De acordo com Alonso Muñoz, a primeira objeção ao ativismo é feita por meio do argumento de que o Judiciário não tem legitimidade para interferir na formação de políticas públicas por não ser eleito. “Lembrem-se, entretanto, que essa legitimidade decorre da aplicação da norma mais importante para garantia do mínimo existencial, que é a Constituição”, contrapôs o palestrante.

 

A segunda objeção é a assertiva da introdução da irracionalidade administrativa através das decisões, ao modificar ou contrariar a racionalidade das políticas públicas e do planejamento orçamentário formulado pelo Poder Executivo. Esta objeção foi refutada pelo analista com a afirmação da necessidade de calibragem das políticas públicas para assegurar a efetivação dos direitos fundamentais, como ocorreu na decisão que compeliu o poder público a fornecer o coquetel para tratamento da Aids em um passado recente.

 

A última objeção foi a da “reserva do possível”, que se traduz como a limitação orçamentária para cumprimento de determinada decisão judicial na área da saúde, por exemplo, objeto de ativismo judicial altamente polêmico. Ele ponderou que, no caso da saúde, a dotação é apenas uma das peças do orçamento, passível de ser comprometida pela decisão política.

 

Fonseca Pires, por seu turno, também recorreu à história para uma breve reflexão sobre a evolução do controle judicial da esfera da atividade pública. Em um segundo momento, relacionou premissas argumentativas favoráveis e contrárias ao controle judiciário do Estado, tendo apresentado, ao final, oito paradigmas para o controle dos atos políticos e políticas públicas.

 

“Todo esse percurso e reflexão crítica converge para o desafio de uma abordagem prática da dogmática aplicada aos temas de transformação do momento em que vivemos. Esses paradigmas permitem pensar casos complexos que vocês poderão enfrentar brevemente, como o controle judicial do fornecimento de medicamentos, o fornecimento de prótese, a prestação do serviço de home care ou assistência domiciliar, a restrição de tatuagens para ingresso no cargo de policial militar, o desfazimento de ciclovias, e a  inscrição em programa habitacional, entre outras ações coletivas ou individuais que irão surgir”, esclareceu o magistrado.

 

ES (texto e fotos)


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