EPM inicia o curso “25 Anos do Código de Defesa do Consumidor”

Com  palestra ministrada pelo juiz Claudio Luiz Bueno de Godoy, conselheiro da EPM, teve início, no último dia 3, o curso 25 Anos do Código de Defesa do Consumidor. A aula inaugural foi dedicada ao estudo da responsabilidade pelo vício do produto e teve a participação dos coordenadores do curso, desembargadores Francisco Eduardo Loureiro e Tasso Duarte de Melo.

 

Com aulas semanais até 2 de junho, o curso visa propiciar a reflexão sobre os avanços e desafios na aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC), e  debater a importância de ações voltadas à educação para o consumo.

 

Ao iniciar sua exposição, Claudio Godoy observou que a  responsabilidade civil foi tratado de maneira inovadora no Código de Defesa do Consumidor e continua atual. Ele ressaltou que há um valor básico da disciplina nas relações de consumo, lembrando que o CDC baseou-se fortemente na “teoria da qualidade”: “o que se pretende com essa disciplina no CDC é assegurar a qualidade justamente esperada pelo consumidor, quer do produto, quer do serviço”.

 

Nesse sentido, recordou que a responsabilidade no CDC é construída sobre o princípio da boa-fé objetiva, que tem, entre suas funções, a supletiva, “em que enriquece o vínculo obrigacional com deveres comportamentais de lealdade, com valores como o segredo, a informação, a segurança, a correção”. Ele frisou que o princípio é cardeal no CDC, que estabelece que todas as relações de consumo devem ser permeadas pela exigência de conduta solidária (artigo 4º, inciso III, do CDC). E acrescentou que o princípio tem uma atuação particular em duas partes especiais do CDC, em sua função supletiva: na matéria relativa à oferta e à publicidade, amparada no dever de informação e transparência, e no campo da responsabilidade nas relações de consumo, em que “há atuação não apenas do dever de transparência, mas também do dever de segurança”.

 

Claudio Godoy ressaltou ainda que o CDC visa assegurar a situação de alguém considerado vulnerável, estabelecendo assim uma proteção especial à justa expectativa do consumidor: “o que se quer no CDC é assegurar a qualidade razoavelmente esperada do produto ou do serviço, como forma de dar vazão a um imperativo de solidarismo na relação consumerista, uma consequência da boa-fé objetiva”. Ele explicou que a qualidade se desdobra na matéria relativa à responsabilidade no CDC em segurança e em adequação aos fins ou prestabilidade. “Quando falta a qualidade segurança, dá-se o fato do produto ou do serviço ou acidente de consumo (artigos 12 a 14). Quando falta a adequação, dá-se o vício do produto ou do serviço”, complementou.

 

A seguir, estabeleceu um paralelo entre os sistemas do Código Civil (CC) e do CDC em relação ao tema, apontando as principais diferenças entre eles. Inicialmente, observou que o CC regulamenta relações entre iguais ou paritárias, razão por que as normas de incidência dos vícios redibitórios (ocultos) são muito mais restritas do que as de incidência da responsabilidade pelo vício no CDC. Por sua vez, nas relações consumeristas há “uma inerente diferença entre as partes, um desequilíbrio intrínseco na relação”. “O legislador consumerista constatou – e esse foi o pressuposto de ordenação dessa matéria – que o sistema civil comum dos vícios era insuficiente para dar cabo de um imperativo constitucional de proteção de alguém vulnerável”, explicou, citando a oferta massiva de produtos e serviços, com técnicas agressivas de publicidade, e a ausência de espaço para negociação livre, como ocorre nas relações paritárias. “Era de se esperar que a disciplina dos vícios do produto no CDC fosse muito mais ampla do que no CC”, ponderou.

 

Ele lembrou também que no CC exige-se que o vício seja redibitório para a responsabilização, exigência que inexiste no CDC, tendo em vista a vulnerabilidade do consumidor: “os vícios de prestabilidade podem perfeitamente ser aparentes. A diferença vai se refletir na contagem dos prazos para a reclamação dos vícios do produto no CDC”, explicou. E recordou que no CDC há uma regra imperativa indisponível às partes, que impede que o regime se afaste por convenção (artigo 25), “ao passo que no CC o regime de proteção diante do aparecimento de vícios redibitórios é afastável por convenção das partes”.

 

Outra diferença apontada foi o fato de que, no CC, além das medidas comuns concedidas em caso de vício (redibição ou devolução e estimação), para haver indenização, é preciso que se demonstre a má-fé do alienante. “No CDC, por outro lado, há uma responsabilidade objetiva, independentemente de culpa do fornecedor, o que permite ao consumidor exigir sempre a indenização, além das medidas comuns”, ensinou.

 

Mencionou, ainda, que no CC quem responde pelos vícios redibitórios é o alienante, diante do adquirente, mas no CDC, “há uma expansão subjetiva, ativa ou passiva, porque respondem não só o alienante, mas toda a cadeia de fornecedores, incluindo o comerciante, e as medidas podem ser adotadas não só pelo adquirente direto, como também pelos subadquirentes”.

 

Acrescentou que as medidas são mais amplas no CDC, porque o consumidor também tem a possiblidade de pleitear a substituição. E ponderou que há uma interpenetração entre os sistemas, porque já se admite que o fundamento no CC também é a boa-fé objetiva. “A diferença não está na essência, mas na modulação, na intensidade da incidência do princípio em um campo ou no outro, o que justifica um tratamento muito mais amplo e parcial no CDC, porque o sistema funciona como uma espécie de pêndulo, que reequilibra aquilo que é desiquilibrado, o que não é necessário nas relações paritárias”.

 

Em relação aos tipos de vícios, Claudio Godoy explicou que existem os de qualidade – por inadequação do produto ou serviço (impróprios para o uso esperado ou com valor reduzido) ou por disparidade informativa (artigo 18) – e os de quantidade.

 

Ele esclareceu que respondem pelos vícios de qualidade toda a cadeia de fornecimento, desde o produtor até o comerciante (solidariedade ampla). E citou as medidas disponibilizadas ao consumidor no caso de vício: substituição do produto, restituição da quantia paga e abatimento proporcional no preço, explicando o “aparente condicionamento ao exercício de qualquer dessas prerrogativas”, representado pelo prazo de 30 dias para que o vício seja sanado pelo fornecedor.

 

Por fim, discorreu sobre os vícios de quantidade (artigo 19), relacionados à diversidade entre o conteúdo quantitativo do produto e as indicações quantitativas em qualquer lugar inserida (publicidade, invólucro, recipiente).


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