Novos juízes participam de debate sobre o relacionamento entre o Judiciário e a mídia

    No dia 5 de agosto, o relacionamento entre o Judiciário e a imprensa foi tema de um debate na Escola Paulista da Magistratura, que fez parte da programação do Módulo Especial do Curso de Iniciação Funcional para os juízes aprovados no 180º Concurso de Ingresso na Magistratura.

    O evento foi coordenado pela juíza Carolina Nabarro Munhoz Rossi, responsável pela área de mídia da EPM, e teve a participação do desembargador Augusto Francisco Mota Ferraz de Arruda, do jornalista Sidnei Basile e da assessora de imprensa do Tribunal de Justiça de São Paulo, Mônica Elisabete Caniato.


    Inicialmente, a juíza Carolina Nabarro observou que, embora o relacionamento com a imprensa faça parte da carreira do magistrado, nem sempre há uma preocupação sobre a forma de se lidar com isso. Nesse sentido, salientou a importância do preparo e da definição prévia do que se quer falar, lembrando que o jornalista busca dados específicos. “O juiz deve manter o controle da entrevista. É preciso transmitir o que for necessário, mas sempre dentro da Lei, sem ficar 'refém' das informações ou da mídia", ressaltou.

    A juíza também destacou a necessidade de transparência, por parte do magistrado, inclusive para melhorar a percepção social do Judiciário. “Atualmente, quando se questiona tanto os Poderes, é importante que o juiz não fique fechado, porque o nosso trabalho depende muito da confiança que as pessoas depositam no Judiciário." Ela ressaltou que o juiz deve aproveitar as oportunidades que a imprensa oferece, porque, muitas vezes, não se trata de uma questão apenas do veículo, mas da sociedade. “O juiz deve se preparar para atuar como protagonista e não apenas como interlocutor da informação perante a imprensa, não perdendo a oportunidade de fazer esclarecimentos de interesse público”, afirmou.


    Carolina Nabarro explicou a organização e o funcionamento dos veículos de comunicação, bem como a responsabilidade de cada profissional. Também falou sobre os perfis dos principais veículos de mídia impressa do País e sobre os tipos de entrevistadores, lembrando que os jornalistas buscam o acesso a fontes confiáveis de informações, daí a importância de se obter um dado de um juiz. Nesse contexto falou sobre o alto grau de credibilidade associado à imprensa. “Em razão disso, é muito difícil recuperar a imagem de alguém quando são divulgadas informações incorretas, mesmo se valendo do direito de resposta”, observou.

    Por último, ponderou que o magistrado deve evitar se indispor com a mídia, que pode ser uma aliada em seu trabalho. “Não se pode ver o jornalista como inimigo ou enxergar um conflito entre a imprensa e o Judiciário. Nós representamos um Poder, sobre o qual as pessoas têm o direito de se informar. Prestar esclarecimentos é um dever e não um favor e a imprensa pode ser um canal para o Judiciário divulgar informações de interesse público”, concluiu.


    Em seguida, a jornalista Mônica Elisabete Caniato lembrou aos juízes substitutos que o trabalho da assessoria de imprensa é fazer a intermediação entre o Tribunal de Justiça e a opinião pública, inclusive nos casos de oitiva de testemunhas em que há maior interesse da mídia. “A assessoria de imprensa é responsável pelo acompanhamento dos interrogatórios e pela divulgação das informações para os profissionais da imprensa”, explicou. Ela ressaltou que, por se tratar do maior Tribunal da América Latina, o Judiciário paulista está sempre na mídia. “Recebemos, constantemente, solicitações de jornalistas", afirmou, acrescentando que a assessoria de imprensa está à disposição de todos os magistrados do Estado.


    Na sequência, o jornalista Sidnei Basile salientou que a convivência entre imprensa e Judiciário sempre deve se basear na presunção da boa-fé, acrescentando que o Judiciário tem falhado em explicar sua relevância político-social. “Isso acontece, em boa medida, porque o ritual da Justiça possui um tempo próprio e a sociedade tem demandas que ocorrem em um tempo diferente, mais parecido com o da imprensa. É curioso como a opinião pública confunde uma prisão processual com a condenação”, afirmou, revelando ficar horrorizado com o tratamento dado pela imprensa aos casos de grande repercussão. “Isso constitui uma aberração, no sentido de que põe em risco a democracia, uma vez que os suspeitos são condenados antes do julgamento. Com isso, o fato de ser culpado ou não acaba se tornando um detalhe”, salientou.

    Em relação ao relacionamento com a imprensa, destacou a necessidade de se levar em conta, antes da entrevista, qual o público e qual a mensagem que se quer passar. “O jornalista é apenas um canal para se chegar ao grande público, ao qual ele tem acesso”, lembrou. Discorreu, ainda, sobre a função do porta-voz de uma instituição, ponderando que apenas o juiz pode falar pelo Tribunal. “É um direito do magistrado decidir se quer falar ou não. Também é fundamental negociar o prazo de resposta, o que pode diminuir a ansiedade sobre determinado processo e pedir a orientação da assessoria de imprensa”, ressaltou.

    Ele também frisou que o magistrado deve saber, com antecedência, a pauta da entrevista e ter em mente que sempre fala como pessoa jurídica. “O teor casual de uma conversa fica totalmente diferente quando expresso no papel”. Recomendou, ainda, certificar-se de que o jornalista tenha entendido o que foi dito. “Em caso de dúvida, é muito útil enviar, via e-mail, um esclarecimento, a tempo de ser incluído na matéria, o que traz a vantagem de ficar documentado”, complementou, acrescentando que não se deve deixar perguntas sem resposta, fornecer dados além dos necessários ou expressar opiniões particulares.

    Encerrando o evento, o desembargador Augusto Francisco Mota Ferraz de Arruda salientou que a imprensa não se dirige ao juiz como autoridade, mas sim como fonte de informação. Ele recordou que o magistrado incorpora uma trindade: o juiz como poder, a autoridade pública e a pessoa física. “Fora do processo, o juiz só pode se manifestar como autoridade pública, devendo, por essa razão, dar exemplo de comportamento e ser discreto. Ele não pode se manifestar como pessoa física, porque o público não faz essa distinção”, observou.

    Para ele, o grande equívoco ocorre quando o magistrado supõe que fala como “poder”, perante os veículos de comunicação, e não apenas como autoridade pública, fazendo declarações que podem afetar toda a magistratura. “O juiz que acha que tem poder fora do processo é um atormentado. Se os senhores refletirem sobre isso, suas carreiras serão muito mais suaves”, frisou.

    Por último, o desembargador fez considerações sobre a ética no relacionamento do Judiciário com a imprensa: “A ética da mídia é buscar a verdade. A ética do juiz é buscar o justo e não pacificar a sociedade ou transformar a Justiça em mercado, porque o conflito faz parte da vida e aprimora o ser humano”, concluiu.


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