Poder de investigação do Ministério Público é discutido no curso de Direito Processual Penal

O desembargador Marco Antonio Marques da Silva, coordenador da área de Direito Processual Penal da EPM, ministrou a aula “O poder de investigação do Ministério Público”, no último dia 16, no 7º Curso de especialização em Direito Processual Penal. A aula contou com a participação do juiz Jayme Walmer de Freitas, coordenador do curso.

 

O palestrante afirmou preliminarmente o que considera uma virtude da sociedade democrática e pluralista brasileira: a maneira multiforme de ver o mundo. Mas também assinalou – em contrapartida e como derivativo da multiplicidade do olhar, de acordo com a posição do sujeito e do objeto –, uma tendência da sociedade brasileira em confundir as esferas da legalidade e da ilegalidade. “Cada um faz o que quer, pois a gente está vivendo uma ditadura da interpretação. Mas tem coisas que talvez pudessem ser interpretadas e outras nem tanto, como os princípios, que hão de ser cumpridos”.

 

Com essa assertiva, Marco Antonio Marques iniciou a análise da antinomia legalidade versus ilegalidade. Sustentou que o que é legal na esfera jurídica brasileira está definido na Constituição Federal. “O artigo 5º, inciso II da Constituição dispõe que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer algo, senão em virtude de lei”, observou. E acentuou as cláusulas pétreas, que dispõem sobre os direitos e garantias fundamentais, como a dignidade da pessoa humana e o devido processo legal como base de qualquer condenação no âmbito do Judiciário.

 

Adiante, criticou o excesso interpretativo e o que reputa desvio do sentido estrito da norma, por meio das súmulas, resoluções e atos normativos. “Parece que, às vezes, estamos vivendo a supremacia da interpretação, porque ninguém mais fala o óbvio. Todo mundo manda na vida da gente, em uma ilegalidade, no sentido de que não advém da lei. Entretanto, a primeira coisa que devemos lembrar é que a lei nos vincula, e a ela devemos obediência”, defendeu.

 

Ele comentou ainda as interpretações em prejuízo da cidadania, do direito de defesa ou contraditório, do devido processo legal. “Algumas coisas precisamos tomar como postulado, e o postulado do cumprimento da Constituição é tão importante quanto os dogmas religiosos. O Direito, em vários quadrantes, permite uma interpretação, uma forma diferenciada de ver, mas não podemos, com isso, interferir em outras atividades ou instituições do Estado, cercear direitos e garantias. A sociedade tem que aprender a trabalhar com avanços e recuos, mas nunca atingindo a liberdade e as garantias individuais, porque amanhã pode nos atingir e, pior, atingir quem não possa se defender”, asseverou, citando, ainda, o professor lusitano Manoel Monteiro Guedes Valente, autoridade policial em Portugal: “Uma investigação criminal deve ser aquela que não destrua a essência e o conteúdo dos direitos fundamentais”.

 

No contexto da segurança pública, Marco Antonio Marques discorreu sobre as atribuições específicas das polícias, regradas pelo artigo 144 da Constituição e de como a norma se caracteriza no poder de polícia. Ele ressaltou o parágrafo 4º, cuja redação diz que “às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.”

 

Em prosseguimento, distinguiu as atuações das polícias repressiva e judiciária. “Aquela, faz a primeira linha da repressão ao crime, esta, os atos de investigação, após a prática de um ato delituoso, para preparar e garantir a eficácia do processo penal, manter a regularidade das relações sociais, desestimulando a prática de novas infrações”. E citou o jurista mineiro José Afonso da Silva, para o qual: “a Constituição reservou à Polícia Civil estadual um campo de atividade exclusiva, que não pode ser invadido por norma infraconstitucional, muito menos por atos administrativos”.

 

Afirmou, na sequência, o inquérito policial como um instrumento de investigação da Polícia Judiciária e de subsídio à ação penal, conforme artigo 4º e seguintes do Código de Processo Penal. Contudo, lembrou que, com frequência, é quebrada a sua natureza sigilosa, prevista no artigo 20 do CPP para não atrapalhar o trabalho de coleta de elementos de prova, como forma de garantia da busca da verdade e para a preservação da dignidade e presunção de inocência do investigado.

Poder de investigação do Ministério Público

 

Em relação à questão da possibilidade ou não de investigação pelo Ministério Público, Marco Antonio Marques esclareceu que a Constituição Federal não permite que haja um processo investigativo pelo Ministério Público. Nesse sentido, recordou as funções institucionais do Ministério Público, previstas no artigo 129 da Constituição, frisando que o órgão não foi contemplado com as funções de presidência de inquérito policial. "O Código de Processo Penal, recepcionado pela Constituição, confirma o inquérito policial como um instrumento de investigação penal da polícia judiciária e não há determinação legal que permita a outra instituição criar seus órgãos de investigação, por melhor que seja a intenção”, frisou.

 

Ele acrescentou que também não existe disposição legal que permita ao Ministério Público investigar na Constituição do Estado, nem no Código de Processo Penal ou na própria Lei Orgânica do Ministério Público (art. 26 e seguintes). E recordou que houve cinco emendas constitucionais que possibilitariam essa atuação ao Ministério Público que não foram aprovadas pelo legislador constituinte. O Ministério Público é um titular de direito em ação penal e, se um órgão da acusação passasse a investigar, a defesa ficaria prejudicada”, ressaltou.

 

ES (texto) 


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