Medidas protetivas de urgência na Lei Maria da Penha são debatidas na EPM
As medidas protetivas de urgência na Lei Maria da Penha foram discutidas na reunião do último dia 26 do Núcleo de Estudos em Direito da Mulher em Situação de Violência de Gênero, Doméstica e Familiar da EPM. O debate contou com a exposição da advogada Alice Bianchini e coordenação da juíza Elaine Cristina Monteiro Cavalcante.
No âmbito das medidas cautelares à disposição do magistrado para a proteção da mulher, Alice Bianchini destacou aquela que considera mais controvertida, a prisão preventiva. De acordo com a expositora, o instituto ainda é objeto de uma grande discussão nos tribunais, com muitas dúvidas dos juízes. “A prisão preventiva é a medida protetiva de urgência mais drástica, mas também a mais efetiva, porque se imagina que, colocando o agressor na prisão, a mulher estaria, em tese, mais segura”, observou preliminarmente Alice Bianchini.
A expositora comentou o cerne da polêmica: os reflexos das alterações havidas no Código de Processo Penal, em 2011, na Lei Maria da Penha. Ela citou duas situações. Uma delas, a interpretação de que, a partir da reforma do CPP, só poderia haver uma prisão preventiva após o descumprimento pelo agressor de uma medida protetiva anteriormente determinada pelo juiz, ao passo que a Lei Maria da Penha prevê a decretação imediatamente após agressão. Outra situação lembrada foi a contraposição da possibilidade da decretação da prisão preventiva de ofício pelo juiz, na fase policial, prevista na Lei Maria da Penha, com a vedação da cautela na reforma do CPP. “Novamente, impõe-se a discussão sobre qual normativa está valendo”, comentou.
A eficácia das medidas protetivas de urgência
Do ponto de vista da suficiência e eficácia dos institutos cautelares previstos na Lei Maria da Penha, a expositora asseverou que depende da estrutura das Varas de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher ou nos lugares que não tem a vara, que seria a Vara Criminal. “O juiz sozinho não consegue dar conta da proteção à mulher. Mesmo que decrete uma medida protetiva de urgência, se não tiver um aparelhamento trabalhando em conjunto para a efetividade da proteção, fica muito difícil”, sustentou a expositora. E citou o exemplo da “Patrulha Maria da Penha”, brigadas militares instituídas por meio de parcerias de diversas instâncias do poder público, que fiscaliza o cumprimento da medida protetiva de urgência, já implantadas em cidades como São Paulo, Porto Alegre e Londrina.
Sustentou ainda que, não obstante a edição da Lei Maria da Penha ser datada de 2006, sua aplicação de fato só viria a ocorrer a partir de 2012, quando foram superados os debates acerca de sua constitucionalidade, por meio de uma ação declaratória julgada pelo STF. Recordou que, no início de sua vigência, houve uma grande quantidade de juízes, promotores e advogados que entenderam que a lei era inconstitucional e não a aplicaram. “Os números estatísticos de sua eficácia prática, portanto, hão de ser considerados a partir de 2012, quando a lei passou a ser efetivamente aplicada em todo o território brasileiro”, observou.
Alice Bianchini apontou a dificuldade da pesquisa da violência praticada contra a mulher com base nos dados apresentados. Asseverou que, no que concerne à apuração dos homicídios praticados contra a mulher em razão do gênero, o feminicídio, existe a proximidade entre a quantidade de casos na vida real e aqueles que chegam ao conhecimento das autoridades públicas “mesmo quando não se encontra o corpo da vítima, como no caso da condenação pela morte da modelo Eliza Samudio, cujo corpo até hoje não foi encontrado”. Diversamente, o grau de certeza não é alcançado nos casos de lesão corporal e crimes contra a honra, cujo número real não é conhecido. “A gente tem o número que chega ao conhecimento das autoridades públicas, mas não sabe em que proporção correspondem à realidade”.
Ela revelou, a propósito da estatística do feminicídio no país, apurado a partir de 2010, uma progressão assustadora, “quase cabalística, porque foram 10 mortes em 2010, 11 em 2011, 12 em 2012, 13 em 2013 e 14 em 2014. “Estamos torcendo para que não sejam 15 mortes diárias de mulheres em 2015 e para a reversão desses números sinistros”, externou Alice Bianchini.
Por fim, apontou como causa do aumento estatístico do feminicídio a vulnerabilidade social do envolvimento crescente das mulheres com o narcotráfico, na medida em que houve o reforço na política pública de combate ao comércio ilegal liderado por homens. “Assistimos as mulheres, de certa forma, ocupando esse espaço que antes era um nicho masculino, tanto que 60% das prisões de mulheres deve-se ao envolvimento com as drogas”.