José Geraldo Brito Filomeno analisa os crimes contra as relações de consumo na EPM

No último dia 11, o professor e jurista José Geraldo Brito Filomeno ministrou a palestra “Crimes contra as relações de consumo” no Curso de especialização em Direito do Consumidor da EPM. A aula fez parte do módulo “Tutelas administrativa e penal no CDC” e teve a participação da juíza Márcia Helena Bosch, coordenadora adjunta do curso.

 

Márcia Bosch destacou a participação do palestrante na comissão que elaborou o Código de Defesa do Consumidor (CDC). “Temos o privilégio de ter uma lei cujos mentores podem tirar as nossas dúvidas, pois todos eles estão vivos e com saúde. Entre esses, o professor Filomeno, que costumamos dizer que é a ‘história viva do CDC’”.

 

José Geraldo Brito Filomeno comentou inicialmente a tipificação penal das condutas contra as relações de consumo no CDC, conforme redação dos artigos 61 e seguintes do diploma, “sem prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais”. E fez, em seguida, uma breve retrospectiva da situação antecedente à edição da normativa, na qual falou de aspectos substanciais e evidentes de defeitos de produtos e serviços, flagrados em casos submetidos ao exame do Judiciário, “para demonstrar o quanto o consumidor era abertamente enganado antes da edição da lei, embora hoje continue a sofrer abusos de formas mais sutis em termos de vigilância sanitária”.

 

Ele explicou a natureza jurídica do CDC, caracterizada como uma lei multidisciplinar e interdisciplinar. “O CDC deve ser encarado como um microssistema jurídico, isto é, um minicódigo, por se tratar de lei ordinária, que contém princípios muito importantes, ao lado de dispositivos de natureza civil, administrativa e penal”, ensinou. E revelou que a elaboração do projeto da Lei 8.078/90 contou com o trabalho de duas comissões: o Conselho Nacional de Defesa do Consumidor, e uma comissão paulista, incumbida da redação da parte penal.

 

“A justificativa maior para a existência de tipos penais no CDC é a garantia de que outros preceitos serão obedecidos pelos seus destinatários, isto é, fornecedores de produtos e serviços de modo geral. Em segundo lugar, o seu caráter multidisciplinar, com as tutelas civil, administrativa e penal”, sustentou o jurista. E comentou que, embora a intenção do legislador fosse a convivência harmônica entre os crimes previstos antes da edição do CDC e aqueles tipificados pelo novo instituto, nem sempre essa coexistência pacífica é lograda, havendo frequentes conflitos de interpretação.

 

O palestrante recordou, por outro lado, que houve uma grande discussão no âmbito interno da comissão sobre a pertinência ou impertinência da introdução da norma penal no CDC. E explicou que a razão dessa discussão estava dimensionada pelo fato de que, das leis que se faziam naquela ocasião em defesa do consumidor, examinadas para a montagem do diploma brasileiro, umas 15 ou 16 espalhadas pelo mundo inteiro, só a lei de Quebec, no Canadá, continha dispositivos de caráter penal.

 

“Diante da conclusão de que a ameaça jurídica de uma sanção administrativa ou a imposição de uma condenação cível contra o fornecedor que lesasse o consumidor não seriam suficientes para inibir a pratica de atos atentatórios ao seu direito, partimos da premissa de que, naquele momento, era necessário colocar tipos penais bem definidos na lei para, em um futuro distante, termos um arcabouço penal específico para inserção em capítulo do novo Código Penal”, lembrou.

 

Brito Filomeno sustentou que esse futuro já chegou, porque o projeto do novo Código Penal já foi elaborado e tramita perante o Congresso Nacional, tendo contemplado os crimes introduzidos pelo CDC.

 

Em prosseguimento, analisou os critérios para análise de fatos delituosos. Caracterizou, em princípio, a relação de consumo, com aquela que considera a definição mais singela possível: “Uma relação jurídica qualificada pela existência de uma parte vulnerável, destinatária final de produtos e serviços, em face de outra parte a que chamamos fornecedor”.

 

Ele estabeleceu uma distinção entre os crimes praticados direta e indiretamente contra as relações de consumo. Para Brito Filomeno, os crimes elencados diretamente dentro da categoria relações de consumo, além daqueles introduzidos pelo CDC, são os previstos na Lei 8.137/90, que “define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo”, aqueles previstos na lei de crimes contra a economia popular (Lei 1.521/51) e os crimes de incorporações de imóveis, mais conhecidos como Lei dos Condomínios (Lei 4.591/64). Já os crimes derivados indiretamente das relações de consumo são os crimes contra a pessoa, o patrimônio, a saúde pública, os loteamentos clandestinos, os derivados de cobranças indevidas em contratos de locação, e os de “colarinho branco”.

 

Adiante, Brito Filomeno discorreu sobre os delitos contra a pessoa no âmbito da tutela penal geral do consumidor, quais sejam, as lesões corporais e comprometimento à saúde, em caso de equívoco de receita médica ou de sua execução, acidentes de consumo como aqueles ocorridos em parques de diversões, transporte e turismo, os homicídios culposos e, até, dolosos, desdobramentos dos delitos contra a saúde pública. Também falou dos crimes contra o patrimônio, como, por exemplo, a apropriação indébita, o estelionato-tipo, a fraude no comércio e a defraudação na entrega da coisa.

 

Analisou igualmente os crimes contra a saúde pública, como a infringência de medida sanitária (Art. 268 do CPP) pela reutilização de seringas e agulhas (Lei Henfil, 7.649/88) em procedimento médico, a atividade dos matadouros clandestinos, a corrupção ou poluição de água potável, o envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal, a falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produtos alimentícios.

 

Discorreu, finalmente, sobre os “crimes do colarinho branco”, tipificados pela Lei 7.492/86, que cuida dos delitos praticados pelos responsáveis por instituições financeiras e consórcios de bens, e cujos tipos mais evidentes são a gestão temerária ou fraudulenta, sob a competência da justiça federal. E concluiu a preleção com comentários sobre aspectos do processo penal para apuração dos crimes e casos da jurisprudência sobre o tema.

 

ES (texto)


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