EPM conclui o seminário “As tutelas de urgência e a efetividade da atuação judicial”

Com a análise de temas afetos à administração judiciária e à jurisdição de Infância e Juventude, foi encerrado, no último dia 20, o seminário As tutelas de urgência e a efetividade da atuação judicial da EPM. Coordenado pelas juízas Ana Rita de Figueiredo Nery e Helena Campos Refosco, o seminário teve participação exclusiva de magistrados, presencialmente e a distância, e contou com a presença do diretor da EPM, Fernando Maia da Cunha.

 

O juiz Regis de Castilho Barbosa Filho, assessor da Corregedoria Geral da Justiça, foi o expositor do Módulo V, “Administração judiciária”, que teve como debatedora a juíza Maria Fernanda de Toledo Rodovalho, assessora da Presidência. Foram discutidos os temas “Interlocução com servidores, partes e advogados”, “Produtividade e qualidade da jurisdição: métodos de avaliação e reconhecimento institucional do trabalho judicial” e “Estatísticas e Planejamento”.

 

Regis Castilho agradeceu inicialmente ao diretor da EPM, “pela oportunidade dada à Corregedoria, para que possamos ter um caminho que possamos trilhar, no sentido de ter essa interlocução com os colegas, e agora também com os servidores, nessa iniciativa maravilhosa, que foi a criação da Escola Judicial dos Servidores (EJUS)”.

 

Ele assinalou a importância que as funções administrativas ganharam na administração contemporânea do judiciário. Em sua avaliação, o TJSP “vem se aprimorando muito nos últimos anos em suas políticas públicas, e tem buscado a sua autonomia e a sua independência”. Ele lembrou que até a década de 1980, os magistrados eram nomeados pelo secretário da Justiça, e não se cogitava que o Tribunal pudesse ser dotado da magnitude,  independência e autonomia financeira e administrativa que lhe cabem hoje.

 

Regis Castilho falou do desenvolvimento de uma metodologia própria e aplicável ao Poder Judiciário, no que tange às suas particularidades relativas ao exercício da política e da gestão judiciárias. De acordo com seu entendimento, a administração judiciária há de ser dotada de uma “metodologia instrumental sistematizada de forma padronizada, executada pelos magistrados e servidores, com escopo de concretizar as políticas públicas judiciárias, com forte amparo nos princípios constitucionais de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Ou pode significar, de forma ampla, todo o aspecto da política e da gestão judiciária”.

 

Mas o expositor observou, por outro lado, que a administração do Tribunal, em grande parte na mão dos magistrados (quando assumem a gestão do próprio gabinete e dos fóruns, a corregedoria permanente dos cartórios, dos abrigos da Infância e da Juventude, do serviço extrajudicial notarial e registral, da polícia judiciária, das unidades prisionais, etc.) não se confunde com o exercício do poder jurisdicional. “Trata-se de uma gama enorme de funções que nos são acometidas, e a novidade é, exatamente, a criação dessa metodologia, com um arcabouço normativo e de funções administrativas que permitem que possamos visualizar uma administração judiciária própria”.

 

Maria Fernanda Rodovalho, autora de tese de doutorado sobre a reforma do Poder Judiciário, por sua vez, discorreu sobre a administração da Justiça a partir de seu microcosmo, destacando as suas principais inovações. De acordo com ela, é da tradição pensar o Judiciário como um poder que faz justiça, e não como administração, esquecendo-se o fato de que há um corpo de servidores organizados hierarquicamente, do qual depende esse tipo de prestação de serviço.

 

“Com a Constituição Federal de 88, passamos a ter vários princípios que são próprios de administração pública, e não necessariamente do Judiciário. Hoje, em todos os lugares, em todos os poderes, fala-se da exigência de uma administração pública gerencial, aquela que não está voltada (como na burocracia tradicional) à observância de hierarquias, mas orientada para chegar a uma efetividade, a uma boa prestação voltada para a satisfação do cliente ou consumidor daquele serviço. O problema de administração judiciária se insere nesse contexto”, sustentou Maria Fernanda Rodovalho.

 

A rede de proteção à infância e o papel de interlocutor do juiz

 

O debate desenvolvido no Módulo VI, “Infância e Juventude”, contou com a exposição da juíza Dora Aparecida Martins e a participação do juiz Iberê de Castro Dias como debatedor. Foram abordados os temas “Fortalecimento da rede de infância”, “Ação social do juiz” e “Medidas protetivas e socioeducativas”.

 

“No pequeno mundo onde as crianças levam sua existência, nada há que seja percebido e sentido tão precisamente quanto a injustiça”. Com esta assertiva, a juíza iniciou a exposição sobre a organização da rede de proteção à criança e ao adolescente, defendendo o papel do juiz como principal articulador entre seus atores.

 

Dora Martins discorreu sobre os graus de dificuldade enfrentados na jurisdição da Infância e Juventude, tendo enfatizado uma razão de ordem psicológica em particular, fundada em sua humanidade: “É muito difícil para o juiz que atua em várias áreas cumulativas com a Infância, porque as questões são sempre muito tormentosas, flamejantes, batem no nosso consciente ou inconsciente, e então o nosso menino ou a nossa menina aparecem, e a gente fica com muita dor e sofrimento”.

 

A expositora lembrou que, antes da edição do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os juízes tinham mais poder para tratar as questões emergenciais afetas à infância, e podiam exercer papéis assistencialistas e de polícia, sem contraditório. “O juiz saía, colocava criança no abrigo, destituía o poder da mãe, tudo em um só processo”, recordou.

 

Ela sustentou que, com a edição do ECA, operou-se uma quebra de paradigmas, e o juiz da Infância e Juventude passou a ser um dos atores de um processo complexo e organizado, que visa garantir os direitos da criança e do adolescente. “Obviamente, se atuamos em uma rede, e ela é cheia de buracos e esgarçamentos, não vai funcionar. Então eu acho que a grande luta no Brasil ainda é essa: temos uma rede fragilizada em pontos fundamentais, composta por Vara da Infância e Juventude, conselhos tutelares, comunidade local, CRAS e CREAS, secretarias municipais, unidades de acolhimento, conselhos municipais, defensoria pública e ministério público. Essa rede tem que interagir e conversar, tem que funcionar, senão gera pontos de sofrimento para a criança e o adolescente, que são nossos clientes”, observou Dora Martins.

 

Para a magistrada, além de atuar no processo, o juiz há de exercer o papel de interlocutor com a rede e cobrar ao Estado as políticas públicas para a efetiva proteção da criança e do adolescente. “Em se tratando de infância, tudo é urgente”, sentenciou.

 

Adiante, comentou problemas relativos à adoção e à preservação dos vínculos biológicos. Mas defendeu que o dever do juiz não é prestigiar esse vínculo, mas garantir o direito da criança. “Em meu entendimento, o ECA dá valor mais destacado e de mais sobrepeso à convivência familiar da criança do que ao direito da paternidade. Uma grande mudança de paradigma do ECA é que o direito da criança se sobrepõe ao direito dos pais”.

 

Ela falou ainda sobre o Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária, “um direito da criança, que prevê a adoção e o reordenamento da rede de acolhimento, que abole o conceito de orfanato e adota o conceito de abrigamento, com as opções de ‘abrigo institucional’, ‘famílias acolhedoras’, ‘apadrinhamento’, ‘república para jovens’ e ‘casa-lar’, um sistema em construção”.


As tutelas de urgência em um contexto de premências jurisdicionais

 

Iberê Dias, por seu turno, iniciou sua exposição com a consideração sobre a marca de premência dos pleitos na jurisdição da Infância e Juventude. “Varas da Infância só têm tutelas de urgência. Não existe outra hipótese, porque as questões são absolutamente prementes. Quando comecei a trabalhar na Vara da Infância, tive a percepção real do que é a questão urgente, de qual é o grande problema do tempo no processo. O tempo na Vara da Infância não é só o tempo do processo; é o tempo da criança, que não se mede no relógio, dando a impressão que é sempre no passado, que já foi. E quando você tomar uma medida, é sempre paliativa, e a resolução significa reduzir os danos. Isso é o que é mais cruel”, asseverou.

 

Ele assinalou a importância da  mudança de concepção de postura do juiz na prestação jurisdicional contemporânea. E ponderou que as relações entre o magistrado, os demais atores do sistema Judiciário e os jurisdicionados devem ser feitas na horizontalidade. “O juiz, embora tenha que exercer o poder correcional, tem que descer do tablado, sair da mesa e trabalhar de maneira horizontal. Se existe uma forma de efetivar direitos na Vara da Infância, é atuar preventivamente”.

 

Corredor de maratonas, Iberê Dias falou do projeto “Sua que é sua”, que leva jovens em situação de risco à pratica esportiva de corrida de rua nas manhãs de domingo. “Numa perspectiva de antecipação a problemas, ações desse tipo podem, ao longo do tempo, reduzir práticas infracionais, mas podem, principalmente, fazer da criança e do adolescente um cidadão melhor, mais cônscio de si e de suas responsabilidades, com melhora da consciência corporal e da autoestima, de pertencimento à coletividade”, observou o magistrado corredor.

 

Durante os debates, Dora Martins observou, em relação aos abrigos, que a normativa existe, “mas o que não existe é o apoderamento dos papéis por seus personagens, que são múltiplos”. Ela exemplificou com a cidade de São Paulo, em que a maioria dos abrigos é conveniada com a Prefeitura, mas que o serviço é fiscalizado por uma política pública que prevê a intervenção do Ministério Público, do Judiciário e de outros atores da rede quando o abrigo não estiver funcionando. Mas lembrou que o ECA, “embora seja uma ferramenta útil, ainda não foi totalmente implantado”.

 

Fernando Maia assinalou, ao final, o caráter heroico da atuação dos magistrados que assumem e conduzem as varas da Infância e Juventude, recordando a época em que exerceu a presidência da Seção de Direito Privado e fazia parte da Câmara Especial, que é onde desaguam as questões da Infância e Juventude, ressaltando a importância da experiência de suas juízas assessoras.

 

“Estes nossos encontros pretendem ser muito mais do que foi discutido aqui. Eles pretendem ser um fórum de debates da primeira instância, de questões que vivem os juízes no seu dia a dia. E deixo à disposição dos participantes trazer novas ideias”, conclamou o diretor da Escola.

 

Seminário

 

Com a duração de três dias, o seminário também teve debates direcionados ao Processo Civil (Módulo I), com exposição dos juízes Silas Silva Santos e Alberto Gentil de Almeida Pedroso; às questões afetas ao Direito Penal e Execução Criminal (Módulo II), com exposição dos juízes Maria de Fátima dos Santos Gomes Muniz de Oliveira e Henrique de Castilho Jacinto; aos temas relativos à jurisdição da Fazenda Pública (Módulo III), com exposição das juízas Alexandra Fuchs de Araújo e Luiza Barros Rozas; e ao Direito Civil e Empresarial (Módulo IV), com exposição dos juízes Alexandre David Malfatti e Alexandre Dartanhan de Mello Guerra.

 

ES (texto)


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