EPM inicia módulo sobre responsabilidade e dano no curso “Direito Ambiental”

A palestra “Responsabilidade civil ambiental – Poluidor-pagador – Natureza (objetiva e subjetiva)”, ministrada pelo professor José Rubens Morato Leite no último dia 13, deu início ao Módulo III, “Responsabilidade e dano”, do curso Direito Ambiental da EPM, no qual serão debatidos os temas correlatos nas esferas Civil, Administrativa e Penal. A aula teve a participação do desembargador Eutálio José Porto Oliveira, como mediador, e dos coordenadores do curso, desembargador Ricardo Cintra Torres de Carvalho e juiz Álvaro Luiz Valery Mirra.

 

José Rubens Morato Leite assinalou inicialmente a complexidade dos problemas do Direito Ambiental, fato conducente à necessidade de análise da evolução do sistema para sua compreensão. “A epistemologia do Direito e da área ambiental é mais complexa, porque não é a do conhecimento tradicional. Temos que ter em conta que estamos lidando com uma área transversal e transdisciplinar do Direito por natureza, cuja complexidade e interatividade de questões ultrapassam muito a visão estritamente jurídica”.

 

Ele asseverou que o tratamento jurídico das questões do meio ambiente trouxe uma “ecologização do Direito”, termo empregado pelo jurista português José Joaquim Gomes Canotilho. “A ecologização do Direito já pressupõe uma atividade diferenciada, porque não estamos tratando de um direito interindividual, e sim de um direito difuso e coletivo”, observou.

 

Ele citou como marco do Direito Ambiental de primeira geração, ou seja, um formato legislativo para a busca de soluções para a crise ambiental no âmbito nacional, sem referência a problemas planetários, a legislação americana, da década de 1970.

 

De acordo com o palestrante, Canotilho também define os problemas ambientais de segunda geração como aqueles de ordem planetária, incorporados por tratados internacionais de proteção ao meio ambiente, cujas regras são incorporadas ao sistema normativo dos países signatários.


O professor lembrou ainda que o próprio conceito de bem ambiental sofreu uma mutação. “No sistema normativo brasileiro, partimos para um conceito aberto, em que muitos doutrinadores salientaram que diz respeito à vida em todos os seus sentidos. E ele foi ampliado pela Constituição, a partir do momento em que deixou claro que é um bem de uso comum do povo (artigo 225), que não pertence exclusivamente a ninguém e no qual tem pertinência o equilíbrio ecológico e a qualidade de vida, elevando-se à condição de direito fundamental, de natureza difusa e coletiva”.

 

Diante desse quadro de complexidade, “como julgar as questões ambientais?”, indagou o palestrante. E asseverou que o julgamento exige uma pré-compreensão da problemática ambiental para interpretar de forma hermenêutica a principiologia constitucional aplicável à matéria e as normativas específicas.

 

Elementos problemáticos do dano ambiental e da responsabilização civil

 

José Rubens Morato Leite sustentou a existência de uma multidimensão da própria juridicidade do dano ambiental e um desenho normativo infraconstitucional insuficiente para resolver os problemas jurisdicionais. “Se o bem ambiental é complexo e aberto, e a legislação ambiental infraconstitucional não é muito clara, causando uma dificuldade para o intérprete, temos que nos basear mais fortemente na Constituição Federal”, defendeu.

 

Também comentou elementos agravadores da complexidade dos problemas ambientais e de sua jurisdição, como sua natureza muitas vezes transfronteiriça, cumulativa, invisível, transtemporal (que ocorre num determinado tempo, mas cuja percepção do dano, da consequência, é posterior), além de sua natureza imprescritível. Lembrou ainda o nexo de causalidade e sua complexidade: “muitas vezes é difícil precisar qual o causador do dano, e o sistema fica congestionado com esses problemas”.

 

Outro fator destacado pelo professor foi a ambivalência do dano nessa esfera do Direito. “Ele é ao mesmo tempo um dano individual, coletivo, individual homogêneo e difuso (metaindividual ou plurindividual). E, mais que isso, trabalhamos dentro da norma muitas vezes com a incerteza científica trazida pela própria Ciência, que não nos garante uma certeza, porque trabalha com a lógica da probabilidade. Os dois sistemas não têm uma lógica intrínseca. O sistema jurídico faz com que o juiz seja obrigado a decidir e trazer o maior grau de certeza possível, enquanto que a lógica do sistema da Ciência nos traz a probabilidade”.

 

A proteção do macrobem ambiental relacionado às gerações futuras

 

Entre outros aspectos, o palestrante apresentou um quadro da evolução dos critérios de responsabilização civil. Ensinou que, no século XIX, vigeu a responsabilidade-sanção, fundada na culpa e centrada no comportamento do autor do dano. A doutrina do século XX trouxe a responsabilidade-indenização, fundada no risco e centrada na vítima e na reparação do dano. Ele comentou o aspecto perverso desse sistema, porque retrospectivo, ou seja, que opera a partir de uma lesão e de uma vitimização consumados. Já o século XXI assiste à construção de um sistema antecipatório e preventivo, que traz a responsabilidade-antecipação, fundada na ameaça de riscos sérios e centrada nas gerações atuais e futuras e nos seres vivos, caracterizada pela aplicação de medidas preventivas e precaucionais.

 

José Rubens Morato Leite discorreu ainda sobre a responsabilidade objetiva pela reparação dos danos ambientais, de acordo com a qual o dever de indenizar independe da verificação da culpa do agente, tendo comentado o princípio do poluidor-pagador, expressamente previsto no artigo 225, parágrafo 3 da Constituição Federal, associado ao princípio da precaução. Por esse princípio, assume a responsabilidade pelos danos oriundos do risco criado aquele que exerce uma atividade potencialmente poluidora ou que implique risco a alguém.

 

“O princípio da responsabilidade é multifuncional, na medida em que visa à precaução e à prevenção de atentados ambientais e também à redistribuição dos custos da poluição. Há uma função pedagógica na responsabilidade civil. Os princípios da responsabilidade e do poluidor-pagador buscam a internalização dos custos de deterioração ambiental, fazendo com que pague o preço aquele que polui”, asseverou.

 

ES (texto e fotos) 


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