Lei Maria da Penha e Feminicídio são debatidas no encerramento do 2º curso de Atualização em Direito Penal

Com palestra do promotor de Justiça Rogério Sanches Cunha sobre a Lei Maria da Penha e sobre o Feminicídio, foi concluída, no último dia 19, a programação do 2º curso de extensão universitária Atualização em Direito Penal da EPM.

 

A aula teve a participação do juiz Jamil Chaim Alves, coordenador do curso, que agradeceu a participação do palestrante e dos alunos e os convidou a encaminhar à Escola ou diretamente a ele sugestões de temas para uma terceira edição do curso.

 

Inicialmente, Rogério Cunha recordou que a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06), surgiu no contexto da política de especialização da legislação brasileira ocorrida a partir da década de 1990. Ele salientou que a lei não é uma legislação penal, mas extrapenal multidisciplinar, porque cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar, conforme estabelecido em seu artigo 1º. 

 

O palestrante explicou que o pressuposto de aplicabilidade da lei é a violência de gênero (preconceito, discriminação ou menosprezo quanto ao sexo feminino, deixando a mulher em situação de hipossuficiência). E frisou que a aplicação da lei não deve estar vinculada à existência de crime ou contravenção, mas à violência doméstica e familiar contra a mulher. “A violência prevista no artigo 7º da lei pode corresponder a um crime, como um homicídio (feminicídio); pode não corresponder a um crime, mas a uma contravenção penal (vias de fato); ou pode ser um fato atípico, que não corresponda a um crime ou uma contravenção penal, mas que não deixe de ser uma violência doméstica como, por exemplo, o adultério (violência psicológica)”, esclareceu.

 

A seguir, discorreu sobre as medidas previstas na lei para prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher (artigo 8º), entre elas o combate à veiculação de papeis estereotipados da mulher nos meios de comunicação. Falou ainda sobre as medidas de assistência (artigo 9º) e sobre as medidas protetivas (artigos 22,23 e 24).

 

O professor ressaltou que a Lei Maria da Penha é uma lei só para as mulheres, mas observou que o legislador passou a permitir, em 2011, que as medidas protetivas previstas também fossem aplicadas aos homens vulneráveis (crianças, adolescentes, idosos, enfermos ou pessoas com deficiência).

 

Ele lembrou que o descumprimento de medida protetiva determinada pelo juiz passou a ser condição de admissibilidade da prisão preventiva, tendo em vista que a Lei 11.340/06 alterou o artigo 313 do Código de Processo Penal, que teve o acréscimo do inciso III. Entretanto, ponderou que o descumprimento de medida protetiva por si só não gera prisão preventiva, salvo se houver prática de infração penal. Nesse sentido, lembrou que houve entendimento do STJ de que o descumprimento de medida protetiva da Lei Maria da Penha estaria atrelado ao crime de desobediência, mas, de acordo com entendimento mais recente do próprio STJ, o simples descumprimento da medida protetiva não implica necessariamente crime de desobediência, devendo ser analisado o caso concreto.

 

Feminicídio

 

A seguir, Rogério Cunha discorreu sobre o Feminicídio (Lei 13.104/15), esclarecendo que ele consiste na mais recente circunstância qualificadora do crime de homicídio (inciso VI do artigo 121 do Código Penal), que passou a ser qualificado e considerado crime hediondo quando praticado contra a mulher em razão da condição do sexo feminino, por preconceito, menosprezo ou discriminação quanto ao sexo.

 

Ele destacou as causas de aumento da pena, previstas no parágrafo 7º do artigo 121 do CP: prática do feminicídio contra vítimas gestantes ou parturientes até o terceiro mês após o parto; contra vítimas menores de idade, maiores de 60 ou pessoa deficiência; e prática do crime na presença de ascendentes ou descendentes da vítima.

 

O palestrante analisou algumas questões controvertidas a respeito do feminicídio, entre elas, se a realização da fase inicial do julgamento (pronúncia), deve ser feita pelo juiz criminal ou pelo juiz da vara de violência doméstica e familiar contra a mulher. “De acordo com entendimento recente do STF, a pronúncia é feita pelo juiz criminal, salvo se a lei de organização judiciária dispuser em sentido contrário”, explicou.

 

Outra questão discutida foi a possibilidade ou não da aplicação da Lei do Feminicídio aos transexuais. “Isso depende do critério utilizado para definir o sexo feminino: se for o critério biológico, a transexual não será abrangida na lei, mas, se for utilizado o critério jurídico, que tem prevalecido, a transexual também poderá ser vítima de feminicídio”.

 

Por fim, indagou se o feminicídio é uma qualificadora objetiva ou subjetiva: “Entendo que seja subjetiva, porque ela diz respeito ao motivo do crime, que pode ser preconceito, menosprezo ou discriminação.

 

Curso

 

Iniciado no dia 23 de fevereiro, o curso teve, entre seus palestrantes, a ministra do STJ Maria Thereza Rocha de Assis Moura, o desembargador José Damião Pinheiro Machado Cogan, o professor e procurador de Justiça aposentado Oswaldo Henrique Duek Marques, o procurador regional da República Paulo de Souza Queiroz, o promotor de Justiça Christiano Jorge Santos, o defensor público Gustavo Octaviano Diniz Junqueira e os professores Aury Lopes Junior e Cezar Roberto Bitencourt.

 

Foram debatidos, entre outros temas, as mudanças trazidas pela Lei 12.403/2011; a Lei de Drogas e a jurisprudência a respeito do STJ; a conformidade constitucional e convencional do processo penal; os movimentos de política criminal e democracia; a interpretação do Direito Penal; e os crimes de preconceito e de discriminação.


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