02/05/07: Parceria entre Justiça e Educação é tema de fórum

Parceria entre Justiça e Educação é tema de fórum

Na última sexta-feira (27/04), a sede da Secretaria Estadual da Educação foi palco do fórum Justiça e Educação - Parceria pela Cidadania que apresentou os resultados do projeto de mesmo nome, implementado na comarca de Guarulhos e no bairro paulistano de Heliópolis. A meta principal do projeto foi estabelecer nas escolas estaduais de ambas as regiões os círculos restaurativos, um dos instrumentos práticos de aplicação da Justiça Restaurativa, que é uma nova abordagem empregada no âmbito da resolução de conflitos. A iniciativa tem apoio da Escola Paulista da Magistratura, que abriga, desde o final de 2005, um Centro de Estudos de Justiça Restaurativa.

O projeto, iniciado em agosto de 2006, é uma parceria entre o Tribunal de Justiça, a Secretaria Estadual de Educação, a Coordenadoria de Ensino da Grande São Paulo e a Fundação para o Desenvolvimento da Educação. O corregedor-geral de Justiça, Gilberto Passos de Freitas, presente à mesa de abertura, agradeceu aos juízes coordenadores do Justiça e Educação, Egberto de Almeida Penido e Daniel Issler, pela iniciativa. Também agradeceu à secretária de educação, Maria Lúcia Vasconcelos, pela oportunidade da parceria neste e em outros projetos, como o Paternidade Legal. “Em maio vou à Brasília para reunião com os corregedores de todo o país. Peço licença a vocês, pois estou levando este projeto para que seja estendido a toda nação”, informou o desembargador. A secretária também exaltou a parceria. “Esta é uma ação educativa por parte da Justiça. Queremos ver essa parceria crescendo e se desenvolvendo independentemente do Governo que seguir.”

 

O foco do projeto no ano passado foi a capacitação de facilitadores de práticas restaurativas - agentes voluntários ligados às escolas e também à comunidade. A Escola Estadual Presidente Tancredo Neves, localizada na divisa de Heliópolis com o município de São Caetano do Sul, abriga 1.706 alunos e destinou inicialmente o projeto a suas classes de Ensino Médio. Rapidamente ela pôde contar com a iniciativa de voluntários que o levariam a cabo. Dois professores, a inspetora de alunos e uma aluna representante do Grêmio se apresentaram e buscaram junto à comunidade outros participantes. Uma mãe de ex-aluno e uma psicóloga da região aderiram à causa.

 

A instauração dos círculos nas escolas começou em fevereiro. O primeiro círculo na Tancredo Neves foi realizado depois que duas mães apareceram para falar de um problema envolvendo suas filhas. As garotas vinham trocando agressões pela internet. O círculo foi bem sucedido e a escola ganhou confiança na metodologia. Depois deste, já foram realizados mais três círculos. A diretora da escola, Rosimeire Peron Pinto Velicu, tem conseguido notar certos padrões que aparecem nos conflitos. “Percebemos que o conflito na escola está sempre relacionado à dinâmica familiar”, diz.

 

Em Heliópolis, são oito as escolas englobadas no projeto. Em Guarulhos, são 11. Daniel Issler, juiz da Vara da Infância e Juventude de Guarulhos aponta um elemento essencial para o sucesso da iniciativa. Trata-se da formação da rede de atendimento. “A rede é um movimento social não hierarquizado, no qual os participantes têm a liberdade de expor suas idéias”, diz. Ela é composta por diversas entidades que atendem a crianças e adolescentes e serve para desburocratizar procedimentos e evitar que sejam realizados duas vezes por entidades diferentes, além de facilitar a comunicação entre as instituições. A rede de Guarulhos vem se consolidando desde 2004, quando a comarca participou de outro projeto na área de Família. Já Heliópolis se empenha em formar sua própria rede. A comunidade conta bastante com a estrutura formada em São Caetano, que é sede, desde 2005, da primeira experiência com Justiça Restaurativa do Judiciário paulista, desenvolvendo projeto similar.

 

Os círculos também estão ocorrendo na Vara da Infância e Juventude de Guarulhos e no setor piloto de Justiça Restaurativa no Fórum das Varas Especiais da Infância e Juventude, na capital. Por enquanto, as duas vertentes do projeto só tem realizado círculos em casos relativos a infrações de menor potencial ofensivo. A promotora de Justiça Luciana Bergamo Tchorbadjian, que trabalha com os processos de Heliópolis, defende que “os passos devem ser pequenos, lentos e gradativos” para que todos os envolvidos na implementação do projeto possam assimilar bem as técnicas e experimentos com Justiça Restaurativa. Mas, a longo prazo, considera viável a idéia de lidarem com casos mais graves.

 

O juiz criminal Leoberto Brancher, do Rio Grande do Sul, provou que isso é possível. O magistrado proferiu palestra no evento e exibiu um mini-documentário, PM Brasil, que mostrou um círculo restaurativo realizado em Porto Alegre. O caso levado ao círculo era o de um policial que reagiu a um assalto disparando tiros na perna do menor infrator. O ‘agressor’ e a ‘vítima’ encontravam-se cinco meses após a ocorrência. Estavam presentes familiares de ambos, coordenadoras da Fase (antiga Febem) e a facilitadora. No vídeo é possível perceber toda a emoção que decorreu do encontro. O policial acabou por declarar que perdoava o adolescente, que até chorou quando relembrou o momento dos tiros. Pelo seu depoimento, ficou evidente que havia grande fragilidade em sua estrutura familiar.

O acordo firmado entre os dois envolveu um almoço que seria realizado na casa da avó do menor, com a presença de toda sua família; uma viagem à praia que ele faria com seu pai; uma visita do policial à Fase para relatar sua experiência como vítima de crime e a realização de um vídeo que mostrasse o enredo desse episódio para ser exibido na corporação do policial e incentivá-los a terem novas atitudes perante a realidade do crime. O juiz Egberto Penido, coordenador do ramo Heliópolis, define bem a tônica do projeto: “É uma iniciativa ousada porque trabalha com uma mudança de paradigma cultural”.   

 

 


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