Ministro Dias Toffoli profere aula sobre reforma eleitoral na EPM
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) José Antonio Dias Toffoli foi o palestrante da aula do último dia 6 do 3º Curso de especialização em Direito Eleitoral e Processual Eleitoral, promovido em parceria pela EPM e pela Escola Judicial Eleitoral Paulista (EJEP). O evento contou com a participação do desembargador Carlos Eduardo Cauduro Padin, vice-presidente e corregedor-geral do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) e coordenador da área de Direito Eleitoral da EPM, e dos juízes André Guilherme Lemos Jorge (TRE-SP), diretor-executivo da EJEP; e Richard Pae Kim, coordenador pedagógico do curso.
Dias Toffoli discorreu sobre o tema “Reforma eleitoral”. Ele iniciou a preleção com comentários sobre a crise político-econômica que o país atravessa, externando otimismo quanto ao seu enfrentamento pelas instituições. “Os problemas atuais do país não podem nos abater ou desanimar. Têm que ser enfrentados como um desafio e uma necessidade de melhorar a nossa convivência social. Qualquer crise no processo democrático é muito melhor do que qualquer solução autocrática, que não seja dentro da democracia e das regras do jogo”, asseverou.
Ele ressaltou a importância do conhecimento do processo histórico, advertindo que muitos problemas nacionais de convivência devem-se à primazia de um Estado criado antes da sociedade civil, ainda muito dependente da estrutura dos governos. “Não é à toa que ainda não temos no país um partido liberal clássico, afigurando-se dependentes do Estado todos os partidos existentes. E embora o mandante seja o povo, a maioria das pessoas quer uma resposta dada pelo outro, autoridade ou mandatário”, observou.
De acordo com o palestrante, a tutela estatal da sociedade civil, pouco participativa em todas as esferas de decisão, constitui o principal entrave da consolidação do processo democrático no país. “Temos que incentivar a participação da sociedade e das pessoas nos meios públicos democráticos”, conclamou.
Adiante, Dias Toffoli discorreu sobre a complexidade política do país, apontando um quadro histórico das representações governamentais bastante instável, traçando um paralelo entre crises antigas e a atual. Lembrou que o primeiro imperador, Dom Pedro I, abdicou em favor do filho, Dom Pedro II, que embora tenha governado por 48 anos (de 1841 a 1889), o fez por meio da composição de 32 gabinetes, o que dá uma média de menos de 2 anos de exercício para cada um deles. Também recordou que, nos primórdios da República, o primeiro presidente, Deodoro da Fonseca, renunciou após fechar o Congresso, tendo assumido o seu vice, Floriano Peixoto. Outro episódio lembrado foi o fato de Júlio Prestes, presidente eleito em 1930, não ter tomado posse, tendo sido deposto e deportado o então presidente Washington Luís, ascendendo ao cargo de presidente o segundo colocado, Getúlio Vargas.
Para o palestrante, um dos episódios mais significativos na história política brasileira foram as decisões da Revolução de 1932, uma das quais um pacto em que se estabeleceu que a industrialização seria feita a partir de São Paulo. “Por esse pacto, São Paulo cuidaria da economia, e o resto do país da política, com uma base eleitoral não só proporcional, mas também corporativa, permanecendo até hoje a base proporcional”.
Entre os desafios da reforma política, ele citou o pluralismo partidário, mencionando a atualidade do pensamento do cientista político e sociólogo francês Maurice Duverger (1917–2014), em obra publicada em 1945, durante o processo de redemocratização da Europa. “Maurice Duverger escreveu que qualquer base proporcional com voto em dois turnos leva à pluralidade partidária e à ingovernabilidade”.
O palestrante destacou ainda os debates constituintes que promoveram o protagonismo do Poder Judiciário como poder moderador, “razão pela qual a disputa política passou a ser mais acirrada”.
Otimismo em relação à crise
Dias Toffoli explicitou as razões de seu otimismo para a superação da crise instaurada, comparando a situação dos países do bloco europeu com os países sulamericanos. “Estamos dentro de uma ordem mundial em crise, com um cenário de 50 milhões de refugiados, pessoas em busca de uma nova pátria, rejeitados pelos países europeus, ao contrário do Brasil, que tem absorvido parte desse fluxo migratório sem maiores traumas”, observou. E comentou que, nesse cenário, não há identidades ideológicas que consigam formar maiorias, e que, por esta razão, todas as eleições mundiais têm sido extremamente disputadas.
Entretanto, destacou como vantagem do Brasil a autonomia para a solução dos atuais problemas econômicos e políticos, num quadro de estabilidade de fronteiras, de paz entre nações vizinhas e de ausência de situações políticas internacionais que afetem o país. “São problemas que estão, exclusivamente, dentro da nossa competência e da nossa possibilidade de solução, pois não dependemos de bloco econômico de países, de situação geopolítica ou de decisões de qualquer outro país regional para nos dizer o que devemos ou não fazer. Mas temos que nos olhar no espelho”, destacou.
Outros fatores elencados como geradores do otimismo foram a pujança agrícola, os recursos e as belezas naturais, o caráter multiétnico pacífico. De acordo com o palestrante, em que pesem as diferenças sociais e regionais e a violência a serem enfrentadas pelo conjunto dos poderes, as dificuldades são menores do que as imaginadas pelo senso comum.
Quanto ao papel do Judiciário para a busca de soluções para os problemas nacionais, Dias Toffoli sustentou que o ativismo judiciário não é uma novidade. “O Judiciário sempre foi bastante ativo; a diferença é que não era protagonista das soluções, como o é agora”.
O repactuamento político nacional
Dias Toffoli comentou a reforma eleitoral em curso, aprovada em 2015 e aplicável a partir da eleição para prefeitos e vereadores que ocorrerá neste ano, ponderando que ainda remanesce a necessidade de um repactuamento político do Estado nacional, no sentido de reformular o sistema político-eleitoral em sua integralidade.
Ele assinalou a definição de uma unidade ideológica como um dos principais problemas a serem resolvidos pelos partidos políticos na contemporaneidade, “no cenário de uma sociedade transversal, cujos indivíduos buscam uma identidade, muito mais complexa do que aquela do mundo bipolar comunismo-capitalismo, de alta octanagem, do ponto de vista explosivo, em que, além das disputas entre trabalhadores e capitalistas, tem que atender reivindicações de diversos setores e extratos sociais”.
Apontou ainda como problemas a serem discutidos no âmbito da reforma a constitucionalização das coligações partidárias, a fidelidade partidária e, como consequência, a proliferação de partidos, o teto de campanha e o financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas.
Ele lembrou três grandes novidades do processo eleitoral brasileiro, em matéria de financiamento, destacando os ganhos de transparência e o aumento do poder de fiscalização. As inovações são o fim da doação por pessoa jurídica, decidida pelo STF, a inédita e possível fixação do teto de gastos com campanhas, recentemente aprovada pelo Congresso, e a necessidade de prestação de contas de campanha e sua disponibilização pelos partidos na internet, a cada 72 horas.
“O teto de gastos fornece um parâmetro para comparar uma eleição com outra, para a fiscalização da sociedade, para os partidos fiscalizarem-se uns aos outros, para o Ministério Público Eleitoral atuar e a Justiça julgar o que é abuso de poder econômico”, comentou o palestrante, ressaltando o grau de transparência que deverá ter a próxima eleição.
ES (texto)