EPM inicia o curso “Temas atuais do Direito das Famílias e das Sucessões”

Teve início, no último dia 8, o curso Temas atuais do Direito das Famílias e das Sucessões da EPM, com palestra do juiz Hamid Charaf Bdine Júnior, conselheiro da Escola, e a participação dos coordenadores do curso e da área de Direito de Família e Sucessões da EPM, desembargador Luiz Fernando Salles Rossi e juiz Augusto Drummond Lepage.

 

A aula inaugural teve como tema a “Multiparentalidade: abrangência e repercussões”. Na esfera da também chamada “relação familiar múltipla”, o palestrante analisou casos concretos e situações hipotéticas envolvendo guardas e visitas de filhos, alimentos, reconhecimento de paternidade, emancipação, usufruto de bens de menores, troca de filhos na maternidade, sucessão de direitos e união a três ou “poliamor”, barriga de aluguel e casais homoafetivos.

 

Hamid Bdine discorreu inicialmente sobre problemas interpretativos e práticos enfrentados na seara do Direito no que concerne à multiparentalidade, “um tema complexo, que conta com escassa jurisprudência”. Ele esclareceu que a expressão não se confunde com “biparentalidade”, que refere os casos que reúnem tanto os casais heterossexuais quanto os casais do mesmo sexo.

 

Entretanto, asseverou que o tratamento jurídico do tema dos casais homoafetivos não está mais evoluído que o da multiparentalidade, embora o STF tenha se posicionado pela aplicação da regra da união estável às uniões homoafetivas. “A posição do Supremo encaminha boa parte dessa discussão para uma normatização adequada, com uma sequência de desdobramentos no Direito Sucessório”, observou o expositor.

 

Para o entendimento do status jurídico da multiparentalidade, Hamid Bdine discorreu sobre a filiação. Ele anunciou a existência do consenso de que a filiação não decorre apenas da consanguinidade e de aspectos afetos ao sistema registrário, e que seu foco atual está no tema da socioafetividade, “que ganhou larga aceitação e aplicação intensa no Direito de Família”.

 

Contudo, observou que o STJ propôs uma rediscussão do tema. “O que parecia ser uma verdade consolidada, de que sempre haveria de prevalecer a socioafetividade em relação à verdade biológica, já não é mais algo tão uniforme”, comentou o expositor, para quem o melhor caminho para a solução de impasses jurídico-processuais em torno da questão da filiação ainda é a identificação das peculiaridades do caso concreto.

 

Hamid Bdine problematizou a filiação a partir de casos de paternidade. E para a superação dos problemas conceituais afetos à filiação, afirmou ser necessário responder se pode haver dois pais, explicando que a questão é relevante porque reflete a multiplicidade dos afetos. “Muitas vezes, o enteado tem boas relações afetivas tanto com o pai biológico quanto com o socioafetivo (padrasto). E há casos em que tanto um como o outro querem voluntariamente que o nome de ambos conste do registro”.

 

Para o palestrante, diante desses casos reais, o primeiro questionamento que deve ser feito é se pode haver reconhecimento da paternidade socioafetiva como situação jurídica, no caso de consolidação dessa relação, e não como ato jurídico. Ele observou que é preciso pensar se essa relação precisa de proteção, mas externou a opinião de que, nesses casos, o Direito intromete-se na autonomia privada.

 

Ele ponderou ainda que “a questão patrimonial não pode ser determinante nessas discussões, porque todo raciocínio é construído para a dignidade da pessoa humana e para a busca da felicidade, de modo que deixar predominar a questão patrimonial é uma volta ao passado, embora em alguns casos a proteção patrimonial exsurja como garantia da dignidade”.

 

Princípios da busca da felicidade e da proporcionalidade

 

Em linhas gerais, Hamid Bdine assinalou a necessária observância de dois princípios para a solução adequada dos conflitos familiares na contemporaneidade – felicidade e proporcionalidade. “Há um posicionamento do Direito Civil contemporâneo de que as relações de família devem ser regidas pela busca da proteção da felicidade individual de cada um, sob a égide da autonomia privada”.

 

Ele ponderou, entretanto, que o Direito tem uma visão do mundo bastante conservadora, “até justificada, de certo modo”, e não supõe que as relações familiares possam ser estabelecidas da maneira que convier a quem estiver inserido em determinado contexto sem repercussão social. De acordo com o expositor, pela ótica conservadora, “a sociedade tem o direito de estabelecer limites para a organização familiar, uma verdade implícita bastante questionável, porque o Direito deve buscar o equilíbrio e evitar que, nas relações familiares, haja a predominância de um membro sobre o outro”.

 

Como exemplo de problema no campo de exercício da autonomia privada, falou sobre o reconhecimento do Direito Sucessório de quem casa com o regime da separação convencional. “Do ponto de vista prático, é um problema difícil de resolver, porque sendo o cônjuge herdeiro necessário, o regime de separação de bens pelo qual ele optou reflete de modo inevitável na sucessão, provocando, exata e precisamente, o efeito que se queria evitar”, refletiu o palestrante.

 

Ele comentou que nem sempre se pode interpretar pelo afastamento da cláusula, porque em determinadas situações a proteção de quem casou no regime da separação convencional é útil e necessária. Como regra geral, sustentou que o magistrado deve preocupar-se  com o que é melhor para a organização e o desenvolvimento da família, buscando o princípio da proporcionalidade.

 

“A legalidade caminha para dar razão à possibilidade de dois pais e uma mãe, etc. A Lei 11.924 (que modifica a Lei 6.015/7 – Lei de Registros Públicos), já permite ao enteado ou enteada que, no registro de nascimento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus apelidos de família”, assinalou Hamid Bdine.

 

ES (texto e fotos)


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