Módulo III do curso de Direito Empresarial tem início com aula do corregedor-geral da Justiça

Com a palestra “Princípios fundamentais dos contratos”, foi aberto ontem (15) o Módulo III, “Contratos Empresariais”, do 7° Curso de especialização em Direito Empresarial da EPM. A aula foi ministrada pelo desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, corregedor-geral da Justiça e coordenador do curso, e teve participação do desembargador Fernando Antonio Maia da Cunha, professor assistente do curso.

 

Pereira Calças falou preliminarmente sobre o princípio da autonomia privada, “expressão preferida pelos civilistas, que confere a cada pessoa o poder de conformar suas relações jurídicas de acordo com a sua vontade, usando diversos tipos de contratos típicos ou atípicos”.

 

De acordo com o palestrante, nasce desse princípio o negócio jurídico, que é o instrumento pelo qual cada pessoa atua ou exerce o seu poder de criar direito, de criar a sua lei. O contrato, assim, é uma modalidade do negócio jurídico, “uma norma jurídica estabelecida pelas partes contratantes, orientada pelos princípios gerais estabelecidos pelo Código Civil, que são a eticidade, a instrumentalidade, a boa fé objetiva e a socialidade”, definiu Pereira Calças. E aduziu que, como instrumento da autonomia privada, trata-se de norma dirigida ao Poder Judiciário, no sentido de que, se não houver o adimplemento espontâneo, caberá ao magistrado, coercitivamente, impor aos contratantes o seu cumprimento.

 

O expositor comentou a teoria da crise do contrato no mundo contemporâneo, “objeto de debates e preocupações entre os juristas nacionais e estrangeiros”. Ele lembrou a assertiva do professor norte-americano Grant Gilmore (1910–1982), que sustentou ao seu tempo a morte dos contratos, referindo-se à mudança de paradigma do modelo clássico formal, fundado na soberania da vontade do livre mercado, para se adaptar à realidade das mudanças da sociedade pós-industrial com seus interesses substanciais, permitindo a criação de novos vínculos jurídicos pelo encontro da vontade das partes e com a inevitável consideração dos sujeitos vulneráveis.

 

Em prosseguimento, Pereira Calças discorreu sobre os tipos de contrato, dividindo-os em contratos típicos ou tradicionais e os atípicos ou novos, na perspectiva da possibilidade aberta das inovações contratuais ou mesmo da criação de híbridos entre aqueles previstos no ordenamento jurídico pela força da tradição.

 

Como exemplo de contratos típicos, mencionou os instrumentos de compra e venda, de comodato, de locação e de arrendamento. Entre os contratos mais recentes, surgidos no âmbito da autonomia privada, citou o de alienação fiduciária, de leasing, de transferência de know how, de licenciamento de marcas, patentes e design, os vinculados a pactos parassociais, como o acordo de acionistas, de construção para servir (built to suit, originário do Direito norte-americano, pelo qual se ajusta previamente a construção de imóvel para locação).

 

Ele observou ainda que não há qualquer restrição às possibilidades que as partes têm de estabelecer contratos sui generis, inovadores, com a forma mais livre possível, desde que o façam com a livre manifestação de vontade e sem afrontar as regras jurídicas, principalmente os princípios da boa fé e as normas de ordem pública.

 

Na reflexão que fez sobre o exercício da autonomia privada por meio da criação da norma contratual, o palestrante lembrou que a prerrogativa legiferante, em que pese a divisão tripartite de poderes estabelecidas por Montesquieu, não é atribuição exclusiva do Poder Legislativo, sendo exercida também pelo Judiciário e pelo Executivo. Lembrou, por exemplo, que é o próprio Tribunal de Justiça quem edita o seu regimento interno, que é uma norma jurídica originária da competência constitucional.

 

Pereira Calças passou, enfim, à análise dos princípios clássicos que devem reger a criação dos contratos, que são a autonomia da vontade, a dignidade da pessoa humana, o consensualismo e o pacta sunt servanda (força obrigatória dos contratos).

 

Ele assinalou a necessidade de sopesamento de interesses, de obrigações e direitos nos contratos clássicos de natureza bilateral, para que as prestações e contraprestações convencionadas entre os contratantes fiquem num patamar de isonomia e igualdade. Lembrou que o “sinalagma”, nada mais é do que a possibilidade de permanência da equação econômica do contrato comutativo. “A observância do princípio da isonomia evita que, subsequentemente, o Poder Judiciário interfira domesticamente na economia do contrato para restabelecer o sinalagma, em razão de onerosidade excessiva, de impossibilidade jurídica de cumprimento ou ainda em razão da mudança da situação fática”, afirmou.

 

Na perspectiva do princípio do equilíbrio econômico dos contratos, ele comentou ainda que o primeiro ramo do Direito em que se procurou restabelecer a igualdade entre contratantes economicamente desiguais foi o contrato de trabalho. “Uma frase que eu uso em todo tipo de contrato, quando há uma desigualdade técnica econômica, principalmente, para se restabelecer uma igualdade hipoteticamente jurídica, é “que entre o forte e o fraco é a liberdade que escraviza e a lei que liberta.

 

Pereira Calças também comentou o princípio moderno da função social do contrato. Além de sua função clássica de criar e circular riquezas, nos termos do artigo 421 do Código Civil, “a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.

 

ES (texto e fotos)


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