Correntes feministas, violência doméstica e licenças parentais são debatidas na EPM

Foi realizada hoje (24) na EPM a palestra Feminismos e direitos – violência doméstica e licenças parentais em uma perspectiva comparada, proferida pela professora Joanna Vieira Noronha, com a participação das juízas Camila de Jesus Mello Gonçalves e Helena Campos Refosco, coordenadoras do evento.

 

A palestrante discorreu sobre “Correntes feministas nas Américas e suas principais ideias”, “Violência doméstica” e “Licenças parentais”, temas afetos à pesquisa que vem realizando na Harvard Law School, com foco em feminismos, gênero e sexualidade, design institucional, Direito de Família e Direito Comparado.

 

Ela revelou preliminarmente o eixo do debate – a análise da pluralidade das ideias sobre o feminismo e suas correntes nas Américas, como elementos fundamentais para o desenho de políticas públicas e projetos de justiça que levam em consideração o princípio da igualdade de gênero e a sexualidade, na interface entre o normativo e o descritivo. “Há projetos feministas bastante díspares, baseados em projetos de justiça bastante diferentes, que por sua vez possibilitam alianças com projetos de justiça não feministas, e precisamos conhecer as raízes dos argumentos  dessas correntes teóricas, para que possamos aplicá-las à nossa realidade. A ideia principal é “feminismos”, justificou.

 

Adiante, ela buscou uma definição de feminismo, “uma ideia que envolve empoderamento das mulheres, porque elas estão em um patamar diferente dos homens, e a gente quer mudar isso”.

 

Em um quadro comparativo, discorreu sobre os principais focos de produção das ideias que circulam pelo mundo sobre o tema, principalmente nos EUA, França e Inglaterra. Apresentou a teoria da acadêmica Janet Halley, na obra Split decisions”, de acordo com a qual há três características mínimas que definem um projeto feminista. “Uma primeira característica é que alguns enxergam homens e mulheres como grupos distintos, focados na diferença entre masculino e feminino com lentes mais ou menos binárias; uma segunda característica é que existe algum tipo de desnivelamento, consistente em algum tipo de subordinação das mulheres pelos homens ou do feminino pelo masculino; uma terceira característica é que, se o projeto é feminista, vai tentar empoderar as mulheres ou diminuir essa distinção”.

 

Ela destacou ainda a “teoria queer”, desenvolvida pela filósofa pós-moderna norte-americana Judith Butler. De acordo com essa teoria, a orientação sexual e a identidade sexual ou de gênero dos indivíduos resulta da cultura;  portanto, não existem papéis sexuais essencial ou biologicamente inscritos na natureza humana, antes formas socialmente variáveis de desempenhar um ou vários papéis sexuais.

 

Também falou sobre o feminismo liberal norte-americano, que aceita a diferença entre masculino e feminino, mas vê o desnivelamento entre homens e mulheres como algo tênue, abrigando a crença no potencial do Direito como instância niveladora. De acordo com a palestrante, Janet Halley formulou uma classificação de feminismo aceita como útil por vários países. “Ela defende basicamente a existência de duas correntes clássicas centrais de pensamento feminista nos Estados Unidos. Uma é o feminismo centrado na ideia do poder, outra, o feminismo cultural.

 

Joanna Noronha apontou como principal teórica do feminismo do poder Catharine Alice MacKinnon, que transita entre ativismo político, advocacia e teoria do Direito. “Para MacKinnon, o mundo está estruturado em relações de poder, e no centro dessas relações está a subordinação feminina, um conceito que ela reputa mais importante que o marxismo. Ela teve a audácia de dizer que o feminismo é o jeito de pensar a estrutura de poder”, observou.

 

A palestrante falou sobre a importância do feminismo brasileiro: “seu papel é pensar, criar vocabulário sobre a desigualdade de gênero, atritar diferentes correntes feministas, incitar o espírito crítico e o pensamento de alternativas, trazer teorias de fora e aplica-las à realidade brasileira”.

 

Helena Refosco também manifestou-se sobre o contexto brasileiro, assinalando a necessidade  de pensar em formas de avançar a pauta de  forma consistente. “Muitos fatos graves ocorreram recentemente. Tentou-se restringir pela via legislativa, ainda mais, a já bastante restrita liberdade reprodutiva da mulher, mas houve reação das mulheres. Também ocorreram estupros coletivos em mais de um Estado da federação, e as mulheres mostraram que não admitiriam a culpabilização da vítima. Há grupos feministas sendo formados para organizar o ativismo nessa área. Há muito a ser feito. A Constituição garante a igualdade política, econômica e social da mulher, mas essa promessa nem sempre se traduz em realidade”.

 

Violência doméstica

 

Em prosseguimento, Joanna Noronha analisou o tema da violência doméstica à luz das ferramentas conceituais. De acordo com a palestrante, por volta do ano 2000, basicamente todos os grupos feministas concordam que a violência doméstica precisa ser tratada de forma específica pelo Direito. “Diante da percepção da violência doméstica contra mulheres, e da insuficiência dos instrumentos tradicionais do Direito Penal para lidar com ela, as pessoas começam a criar legislações específicas, de que é exemplo a Lei Maria da Penha, editada em 2006 no Brasil. Os estados norte-americanos também criam leis lastreadas na igualdade substantiva ou material”, relatou a palestrante.

 

Entretanto, ela observou que as leis criadas nos EUA nesse sentido não sobreviveram à ideia da igualdade material, regressando-se ao princípio da igualdade formal. “A regressão reflete problemas da transição do descritivo para o normativo, ou seja, vê-se um problema e desenha-se o Direito para lidar com ele, mas às vezes o direito ricocheteia e não dá certo”, ponderou a expositora.

 

Licenças parentais

 

A palestrante falou por fim sobre as licenças parentais, “uma licença remunerada ou não remunerada que as pessoas tiram quando adotam uma ou mais crianças”. Ela observou que, nos Estados Unidos, a licença parental não é remunerada, e que França e Suécia são países que a pagam de longa data, com afastamentos do trabalho por períodos que oscilam entre nove meses e um ano.

 

No Brasil, desde 2013, a licença parental é remunerada e concedida a pais e mães ou pessoas adotantes do mesmo sexo por 120 dias, no caso de adoção ou guarda judicial para fins de adoção e, independentemente da idade do adotado, que deverá ter no máximo 12 (doze) anos de idade.

 

ES (texto e fotos)


O Tribunal de Justiça de São Paulo utiliza cookies, armazenados apenas em caráter temporário, a fim de obter estatísticas para aprimorar a experiência do usuário. A navegação no portal implica concordância com esse procedimento, em linha com a Política de Privacidade e Proteção de Dados Pessoais do TJSP