Efeitos do uso de documentos falsos nos atos notariais e de registro são discutidos em aula na EPM

O juiz Hamid Charaf Bdine Júnior, conselheiro da EPM, foi o palestrante da aula do último dia 17 do 3° Curso de especialização em Direito Notarial e Registral Imobiliário da Escola, dedicada ao estudo do tema “Efeitos dos atos notariais e de registro realizados mediante uso de documentos falsos”. A palestra teve a participação do desembargador Francisco Antonio Bianco Neto, professor assistente do curso.

 

O expositor discorreu, inicialmente, sobre as escrituras como atos que exprimem “não propriamente a verdade do seu conteúdo, mas os cartórios e os atos notariais expressam, por intermédio desse delegado da atuação do Estado, aquilo que é reprodução da manifestação de vontade ou da intenção de quem outorga a escritura”. Essa reflexão conduz à necessidade de identificação do serviço notarial a partir do plano do negócio jurídico.

 

Hamid Bdine Júnior observou que, para se compreender o desdobramento do negócio jurídico, deve-se atentar para o fato de que ele deve ser feito apoiado em um plano tríplice de interpretação, como se respondesse a três perguntas sucessivas: "verifica-se uma manifestação de vontade e se diz: isso existe? Se existe, é válido? Se existe e é válido, produz efeitos?", explicando que é com base nessas argumentações que se inicia o processo de definição de negócio jurídico.

 

“O negócio jurídico é um gênero em que se incluem todas as manifestações de vontade que tenham aptidão para um efeito de criação, modificação ou extinção de relações jurídicas”, sintetizou o palestrante. E esclareceu que os negócios jurídicos são definidos também pela presença de certas peculiaridades, como por exemplo, “os negócios ditos unilaterais, como são os testamentos ou os contratos, que têm por fim serem um negócio de natureza patrimonial”.

 

Ele explicou ainda que a existência do negócio jurídico está condicionada à presença de três elementos estruturais: a manifestação de vontade, o objeto possível e a forma, detendo-se ao esclarecimento de que a forma constitui “o canal de manifestação da vontade, sendo que não há viabilidade de se estabelecer um negócio jurídico sem que haja forma, por isso ela está presente no plano da existência”.

 

Em prosseguimento, explanou sobre os requisitos que compõem o plano de validade do negócio jurídico, estabelecidos no artigo 104 do Código Civil: agente capaz, representado ou assistido; objeto lícito, determinado ou determinável e forma livre, salvo quando a lei exigir solenidade. “Esses requisitos são adjetivos da lei para os elementos da existência. O Código Civil só traz o negócio jurídico dentro do sistema a partir do plano da validade, já que para o plano da existência o legislador não estabeleceu regras”, frisou, acrescentando que, superados os dois planos anteriores, a próxima etapa é consistente no plano da eficácia.

 

Na sequência, Hamid Bdine Júnior tratou da falsidade de documento na celebração de escritura pública, ressaltando que a frequência com que ocorrem esses fatos justifica-se por ser uma prática que vem se sofisticando. “A maioria dos casos tem origem na falsidade de procuração, iniciando, assim, a falsidade das escrituras”.

 

O expositor mostrou que a discussão daí decorrente implica na inexistência dos negócios jurídicos, pela falta de “manifestação de vontade de quem participara falsamente do negócio”. Entretanto, assinalou que existe uma linha reflexão que defende que, quando da existência de uma procuração inverídica, o titular da procuração não se vincula ao negócio realizado, pois se trata de um negócio oculto ou dissimulado.

 

Ele acrescentou que alguns autores defendem que “o mandatário, que pode ser alguém verdadeiro e está celebrando um negócio para o qual não tem poderes, pode prometer a venda e responder pelo negócio que fez, que seria a promessa ou venda de bem de terceiro, o que não é ilícito, desde que seja entregue. Portanto o negócio jurídico seria dissimulado e válido”.

 

No entanto, advertiu, fundamentando nos artigos 167 e 170 do Código Civil, para a ausência de um requisito na última hipótese, que é a intenção das partes no resultado daquele negócio. “É preciso que o negócio aparente esconda o negócio verdadeiro que as partes desejariam fazer se soubessem que a simulação não prevaleceria. Não me parece possível aplicar esse raciocínio ao caso do documento falso, pois uma coisa é comprar de alguém que tem poderes para entregar, outra é saber que o bem vendido não pertence a quem está vendendo”, concluiu.

 

FB (texto)


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