Ética dos conciliadores e mediadores é discutida no curso de Métodos alternativos de solução de conflitos

Aula foi proferida por José Renato Nalini.

 

A aula do último dia 12 do Curso de especialização em Métodos alternativos de solução de conflitos da EPM foi dedicada ao tema “Ética na mediação: o Código de Ética na Mediação”. A exposição foi ministrada pelo desembargador José Renato Nalini, secretário estadual da Educação e ex-presidente do TJSP, com a presença do juiz Ricardo Pereira Junior, coordenador do curso.

 

Nalini refletiu inicialmente sobre o alto índice de judicialização no País, onde existem cem milhões de processos para uma população com 206 milhões de pessoas. “O Brasil judicializou a vida. Qualquer problema passa a ser, independentemente de sua dimensão, algo que cedo ou tarde será enfrentado por um juiz ou um tribunal”. Nesse contexto, destacou a proliferação de faculdades de Direito no Brasil, salientando que o número total supera a somatória das faculdades de Direito existentes no restante do mundo. “Enquanto os Estados Unidos possuem entre 180 e 210 faculdades de Direito, o Brasil tem cerca de três mil. Apenas São Paulo tem mais faculdades de Direito do que várias nações”, complementou.

 

O palestrante chamou a atenção também para a violência existente no Brasil, com 60 mil homicídios por ano, incêndios de ônibus, invasões de escolas, rebeliões em presídios. “A paz é algo que o Ocidente não cultiva como o Oriente. A Índia, que possui uma população bem mais numerosa que a nossa, com pobreza acentuada e sistema de castas, tem índices muito reduzidos de violência”, observou. Ele explicou que neste país existe o conceito de “ahimsa”, a falta de violência no sentido absoluto, o que significa banir da consciência qualquer sintoma de ódio, ressentimento ou mágoa em relação aos semelhantes. “Também é violento aquele que é indiferente em relação ao próximo”, completou. E citou situações como o bullying, o humor pesado, a insensibilidade, e a frieza em relação às pessoas “invisíveis”, que vivem de maneira indigna, ponderando que são formas de violência e ferem o princípio da dignidade da pessoa humana, o que se reflete no excesso de judicialização.

 

Nesse contexto, ele recordou a edição da Resolução 125/2010 pelo Conselho Nacional de Justiça, com o objetivo de “consolidar uma política pública permanente de incentivo e aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução de litígios”. “Quando se percebeu que a eficiência processual, o acesso ao sistema de Justiça e a responsabilidade social são objetivos estratégicos do Poder Judiciário, o CNJ editou a Resolução 125/2010”, ponderou.

 

O expositor observou que a mediação e conciliação podem auxiliar na redução de recursos e execução de sentenças, “um dos motivos de o Tribunal ter iniciado tais práticas na segunda instância”. E acrescentou que podem reduzir perdas, porque, em um processo comum, o réu pode ter de pagar um grande valor e na conciliação este pode ser parcelado e negociado.

 

Ética dos conciliadores e mediadores judiciais

 

Nalini recordou que, a partir de experiências positivas com a conciliação e a mediação, o CNJ regulamentou e editou o Código de Ética para conciliadores e mediadores judiciais, com redação conferida pela Emenda 2/16 da Resolução 125/2010. Ele elencou como princípios fundamentais do Código a confidencialidade, a decisão informada, competência, imparcialidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes, empoderamento e validação.

 

Em relação à confidencialidade, lembrou que o mediador e conciliador tem o dever de manter em sigilo tudo o que lhes é dito na sessão, salvo autorização expressa das partes ou no caso de que tal sigilo viole ordem pública ou leis vigentes. O conciliador ou mediador também não podem ser testemunhas do caso ou atuar com os envolvidos em qualquer hipótese.

         

Quanto ao princípio da decisão informada, Nalini esclareceu que ele consiste no “dever de manter o interessado plenamente informado quanto aos seus direitos e ao contexto fático no qual está inserido”, porque, quando alguém aceita a mediação, deve ter uma ideia clara das consequências e resultados que se podem colher desta opção.

 

Nalini ensinou a seguir que o princípio da competência consiste em possuir qualificação técnica, conforme previsto na Resolução 125/10, “submetendo-se às reciclagens periódicas obrigatórias para a formação continuada”.

 

Ele esclareceu que o princípio da imparcialidade significa atuar com “ausência de favoritismo, de preferência e vedação a qualquer preconceito”, bem como garantir que valores pessoais não interfiram no resultado do trabalho.

 

Nalini discorreu também sobre independência e autonomia do mediador e conciliador, frisando que devem atuar com liberdade, sem sofrer qualquer pressão interna ou externa. “É preferível recusar, interromper ou suspender a sessão se ausentes as condições necessárias ao seu bom desenvolvimento”, salientou.

 

O palestrante analisou depois o princípio de respeito à ordem pública e às leis vigentes. “Como se cuida de um Código de Ética, é preciso ser mais exigente e austero de que atender à mera legalidade estrita. Ética é muito mais do que isso”, frisou.

 

Quanto ao princípio de empoderamento, esclareceu que se trata de um aspecto pedagógico a ser observado pelos mediadores e conciliadores, que devem instruir as partes de modo que em futuros problemas análogos já possuam condições de solucionar o conflito por si mesmas. “As partes não podem ser ‘súditos do Judiciário’ (objetos da vontade do Estado e juiz) como também do conciliador e mediador”, asseverou.

 

Por fim, discorreu sobre a validação, que conceituou como o dever de estimular os interessados a se perceberem reciprocamente como seres humanos merecedores de atenção e respeito. “Conciliar, mediar ou participar de qualquer modalidade de composição consensual de conflitos não é apenas um ato neutral, técnico, despido de uma conotação essencialmente ética. A validação é mostrar que existe um espaço no qual a pessoa é tratada como pessoa, não como parte anônima, invisível. A conciliação deve ser um ambiente afável. E tenho certeza que se consegue muito mais com esta empatia do que com conhecimento jurídico inexpugnável”, concluiu.

 

LS (texto) / FB (foto)


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