Contribuição da pesquisa empírica para o controle e monitoramento de litígios é debatida na EPM
Trabalhos do Numopede foram discutidos no evento.
Foi realizado no último dia 8, na EPM, o I Workshop sobre a contribuição da pesquisa empírica para o controle e monitoramento de litígios, coordenado pelos juízes assessores da Corregedoria Geral da Justiça Ana Rita de Figueiredo Nery, Leandro Galluzzi dos Santos, Maria Rita Rebello Pinho Dias e Renata Mota Maciel Madeira Dezem, integrantes do Núcleo de Monitoramento de Perfis de Demandas (Numopede), vinculado à Corregedoria.
A mesa de abertura teve a participação dos desembargadores Carlos Alberto de Salles e Sérgio Seiji Shimura, das juízas Maria Rita Dias e Renata Dezem, e dos professores Carlos Ari Sunfeld e Heitor Sica.
Renata Dezem lembrou que o Numopede foi criado no final do ano passado para verificar qual o perfil das demandas que ingressam no Judiciário, analisar dados e propor recomendações aos juízes. “Nosso objetivo é contribuir para que as atividades sejam conduzidas da melhor forma possível, com base em racionalização, economia processual e conhecimento sobre as demandas, para que não sejamos vítimas do sistema e sim protagonistas”, explicou.
O painel inicial, “Organização e produção de dados empíricos para conhecimento das demandas e gestão do Poder Judiciário”, teve como debatedores os desembargadores Carlos Alberto de Salles e Sérgio Seiji Shimura e professor Heitor Sica.
Sérgio Shimura chamou a atenção para a divulgação de dados pelo Numopede sobre demandas abusivas, que comprometem a eficiência, celeridade, gestão e credibilidade do Judiciário, citando como exemplo o ajuizamento de 700 ações idênticas pelo mesmo advogado, perante várias empresas, relacionadas à inclusão em cadastro de inadimplentes, com pedido de danos morais. “Diante da atuação desses profissionais, parece-nos que se não houver uma iniciativa institucionalizada pela Corregedoria, trabalharemos somente no varejo para coibir esses abusos”, ponderou. Nesse sentido, sugeriu a fixação de critérios ou teses para a concessão ou não da justiça gratuita, via precedente ou Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR); a aplicação uniforme de mecanismos de coerção, litigância de má-fé ou do dispositivo de casos repetitivos do novo CPC; e o diálogo com a OAB, Ministério Público, outras Corregedorias e o CNJ.
Carlos Alberto de Salles salientou a importância do trabalho do Numopede e da utilização dos dados empíricos, não apenas para lidar com a “patologia”, mas para gerir a massa de processos. “Temos um manancial muito grande com a análise do dado empírico, para transformar uma resposta do Judiciário que, no mais das vezes, é intuitiva, para uma racionalmente pensada”. Ele destacou três pontos centrais, sugerindo questões para serem discutidas: a litigância repetitiva, os grandes litigantes e o gerenciamento de processos pelo Judiciário. Em relação ao último, apontou três frentes de ação: o encaminhamento de casos para solução consensual; a utilização do IRDR e de ações coordenadas pelo juiz e pelo Judiciário; e a avaliação dos limites desse gerenciamento para não causar prejuízo às partes.
Heitor Sica propôs a criação de ferramentas computacionais para identificação de movimentos anormais na distribuição de processos, para que o Numopede não dependa de denúncias. Ele também sugeriu o tratamento distinto para demandas repetitivas e para casos de aumento anormal do número de ações, com a utilização de ferramentas processuais previstas no novo CPC. E refletiu sobre as dificuldades para gerir ações de planos de saúde, ponderando que, embora repetitivas do ponto de vista jurídico, exigem o aprofundamento do caso concreto. “Talvez não tenhamos prevalência de questões comuns, o que desautorizaria ações coletivas ou incidentes como o IRDR”. Entretanto observou que alguns dispositivos do novo CPC teriam potencial para gerir esse tipo de ação, citando o artigo 69, parágrafo 2º, inciso VI.
Na parte da manhã, foi realizado ainda o painel “Acesso à Justiça x acesso à solução jurisdicional: razões da judicialização de matéria regulatória e possibilidades de articulações interinstitucionais”, que teve como debatedores os professores Carlos Ari Sunfeld, Paulo Eduardo Alves da Silva e Marcos Lisboa, presidente do Insper.
Difusão de boas práticas
O período da tarde foi dedicado à exposição dos resultados do Numopede e das boas práticas recomendadas pelo Núcleo, feita pelas juízas Ana Rita de Figueiredo Nery e Maria Rita Rebello Pinho Dias.
A abertura dos trabalhos foi feita pelo corregedor-geral da Justiça, desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, que agradeceu a participação de todos e lembrou que o Numopede surgiu a partir da necessidade de se verificar o tipo de demanda que é distribuída no TJSP, em especial para apurar repetições ou excessos que sobrecarregam magistrados e servidores e prejudicam a prestação jurisdicional. “Muitas vezes, identificamos o uso indevido ou abusivo do Judiciário, inclusive para a prática de fraudes”, observou.
Manoel Pereira Calças explicou que o objetivo do Numopede é divulgar as informações obtidas para todos que atuam no Judiciário paulista, para que possam não apenas ajudar a detectar fraudes, mas também participar de políticas e metodologias judiciárias que visam à eficiência do atendimento ao jurisdicionado. “Precisamos criar uma cultura de estudo, análise e prevenção de práticas predatórias que afetam o Judiciário”, concluiu.
Maria Rita Rebello esclareceu que o Numopede tem três enfoques: as demandas de massa, os grandes litigantes e o uso abusivo ou indevido do Judiciário, questões tradicionalmente gerenciados de forma pontual pelo juiz, sem um resultado imediato positivo. “A Corregedoria pode contribuir para repensar os problemas de forma administrativa, em uma perspectiva mais ampla e eficiente”. Nesse sentido, destacou a necessidade de disponibilizar informações aos juízes sobre as ações repetitivas, para que tenham uma visão global e possam aplicar soluções de forma mais rápida e pacífica.
Em relação aos grandes litigantes, ela ressaltou que são responsáveis por 30% dos processos de algumas unidades judiciais. “Se conseguirmos conscientizá-los sobre o impacto que têm na atividade judiciária, podemos orientá-los a aprimorarem a forma como peticionam, contribuindo para a eficiência do Judiciário”. Quanto à abusividade, identificou as ações com distribuição atípica, “que capturam grande parte da força de trabalho, com serviços volumosos e repetitivos, e com frequência, que não necessariamente refletem uma situação de tensão social existente”.
Ana Rita Nery ressaltou que o Numopede também constitui um veio de comunicação entre o primeiro grau e entre este e o segundo, na difusão e suporte normativo da Corregedoria para as boas práticas do 1º grau. “O Núcleo identificou práticas muito positivas no primeiro grau, mas fragmentadas, que acabavam não sendo mantidas em segundo grau por falta de conhecimento sobre a incidência ou da abusividade ou por violarem normas da Corregedoria”, observou.
Entre as boas práticas recomendas pelo Numopede, Ana Rita Nery destacou a divulgação do perfil das demandas atípicas (justiça gratuita, lides genéricas, poucos pedidos); a análise detida da inicial, com identificação do conflito, para verificar se existe efetivamente o litígio, e, em caso de dúvida sobre o conhecimento da parte sobre a existência da ação, ouvi-la pessoalmente. “Essa é uma prática muito eficaz e cívica, porque, muitas vezes, a parte não sabe que moveu a ação em questão”, frisou, citando também a importância da análise minuciosa dos documentos.
Complementando as recomendações, Maria Rita Rebello lembrou a utilidade do convênio do TJSP com o Serasa e com o Serviço Central de Proteção ao Crédito (SCPC) para averiguar eventuais manipulações de informações em documentos. Por fim, lembrou que o Numopede está à disposição para receber informações sobre situações estranhas ou de uso atípico do Judiciário, por e-mail (numopede@tjsp.jus.br), que serão muito bem-vindas para contribuir para o aprimoramento da prestação jurisdicional.
MA (texto) / FB (fotos)